quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

O Porto é só…




O Porto é só uma certa maneira de me refugiar na tarde, forrar-me de silêncio e procurar trazer à tona algumas palavras, sem outro fito que não seja o de opor ao corpo espesso destes muros a insurreição do olhar.

O Porto é só esta atenção empenhada em escutar os passos dos velhos, que a certas horas atravessam a rua para passarem os dias no café em frente, os olhos vazios, as lágrimas todas das crianças de S. Victor correndo nos sulcos da sua melancolia.

O Porto é só a pequena praça onde há tantos anos aprendo metodicamente a ser árvore, procurando assim parecer-me cada vez mais com a terra obscura do meu próprio rosto.

Desentendido da cidade, olho na palma da mão os resíduos da juventude, e dessa paixão sem regra deixarei que uma pétala poise aqui, por ser tão branca.


Eugénio de Andrade


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