terça-feira, 30 de abril de 2019

COPOS DE SEDE





Se duvidas da tua sede, se não te atreves
a perguntar-lhe ou a dar-lhe um nome,
se só sabes que procuras uma água
que a sacie e não encontras senão poços,
e neles ecos que te chamam, bebe.

Se a sede ao beber desaparece
é porque era só sede. Continua a procurar.

Mas se cresce em ti quando a sacias,
se queres não deixar de ter sede
e sim continuar a beber dia e noite
copos de sede, não duvides:
podes chamar-lhe amor, continuar sofrendo,
e saber que não existe quem te guie.


 Juan Vicente Piqueras
in, Instruções para Atravessar o Deserto





Uma Lágrima na Face da Índia





O livro conta a história de um enfermeiro inglês chamado Noah com 32 anos, que trabalha num hospital em Londres, no serviço oncológico da Pediatria. Um trabalho muito difícil de gerir emocionalmente porque lida diariamente com crianças com cancro, muitas delas acabam por não resistir e partem deixando os pais num desgosto profundo.
O livro começa por relatar esse dia-a-dia desse enfermeiro e da sua decisão de tirar licença no trabalho para viajar para a Índia, Cambodja e Bali. Acabou por se sensibilizar com a situação fragilizada das mulheres indianas e ficou só pela Índia.

Tudo começou quando, ainda no hospital, leu um livro que dizia assim:
“ Aproveitas-te, meu velho, a tua vida como sempre sonhaste?
E o teu talento, o que fizeste com o teu talento? Pegaste nele e fizeste maravilhas pelo mundo, ou deitaste-o fora, com verdadeira cobardia, enquanto pensavas que estavas a desperdiçar uma vida inteira e te lamentavas, perdido nos recantos da tua casa, que eras incapaz de seguir para diante?”
Também eu passei por isto aos 36 anos, o que me fez olhar para uma porta que eu teimava em manter fechada, sem saber o que podia encontrar lá dentro, quando à minha espera estavam outros gritos, outros sons, e uma nova felicidade que teimava em não chegar.
Não parece nada demais, pois não?
Questionamos, pensamos e agimos.
Eu, tal como o Noah, sentia que estava a desperdiçar a minha vida com coisas sem importância, e pensava que, devia fazer algo diferente com a minha vida, com mais valor, com mais significado. Pensava nas mulheres e crianças que vivem para lá do meu horizonte, o que estariam a fazer e se precisariam da minha mão amiga pronta a ser estendida e amparar a queda de alguém. O que eu não sabia era que para o saber fazer com o coração, teria primeiro de amparar a minha própria queda.
Precisava de ir em busca de não-sei-o-quê, com uma nova língua e uma nova força, pelo mundo, porque o mundo é uma casa sem teto para todos nós. E, tal como o Noah, o meu coração chama-me para a Índia, para amparar a queda de meninas e mulheres que vivem nas ruas sem teto.
Por tudo isto, este livro me tocou profundamente no coração.

Quando chega à India, hospeda-se em Old Delhi, e descreve várias experiências que teve lá e que são o ponto de arranque para tudo o que acontece a seguir. Conhece um comerciante chamado Ilesh em Chandni Chowk, um dos mercados mais antigos de Old Delhi, que lhe dá o contacto de uma sobrinha de um amigo seu, para ser a sua Guia Turística durante a sua estadia na Índia, chamada Sahana. Quando a vê apaixona-se de imediato, mas ela já estava prometida em casamento contra sua vontade pela família para um polícia de Delhi. E é através da Sahana que passamos a ter conhecimento sobre como é nascer menina na Índia. 

Antes de conhecer Sahana, depois de sair da loja do Sr. Ilesh, foi comer um Sheekh Kabab por 40 rupias, a moeda da Índia, que são 0,60 cêntimos (lá é tudo muito barato desde que seja comprado na rua) e conheceu um homem chamado Lambodar que lhe contou que era casado há 46 anos e que era pai de 7 filhos todos rapazes, e disse-lhe que era um homem de sorte porque não tinha filhas. Explicou-lhe que as mulheres são uma Maldição. Que as mulheres na Índia não são livres, porque antes de nascerem já o seu destino está traçado: a morte ou o sofrimento.
Depois, através da Sahana ficamos a saber a razão do Lambodar ter dito isto a Noah.

Um dia, ao observar as pessoas na rua, interrogou-se “Onde estão as mulheres?”.
Poucas eram as mulheres que caminhavam no meio dos homens, e as poucas que por ali andavam, tinham um olhar assustado, preocupado, e tímido. Foi pesquisar na net, e encontrou uma imensidão de notícias assustadoras sobre as mulheres da Índia: mulheres violadas, mulheres espancadas, mulheres assassinadas, bebés meninas mortas à nascença, meninas abandonadas na rua, mulheres e meninas raptadas, desaparecidas. 
Leu um artigo de jornal que relatava uma violação colectiva num autocarro em Delhi no dia 29 de Dezembro de 2012( eu vi um documentário sobre isto na net e fiquei arrasada). A rapariga era estudante de medicina e foi violentamente espancada e violada por 6 homens, incluindo o motorista, dentro do autocarro, até à sua morte.
Depois, numa viagem que fez até Varanasi com Sahana, ela explicou-lhe que a principal razão para haver tanta pobreza e miséria na Índia é a existência dos Varnas e das Castas. Os Varnas são uma categoria, condição social, uma posição numa ordem hierárquica. Enquanto que as Castas (Jati em hindu) são entidades mais pequenas, que dependem da origem, da zona onde se vive, do trabalho que se tem, do parentesco. Cada Casta é única e tem as suas próprias características, rituais, língua, deuses, regras… os Varnas são Categorias que, embora se encontrem dentro das Castas, não as constituem. É uma complexa divisão social hindu, e quem nasce nesta ou naquela Casta, vive e morre nessa determinada Casta. Entretanto, foi declarada ilegal mas, o sistema permanece como forma de tradição, desigualdade social e discriminação.

Existem 4 Varnas, por ordem de importância: 
- Brahmins, a classe mais alta, considerados quase Deuses, e são os sacerdotes, os professores e os filósofos;
- Kshatriyas, são os soldados, os polícias e os administradores;
- Vaishyas, são os comerciantes e homens de negócios;  
- Shudras, são os camponeses, artesãos, operários e servos.
Por último, há um grupo que é considerado sem Casta. São excluídos da sociedade e são considerados impuros e por isso ninguém lhes toca. São os Dalits, os chamados Intocáveis, aqueles que fazem os trabalhos mais desprezíveis, como limpar o lixo, etc…

O Sistema de Castas assenta numa noção religiosa: a pureza e a Impureza.
Milhões de Dalits continuam a sofrer de forma permanente a discriminação. Dão-lhes trabalhos sujos, como limpar o lixo, excrementos, varrer, pavimentar, eliminar corpos humanos das ruas, limpeza de esgotos, limpeza de fossas, sendo obrigatório que a limpeza seja feita com as próprias mãos sem luvas.
Ninguém lhes toca, e não comem comida feita pelos Dalits, ou tocada por eles, para não contaminarem as pessoas de outras Castas. Não lhes é dado nenhum respeito nem nenhuma dignidade. Quem nasce Dalit, morre Dalit, e muitas crianças acabam abandonadas nas ruas, porque filhos de Dalit serão sempre Dalits.

Isto das Castas é um problema sério com fortes consequências nas comunidades indianas.
As crenças religiosas hindus continuam enraizadas nas comunidades, porque existe uma enorme resistência à mudança. As meninas e as mulheres Dalits continuam a ser exploradas e são maltratadas. Habitualmente são mulheres sem educação e analfabetas. Algumas são chamadas Devadasis, ou Servas de Deus. O hinduísmo é caracterizado por ter muitos Deuses e diferentes Ritos, e este das Devadasis é praticado há muitos anos, em que se acredita que as meninas nasceram para servir uma divindade de um templo, durante toda a sua vida. Elas estão presas ao trabalho e são exploradas desde a sua infância. Depois, mais tarde, são obrigadas a prostituir-se. Quando as meninas são entregues a um templo local, elas casam-se com a deusa Yellamma, a Deusa da Fertilidade, assim que atingem a puberdade. Nessa altura, geralmente entre os 8 e os 12 anos, a sua virgindade é vendida a um homem de Casta Superior e, a partir daí, tornam-se escravas da Deusa. Depois disso, não podem casar com nenhum homem e são obrigadas a usarem objectos que demonstram que são Devadasis. A função delas, até serem consideradas velhas ou pouco atractivas, é servir os desejos sexuais dos homens das suas comunidades. Dizem delas “ Devadasi, Servas de Deus mas esposas de toda a cidade”.
Elas são presas dentro deste sistema, e fazem-nas acreditar que o que fazem é perfeitamente aceitável porque é algo que estão a fazer por devoção à Deusa Yallemma, que está presente na comunidade e tem poder sobre a vida das pessoas, e por isso estas mulheres e meninas crianças acreditam (ou acreditavam algumas) que se não cumprirem a devoção pela Deusa, toda a sua família será amaldiçoada, mas se cumprirem e agradarem a Deusa, ela trará saúde e riqueza. Elas não recebem dinheiro em troca mas, recebem presentes. Dantes viviam no templo mas, hoje em dia isto transformou-se num negócio, em que são vistas como superiores em relação às prostitutas normais dando-lhe um carácter sagrado valorizando mais o negócio para quem o explora.
Para combater a pobreza, os pais entregam as suas meninas ao templo, em troca de um emprego ou dinheiro. Eles sabem que não estão a prestar nenhuma devoção á Deusa mas, fecham os olhos a troco de algum dinheiro. São os pais que decidem a vida delas, e elas nem sabem para o que vão, só descobrem mais tarde quando chegam à puberdade. Outras meninas e mulheres, são vendidas para tráfico e exploração sexual em várias localidades da Índia. 
Esta prática foi proibida pelo Estado, mas são os próprios polícias e políticos a recorrer às Devadasis para satisfazerem as suas necessidades sexuais, e nos dias de hoje elas continuam a prestar a devoção á Deusa em suas casas, sendo uma fonte de rendimento para os seus pais.

A violência sexual na India é um crime frequente o que leva a que as mulheres não se sintam seguras na rua. As mulheres grávidas de meninas são obrigadas a abortar, a matar as bebés à nascença ou a abandoná-las na rua. 
Este é o maior problema da India:
Violação sexual, Infanticídio e Genocídio.       
 
Quanto ao Infanticídio e Genocídio, as famílias acreditam que os rapazes trarão Força, riqueza, bênçãos e saúde à Família. As raparigas são consideradas uma maldição para a família porque, terão de dar um dote à família do noivo (bens materiais e dinheiro) para eles a sustentarem. Ficam sem a filha e sem os seus bens e o seu dinheiro. É o fim de uma linhagem familiar.

Quanto à Violação, a India tem uma cultura que apoia e defende que as mulheres devem ser violadas como forma de castigo, de poder masculino e disciplina. 
Todos os anos são mortas mais de 100 mil mulheres só porque elas não reproduzem rapazes, ou porque os maridos não ficam satisfeitos com a quantidade de dinheiro que recebem da família da noiva quando se casam.

As crenças tradicionais hindus dizem que as meninas têm de ser educadas para serem boas filhas e esposas obedientes. Elas devem ficar em casa e fazer todo o trabalho doméstico. Uma mulher que se desvia das normas sociais representa uma vergonha para a família e para a sociedade, e é punida violentamente como meio de controlo social e castigo. Por exemplo, uma mulher nunca deve sair à noite sozinha, muito menos com um homem. Nem deve sair à rua de noite para fazer as suas necessidades em zonas onde não existem casas de banho. É completamente inaceitável. Mulheres idosas são violadas por irem de noite à rua fazer as suas necessidades, e na sua maioria morrem na rua abandonadas. 
Os homens culpam sempre as mulheres pelas suas violações. Em alguns casos, são obrigadas a casar com o agressor, se ele o exigir, de forma a recuperar a sua dignidade. E o preocupante é que, algumas mulheres, admitem por vezes por medo que, provocaram um comportamento violento por parte dos homens. Acreditam que não têm outra escolha senão aceitar a violência por parte dos homens. E isto acontece tanto com as mais velhas, como com as estudantes do ensino médio e universitário.

Eu acredito que o problema está na educação dos mais novos, que crescem em ambientes hostis.
Se eles vêm ao longo do seu crescimento desde pequenos, um comportamento de violência contra a mulher, existe uma forte probabilidade de seguirem o mesmo comportamento porque é o considerado normal e aceitável. Isto chama-se de Modelagem. Por isso acredito que a solução está, a médio e longo prazo, na reeducação de valores e crenças tradicionais.
50 milhões de mulheres estão desaparecidas na India!
Todos os dias, 100 mulheres são violadas!
Uma grande parte da violência contra as mulheres indianas é violência doméstica, queimadas com ácido e espancadas até à morte, raptadas e mortas, fruto de uma crueldade medonha por parte dos maridos e dos sogros, por receberem dotes pequenos, não terem rapazes… é precisamente no leio conjugal onde ocorrem o maior número de crimes. Isto acontece em todos os estratos sociais e económicos, mas a pobreza  e a baixa escolaridade agravam bastante a situação devido ao stress económico, à falta de conhecimento sobre as leis, e à falta de informação sobre a igualdade de género. Quando os homens perdem o controlo socioeconómico vingam-se na mulher espancando-a por tudo e por nada. É uma forma de Poder e Controlo, de mostrar a sua masculinidade, de mostrar quem manda. O homem indiano de classe média acredita que masculinidade é agir com autoridade, exercendo livremente esse privilégio de ser homem para estabelecer regras nas relações pessoais e para controlar as mulheres. Para serem homens precisam de ser rígidos, e o pior é que muitas mulheres acreditam e aceitam isto.

Quando uma mulher não se apaixona por um homem logo cedo, passado algum tempo a família escolhe um homem para ela casar e ter filhos, porque é uma vergonha para a família ter uma filha que não seja casada. Eles têm esse poder sobre as filhas. Se as mulheres ficarem muito tempo sozinhas, as famílias começam a sentir vergonha porque os outros começam a dizer que ninguém as quer porque andam na rua com outros homens e não prestam. 
É o estatuto social da família que fica em causa.
As mulheres na India são sempre propriedade de alguém…primeiro dos pais, e depois dos maridos e da família dos maridos. Podem mantê-las, vendê-las ou matá-las. Por isso existem 50 milhões de mulheres desaparecidas na India. Esses desaparecimentos não são investigados.
Quando os dotes não são do agrado do marido e da família do marido, a violência começa logo no início do casamento. Os dotes podem ser em dinheiro e em bens materiais, como terras, casas, carros, ou outras coisas de valor. Na india, quando o noivo não fica satisfeito com os dotes que recebe da parte da família da noiva, ele pode espancá-la ou matá-la, como forma de castigo, de revolta, de machismo. A entrada de uma mulher na família do noivo não serve para nada se a sua família não der bons dotes ao noivo. As mulheres são uma fonte de entrada de dinheiro na família do noivo, e por isso só querem ter rapazes, porque é uma fonte de rendimento.
Os dotes estão fortemente relacionados com o infanticídio e com o genocídio. 
As mulheres na India vivem numa sociedade que diz. “Nós não queremos mulheres. Mulheres são uma maldição!”

Quando uma mulher engravida de uma menina é obrigada pela família do noivo a abortar antes da bebé nascer. Se a mãe não aceitar é perseguida até ao fim da gravidez e quando a menina nasce é morta pela família do noivo. Se a mãe conseguir salvar a menina, tem de a fazer desaparecer de casa, abandonando-a na rua. São obrigadas a abortar e a engravidar até terem rapazes, e caso não consigam, são consideradas inúteis e por isso são espancadas e assassinadas, para poderem casar de novo. 

As mulheres significam 
a saída de dinheiro e bens materiais numa família.
Os homens significam 
a entrada de dinheiro e bens materiais na família.
E isto faz com que as meninas sejam logo indesejadas.


Os indianos dizem: “perdemos as nossas filhas porque passam a ser propriedade da família do noivo, ficamos sozinhos sem ninguém para cuidar de nós, e ainda temos de pagar para mantê-las noutra família.
Ter uma filha na India é como regar o jardim do vizinho.”

Muitos pais nem se sentem tristes quando matam as filhas. Eles acreditam que, em vez da criança sofrer no dia-a-dia por ser menina na pobreza ( 1 em cada 4 não resiste até à puberdade, por homicídio por negligência por falta de tratamento médico), é preferível matá-la logo após o seu nascimento. 
Isto não acontece só na India.
Há outros países asiáticos e africanos que fazem o mesmo.
No mundo, há cerca de 200 milhões de mulheres desaparecidas.
Só na India são 50 milhões.
Elas estão desaparecidas porque deixaram de existir, foram assassinadas.

Os rapazes quando nascem são vistos como uma bênção.
As raparigas quando nascem são vistas como uma maldição.
Elas são mortas através do aborto selectivo, ou pelo infanticídio, ou abandonadas na rua, e por isso deixam de existir demograficamente.  
Na India e na China, 30% das meninas são mortas antes de nascerem.

Isto virou um negócio bastante rentável porque, o Estado proibiu os aparelhos de ultrassom para saber o sexo do bebé antes de nascer, e passou a ser obrigatório registar os aparelhos de ultrassom e a informar quem queria fazer o teste e porquê, mas a maioria dos médicos ignora a Lei e aceita o dinheiro das famílias como suborno. Ganham milhões com isto.
As famílias pobres, que não têm possibilidade de recorrer à medicina, para evitar os dotes, matam as filhas à nascença ou abandonam-nas na rua. 

Outra forma de fazer desaparecer as mulheres é através da violência física. 
Elas são brutalmente assassinadas pelas famílias dos maridos.

Outras também desaparecem por serem traficadas para fins de exploração sexual, muitas vezes vendidas aos traficantes pelos maridos.

Há coisas que estão a mudar na India, mas há outras que só levantam polémicas, nomeadamente no que diz respeito à Educação.
A India criou a Lei do Direito à Educação, mas depois o Governo aprovou uma alteração na Lei de Proibição do Trabalho Infantil, que permite que as crianças com menos de 14 anos trabalhem nos negócios familiares. Isto é um retrocesso porque a Lei deveria proibir qualquer trabalho infantil e ser obrigatório irem para a escola. Esta alteração à lei, para além de permitir o trabalho infantil, também permite que as famílias recusem a entrada dos filhos na escola. Esta alteração foi feita porque acreditam que trará vantagens para as crianças. Acreditam que estão a ajudá-las a ganhar espírito de empreendedorismo. Isto é inacreditável!
O que representa uma criança que faz um trabalho contra a sua vontade?
Escravidão!
Primeiro salientam a importância de irem à escola, mas depois emendam uma Lei antiga, que proibia o trabalho infantil em 83 áreas consideradas perigosas, passando a proibir qualquer trabalho infantil, excepto nos negócios familiares. Ou seja, agora têm as crianças a trabalharem, com a desculpa de serem negócios familiares. Não dá para entender uma emenda destas nesta lei, quando a India é o país com mais incidência de trabalho infantil.
Agora, as crianças voltaram a trabalhar nas fábrica e nos campos. As escolas vão ficar vazias de novo, e recomeçará o tráfico humano de crianças para a exploração comercial. Haverá sempre a desculpa de que a criança é parente de alguém, e não haverá forma de provar o contrário.
O que aconteceu de imediato foi: a maior parte das meninas deixaram de ir à escola, e a maior parte delas estão desaparecidas. 
Se as mulheres têm o mesmo tratamento na escola? Sim e não.
Por Lei, elas têm o mesmo direito à Educação que os homens, mas depois verifica-se que os homens com os mesmos cursos que elas, têm salários muito mais altos e muito mais regalias. A descriminação continua, e elas têm um nível de Educação bastante inferior ao dos homens, e a maior parte abandonam a escola precocemente por causa do dever patriarcal. 

Seria um grande avanço se as mulheres estudassem, porque existem vários estudos que associam a baixa escolaridade à pobreza e à necessidade das mulheres trabalharem em casa, além de que a educação das mulheres tem um papel importantíssimo para o país. A Alta Educação permite que elas sejam mais competentes dentro e fora de casa, encoraja e promove a educação das crianças, especialmente as do sexo feminino, reduzindo assim a taxa de feticídio. Podemos prevenir o feticídio com o aumento da escolaridade!!

A India, em muitas zonas rurais, vê na Educação o veículo para uma mudança social na comunidade. Está provado que a falta de educação nas mulheres surge associado à pobre nutrição dos seus filhos e também à morte dos mesmos.
A Educação serve não só para explicar o feticídio, como também a violência contra as mulheres. E por isso, a educação é importante para as mulheres, mas também para os homens, porque os homens com uma educação mais elevada e com atitudes favoráveis em relação à igualdade de género, estão menos propensos a terem comportamentos violentos contra as mulheres. 
Por outro lado, o stress económico, o fracasso no trabalho e a insegurança parecem agravar e perpetuar a violência contra as mulheres. Isto está relacionado com as normas de masculinidade e as expectativas dos homens relativamente a sustentar economicamente a família, mesmo nas situações em que a mulher trabalha e tem o seu salário. Logo, pela lógica, se houvesse mulheres com mais escolaridade, elas teriam os seus salários e a situação financeira da família melhoraria e evitaria comportamentos violentos contra elas mas, na realidade não é isso que acontece…em muitos casos, quando elas ganham mais dinheiro do que eles, a violência doméstica aumenta, para os homens demonstrarem o seu poder e superioridade.
E assim voltamos ao problema da masculinidade, e à superioridade dos homens em relação às mulheres na India.

As questões para se chegar à Discriminação levam-nos a várias situações, como o abuso sexual, o espancar, e a violência psicológica que acontecem dentro de cada família, e à observação da violência entre os pais.
Esta questão da observação, chama-se Teoria de Aprendizagem Social de Bandura, em que o processo de aprendizagem decorre a partir da Observação do comportamento de outras pessoas. É o que se chama de Modelagem. No entanto, os comportamentos não serão postos em prática sem que haja uma motivação, mesmo que os tenha observado e memorizado.
A motivação será, “Se ele pode bater nas mulheres, eu também posso”, “Se ele bate nas mulheres, então eu também irei bater”. As crianças são muito influenciadas por aquilo que vêem nas figuras masculinas. O controlo sobre as mulheres nas suas variadas formas e o respeito incutido que lhes dá outro estatuto social. Os rapazes interiorizam estes comportamentos violentos contra as mulheres como sendo aceitáveis para expressar a sua insatisfação, o stress ou a sua desaprovação. Ou seja, a violência e a discriminação podem ser desenvolvidas como normais se a criança, durante a sua infância, observar ou for vítima de algum tipo de violência ou discriminação. Essas crianças terão quatro vezes mais probabilidades de terem comportamentos violentos, quando comparado com homens que nunca experienciaram este tipo de violência e discriminação. 

A lei de 2013 inclui agora pena de morte para as violações que causam a morte ou estado vegetativo da vítima, a relação sexual de um marido sobre a esposa durante o divórcio, a relação sexual de uma pessoa numa posição de autoridade, e a violação colectiva. Inclui também crimes como ferir alguém com ácido, assédio sexual, voyeurismo, intensão de se despir e perseguição. Estas alterações foram importante para a India, no entanto existe muita corrupção na polícia e na maioria das vezes os processos não chegam aos tribunais e a justiça nunca é feita. Os elementos das Forças Armadas continuam com imunidade e são uma enorme ameaça para as mulheres. Para além disto, a idade mínima para casar continua a ser os 16 anos, e a violação no casamento é legal.  

Está lá no Código Penal:
“ Relações sexuais ou acto sexual por um homem com a própria mulher, não tendo ela menos de 15 anos, não é violação”. 

Isto é permitido para não criar situações de stress nas famílias e também por questões culturais e religiosas do hinduísmo. A India é uma sociedade patriarca, onde os homens lideram em casa, e a mulher é considerada um Ser Inferior. Só por ser mulher, ela tem de se sujeitar a fazer o que ele manda. E se eles quiserem ter sexo, é obrigação da mulher aceitar e não se negar, porque quando ela casa com um homem, ela já sabe que é esperado que ele domine em todas as esferas da vida. No fundo, o corpo delas é deles. Quando uma mulher casa, o homem assume que ela está a consentir ser dominada por ele e a ter relações sexuais, e por isso exige que ela lhe obedeça. Quando por algum motivo, ela não dá o seu consentimento, ele tem o direito de a forçar através da violência. Isto proíbe legalmente as mulheres de dizerem “Não”. Os homens sabem que a lei os protege, o que lhes permite fazerem o que querem das mulheres dentro de casa. Isto explica a enorme incidência de violência doméstica na India.

As mulheres na India não têm qualquer valor: são mortas à nascença, assassinadas, raptadas para exploração de trabalho infantil, trabalho sexual, escravidão, são espancadas, violadas… 

Eu continuo a achar que a melhor forma de alterar isto é através da Educação, tanto dos meninos como das meninas. Por várias vezes me disseram que “Não podemos fazer nada!” e cruzam os braços e ficam a assistir nos seus sofás à miséria humana nas televisões, tornando-se indiferentes a tanta tragédia humana que lhes entra em casa pela televisão. Nós podemos não conseguir mudar milhões de vidas mas, se cada um de nós mudar uma vida, se preocupar com outra e lhe fizer bem, imaginem o bom que este mundo poderia ser. 
Sermos uma para cada uma!
Eu acho que este é o dever de todas as pessoas!
Começar por aí, por ser uma para cada uma!
Depois, se conseguirmos mudar mais vidas, melhor.
É claro que é nosso dever cuidar e respeitar todas as pessoas que se cruzam no nosso Caminho!
Mas, num país como a India, onde os homens odeiam as mulheres, que mais podemos nós mulheres desejar, a não ser que cada um se preocupe com uma só mulher, e mude a vida de uma só mulher?
Seria um excelente começo!
O importante é Salvar alguém! 
As pessoas têm de ter consciência disto. 
A Paz e a dignidade é um Direito de Todos!!!





          

sábado, 27 de abril de 2019

Desejos Vãos





Eu queria ser o Mar de altivo porte
Que ri e canta a vastidão imensa!
Eu queria ser a pedra que não pensa,
A pedra do caminho rude e forte!

Eu queria ser o Sol, a luz imensa,
O bom do que é humilde e não tem sorte!
Eu queria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!

Mas o Mar também chora de tristeza…
As árvores também, como quem reza,
Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!

E o Sol altivo e forte, ao fim de um dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as pedras… essas… pisa-as toda a gente! …


Florbela Espanca










Adios Nonino - Astor Piazzolla

O Instante





Quem posso eu chamar, que palavras lúcidas 
e sóbrias, veementes 
poderão despertar as ondas felizes, 
que outro apelo, que outro alento 
aproximará as árvores, o hálito das suas frases? 

Quem me oferecerá no seu corpo o estuário das mãos,  
que prodígios da terra deslizarão no repouso, 
que declives, que jardins, que palácios diminutos,  
que intangíveis enlaces, que adoráveis volumes? 
Quem me dará o sossego da fábula mais pura 
com o exacto relevo imediata e vagarosa?  

Real e perfeita 
num deslizar de gozo, em lábios que emudecem deslumbrados, 
real e completo, secreto, imediato, maravilhoso 
é o instante que descobre o animal mais ardente, 
a mais ardente exactidão 
a mais oferecida à claridade, 
a mais contínua, a mais profunda suavidade. 

Estamos dentro de um seio onde nascemos  
como de uma montanha latente, somos a nascente confusão 
de múrmurios silvestres e a magia natural 
de um silêncio límpido, abraçamos a maravilha 
aqui e agora, reconcentração na felicidade, 
na evidência de delícias, múltiplas, fatais. 


António Ramos Rosa






Every point is the center





In an infinite fractal of rotation, how do you define the center? 
Every point is the center. 
You are the center of the universe observing the universe from your very own center. 
Wherever you pick a point of observation in the fractal, that point becomes the center from which you're observing the universe. 
That point becomes stillness. Why stillness? 
Because in that point now, all the spins of the universe cancel out.… 
You need stillness to have a frame of reference for rotation… 
And that's how singularity occurs. 
Singularity is the point at the center of your experience of the universe, that is the point of stillness from which you're observing the universe.

Nassim Haramein





sexta-feira, 26 de abril de 2019

A Sad State Of Freedom





You waste the attention of your eyes,
the glittering labour of your hands,
and knead the dough enough for dozens of loaves
of which you'll taste not a morsel;
you are free to slave for others--
you are free to make the rich richer.

The moment you're born
they plant around you
mills that grind lies
lies to last you a lifetime.
You keep thinking in your great freedom
a finger on your temple
free to have a free conscience.

Your head bent as if half-cut from the nape,
your arms long, hanging,
your saunter about in your great freedom:
you're free
with the freedom of being unemployed.

You love your country
as the nearest, most precious thing to you.
But one day, for example,
they may endorse it over to America,
and you, too, with your great freedom--
you have the freedom to become an air-base.

You may proclaim that one must live
not as a tool, a number or a link
but as a human being--
then at once they handcuff your wrists.
You are free to be arrested, imprisoned
and even hanged.

There's neither an iron, wooden
nor a tulle curtain
in your life;
there's no need to choose freedom:
you are free.
But this kind of freedom
is a sad affair under the stars.



Nazim Hikmet






Totem Animal Pessoal





A sabedoria dos animais acompanha as mais antigas tradições tribais deste planeta, sendo uma fonte de referência a guiar o ser à manifestação e boa relação com seu poder pessoal. Cada animal existente expressa qualidades que inspiram virtudes de grande valor prático para o quotidiano e também para o desenvolvimento do caminho espiritual.

Acompanhando a roda de medicina xamânica o totem animal é composto por cinco animais correspondentes aos arquétipos do curador, visionário, guerreiro, mestre e líder(animal de poder), sendo cada um reconhecido pelas características de um animal específico a manifestar sua medicina.
Por medicina de um animal, pode-se entender o dom de cura que suas virtudes trazem à existência de uma pessoa.

Na antiguidade os jovens descobriam o seu totem animal pessoal para que, eles e toda a tribo, reconhecessem a finalidade de sua existência e qual o papel que este ser cumpriria ao longo da vida. Assim, a descoberta dos cinco animais do totem atua como uma bússola a direcionar a consciência a manifestar seus potenciais, sendo essa manifestação a caminhada rumo ao cumprimento da missão de vida.

Descobrir o Totem Animal Pessoal é um daqueles divisores de água que abrem caminho ao resgate da inocência originária, a uma clareza de compreensão, à realização dos sonhos íntimos, ao instruir da intuitividade e ao empoderamento do poder que carregamos como seres viventes numa caçada onde o alimento é a própria consciência.


O Totem Animal pessoal é uma ferramenta de autoconhecimento, desenvolvimento pessoal e conexão com nossa essência. 
Através das energias animais que carregamos e do papel que estas desempenham na arquitetura da nossa Roda de Medicina, podemos reconhecer mais facilmente a beleza e utilidade das características que nos tornam únicos, aprimorar e desenvolver dons e talentos, acompanhar conscientemente nossos processos internos, e aproveitar melhor nossas ferramentas naturais ao longo da vida.



5 ANIMAIS DO TOTEM ANIMAL PESSOAL


* ANIMAL CURADOR DO SUL – É o lugar onde reside, dentro de nós, nossa Criança Interior, o arquétipo do Curador interno. Neste quadrante, acontece o alinhamento consigo mesmo, através do impulso da nossa verdade interior se exteriorizando, da criatividade e curiosidade nos conduzindo com nossos instintos e emoções. Questões relacionadas à identidade, autoaceitação, à manifestação dos sentimentos e dos instintos, à capacidade de ser fiel a si mesmo e de fazer-se respeitar, de restabelecer-se de experiências difíceis, de lidar com os sentimentos, de motivar, mover, impulsionar e curar, estão relacionadas ao quadrante Sul.
As energias deste quadrante são responsáveis pela renovação dos nossos ciclos, pela autoconsciência, pela cura, pela identidade e pela capacidade de seguir a voz do coração.

 O Animal Curador da direção Sul vem expressar nossa relação com a própria integridade original e renovar os ciclos que vivenciamos ao longo da existência.



* ANIMAL VISIONÁRIO DO LESTE – É o ponto onde desponta o Visionário interior, e traz a inspiração e a iluminação. Neste quadrante acontece o desenvolvimento da consciência, através da criatividade, da inteligência, e da capacidade de ampliar cada vez mais o conhecimento e a consciência, renovando as idéias, quebrando paradigmas e crenças e partindo para novos patamares de visibilidade interior e exterior. Questões relacionadas ao nosso caminho, às nossas estratégias, à nossa disposição de transcender limitações, à nossa capacidade de perceber a realidade interior e exterior e confiar em nossa própria visão e consciência estão relacionadas ao quadrante Leste. As energias deste quadrante são responsáveis pelas nossas escolhas, pela nossa forma de pensar e interpretar a realidade, pela nossa maneira de aprender e ensinar evoluindo sempre, de expandir a mente e de direcionar o potencial criativo de forma prática e objetiva.

 O Animal Visionário da direção Leste traz com seus dons o ensinamento de como obtermos clareza e discernimento, mostrando assim como obter as melhores estratégias para lidar com a própria vida.



* ANIMAL GUERREIRO DO NORTE – É o ponto onde se manifesta o Guerreiro interior, mostrando seu poder de concretização através da atitude. Neste quadrante acontece a manifestação de tudo o que sentimos e pensamos em forma de atos, e de resposta aos atos – é o Guerreiro interior que parte para a prática, e manifesta seus frutos internos expressando quem ele é, a que veio e quais são suas características pessoais, de forma concreta: através de seu corpo, suas palavras, seu posicionamento diante de si mesmo e do mundo, e através da abundância (em todos os aspectos – financeiro, afetivo, social, familiar, etc.) que suas ações geram ao seu redor. Questões relacionadas ao nosso poder de ação e reação, à nossa forma de construir e operar a autolapidação e o crescimento, de equilibrar nossas relações, de expressar nossa verdade interior, de conquistar e construir, de modelar a realidade, estão relacionadas ao quadrante Norte. As energias deste quadrante são responsáveis pela saúde física, pela abundância em todos os aspectos, pela capacidade de expressão e comunicação, pela habilidade de desenvolver seus potenciais e de encontrar seu lugar no mundo, de nutrir a si mesmo e de brilhar através de sua personalidade verdadeira.

O Animal Guerreiro da direção Norte é o responsável pela lida prática com a vida quotidiana, expressando com seus talentos a postura e posicionamento que trazem a bênção da abundância à vida.



* ANIMAL MESTRE DO OESTE – É o ponto onde desabrocha o Mestre interior, que traz a conexão com a sabedoria, que orienta e empodera-nos do nosso destino, que dá vazão à intuição e ao contato com nosso inconsciente profundo e seu saber. Neste quadrante acontece a revelação do nosso próprio caminho e nele o Mestre interior nos dá forças e sobriedade para as transformações necessárias, para o desapego, para a coragem que ele nos exige. Questões relacionadas à capacidade de superar seus medos, de confiar em sua capacidade, de aprender com suas experiências, de conduzir a si mesmo, de desvendar o mistério que existe dentro de você e de conectar-se à sabedoria universal estão relacionadas ao quadrante Oeste. As energias deste quadrante são responsáveis por encerrar nossos ciclos, preparar-nos para as mudanças e saltos da existência, por encerrar as repetições, por nos conferir emancipação para traçar nosso destino, pela forma como lidamos com as energias externas que nos chegam e porque nos permitimos ser afetados por elas, pelo amadurecimento e fortalecimento interior.

O Animal Mestre da direção Oeste representa a fonte intuitiva que instrui através da experiência adquirida ao longo dos ciclos naturais que decorreram-se durante a existência, tratando assim de abrir as revelações da sabedoria interior.



* ANIMAL DE PODER DO CENTRO - Este é o ponto para o qual todas as energias convergem, e ao mesmo tempo o ponto de onde elas partem. Aqui reside aquilo que SOMOS, o que algumas filosofias chamam de “Eu Superior” ou “Self”, nossa verdadeira essência, que manifesta em cada quadrante um de seus atributos, de sua forma própria. As energias deste ponto alinham as energias de todos os quadrantes através de sua ordem, direcionamento e vibração.

O Animal de Poder da direção central é o lider reponsável por manter a ordem em nosso mundo interno e também por mover o poder pessoal em direção à manifestação dessa ordem na vida quotidiana. Este animal expressa a pura força de vontade e através de seus dons e talentos temos a oportunidade de reconhecer diretamente as virtudes do próprio espírito.


– Animal Curador 
– Animal Visionário 
– Animal Guerreiro 
– Animal Mestre 
– Animal de Poder 






quinta-feira, 25 de abril de 2019

PÁTRIA





Por um país de pedra e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro
.
Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Dum longo relatório irrecusável
.
E pelos rostos iguais ao sol e ao vento
.
E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas
.
- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro
.
Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo



SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
in, LIVRO SEXTO





sexta-feira, 19 de abril de 2019

Notre Dame






O que me irrita genuinamente na maioria das críticas/análises que eu vejo sobre Notre Dame é um sentimento profundo de que elas simplesmente não vêem o óbvio, aquilo que uma sociedade pós-iluminista nos treina para não ver, mas que qualquer grupo humano até há 300 anos atrás veria.
Essas duas coisas coisas são: 
A riqueza hermenêutica do evento que quase nos pede que o interpretemos, e a noção de que o mundo funciona principalmente por causa de agências não humanas (sejam elas Deus, deuses, demónios, a alma do mundo ou os espíritos do local).

A catedral de Notre Dame ardeu no primeiro dia da semana santa, o período mais importante do cristianismo que conduz àquilo que, do ponto de vista cristão, é o momento de redenção total da humanidade e a vitória final de Cristo sobre a morte. A torre principal da catedral ardeu e caiu, e algumas notícias apontam para que a reconstrução vá ser difícil por já não haver árvores grandes o suficiente em França para replicar a estrutura. Depois do evento, várias das pessoas mais ricas de França fizeram doações milionárias para a reconstrução da catedral. Tão milionárias que custa sequer imaginar a quantidade de dinheiro. As doações foram seguidas de críticas duras a noções de cultura como separada de projetos opressivos de poder, à distribuição da riqueza, a hábitos caridosos desadequados etc.
O interessante, mais uma vez, é que o evento se perdeu na crítica.

Para pessoas com interesse em tradições religiosas, e principalmente adivinhatórias, estas críticas soam pobres porque falham em reconhecer a voz da própria catedral, do génio do sítio que ardeu e que se expressou no incêndio.
No fundo, do presságio de Notre Dame. 
Qualquer crítica à preocupação das pessoas em ver a catedral a arder quando existem tragédias em Moçambique, quando o ambiente está a ser destruído, quando a Europa se radicaliza à direita, ignora que todas essas críticas estão contidas no próprio evento do fogo. A catedral arde por causa dessas coisas, não apesar dessas coisas, da mesma maneira que o Museu Nacional do Rio de Janeiro arde um mês antes da eleição do Bolsonaro. O incêndio, em ambos os casos, é a crítica mais cerrada ao estado do mundo.

Uma leitura deste tipo implica uma atitude simbólica perante a realidade, a ideia de que ela pode ser interpretada como uma obra de arte, e a ideia de que ela se pode expressar e protestar. O incêndio da catedral transforma-se ele mesmo numa teofania, numa imagem igual a tantas outras imagens religiosas.

É impossível não ver o décimo sexto arcano do tarot na torre de Notre Dame que ruiu, é impossível não associar a destruição da nossa senhora de Paris com as imagens cristãs, abundantes, do coração dilacerado da Virgem Maria. É impossível, a esta luz, não ver a compulsão dos ricos em esconder o presságio. Doações milionárias para disfarçar o facto de que até uma das catedrais mais famosas da Europa já não pode com eles. 

As doações são mal aplicadas porque também elas falham em ler a crítica. A lição do mito da Torre de Babel não é que havia poucos milionários para a reconstruir, é que a sua destruição era em si mesma uma crítica ao ethos de uma sociedade inteira que procurava o domínio do(s) mundo(s). A queda da torre de babel era uma crítica à húbris humana, e se milionários a tivessem tentado reconstruir, a húbris só teria sido amplificada.

A razão porque eu insisto nesta leitura é que o desespero cru das pessoas que gostavam da catedral porque se apaixonaram por ela, pelo seu lugar, talvez até pelo templo de Júpiter sobre o qual foi construída, é injustiçado nas críticas que têm sido feitas. As pessoas não sofrem por Notre Dame *apesar* do estado do mundo, elas sofrem por Notre Dame *por causa* do estado do mundo que ela representa metonimicamente.

A compulsão de restaurar a catedral com todo o dinheiro possível é, naturalmente, um defeito do literalismo que assombra os nossos dias. O que quer que a catedral possa representar para quem faz as doações, a expectativa é que o resultado seja a cura.
Se alguém vê em Notre Dame o “estado da cultura ocidental”, o passo literalista é recuperar a catedral para recuperar a cultura.
Se alguém vê nela o “estado do mundo”, as doações escondem o literalismo de resolver o estado do mundo na reconstrução da catedral.
Mas a questão com o literalismo é que ele é o problema, não a solução.
A compulsão de corrigir o presságio fazendo doações revela a ideia (puramente capitalista ocidental) de que atirar dinheiro a um problema com força suficiente faz com que o problema vá embora. Deixarmo-nos cair nesta leitura é deixar que a catedral tenha ardido em vão, é recusar a sua mensagem, a sua agência no fogo em si.

Júpiter, senhor de Notre Dame antes da Virgem Maria, viaja agora por um signo de fogo no céu.
Zeus Xenos, dos estrangeiros, que ofendemos com o aumento da xenofobia na Europa.
Zeus Phyxios, do refúgio, que ofendemos com a nossa gestão trágica da crise de refugiados.
Zeus Laiotes, do povo, que ofendemos com o nosso desprezo crescente pela democracia.
Zeus Labrandeus, furioso, que nos relembra que não podemos continuar a deixar o mundo a ferro e fogo impunemente.
Zeus Semaleos, dador de sinais, sinais que não podemos continuar a ignorar.


Simão Cortês



quinta-feira, 18 de abril de 2019

O Segredo de Compostela






Sobre o segredo de Santiago de Compostela…afinal não é o apóstolo Tiago que está lá enterrado mas sim, Prisciliano.

Este livro leva-nos a fazer várias perguntas logo no início:

  1. E se no destino final a que nos conduzem os místicos caminhos de Santiago se esconder um dos segredos mais bem guardados do Ocidente?
  2. Afinal, quem está sepultado no túmulo?
  3. Qual o sentido atual das peregrinações a Santiago de Compostela?


Prisciliano, líder carismático do século IV e pioneiro defensor da igualdade das mulheres e dos valores do Cristianismo primitivo, é a figura preponderante neste enigma secular. De pagão tornou-se um sedento de conhecimento e de outras culturas para acabar por ser decapitado como herege e devedor. Pelo meio converteu-se à cristandade e tornou-se asceta. Comprometido com a força da sua espiritualidade, viveu no coração os sobressaltos de um amor proibido, envolto em ciúmes e intrigas. Apesar de aclamado bispo pelo povo, Prisciliano tornou-se no primeiro mártir da sua Igreja, a quem a História ainda não prestou o devido reconhecimento.
Foi decapitado em praça pública acusado de bruxaria.

A história acontece na Península Ibérica no Séc IV durante o Império Romano.
É um livro de investigação histórica, como todos os livros de Alberto S. Santos, e por isso se tornam muito mais interessantes por serem histórias verídicas. São aulas de história…
Fala sobre o confronto religioso entre o Paganismo e o Cristianismo emergente nessa altura.
No século IV as “inovações” facilmente se confundiam com bruxaria, e os chamados então de Priscilianistas, à medida que convertiam fiéis à sua causa, semeavam discórdia e cultivavam inimigos. Demasiado à frente do seu tempo, Prisciliano, considerava que todos os seres humanos eram iguais, incluindo mulheres e escravos. São um grupo diferente que defende a comunhão com a natureza, a vida longe de excessos, a amizade, a bondade e uma total dedicação à religião. Mas, tais filosofias foram a causa da sua morte, comum a todos os profetas.
A incrível atualidade desta situação fez-me pensar como hoje em dia muitas lutas se ganham e se perdem por motivos que nada têm a ver com as causas.
Mais importante que saber quem secretamente está sepultado em Compostela, uma dúvida que só tem a importância que a fé de cada um lhe atribui, é conhecer o percurso de vida deste homem que só quis aprender e ensinar.

“Elpídio acompanhava a discussão com os olhos esbugalhados de interesse. Estava cada vez mais claro para Prisciliano que a viagem de Elpídio a Alexandria estava relacionada com uma intensa sede de sabedoria. E Prisciliano, um rapaz que todos consideravam brilhante, sentia-se cada vez mais insignificante ao contactar tais seres. Àquela hora da viagem já não era o mesmo Prisciliano que aportara no Eunostos, deslumbrado com a cidade desconhecida, acompanhando o tio Sabino na busca da cura. Agora, ele próprio se sentia doente. O verdadeiro doente. Sofria as dores da ignorância por assuntos debatidos pelas mais sábias pessoas do século. As questões ontológicas e metafísicas nunca haviam sido a sua prioridade. Mas o ar que respirava em Alexandria era diferente de tudo o que conhecia. Despertava-o interiormente para inquietações que não imaginaria existirem sequer. E estremecia por o acaso lhe ter concedido a benesse de o colocar entre gente tão sábia. Olhou para Elpídio e agradeceu-lhe intimamente por tudo o que estava a viver. A seguir, recordou Egéria. Sem perceber a razão, pressentiu uma corrente espiritual que o conectava com ela, ao mesmo tempo que um sobressalto interior.”

Santiago, personagem do livro O Alquimista, de Paulo Coelho, caminhou na imensidão do deserto egípcio, procurando sempre escutar o que o seu coração dizia para lutar pelo seu sonho.
Um outro peregrino bem conhecido da literatura, criado por Hermann Hesse, é Siddartha, que abdicou da sua vida material e enveredou-se numa longa viagem existencial ao encontro da paz espiritual.
Um outro personagem real da nossa História, que viveu na Galécia (actual Galiza), na obsoleta Hispânia, no século IV, é Prisciliano, um homem amado e odiado, uma figura controversa, que tem suscitado ao longo dos tempos o interesse de estudiosos e pensadores, como Agostinho da Silva. Prisciliano só tentou desencadear uma revolução espiritual, nunca religiosa, e pagou por isso. Foi decapitado, decorria o ano de 385. O certo é que ele deixou uma marca espiritual muito forte no Ocidente da Península Ibérica.

As peregrinações a Santiago de Compostela, que são realizadas por fiéis há mais de mil anos, fazem parte de um pacto da Igreja para angariar cada vez mais dinheiro, doado pelos devotos. Quanto mais fiéis mais dinheiro angariavam. Este tipo de manobras por parte da igreja aconteceu muito.
Em Portugal, temos o caso da invenção do Milagre de Fátima por parte da Igreja para angariar devotos e o seu dinheiro, quando não havia segredo nenhum nem aparição nenhuma. Lúcia era vidente, e aproveitaram as suas visões para criar o milagre para construir e sustentar o que lá está hoje. Em Espanha o tema é “incómodo” e oculto, — tal como o túmulo enterrado na cripta da Catedral espanhola.

Como Prisciliano afirma: 

«Devemos conhecer para compreender, 
conhecer para concordar, 
conhecer para discordar»





O Gato





Com um lindo salto
Lesto e seguro
O gato passa
Do chão ao muro
Logo mudando
De opinião
Passa de novo
Do muro ao chão
E pega corre
Bem de mansinho
Atrás de um pobre
De um passarinho
Súbito, para 
Como assombrado
Depois dispara
Pula de lado
E quando tudo
Se lhe fatiga
Toma o seu banho
Passando a língua
Pela barriga.

Vinicius de Moraes






segunda-feira, 15 de abril de 2019

O SILÊNCIO DOS DIAS





Foi ali que o guardou naquele canto secreto
onde os silêncios eram jóias raras
e as palavras se misturavam nos perfumes do tempo
Já não importava o cansaço dos dias
nem as manhãs vestidas de cinza
a memória era um pequeno baú
onde guardava as lembranças mais vivas
existência rica de quem muito viveu
de quem muito se deu.
Abria o baú
de tempos a tempos
e o perfume das palavras
entranhava-se nas narinas
chegando ao âmago do ser.
Era aí que a luz mais brilhante raiava no quarto
nas cortinas cor de sangue
e no corpo tatuado de palavras e silêncios.
Foi ali que guardou a história que marcou um tempo
nesse tempo agitado de figurantes a deriva
de mares revoltos e ondas bravias
de mulheres perdidas de ciúme
e de homens tentando amainar as violentas marés
Foi ali no baú do tempo
que o guardou para sempre
longe dos holofotes 
projectores de sonhos inacabados
de esperanças naufragadas.
Foi ali que o guardou
para sempre
no silêncio dos dias que passam.



SÃO GONÇALVES




Aparição


Casa do Alto
Alto de S. Bento
Évora





Pela última vez, durmo na Casa do Alto.
É uma noite sem lua mas com um céu vivo de estrelas.
Mas a minha atenção prende-se à cidade, à planície. Para os lados da estrada de Viana descubro um espectáculo extraordinário que me alvoroça, que me fascina: numa vasta extensão de terreno, um incêndio lavra interminávelmente, iluminando a noite. É uma "queimada", suponho, o incêndio do restolho para a renovação da terra. Alinhadas pelos sulcos, as chamas avançam como um flagelo inexorável. E aos meus olhos saqueados é como se uma cidade ardesse, uma cidade fantástica, aberta de quarteirões, de praças, de sonhos.
Cidade, minha cidade... Que a terra tenha razão sobre ti, que essa força que mal sei te absorva, te revele em cinzas, tire delas outra fecundação e outro ignorado recomeço - que me importa?
A minha vida é "a" vida, só existe o que sou: não se imagina quem se não é..
Acendo um cigarro, fico-me a olhar o incêndio.
...
Lembra-me imagens da guerra, de cidades bombardeadas.
Alguém deve ir pegando o fogo por sectores, estabelecendo linhas de chamas que o vento vai impelindo. O campo arde vastamente, como uma destruição universal. Quase ouço o crepitar das chamas como o fervor final de uma inundação. Sinto-me só e nu, escapando ao desastre. Mas esta nudez que eu algum dia julguei possivelmente coberta pela compreensão dos outros, esta redução extrema às minhas raízes, esta solidão inicial de quem não pode esquecer a sua pobre condição é o sinal humilde e amigo de que à vida que me deram a não repudiei, de que cuidei dela, a não perdi, a levo comigo nesta viagem breve, a aceito ao meu olhar de fraternidade e perdão... A noite avança, a minha cidade arde sempre. Vou fundar outra noutro lado. Mas não sabia eu que ela devia arder? Acaso será possivel construir uma cidade como a imagino, a cidade do Homem? Acaso não dura ela em mim, no meu sonho, apenas porque a penso sem consequências, a imagino, a não vivo, lhe não exijo responsabilidades? Não o sei, não o sei...
...
Mas o que sei é que o homem deve construir o seu reino, achar o seu lugar na verdade da vida, da terra, dos astros, o que sei é que a morte não deve ter razão contra a vida nem os deuses voltar a tê-la contra os homens, o que sei é que esta evidência inicial nos espera no fim de todas as conquistas para que o ciclo se feche - o ciclo, a viagem mais perfeita.
...

Fecho o álbum, acendo um cigarro.
Para lá da janela atinjo a linha azul do horizonte que se desvanece na tarde. Penso, penso. Não, não penso: procuro. Outra vez, outra vez. Não, não quero «saber», sei já há tanto tempo... Mas nenhum saber conserva a força que estala no que é aparição.
Porque o escrevo de novo?
A verdade é que nada mais me importa.

E, todavia, um estranho absurdo me ameaça: quero saber, ter, e uma aparição não se tem, porque não seria aparecer, seria estar, seria petrificar-se. Queria que a evidência me ficasse fulminante, aguda, com a sua sufocação, e aí, na angústia, eu criasse a minha vida, a reformasse. Mas uma reforma, uma regulamentação é já do lado de fora.
Quem é fiel a uma certeza e a pode «ver» quando lhe apetece?
A fidelidade é então só teimosia ou cedência à parte convencional da «nobreza de carácter», da «honradez». Não é isso, não é isso que eu quero.
Em que iluminação eu acredito quando falo em nome dela e a imponho a Ana, aos outros?
Falo de cor - a iluminação é então a minha noite de secura.

Por isso, quando ela volta, eu me abro à sua devassa, à acidez da sua presença.
Por isso eu recebo ainda agora e falo dela e me aqueço e queimo ao seu lume.
Não escrevo para ninguém, talvez, talvez: e escreverei sequer para mim?
O que me arrasta ao longo destas noites, que, tal como esse outrora de que falo, se aquietam já em deserto, o que me excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da arte.
Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que fulgurou e morreu.


VERGÍLIO FERREIRA
in, APARIÇÃO






sábado, 13 de abril de 2019

Lou Reed - Walk on the Wild Side (audio)

AMOR DA PALAVRA, AMOR DO CORPO





A nudez da palavra que te despe.
Que treme, esquiva.
Com os olhos dela te quero ver,
que não te vejo.
Boca na boca através de que boca
posso eu abrir-te e ver-te?
É meu receio que escreve e não o gosto
do sol de ver-te?
Todo o espaço dou ao espelho vivo
e do vazio te escuto.
Silêncio de vertigem, pausa, côncavo
de onde nasces, morres, brilhas, branca?
És palavra ou és corpo unido em nada?
É de mim que nasces ou do mundo solta?
Amorosa confusão, te perco e te acho,
à beira de nasceres tua boca toco
e o beijo é já perder-te.


António Ramos Rosa
in, "Nos Seus Olhos de Silêncio"





A Energia Sexual da Mulher





Condori explicou a Kantu:
- Na mulher, a energia sexual é um poder enorme que a natureza lhe deu para vencer sem ter de combater, para obter o que deseja apenas com amor e ternura, com força e coragem.
É uma energia que permite modelar e criar o próprio corpo para que dê guarida ao espírito que deseja visitar a Terra.
É uma energia que permite ser artífice da própria vida, curar-se a si própria e aos outros, restabelecendo o equilíbrio natural.
É uma energia que permite alcançar a imortalidade, não apenas sobre a Terra, mas em todo o Universo.
Mas, é fundamentalmente uma energia que te permitirá adquirir determinados conhecimentos, visitar universos distantes, mundos nunca vistos, paisagens inexistentes sobre a Terra.
Devo, porém, avisar-te de que, se esta mesma energia for mal utilizada, pode provocar morte, caos, sofrimento, ignorância, doenças e desgraças.
Kantu sentia que o uso impróprio da sua sexualidade pertencia ao passado; aprendera a distinguir entre amor e paixão, ordem e caos, paz e violência, saúde e doença, e sobretudo, entre o conhecimento e a falsidade.
- Estás pronta - disse-lhe Condori.
És uma verdadeira mulher com um domínio absoluto da tua pessoa, és uma guerreira do amor, uma semideusa. Poderás enfrentar qualquer homem, vencê-lo docemente para depois lhe ensinares o que é o amor, a paz, a fraternidade e a ordem.



Hernán Huarache Mamani
in, A Profecia da Curandeira