sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Gostava de falar em voz alta comigo mesmo, mas tenho medo




Silêncios, silêncios de todos os géneros circulam no meu sangue.
Silêncios inexplicáveis, silêncios que vêm dalgum lado desconhecido
do meu corpo, do sul muito ao sul da memória. E as moscas voam
em volta do candeeiro, desesperadamente. O silêncio mais constrangedor
emana-se delas, do ruído surdo das asas cortando o ar.
    Ouço-me agora atentamente, as mãos cansadas sobre a mesa de trabalho.
    Não me ocorre qualquer palavra escrever. A noite acende-se pelas
paredes, abro a janela e um rumor de mar chega até mim.
    Os roncos dos petroleiros no porto, o zumbido laminar dum insecto. Apoio-me
ao parapeito e começo a esmigalhar as formigas que passam.
    Que horas serão no tremer inquieto do coração?
    Uma ave nocturna levantou voo, por entre as palmeiras, e noite tornou-se
mais escura. Incompreensível, distante desta janela.
    O silêncio abate-se também sobre o rosto. Sinto-o quente no lado de dentro da pele.
    Gostava de falar em voz alta comigo mesmo, mas tenho medo.


Al Berto



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