quinta-feira, 29 de setembro de 2022

A Ovelha Negra e a Família




Porque a família 
representa um desafio 
para a viagem da Ovelha Negra?


Porque normalmente a família está presa na vibração dos papéis sociais, associada com a personalidade ou ego. Logo, o discurso limita-se a esses papéis e aos contratos, expectativas, cobranças e apegos que os mesmos implicam.

Como a Ovelha vem reconectar com a sua identidade espiritual, com a sua alma, ela vai responder na vibração do Eu, na energia da liberdade, na necessidade de ser diferente, na exigente responsabilidade pessoal onde a sua prioridade é seguir a voz do coração.

Conclusão?
O rebanho da família não entende e julga  a ovelha negra, 
e a ovelha negra por sua vez já não aceita as limitações e afasta-se do rebanho.

Esse afastamento tem um propósito maior não entendido pela mentalidade do rebanho. 
Por isso mesmo a viagem da ovelha negra é desafiante e solitária. 

Enquanto não sentir esse apelo do afastamento e, a “segurança” do rebanho for mais importante, o caminho de auto descoberta não será possível até porque o rebanho nunca abençoou ovelhas negras.

A paz e o amor são necessários sim mas, dentro de nós e não dependentes de outros.

Mesmo não sendo confortável para qualquer um dos lados, o fenómeno é real e quanto mais consciente, melhor conseguiremos lidar com ele. 
Estejamos do lado do rebanho ou do lado da Ovelha Negra.

O desafio começa logo por saber o que queremos ter. 
Um trabalho estável, uma relação de amor, ter filhos, ir viver para o campo e tantos outros sonhos e idealizações que valem o que valem mas que jamais vão ter verdadeiro valor se não soubermos o que queremos SER. 

Muito antes de chegarmos às relações com os outros, aos amigos, aos amores, ao papel profissional que representamos, já temos uma missão pessoal a cumprir. 
Aliás, antes ainda de chegarmos ao colo da mãe aquando do nascimento, antes ainda do nome que nos vão dar e dos papéis que vamos representar na família e no mundo, já temos um projeto de evolução pessoal. Aprendizagens que só nós podemos fazer, desafios que só nós podemos superar, novos patamares que só nós conseguimos subir, prisões internas que só nós conseguiremos libertar. 

Não há dinheiro, filho, sucesso profissional ou amor romântico que substitua este trabalho interno. 

Feliz daquele que consegue conciliar os dois lados. 
Triste aquele que usa o exterior para compensar a falta de trabalho interior. 

Deixo-te assim a pensar ou sentir, de preferência ambos, o que queres fazer da tua vida, o que pretendes que ela represente, que papel, passivo ou activo tens tu na construção da mesma.



Vera Luz




quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Cântico do País Emerso








 Os previdentes e os presidentes tomam de ponta
Os inocentes que têm pressa de voar
Os revoltados fazem de conta fazem de conta...
Os revoltantes fazem as contas de somar.

Embebo-me na solidão como uma esponja
Por becos que me conduzem a hospitais.
O medo é um tenente que faz a ronda
E a ronda abre sepulcros fecha portais;

Os edifícios são malefícios da conjura
Municipal de um desalento e de uma Porta.
Salvo a ranhura para sair o funeral
Não há inquilinos nos edifícios vistos por fora

Que é dos meninos com cataventos na aérea
Arquitetura de gargalhadas em cornucópia?
Almas bovinas acomodadas à matéria
Pastam na erva entre as ruínas da memória,

Homens por dentro abandalhados em unhas sujas
Que desleixaram seu coração num bengaleiro;
Mulheres corujas seriam gregas não fossem as negras
Nódoas deixadas na sua carne pelo dinheiro;

Jovens alheios à pulcritude do corpo em festa
Passam por mim como alamedas de ciprestes
E a flor de cinza da juventude é uma aresta
Que me golpeia abrindo vácuos de flores silvestres

E essa ansidedade de mim mesma me virgula
Paula de pátria entressonhada. É um crisol.
E, o fruto agreste da linfa ardente que em mim circula
Sabe-me a sol. Sabe-me a pássaro. Pássaro ao sol.

Entre mim e a cidade se ateia a perspectiva
De uma angústia florida em narinas frementes.
Apalpo-me estou viva e o tacto subjectiva-me
a galope num sonho com espuma nos dentes.

E invoco-vos, irmãos, Capitães-Mores do Instinto!
Que me acenais do mar com um lenço cor da aurora
E com a tinta azulada desse aceno me pinto.
O cais é a urgência. O embarque é agora.


Natália Correia


David Icke EXPOSES The Cult Who Control The World

domingo, 25 de setembro de 2022

O Grito


Jim Thornber





Não valia a pena esperar, ninguém viria
que nos segurasse a cabeça e nos pegasse nas mãos,
estávamos sós e essa solidão éramos nós;
e era indiferente sabê-lo ou não,
ou gritar (ou acreditar), porque ninguém ouvia:
o grito era a própria indiferença.
.
Presente, apenas presente;
a memória, presente,
a esperança, presente.
.
E, no entanto, houvera um tempo
em que tínhamos sido talvez felizes,
quando não nos dizia respeito a felicidade,
e em que tínhamos estado perto
de alguma coisa maior que nós
ou do nosso exacto tamanho.
.
Como um animal devorando-se
por dentro a si mesmo,
consumira-se, porém,
o pouco que nos pertencera, os dias e as noites,
a certeza e o deslumbramento, a cerejeira e a
palavra “cerejeira” ainda em carne na jovem boca.
.
Nenhuma beleza e nenhuma verdade que nos salvasse,
nenhuma renúncia que nos prendesse
ou nos libertasse, nenhuma compaixão que
nos devolvesse o ser
ou o mesmo,
ou fosse a morada de algo inumano como um coração.
.
Nenhuns passos ecoavam no grande quarto interior,
nenhumas pálpebras se abriam,
como poderíamos não nos ter perdido?
.
Entre 10 elevado a mais infinito
e 10 elevado a menos infinito,
uma indistinta presença impalpável na indiferença azul,
sós,
sem ninguém à escuta,
nem a nossa própria voz.



Manuel António Pina






The Universe responds to your vibration...and your emotions indicate what your vibration is






Most people believe, or want to believe, that everything in the Universe responds to their words in the same way that other people around them can sometimes be trained to behave. 
When you tell someone, “Yes, come to me,” you expect them to come. 
When you say, “No, go away from me,” you expect them to go. 
But you live in an attraction-based Universe (an inclusion-based Universe), which simply means there is no such thing as No.

When you give your attention to something wanted 
and you say, “Yes, come to me,” 
you include it in your vibration, 
and the Law of Attraction begins the process 
of bringing it. 
But when you look at something unwanted 
and you say 
“No, I do not want you—go away!” 
the Universe brings that, also.


Your attention to it, 
and therefore 
your vibrational alignment with it, 
is what is causing 
the response—not your words.


And so, as you say, “Perfect health, I seek you… I want you—I bask in the idea of perfect health,” you are attracting health. 
But as you say, “Sickness, I do not want you,” you are attracting sickness. 
As you say, “No, no, no,” it is coming closer, closer, closer, 
because the more you struggle against something that you do not want, 
the more engulfed in it you become.

People often believe that once they find their perfect mate, or achieve their perfect body weight, or accumulate enough money, then, once and for all, they will also find the happiness that they seek… but nowhere is there a little corner of something where only positive aspects exist. 

The perfect balance of the Universe says that positive and negative (wanted and unwanted) exists in all particles of the Universe. When you, as the creator, the chooser, the definer, the decider, look for the positive aspect, that becomes what you live—in all aspects of your life. 
You do not have to wait around for that perfect thing to show itself to you so that you can then have a positive response to it. 

Instead, 
you positively train 
your thoughts and vibrations, 
and then you become the attractor of it, 
or the creator of it.


We would encourage you to begin each day with the statement:

Today—no matter where I go, no matter what I am doing, and no matter who I am doing it with—it is my dominant intent to look for what I am wanting to see.

Remember, when you awaken in the morning, you are reborn. 
While you have slumbered, all attraction has stopped. 
That sequestering away for a few hours of sleep—where your Consciousness is no longer attracting—gives you a refreshing new beginning. And so, unless you wake up in the morning and begin regurgitating what troubled you the day before, it will not trouble you in your new day, in your new birth, in your new beginning.


Esther Hicks



sexta-feira, 23 de setembro de 2022

FECHA-ME OS OLHOS







 Fecha-me os olhos devagar, com um beijo leve,
com três palavras apenas:
dorme, parte, adeus.

Assim tenho de me despedir.
Deixo uma buganvília à entrada da porta branca,
um bairro de sombras floridas,
um cão a quem dei o meu nome.

Deixo a casa amarela,
o limoeiro, as hortênsias, duas estrelícias na
jarra vermelha,
translúcida,
sobre a mesa de mogno.

Deixo alguns livros,
algumas paisagens de litorais desvanecidos,
alguns naufrágios que desenhei com o lápis das
tempestades.

Por favor,
não digam que fui feliz, se não me viram
caminhar pelas ruas desertas,
esmagando a serpente dos dias,
construindo muralhas,
que pouco depois se desmoronavam.

Eles também se despediram, os amigos.

Quando me lembro deles,
há um cântico negro,
com labaredas altivas, um eco de metal que vibra.

Não está certo que assim seja, que se soltem do
nosso peito, um após outro,
os delicados fios de ouro da ternura.

Deixo-vos as maçãs verdes sobre a mesa.
Com o tempo, tudo há-de amadurecer.


JOSÉ AGOSTINHO BAPTISTA
in, Esta voz é quase o vento



EU, YALOM

 

Irvin D. Yalom





Michael tinha ganhado, recentemente, um importante prémio internacional de ciência.
“Provavelmente consegue adivinhar o que me aconteceu em seguida:
Uma descarga de orgulho, demasiado rápida, e depois, vaga após vaga de dúvidas ansiosas. O mesmo de sempre – lá no fundo, sou superficial.”
(…)…a falta de um Mentor significativo na infância.
Falou bastante acerca do quanto invejava as pessoas colocadas sob a asa e acarinhadas por uma outra pessoa mais velha, ao passo que ele tivera de trabalhar quase sem parar e conseguir as notas mais altas de todas para que reparassem nele. Tivera de se criar a si mesmo.
Criar-se a si mesmo é uma fonte de grande orgulho, mas também conduz a uma sensação de ausência de fundações…a sensação de serem lírios a crescerem no pântano – flores muito bonitas, mas sem raízes profundas.”
 
 
“Quero que ele desapareça”
…pouco depois, estava a pensar na minha mãe…como se deve ter sentido aliviada quando eu saí de casa de vez. Eu era o perturbador da sua paz. Nunca teceu um comentário positivo a meu favor e eu devolvia-lhe o favor. (…) Nessa noite, tinha eu catorze anos,…senti a raiva vulcânica da minha Mãe, e tomei a decisão, para conservar a minha sanidade, de lhe fechar a porta. Tinha de deixar aquela família. Ao longo dos três anos seguintes, mal lhe falei – vivíamos como se fossemos estranhos na mesma casa. O meu Pai…cujo único defeito, acredito, era a sua falta de coragem para fazer frente à minha Mãe. A minha relação com a minha Mãe foi uma ferida aberta durante toda a minha vida e, no entanto, paradoxalmente, é a sua imagem que me passa pela mente quase todos os dias. Vejo o seu rosto: nunca está em paz, nunca sorri, nunca está feliz…não se sentia plenamente realizada e raramente teria um comentário agradável e positivo…penso no pouco prazer que lhe devo ter dado, enquanto vivíamos juntos.
 
 
Recentemente, uma frase extraordinária de Charles Dickens de História Em duas Cidades, chamou-me a atenção:
“Pois, à medida que me aproximo mais e mais do fim, viajo num círculo cada vez mais próximo do início. Parece ser um dos tipos de planos e preparativos do caminho. O meu coração é tocado, agora, por muitas recordações que há muito tinham adormecido…”
Sim, o passado puxa-me e eu sei o que “plano” significa.
Há muita coisa inacabada entre os meus pais e eu. Há muitas coisas de que nunca falámos, acerca da nossa vida em conjunto, acerca da tensão e da infelicidade da nossa família, acerca do meu mundo e do mundo deles.
Olhar para trás, para a minha vida, aos oitenta é assustador, e por vezes, solitário. A minha memória não é de fiar…
Sempre senti um ressentimento não manifesto em relação ao meu pai – por ele nunca, nem sequer uma vez, ter feito frente à minha mãe. Durante todos os anos em que a minha mãe me rebaixou e me criticou, o meu pai nunca discordou dela. Nunca ficou do meu lado. Fiquei desiludido com a sua passividade, a sua pusilanimidade.
 
 
Interesso-me por astronomia e fiz o meu primeiro telescópio, e sempre que olho para o céu à noite fico assoberbado pelo quão minúsculos e insignificantes somos na ordem natural das coisas. Parece-me obvio que os antigos tentaram lidar com sentimentos de insignificância, investindo em algum deus que nos considerava a nós, humanos, tão importantes que deveríamos voltar as nossas atenções para a vigilância de todos os nossos actos. E também me parece óbvio que tentamos acalmar a existência da morte através da invenção do paraíso e de outras fantasias e contos de fadas que têm um tema em comum: “Nós não morremos – continuamos a existir fazendo a transição para outro reino, o reino de deus.”
Para ser sincero, penso nas religiões e nas ideias de vida depois da morte como a mais antiga aldrabice do mundo. Serve um propósito – confere aos líderes religiosos uma vida confortável e ameniza o medo da morte da humanidade. Mas tem um elevado preço – infantiliza-nos, tolda-nos a visão da ordem natural.

 
 
Toda esta história parece plausível e garante uma narrativa satisfatória. Como é poderoso o nosso impulso para preencher gestalts e para criar histórias cuidadosamente compostas. Mas seriam verdadeiras? Setenta anos mais tarde, não tenho qualquer esperança de desencantar os “factos reais”, mas talvez a intensidade do meu sentimento nestes momentos, o desejo de fuga e paralisia, os tenham unido de alguma maneira. Verdade? Infelizmente , sinto-me hoje incerto quanto à possibilidade de se tratar, de facto, do mesmo rapaz e de a sequência temporal estar correta…
À medida que vou envelhecendo, vai-se tornando cada vez mais difícil confirmar as respostas a tais perguntas. Tento recuperar partes da minha juventude, mas quando falo com a minha irmã, meus primos e os meus amigos, fico chocado com a diferença na maneira como se recordam das coisas. Vou-me convencendo cada vez mais da natureza frágil e eternamente mutável da realidade.
As recordações, e sem dúvida também esta, são muito mais ficcionais do que gostamos de pensar.
(…) A memória e as emoções têm um relacionamento curvilíneo: demasiada emoção ou muito pouca emoção resultam, frequentemente, em pobreza de memória.

 
Um rabi teve uma conversa com Deus acerca do Céu e do Inferno:
“Mostrar-te-ei o inferno” disse Deus. E conduziu-o a uma sala onde se encontrava um grande mesa redonda. As pessoas sentadas em volta dessa mesa estavam famintas e desesperadas. No centro da mesa estava uma panela enorme com um estufado com um cheiro deliciosos, e o rabi ficou de água na boca. Cada pessoa em redor da mesa segurava uma colher com um cabo muito comprido. Embora as longas colheres chegassem à panela, os cabos eram mais compridos do que os braços das pessoas, e por isso eram incapazes de levar a comida à boca, e ninguém conseguia comer. O rabi viu que o seu sofrimento era terrível.
“Agora vou mostrar-te o Céu”, disse Deus. Entraram numa outra sala, exatamente igual à primeira, com a mesa redonda e uma enorme panela de delicioso estufado no meio, e as pessoas tinham colheres iguais de cabos compridos. Mas, nesta sala todos estavam bem nutridos e roliços, a rir e a conversar. O rabi não conseguia compreender.
É simples, mas exige uma certa perícia”, disse Deus. “Nesta sala, aprenderam a alimentar-se uns aos outros.


 
“…nos dez anos seguintes, trabalharia com grupos de pacientes que tivessem de falar sobre a morte por se verem confrontados com ela, diagnosticados com cancro terminal. (…)
Uma mulher disse-nos que o grupo a tinha ajudado a tomar uma decisão fundamental: decidira que ia mostrar aos filhos como encarar a morte com graciosidade e coragem.
Dar sentido à vida gera um sentimento de bem-estar.
Trata-se também de um exemplo chocante do conceito de “ondulação” que ajuda muitas pessoas a atenuar o terror da morte. 
A ondulação refere-se à transmissão de parte de nós para os outros, incluindo pessoas que não conhecemos, como a ondulação provocada por uma pedrinha que lançamos a um charco e que se afasta desse ponto central até deixar de ser visível, embora continue a um nível manoscópico.
(…) “que pena ter de esperar até agora, até o meu corpo ser devastado pelo cancro, para aprender a viver.”
Embora a realidade da morte nos possa destruir, a ideia da morte pode salvar-nos. Permite-nos compreender que, dado que só temos uma oportunidade de viver, devemos aproveitar a vida ao máximo, e terminá-la com o menor número de arrependimentos possível.
É importante ter consciência da duração finita da vida.”
(…) Tudo, verdadeiramente tudo, desaparece. Todos temos apenas um instante, precioso e abençoado, sob o Sol.(…)
Fiquei abalado com uma passagem do livro Macbeth: 
“A vida não é senão uma sombra em movimento, um fraco ator que se pavoneia e se preocupa quando chega a sua hora de subir ao palco, e depois nunca mais é ouvido.”
 


Epicuro defendia que a principal fonte de miséria humana era o medo da morte.(…) Desenvolveu uma série de poderosos argumentos para atenuar esse medo da morte, entre eles, o “argumento da simetria”, que defende que o nosso estado de “não ser” depois da morte, é idêntico ao nosso estado antes do nascimento, e esse estado do nosso “pré ser” nunca está associado à ansiedade.
(…) Milan Kundera escreveu que, o ato de esquecer nos oferece uma amostra da morte. Por outras palavras, o que nos aterroriza em relação á morte é não apenas a perda do futuro mas também a perda do passado.
 
“Se alguém vive bem, sem arrependimentos profundos, então enfrentará a morte com maior serenidade.”
  
 
 



Livros e Escritores 

preferidos de Irvin D. Yalom:
 

- Sigmund Freud
- Stefan Zweig
- Franz Werfel
- Arthur Schnitzler
- Robert Musil
- Joseph Roth
- Em Busca de Sentido, Viktor Frankl
- Fiódor Dostoiévski
- Lev Tolstoi
- Samuel Beckett
- Milan Kundera
- Herman Hesse
- Álvaro Mutis
- Knut Hamsun
- A Morte de Ivan Ilych, Lev Tolstoi
- Death and WesternTought, Jacques Choron
- A Negação da Morte, Ernest Becker
- Letters to a Young Poet, Rainer Maria Rilke
- Soren Kierkegaard
- Friedrich Nietzsche
- On the Vanity of existence, Arthur Schopenhauer
- Epicuro
- Baruch Espinosa
- Fala, Memória…, de Vladimir Nobokov
- Betraying Spinoza, Rebecca Goldstein
- Memórias, Marco Aurélio
- Lucrécio
- Christopher Hitchens
- Sam Harris
- Richard Dawkins
- Anthony Trollope
- David Mitchell
- Philip Roth
- Ian McEwan
- Paul Auster
- Haruky Murakami
- J.M. Coetzee
- Cem Anos de Solidão, Gabriel Garcia Márques
- Grendel, Matt Wagner
- Grandes Expectativas, Charles Dickens
- The Adventures and Misadventures of Maqroll, Álvaro Mutis
- Bleak House, Charles Dickens
- Os Filhos da Meia-Noite, Salman Rushdie
- A Tia Júlia e o Escrevedor, Mario Vargas Llosa
- Daniel Deronda, George Eliot
- Silas Marner, George Eliot
- The Way of All Flesh, Samuel Butler



Irvin D. Yalom
in, Eu Yalom




terça-feira, 20 de setembro de 2022

na ferida escondida no fundo da camisa



Planet Flem





 Algumas pessoas vendem o seu sangue. 
Tu vendes o teu coração.
Era isso ou a alma.
A parte difícil é tirar a maldita coisa para fora.
Uma espécie de torção. Como abrir uma ostra,
a tua espinha, um pulso,
e depois, upa! Está na tua boca.
Viras-te parcialmente do avesso
como uma anémona do mar a cuspir um seixo.
Há um “plop”quebrado, o som
de vísceras de peixe a cair num balde.
E ali está, um enorme coágulo vermelho escuro
do passado ainda-vivo, a cintilar inteiro no prato.
Vai passando de mão em mão. É escorregadio. É deixado cair.
Mas também degustado. Muito grosseiro, diz um. Muito salgado.
Muito amargo, diz outro, fazendo uma cara.
Cada um é um gourmet instantâneo,
e tu ficas a ouvir isto tudo
a um canto, como um empregado de mesa recém-contratado,
a tua mão tímida e habilidosa na ferida escondida
no fundo da camisa e peito,
timidamente, sem coração.


Margaret Atwood





A Inveja Passeia pelas Ruas

 








Quem 
não tiver virtude própria 
sempre invejará 
a virtude dos outros. 


A razão disso é que a alma humana nutre-se do bem próprio ou do mal alheio, e aquela que carece de um, aspira a obter o outro, e aquele que está longe de esperar obter méritos de outrem, procurará nivelar-se com ele, destruindo-lhe a fortuna. 

As pessoas que são curiosas e indiscretas são geralmente invejosas; porque conhecer muito a respeito da vida alheia não pode resultar do que concerne os próprios negócios. 
Isso deve provir, portanto, de tomar uma espécie de prazer teatral a admirar a fortuna dos outros. 
Aliás, quem não se ocupa senão dos próprios negócios não encontra matéria para invejas. 
Porque a inveja é uma paixão calaceira, isto é, passeia pelas ruas e não fica em casa. 


Francis Bacon
in, 'Ensaios - Da Inveja'




sexta-feira, 16 de setembro de 2022

O gosto humilde da tristeza


Engin Akyurt






 Quando perderes o gosto humilde da tristeza, 
Quando, nas horas melancólicas do dia, 
Não ouvires mais os lábios da sombra 
Murmurarem ao teu ouvido 
As palavras de voluptuosa beleza 
Ou de casta sabedoria; 

Quando a tua tristeza não for mais que amargura, 
Quando perderes todo estímulo e toda crença,
- A fé no bem e na virtude, 
A confiança nos teus amigos e na tua amante, 
Quando o próprio dia se te mudar em noite escura 
De desconsolação e malquerença; 

Quando, na agonia de tudo o que passa 
Ante os olhos imóveis do infinito, 
Na dor de ver murcharem as rosas, 
E como as rosas tudo o que é belo e frágil, 
Não sentires em teu ânimo aflito 
Crescer a ânsia de vida como uma divina graça; 

Quando tiveres inveja, quando o ciúme 
Crestar os últimos lírios de tua alma desvirginada; 
Quando em teus olhos áridos 
Estancarem-se as fontes das suaves lágrimas 
Em que se amorteceu o pecaminoso lume 
De tua inquieta mocidade: 

Então, sorri pela última vez, tristemente, 
A tudo o que outrora 
Amaste. Sorri tristemente... 
Sorri mansamente... em um sorriso pálido... pálido 
Como o beijo religioso que puseste 
Na fronte morta de tua mãe... sobre a tua fronte morta...


Manuel Bandeira




Estão zangados? - Não! Estamos resolvidos, de bem...Com a vida!







 "- Estás à espera de quem?
- Já não espero ninguém! Estou só a usufruir a brisa passar...
- Não tens família?
- Tenho! Deixei de esperá-los...
- Estão zangados?
- Não! Estamos resolvidos, de bem...Com a vida!
- Como assim?
- Aprendi com os anos de caminho que não devemos esperar ninguém!
- Mas...Uma mãe deve esperar sempre os seus filhos...
- Por muitos anos achei que sim...Depois aprendi que só esperámos na ilusão de posse...
No dia em que entendemos que ninguém pertence a ninguém, que até os filhos são do Universo...
Passámos a Ser livres para receber, sejam os filhos ou tudo o que a vida nos reserva!
- E quando os filhos não chegam?
- Quem nada, nem ninguém espera, tudo é só vida a acontecer...
- É difícil de entender!
- Eu sei. Fomos iludidos a sentir amor como apego, quando a verdade é que o autêntico Amor é saber desapegar, Amor é liberdade para amar sem prender, para amar permitido ao outro voar!
- E não sentes solidão?
- Ela não existe para quem resgatou para si o direito de também continuar a voar...
E hoje, mesmo de forma diferente, aceito e ajusto e continuo a permitir-me ao meu voo!
- E quando não conseguires?
- Eu acredito que quem se permite a Ser livre, a morte chegará leve, quando o meu corpo físico deixar de poder voar, partirei de regresso a casa!
E sabes...
Acredito também que esse é o propósito da vida, nunca deixar de voar,
Para em Alma voo para Sempre Ser!
Até lá...
Vou continuar a usufruir simplesmente a brisa passar..."




terça-feira, 13 de setembro de 2022

O Progresso de Édipo











Estranheza de ser. De agoniado
Espanto sou feita num sonho naufragado.
Tempo emprestado com um astro louco ao fundo.

Sitiada por trevas não descanso
De indagar minha essência e só me alcanço
Na loucura de não ser deste mundo. 


...


Na febre de buscar o senso à vida
Descubro-me dor de alma inacabada.
Poeira em forma breve reunida
No seu nexo de chama encarcerada. 

Nascer é um deus que prega uma partida
À inteligência universal do nada?
E ao fim a morte … talvez uma saída?
Ou nos confins do ser esperançosa entrada?

Estranha a mim na assombração do enigma
Ubíqua estou atada ao tempo, o estigma
A procurar-me sob a máscara, o rosto.

Mais se crispa o mistério na procura
De Deus nenhum sinal. Só à loucura
Do universo meu coração exposto


...


Melhor é ir. Atravessar o muro,
Seguir na barca que passa o golfo escuro
E ao Grande Enigma abandonar os remos.




Natália Correia
in, O Progresso de Édipo - Poema Dramático


Édipo o Rei


Busto de Sófocles




Terei eu também de aceitar o estigma com que esses demónios me
marcaram, de que todo aquele que arrancar a máscara da esfinge terá de
cometer um crime contra a própria natureza?

...


Difícil é esgrimir contigo usando estas palavras que os mortais fabricam
para comunicarem. Porque tu decifraste o enigma da esfinge e por isso és
conhecido como sábio. Mas queres o conselho dum pobre homem que só tem
o dom da vidência quando os deuses se lembram dele, escuta: se quiseres que
as tuas razões prevaleçam sobre a razão dos aedos não empregues a sabedoria.
São as suas almas que comunicam com os deuses. Por isso dizemos deles que
são homens sem cabeça. 

...


A verdade é que eu não vim a Tebas nem para ser rei nem para ser cego.
E ambas as coisas terei de suportar com ânimo de rei. 


...


O caso é que um trono não se obtém de graça. Para chegar a ele quase
todos contraem a cegueira da alma. É uma cegueira que eles provocam para
que o coração não seja um hóspede demasiado importuno no peito dum
monarca. 


...


Cegueira! Crês verdadeiramente que eu seja cego? Haverá de facto
cegueira no mundo? Não será sempre a mesma luz que nos pertence por
direito de nascença e que voltamos para dentro de nós quando as pálpebras se
fecham sobre as formas supérfluas do nosso sentir? Já pensaste, minha bem
amada, que os cegos trazem dentro de si, intacto, esse clarão, que só anima as
coisas essenciais porque o não desperdiça a volubilidade das pupilas? 


...


Não há regresso. Na verdade, nenhuma viagem nos permite verdadeiro
regresso. O retorno é apenas mais uma cadeia do nosso constante progresso. 


...


Dum só golpe eu desatei o nó sagrado da família. Nem um ramo deixei
de pé. Quando mergulhares a ponta desta espada no peito do teu filho, punirás
duma só estocada o parricida que te fez viúva, o filho incestuoso que te
arrastou ao crime e o irmão assassino que provocou a orfandade dos teus
filhos. 


...


Que faz a Rainha? Em vez de embeber a espada no coração
do Rei, fere com a ponta da lâmina as pupilas atónitas do amante. Poderão os
dois pôr uma pedra sobre o pecado e regressarem depois à inocência?


...


Sófocles
in, Édipo Rei


Mito de Édipo

 





Édipo, é um herói da 
mitologia grega que 
matou o pai, 
resolveu o enigma da esfinge 
que atacava a cidade grega de Tebas, e 
desposou a mãe. 
Em função deste incesto, 
foi ao mesmo tempo 
pai e irmão de 
Etéocles e Polinices
Ismênia e Antígona.



Édipo era descendente de Cadmo, fundador de Tebas. 
Seu bisavô foi Polidoro e seu avô Lábdaco, também reis da cidade.

Édipo é a personagem central da tragédia grega Édipo Rei, escrita pelo dramaturgo Sófocles (496 a.C. - 406 a.C.), como parte de uma trilogia que contém ainda os dramas Antígona e Édipo em Colono.

A lenda de Édipo foi recontada em muitas versões e foi usada por Sigmund Freud para nomear e dar um precedente mítico ao complexo de Édipo.

O complexo de Édipo
termo criado por Freud e inspirado na tragédia grega Édipo Rei, designa o conjunto de desejos amorosos e hostis que o menino enquanto ainda criança experimenta com relação a sua mãe, e embora seja muito discutido na área da psicologia e psicanálise, não é uma teoria cientificamente aceita por carecer de evidências.
Freud em seu livro "A Interpretação dos Sonhos" deixa claro que aquele que sofre deste mal tem plena consciência de quem são seus pais. Mas o Édipo literário assassina o pai e tem filhos com sua própria mãe sem ter consciência de suas identidades. Podemos concluir então que o Édipo literário não sofria de complexo de Édipo. 
A tragédia antiga expõe a “céu aberto” o que o inconsciente reluta em dizer.

O suposto fenómeno psíquico também ocorre nas meninas com relação ao pai, mas a este se dá o nome de Complexo de Electra.

O Complexo de Electra, 
define-se como sendo uma atitude emocional que, segundo algumas correntes psicanalíticas, todas as meninas têm para com a sua mãe; trata-se de uma atitude que implica uma identificação tão completa com a mãe que a filha deseja, inconscientemente, eliminá-la e possuir o pai. 
Sigmund Freud referia-se a ele como Complexo de Édipo feminino, 
tendo Carl Gustav Jung dado o nome "Complexo de Electra", baseando-se no mito grego de Electra, filha de Agamemnon, a qual quis que o irmão se vingasse da morte do pai de ambos matando, por fim, sua mãe Clitemnestra. 
Freud rejeitava o uso de tal termo por este enfatizar a analogia da atitude entre os dois sexos. 
O complexo de Electra é, muitas vezes, incluído no complexo de Édipo, já que os princípios que se aplicam a ambos são muito semelhantes.

Em ambos os sexos, 
o mecanismo de defesa fornece resoluções transitórias do conflito entre: 

1 - as motivações do id
 que designa na teoria psicanalítica uma das três estruturas do aparelho psíquico. O id seria a fonte da energia psíquica (libido). É formado pelas pulsões - instintos, impulsos orgânicos e desejos inconscientes. Funciona segundo o princípio do prazer (em alemão Lustprinzip), ou seja, busca o que produz prazer e evita o que é aversivo. 
O id não faz planos, não espera, busca uma solução imediata para as tensões, não aceita frustrações e não conhece inibição. Ele não tem contato com a realidade. Busca satisfação na fantasia e pode ter o mesmo efeito de uma ação concreta para atingir um objetivo. 
O id desconhece juízo, lógica, valores, ética ou moral. É exigente, impulsivo, cego, irracional, antissocial e egoísta.
Id é uma palavra latina com o significado de ele, isto.
De acordo com alguns autores, o id é inconsciente.

2 - as motivações do ego.
O Ego designa, na teoria psicanalítica, uma das três estruturas do modelo triádico do aparelho psíquico: Id, Ego e Superego. 
O ego desenvolve-se a partir do Id, na medida que o bebê vai tomando consciência de sua própria identidade, com o objetivo de permitir que seus impulsos sejam eficientes, ou seja, levando em conta o mundo externo: é o chamado princípio da realidade. 
É esse princípio que introduz a razão, o planeamento e a espera no comportamento humano. 
A satisfação das pulsões é retardada até o momento em que a realidade permita satisfazê-las com um máximo de prazer e um mínimo de consequências negativas.
O Ego é lógico e racional. Sempre cumpre a função de lidar com a realidade externa (faz um meio campo entre o mundo interno e externo), lidando com a estimulação que vem tanto da própria mente como do mundo exterior. Assim, o ego atua como mediador entre o id e o mundo exterior, tendo que lidar também com o superego, com as memórias de todo tipo e com as necessidades físicas do corpo. 
A sua energia é extraída do Id. 


O primeiro, o id, tem como mecanismo de defesa a repressão, o bloqueio de memórias, os impulsos emocionais e as ideias da mente consciente; mas a sua ação não resolve o conflito Id-Ego. 
O segundo, o Ego, tem como mecanismo de defesa a identificação, pelo qual a criança incorpora, ao seu (super)ego, as características de personalidade do pai do mesmo sexo. 
Ao se adaptar, o menino diminui sua ansiedade de castração, porque a sua semelhança com o pai o protege da ira do pai na sua rivalidade materna; 
Ao se adaptar, a menina facilita a identificação com a mãe, que entende que, sendo do sexo feminino, nenhuma delas possui um pênis, e, portanto, não são antagonistas.







MITO:

Édipo nasceu príncipe da cidade de Tebas, filho do rei Laio e da rainha Jocasta. 

Quando Jocasta estava grávida, Laio foi consultar o Oráculo de Delfos onde foi profetizado que 
"o filho que nascesse de seu casamento seria um dia o assassino de seu pai e o esposo de sua mãe", 
se tornaria um herói, desencadeando uma cadeia de desgraças, que causariam a ruína da casa real. Segundo as versões de Ésquilo e Eurípedes, o oráculo antecedeu a concepção, para impedir que Laio tivesse um filho; Laio desconsiderou o aviso, e o menino nasceu.

Aterrorizados e querendo frustrar a profecia, Laio e Jocasta resolveram encarregar um servo de matar a criança. O servo teve pena do bebé e levou-o para a montanha de Citerão, entre Tebas e Corinto, amarrou-lhe os pés com uma correia na altura dos tornozelos, e deixou-o lá amarrado a uma árvore, para ser devorado pelos lobos. Os gemidos do bebé atraíram um pastor chamado Forbas, que pastava as ovelhas do Rei Políbio, e levou a criança para a cidade de Corinto. 
Ao chegar, Forbas entregou o bebé a Peribeia, mulher de Políbio, Rei de Corinto.
A rainha tinha recentemente gerado um natimorto, e decidiu trocar os bebés, dando-lhe o nome de Édipo, que em grego quer dizer "pés inchados". 
Édipo cresce como príncipe em Corinto, acreditando ser um filho legítimo.

Anos mais tarde, Édipo mal fazia catorze anos e já os oficiais da corte tinham tido várias ocasiões de admirar-lhe a força e a destreza. Vencedor em todos os jogos do ginásio, excitou de tal maneira o ciúme de seus jovens companheiros que um, entre eles, para mortificá-lo, disse-lhe que ele não passava de uma pobre criança enjeitada, um filho adotivo. 
Atormentado com aquela censura, Édipo começou a ficar cismado sobre a sua origem, e interrogou com ansiedade, por diversas vezes, aquela a quem sempre chamara mãe. Peribeia, entretanto, que gostava muito dele, evitava esclarecer-lhe as dúvidas. Esforçava-se, ao contrário, para persuadi-lo de que ele era seu filho.
Desejoso de obter uma certeza, Édipo procurou o Oráculo de Delfos para saber mais a respeito do seu parentesco. O oráculo repetiu a profecia, de que viria a matar seu pai e casar-se com sua mãe. 
Sem conhecer sua verdadeira filiação, Édipo acreditou que estava destinado a assassinar Políbio e se casar com Peribeia.

Procurando evitar seu destino, Édipo deixou Corinto e partiu em direção a Fócida. 
Quando chegou a Delfos, encontrou numa estrada estreita quatro homens, entre eles o rei Laio, que estava indo a Delfos consultar novamente o oráculo, pois havia sentido presságios de que seu filho estava retornando para matá-lo. Os lacaios de Laio ordenaram que Édipo desse passagem à carruagem do rei. Como Édipo se recusou, Laio bateu-lhe com seu chicote. Tomado pela fúria, Édipo matou Laio e todos os seus homens, exceto um, acreditando serem um bando de malfeitores.

Depois daquela catástrofe, que privava de seu rei a cidade de Tebas, uma calamidade desolou toda a região: era a Esfinge.
Laio, rei de Tebas e pai de Édipo, tinha-se envolvido sexualmente com outro homem (no contexto da história, esta seria a primeira de todas as relações homossexuais), e então Hera, enquanto deusa do casamento, enviou a Esfinge para vingar-se de Laio.  

A Esfinge era uma figura feminina, filha de Ortros e de Equidna ou Quimera. 
Além da cabeça humana e do corpo do leão, ela também tinha asas de águia e cauda de serpente. 

Ficava sobre uma colina, junto de Tebas, fazia parar todos os viajantes, propunha-lhes um enigma capcioso, e devorava os que não o podiam resolver. Muitos milhares, de infelizes já assim haviam perecido. 

Creonte, irmão de Jocasta, que ocupava o trono, sacrificando seu próprio interesse ao interesse público, mandou anunciar por toda a Grécia que daria Jocasta e a coroa de Tebas àquele que livrasse a Beócia daquele flagelo.
A morte da Esfinge dependia da explicação de um enigma, que era apresentado nestes termos: 
Qual é o animal que tem quatro pés pela manhã, dois ao meio dia, e três à noite? 

Édipo, cuja sagacidade igualava seu amor da glória, apresentou-se ao monstro, ouviu o enigma, e respondeu, sem hesitação: 
"Esse animal é o homem, que, em sua infância, gatinha sobre os pés e as mãos, na idade viril sobre os dois pés e, na velhice, serve-se de um bastão como terceiro pé".


A esfinge, aflita com aquela inteligência de Édipo recobra o fôlego e propõe um novo enigma: 
“São duas irmãs. Uma gera a outra. E a segunda, por seu turno, é gerada pela primeira. Quem são elas?” 

Édipo, rapidamente decifrou: 
"A Luz e a Escuridão. A luz do dia gera a escuridão da noite, que, por sua vez, precede a luz do dia."

Depois que Édipo respondeu corretamente a ambas as perguntas, a Esfinge se matou da mesma forma que fazia com suas vítimas: se devorando.


Salvador de Tebas, Édipo subiu ao trono, e tornou-se o esposo de Jocasta, da qual teve dois filhos, Eteocles e Polinice, e duas filhas, Antígona e Ismênia.

Muitos anos depois desse casamento, os tebanos foram afligidos por uma peste que atacava indistintamente homens e animais, e que resistia aos recursos da arte, às orações e aos sacrifícios.

O oráculo, refúgio habitual dos infelizes, declarou que a Beócia não seria libertada daquele flagelo senão quando o assassino de Laio fosse descoberto e banido do reino. 
Édipo, que ignorava o nome e a qualidade do ancião que outrora matara em Fócida, ordenou, para descobrir o assassino de Laio, as buscas mais escrupulosas.

Tais buscas trouxeram à luz do dia três fatos horríveis: 
  1. que o próprio Édipo era o assassino designado pelo oráculo, 
  2. que Laio era seu pai e 
  3. Jocasta sua mãe. 
A essa revelação esmagadora, estalou nele um desespero sem limites, e, julgando-se indigno de ver a luz do dia, Édipo arrancou os próprios olhos, com a ponta de sua espada.
  
Expulso de Tebas por seus dois filhos, encaminhou-se para a Ática, destituído de tudo, dormindo sobre o chão duro, e mendigando seu pão de porta em porta. 
Antígona, sua filha mais velha, fazia-lhe companhia. Guiava os passos incertos do velho cego, e adoçava, com as mais ternas carícias, o horror de sua situação.

Chegaram junto de Colona, burgo vizinho de Atenas, a um bosque consagrado às Eumênidas, e cuja entrada era proibida aos profanos. Alguns habitantes, surpreendidos por verem ali o rei criminoso, quiseram constrangê-lo a sair. E talvez tivesse ele perecido sob seus golpes se Antígona não os conquistasse pela sua doçura e pelas suas lágrimas.

Édipo foi conduzido a Atenas, para junto de Teseu, que o recebeu com humanidade, e deu-lhe refúgio hospitaleiro, onde ele passou o resto de seus dias.

Entretanto, quando abandonara sua pátria, Tebas, Édipo havia lançado suas maldições sobre as cabeças de seus filhos Eteocles e Polinice, e pedido ao céu que aqueles ingratos brigassem à mão armada, disputando um ao outro o cetro que lhe arrancavam.
  
Para prevenir os efeitos daquelas imprecações, os dois irmãos não quiseram governar juntos, e combinaram que, alternadamente, um deles se conservaria afastado de Tebas, enquanto o outro ali reinaria pelo espaço de um ano. 
Eteocles, que era o mais velho, subiu ao trono, mas, quando chegou o prazo convencionado, recusou descer dele. Polinice, encolerizado, correu para Adrasto, rei de Argos, que lhe deu sua filha em casamento, e ajudou-o, com um exército, a reforçar seus direitos sobre o reino. 
Foi, esse, o início de uma expedição célebre, a dos "Sete contra Tebas": Adrasto, seus genros Polinice e Tideu, o adivinho Anfiaraus, Capaneu, Partenopeu e Hipomedão.

Anfiaraus, o cunhado de Adrasto, em sua qualidade de adivinho, quis opor-se àquela empresa, pois sabia, através de sua arte, que nenhum dos chefes, com exceção de Adrasto, voltaria com vida. 
Mas Anfiaraus, casando-se com Erifila, a irmã do rei, tinha combinado que de todas as vezes que ele e Adrasto tivessem opiniões diferentes sobre um assunto qualquer, a decisão seria deixada a Erifila. Polinice, sabendo disso, deu a Erifila o colar de Harmonia, e com isso ganhou-a para apoiar seus interesses. Aquele colar fora um presente que Vulcano dera a Harmonia, por ocasião de seu casamento com Cadmo, e Polinice o arrebatara dela quando de sua fuga de Tebas. 
Erifila não soube resistir à tentadora isca, e, pela sua decisão, a guerra foi resolvida, mandando Anfiaraus ao seu destino certo. Ele suportou corajosamente sua parte na luta, mas não pôde fugir ao seu fado. Perseguido pelo inimigo, corria ao longo do rio, quando um corisco enviado por Júpiter abriu o solo, e ele, seu carro, e o condutor de seu carro, foram engolidos pela terra.

Cenas de heroísmo e de atrocidade foram muitas, naquela batalha. 
Evadne, a esposa de Capaneu, teve um procedimento que serviu de contrapeso à fraqueza de Erifila. 
Seu marido, no ardor da peleja, declarou que forçaria seu caminho para a cidade, mesmo afrontando Júpiter. Colocando uma escada contra a muralha, a ela subiu, mas Júpiter, ofendido com a linguagem ímpia que ele usara, feriu-o com um raio. Quando seus funerais foram celebrados, Evadne atirou-se à pira, morrendo com o esposo.
  
Logo no início da batalha, Eteocles consultara o adivinho Tirésias quanto aos resultados dela. 
Tirésias, em sua juventude, tinha visto, por acaso, Minerva em seu banho. A deusa, em sua cólera, privou-o da visão. Mais tarde, porém, acalmada, compensou-o dando-lhe o conhecimento dos sucessos futuros. Quando consultado por Eteocles, ele declarou que a vitória seria de Tebas, se Meneceu, o filho de Creonte, se entregasse como vítima voluntária. O heroico jovem, tendo tido conhecimento daquela resposta, deixou-se matar no primeiro encontro.

O cerco continuou longamente, com vários sucessos. 
Por fim, ambos os contendores concordaram que os irmãos decidissem sua disputa em combate singular. Lutaram, e tombaram ambos, mutuamente assassinos. 
Os exércitos recomeçaram as lutas, e por fim os invasores foram forçados a se render, e fugiram, deixando seus mortos sem sepultura. 
Creonte, o tio dos príncipes mortos, tornou-se rei, mas deixou que o corpo de Polinice jazesse ali onde estava, proibindo, sob pena de morte, que alguém lhe desse funerais.

Antígona, a irmã de Polinice, ouviu com indignação o revoltante edital que entregava o corpo fraterno aos cães e aos abutres, privando-o dos ritos considerados essenciais para o repouso dos mortos. Não se deixando abalar pelos conselhos de uma afetuosa, mas tímida irmã, que tentava dissuadi-la de sua ideia, e não podendo conseguir auxílio, ela tentou afrontar o destino, e enterrar o corpo com suas próprias mãos. Foi apanhada naquele ato, e Creonte deu ordens para que a enterrassem viva, como tendo deliberadamente infringido o edital solene da cidade. 
Seu apaixonado, Hemon, filho de Creonte, não tendo podido evitar-lhe o triste fado, não quis sobreviver à mulher que amava, e precipitando-se sobre o cadáver de Antígona, apunhalou-se.  

Édipo, morreu anos mais tarde, em Atenas.




Édipo e a Esfinge, c.1806-08
(Oedipus and the Sphinx, c.1806-08 )
Francois Xavier Fabre




SIMBOLOGIA DA ESFINGE:

No mito de Édipo , havia uma esfinge no deserto que fazia uma charada para todos aqueles que tentassem atravessá-lo:

“Qual é o animal que tem 
quatro patas de manhã, 
duas ao meio-dia e 
três à noite?”


Todos que falharam foram devorados. 
Apenas Édipo conseguiu desvendar a questão com a seguinte resposta: 

“O amanhecer é a criança gatinhando, 
o entardecer é a fase adulta, e 
o anoitecer é a velhice, onde usamos bengala”.



Primeiro Estágio — O homem de quatro patas
Andar em quatro patas é a simbologia do nível mais baixo de uma pessoa, o nível bestial. 
Enquanto o homem é controlado pelos seus desejos mais básicos, ele não se diferencia de um animal sem escolha alguma.
Isso é representado pelo bebê que gatinha.
Nesta fase, ainda não temos a capacidade de ir atrás dos nossos desejos. 
Somos seres dependentes e sem autoridade.

A maioria dos adultos andam em quatro patas.
É o estágio onde pensamos apenas na nossa sobrevivência e em satisfazer as nossas necessidades.

O quatro é o símbolo da segurança e da estabilidade. É onde tudo se encaixa, mas permanece estagnado, pois não vê motivos para mudar.

Nossos níveis bestiais são exatamente como símbolos que eles representam. 
São os burros teimosos, as ovelhas obedientes e os porcos sujos. 
Todos apenas obedecendo conforme a sua própria natureza de ser, imaturos quanto a percepção de uma Realidade muito superior.



Segundo Estágio — O homem de duas patas
Logo depois, ao entardecer, vem o homem de duas patas em seu estágio humano.
Aqui ganhamos independência para agir. Podemos buscar por dinheiro, poder, honra, status e conhecimento.

O dois é o símbolo da dualidade e também do surgimento do conhecimento, pois todo o discernimento é feito pelo contraste de opostos. 
Só sabemos que existe a coragem através do medo. O preto através do branco.
É o nível do homem dual, que se divide entre ter e não ter. Ricos e pobres, inteligentes e burros, bons e maus.

Aqui, de tão individualizado pela sua própria polaridade, o homem não consegue perceber que ele e o outro fazem parte de um mesmo sistema. Que os problemas dos demais também o afetam.

O homem reconhece os seus desejos, mas ainda não compreende o seu lugar no mundo.



Terceiro Estágio — O homem de três patas
Quando anoitece, entra o homem de três patas, originalmente conhecido como idoso por utilizar uma bengala.
Este é o nível do homem sábio e que está entre os dois níveis anteriores, entre o dois e o quatro.

Como idosos, voltamos a ser como bebês. Precisamos da ajuda das pessoas, mas agora já passamos por toda a experiência de ter vivido. Sabemos o que queremos, mas também reconhecemos melhor a importância daqueles ao nosso redor.

O três é o elo, o nível de ligação entre os níveis anteriores. É aquele que consegue entender o mundo além das dualidades, criando um ponto neutro para se colocar acima das polaridades.
O três é conhecido como um número perfeito e espiritual. 
Aqui o três representa uma pessoa que está acima da sua própria individualidade e alcançou um nível espiritual, ou seja, que consegue ver o mundo além do seu próprio ponto de vista.

É o homem que se conecta aos demais e que concilia paradoxos.



A ESFINGE NO TAROT:

A esfinge possui diversas simbologias dentro do ocultismo e do esoterismo.

É o exemplo do Tarot:




Na carta o Mundo, 
a esfinge representa os 4 Estados de Consciência: 
  • o Anjo (Astral)
  • a Águia( Emocional),
  • o Leão (Energia Física, Mental), 
  • o Touro (Realizações, concretizações, materialização) 

A Esfinge representa o homem em todas as suas facetas reunidas num ser só, que o sintetizaria, da mesma forma que o Mundo. 

Representa o Quaternário, os 4 planos de existência:
  1. Astral - Emocional - Mental - Material
  2. Ar - Água - Fogo - Terra
  3. Aquário - Escorpião - Leão - Touro
  4. Paus - Copas - Espadas - Ouros
  5. Anjo - Águia - Leão - Touro

Então, o que é o Mundo? 
Os gregos falam da Quintessência, o quinto elemento que seria a junção dos outros quatro. 
Significaria a harmonia plena. 
Simbolizado pelo Ser Andrógino dentro da coroa de louros no centro.

Para os gregos, a reunião dos quatro animais forma a Esfinge, que simboliza a síntese das quatro características que compõe o homem: 
  • a razão 
  • a emoção 
  • os instintos 
  • o poder 


A frase aparentemente terrível, “decifra-me ou devoro-te”, significa a busca pelo autoconhecimento, pois o homem que não conhece a si mesmo tende a ser destruído por um dos aspectos que não está sob seu controle: 
  1. se negar ou supervalorizar seu instinto, cairá na intemperança, excesso, desregramento; 
  2. se se curvar demais ao poder perderá sua liberdade ou se fizer uso dele de forma tirânica poderá ser destruído; 
  3. se negar a razão poderá cometer um grave erro, se a supervalorizar poderá se tornar arrogante 
  4. e se negar ou supervalorizar suas emoções, poderá cair em depressão ou ter um acesso de raiva.

O Mundo nos mostra um modelo ideal que devemos almejar, onde cada um dos nossos aspectos está em harmonia com os outros e sem polaridades: 
bem/mal, masculino/feminino, sexo/amor, emoção/razão, governante/governado, Deus/Homem. 
Se o alcançarmos em sua plenitude, teremos atingido a Iluminação.

Esse seria o fim último do homem e é inatingível, mas pode ser tangenciado. 
Por isso o Mundo não fecha o Tarot, mas o Louco. 

Quando o tangenciamos, vislumbramos uma nova jornada e o Louco seguirá novamente o caminho.
Assim, o Louco ao encontrar o Mundo, percebe que evoluiu em relação ao início da jornada, mas também percebe que ainda há mais para aprender e continua sua jornada, em busca do Mago para escolher novos caminhos, novamente tendo como base os 4 Estados de Consciência:
  • Bastões - Paus (Astral)
  • Taças - Copas (Emocional)
  • Gládios - Espadas (Mental)
  • Discos - Ouros (Material)






Na carta da Roda da Fortuna 
A Roda da Fortuna é o tear das Moiras, Cloto, Láqueis e Átropos – as deusas gregas que fiavam, teciam e cortavam o fio da vida. Trata-se de uma metáfora dos processos de nascimento, crescimento e desenvolvimento, e desencarne. O fio da vida na roca do destino. 
Fortuna também é a deusa romana da sorte, seja ela boa ou má. 
Geralmente é representada portando a cornucópia, símbolo de abundância, e o leme, que por si só já lembra a figura da Roda, acrescido do sentido de direção. 

Na imagem desse arcano, vemos uma grande Roda que se sustenta em um eixo, e no topo uma figura (geralmente uma esfinge, que simboliza os desafios), além de uma personagem subindo e outra descendo em seu arco. Não se trata da roda do dinheiro, portanto. É a roda da vida.
A evolução humana na sua transitoriedade da existência, depende do decifrar dos enigmas(desafios da vida) da Esfinge.

A esfinge é uma parte do nosso lado bestial representada pela combinação de diversos animais e do Homem. A esfinge é o nosso próprio Ego.

Todos os homens (de duas patas) que confrontavam a esfinge (quatro patas) acabavam sendo engolidos. Ou seja, enquanto o homem não descobrir a sua versão de três patas, ele continuará sendo engolido pelo Ego.

O deserto representa a individualidade, o egoísmo e a solidão. 
É um local seco onde a água não alcança.

Quando estamos afundados 
em nossa individualidade, 
o Ego se sobressai e nos questiona. 
É hora de testar 
os nossos aprendizados e evoluir, 
ou então deixar-se devorar 
pela nossa própria esfinge. 
Dessa forma, 
interrompe-se o processo 
e regredimos, 
nutrindo a nossa própria bestialidade.