sábado, 10 de dezembro de 2016

Sistema de Castas da Índia




O sistema de castas da Índia é uma divisão social importante na sociedade Hindu, não apenas na Índia, mas no Nepal e outros países e populações de religião Hindu. Embora geralmente identificado com o hinduísmo, o sistema de castas também foi observado entre seguidores de outras religiões no subcontinente indiano, incluindo alguns grupos de muçulmanos e cristãos. A Constituição Indiana rejeita a discriminação com base na casta, em consonância com os princípios democráticos e seculares que fundaram a nação. Barreiras de casta deixaram de existir nas grandes cidades, mas persistem principalmente na zona rural do país.

Define-se casta como grupo social hereditário, no qual a condição do indivíduo passa de pai para filho. O grupo é endógamo, isto é, cada integrante só pode casar-se com pessoas do seu próprio grupo.

Hoje, existem cerca de 3 mil castas na Índia, o que é um confusão para se conseguir entender.
Mas essas castas todas podem ser divididas em quatro grupos, que eram as castas originais:


  • Brahmin (Brâmanes): A casta mais alta, é formada por pensadores e letrados, pessoas consideradas próximas aos deuses. Entre as profissões exercidas por eles estão as de sacerdotes, professores e filósofos. Na mitologia hindu, foram criados a partir da cabeça de Brahma.
  • Kshatriya (Xátrias): São os guerreiros, nasceram dos braços de Brahma. Exercem profissões como as de soldados, policias e administradores.
  • Vaishya (Vaixás): São os comerciantes, nasceram nas pernas de Brahma.
  • Shudra (Sudras): São camponeses, artesãos e operários. Nasceram dos pés de Brahma.





À margem dessa estrutura social havia os cordeiros, que vieram da poeira debaixo do pé de Brahma. 
Mais conhecidos como Párias, sem casta, eram considerados os mais atraídos por todas as castas. 
Hoje são chamados de haridchens, haryens, dalit, ou intocaveis. 
Com o passar do tempo, ocorreram centenas de subdivisões, que não param de se multiplicar.

A origem do sistema de castas é incerta.
Segundo o hinduísmo, vem de Brahma, a divindade criadora do universo, mas parece ser proveniente da divisão entre os migrantes arianos — subgrupo dos indo-europeus que povoou a Península da Índia por volta de 1600 a.C., vindo do norte, pelo Punjabe — e os nativos (dasya), que se tornaram escravos. 
As primeiras referências históricas sobre a existência de castas encontram-se num livro sagrado dos indianos, o Manu, possivelmente escrito entre 800 a.C. e 250 a.C..

Apesar de ter origem na fé hindu, foi incentivado e até mesmo reforçado pelos britânicos durante a colonização, transformando-o em algo muito mais rígido.

O assunto é considerado tabu pela maior parte dos indianos, não é um assunto que se vai puxar na mesa de jantar com aquela família que se conheceu sem causar constrangimento. Perguntar a casta de alguém é indelicado, para não dizer outra coisa.
Acreditem, eu já vi isso acontecer e morri de vergonha...

Declarado ilegal em 1950, na época da independência, o sistema chegou bem vivo ao Século XXI em forma de tradições, desigualdade social e preconceito. 
Isto foi possível porque, ao contrário da escravidão, o sistema de castas trabalha de uma forma muito mais subtil e informal.
Sim, hoje em dia não é mais possível criar, por exemplo, clubes exclusivos para membros de uma certa casta, mas as profundas desigualdades sociais e preconceitos originados por séculos de divisão garantem que a exclusão continua a acontecer.
Para nós, o sistema parece indecifrável e confuso, mas ele está bem arraigado na cultura dos indianos.
Eles conseguem saber a qual casta uma pessoa pertence apenas pelo sobrenome. 
Foi por isso que os Sikhs, religião monoteísta muito popular no norte da Índia e que rejeita a divisão de castas, adoptou para todos os seus membros um mesmo sobrenome: 
Singh para homens e Kaur para mulheres.

Na Índia Urbana, o sistema tem vindo a perder força com os anos, ainda que muito lentamente.
Casamentos entres as três castas superiores, embora ainda não extremamente comuns, já não chegam a ser mal vistos.
No entanto, continua a valer como lei em pequenas Vilas e na Índia Rural, onde vivem 857 milhões de indianos.




A consequência mais óbvia deste Sistema de Castas é a perpetuação da desigualdade social. 
Mas, eu diria que há mais.
No ambiente de trabalho existe a arrogância dos chefes, na Índia Urbana de hoje.
Humilhações públicas são ocorrências rotineiras no escritório.
É como se aquela posição tivesse lhes tivesse sido designada pelo próprio Brahma, e não fosse fruto de um punhado de privilégios que eles tiveram desde o nascimento.

Claro que isto não é uma regra absoluta.
Há muita gente bem nascida (aos olhos do Sistema de Castas) que vê a ignorância presente nessa divisão e luta contra as castas na Índia. 
Mas, grande parte dos membros das castas superiores ainda acredita que eles são merecedores natos do bom e do melhor, e que são mais dignos de respeito que os outros.
São pessoas difíceis de lidar, que não aceitam ser contrariadas e que acham que todos devem baixar a cabeça para o que dizem.
Por outro lado, membros de classes inferiores se resignam a ouvir abusos.
Além disto, revoltar-se contra a “vontade de deus” tem consequências graves na fé hindu.



Dalit



Dalits, os intocáveis:

Se os Sudras surgiram dos pés de Brahma, os Dalits tiveram uma origem ainda menos nobre: foram criados a partir da poeira que deus pisou. 
Tratados como párias, excluídos da sociedade, os dalits não têm casta e são considerados impuros. 
Para eles são guardados os trabalhos que os outros indianos se recusam a fazer por considerarem indignos: recolher lixo e limpar casas de banho, por exemplo.
Considerados portadores de impurezas por onde quer que passem, eles vivem um sistema opressivo digno de um apartheid. Um dalit não pode sentar-se à mesa com membros de outras castas ou usar os mesmos pratos e copos. Em casas mais conservadoras, eles possuem uma entrada especial que só permite que eles cheguem até ás casas de banho e à área de recolha de lixo, sendo proibidos de colocar os pés na casa principal.

Como o sistema hoje é cultural e não oficial, alguns mas poucos dalits conseguiram escapar do seu destino e ascender socialmente. 
No entanto, como cidadãos de um país que também sofre com extrema desigualdade, nós sabemos que quebrar o ciclo da miséria não é fácil.
Para reparar os males causados por séculos de um sistema cruel, o governo indiano oferece cotas nas universidades e outros programas sociais, como a concessão de microcrédito, que visam a inserção dos párias na sociedade.
Um grupo minúsculo deles, aproveitam a abertura económica do país nos últimos vinte anos, e conseguiram prosperar pelo empreendedorismo e alcançaram os seus milhões de dólares, criando um fenómeno conhecido como Dalits Millionaires. 
Mas ainda existe um longo caminho a percorrer.
Apenas 30% dos dalits é alfabetizado (a média do país é de 75%) e a discriminação contra crianças dalits nas escolas faz com que elas abandonem as aulas.
Eles também são as maiores vítimas de violência e crimes de ódio.

Hoje, os dalits que conseguem escapar da sina de exercer as profissões indignas são aceites na convivência de outros indianos. Contudo, mais que qualquer outra união entre castas, casar-se com um Dalit é ainda um tabu gigante.



Comunidade Perna,  Dharampura, periferia da capital indiana Nova Délhi.



Os Perna:

A prostituição entre as mulheres Perna é apenas um facto de uma história inteira de desvantagem económica e social da casta. Os Perna foram um dos grupos sociais taxados como hereditariamente criminosos pela Criminal Tribes Act, uma lei imposta no país em 1871, durante a dominação britânica. 
Além dos Perna, mais de 300 outras castas foram incluídas neste grupo. 
Elas eram compostas por vendedores itinerantes, artistas e profissionais ligados ao folclore indiano que, assim como os ciganos europeus, despertavam desconfiança nos britânicos por serem difíceis de serem submetidos às normas do governo.

A lei foi banida em 1947, após a independência da Índia.
Porém, os efeitos dessa alienação da sociedade duram até hoje. 
Muitos Perna, por exemplo, não têm conhecimento dos seus direitos, por isso, costumam fazer o mesmo caminho dos pais. Eles também costumam ser ignorados, barrados ou até mesmo expulsos de alguns estabelecimentos.
Mas, felizmente algumas mulheres Perna estão a começar a questionar o seu destino e a proteger as suas filhas.
As mulheres desta casta que tentam resistir à prostituição acabam por sofrer abusos físicos por parte dos sogros, que esperam que a mulher de seu filho contribua para a renda familiar.

As meninas Perna, aprendem desde muito pequenas que o grupo social ao qual pertencem está ligado à chamada “prostituição intergeracional”.
Casam-se pouco depois dos 10 anos de idade mal entram na puberdade, com homens que nunca viram na vida.
Por volta dos 16 anos já estão a trabalhar como prostitutas na rua para  sustentar a família, e a família do marido. Trabalham na prostituição durante 8 a 10 anos, até as suas filhas entrarem na puberdade, se casarem e terem o seu primeiro filho, e começarem a trabalhar na prostituição.
Os homens desta casta normalmente criam cabras ou simplesmente não trabalham. Desempenham a função de proxenetas das suas mulheres.
Uma pressão exercida pelos próprios pais e sogros.
E os maridos? A eles cabe-lhes, no máximo, serem os chulos das suas mulheres. 
E castigá-las quando o retorno económico não chega para alimentar toda aquela gente.

Uma mulher Perna deu uma entrevista ao canal de Tv Al-Jazeera: 
"Eu não sei por quê. Pode-se dizer que é o modo tradicional. Esse trabalho é o nosso compromisso, nosso meio de sustento. Tentamos fazê-lo rápido. Normalmente dentro dos carros de quem nos procura. Enquanto uma mulher fica com o cliente, outra fica por perto para a proteger. Cada cliente paga entre 200 a 300 rupias(2,50 a 3 Euros) e numa noite faz até 1000 Rupias(15 Euros)(...) Não há outro caminho. Quando a minha filha disse aos sogros dela que não se queria prostituir, eles ameaçaram-na. Disseram-lhe que lhe tiravam tudo, até a roupa. Que a iam deixar sozinha na rua, toda nua."
No seu próprio passado, o cenário de agressão física e ameaças de actos macabros em caso de recusa à actividade foram uma constante. Não teve por onde fugir e, durante mais de uma década, acabou por vender o corpo na rua, acompanhada por inúmeras outras mulheres Perna que o faziam em grupo para se ajudarem a proteger umas às outras.
São literalmente atiradas para as ruas pelos maridos, onde se prostituem por cerca de €2,50.
É apenas esse o “valor” dado ao seu corpo, à sua alma e à sua dignidade.
Os maridos e os sogros vivem desse rendimento e, também por “tradição”, só elas são obrigadas a trabalhar.

Toda esta injustiça e desrespeito pela sua vontade e dignidade fizeram com que a filha de Leela que deu esta entrevista, fugisse da família do marido, acto muito pouco comum dentro da comunidade.
Primeiro foi para casa da mãe, hoje com trinta e poucos anos.
Depois, quando percebeu que também a sua própria família não lhe daria o apoio necessário, acabou por se refugiar num abrigo de uma ONG que trabalha com mulheres na mesma situação.
Nas costas carrega a raiva, mas também a eterna vergonha que todos a fazem sentir por fugir à tarefa que lhe foi atribuída mal nasceu, mulher. 
Hoje, alguns meses depois da fuga, a própria Leela admite que toda a família espera que seja aquela adolescente a quebrar o ciclo das meninas do seu clã.
O acesso à educação, como porta para um futuro melhor, mais digno e independente economicamente, parece ser a solução.

Ruchira Gupta, fundadora da ONG anti-tráfico APNE AAP, que acolheu a filha de Leela, e que tem trabalhado em Najafgarh com a Comunidade Perna há mais de 5 anos, disse que "Ser uma mulher Perna, é ser uma casta marginalizada da Índia onde a prostituição normalmente é o passo seguinte das mulheres após o casamento e o nascimento do primeiro filho."
Vêem-se a vender sexo nas ruas que cortam Najafgarh, em Dharampura, onde existe uma Comunidade Perna, um bairro pobre situado na periferia da capital indiana Nova Délhi.

A casta Perna é a mais marginalizada na Índia.
Quer a nível social, quer a nível económico, quer a nível histórico que os excluiu das liberdades e direitos de cidadania.

A “sentença” de vida das mulheres ‘perna’ é só um ponto de partida para a realidade atroz de tantas outras mulheres de castas mais baixas na Índia. 
De uma forma ou de outra, a violência sexual é recorrente e desvalorizada. 

Tal como em tantas outras partes do mundo: globalmente, diz as Nações Unidas, 120 milhões de meninas e adolescentes já foram forçadas a ter relações sexuais contra a sua vontade.
Mais de 70% das vítimas de tráfico humano são do sexo feminino, sendo que 80% das mulheres e meninas traficadas entram em redes de exploração sexual.

No dia-a-dia na Índia sente-se bem a segregação informal imposta pelas castas.
No atendimento nos restaurantes, no tratar as pessoas nas ruas, nas casas de banho públicas, etc...
Apesar de saber que é fruto da Cultura local, não deixa de ser constrangedor, repugnante e revoltante.
Não é por ser cultural, que temos de o aceitar!!!




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