A minha avó contava-me que na véspera, quando já todos dormiam, metia dentro dos sapatos de cada uma das crianças um rebuçado, e que na manhã de Natal aquilo era de uma felicidade levada a extremos. Que faziam daquilo história para o ano todo, que depois daquela manhã eram todos mais felizes. Foi este o Natal que ela me passou, mesmo que eu o achasse fraco porque já tinha um Game Boy e carros telecomandados; mas apreciava o verdadeiro sentido das coisas, o gesto que enchia corações e os tornava felizes com tanto no meio de tão pouco.
Mais tarde ela mostrou-me que a noite de Natal era uma mesa cheia, de pessoas e comida, de gargalhadas. Era o dia que a família se juntava toda em casa deles, dos avós. Os pequenos numa mesa diferente da dos adultos, porque era nestas dias que nos davam “mais largas” e à meia noite em ponto se abriam os presentes. Apagavam as luzes, e só com as da árvore, aparecia um dos adultos vestido de Pai Natal. E foi a partir dos oito anos que deixei de olhar para a chaminé na cozinha, por cada vez que o via entrar pela porta da rua; sempre achei estranha aquela logística mal feita. Eram dias felizes, a gelatina da minha tia era um brilho nos olhos de cada um e costumávamos terminar os serões com uma “cartada”. E eu gostava verdadeiramente deste Natal que me criava ansiedade na véspera e saudade na partida.
Mas o Natal já não é o que era, o tempo tem a facilidade de levar com ele as pessoas que o faziam verdadeiramente genuíno e especial, que lhe acrescentavam felicidade. Porque acredito que não foi o Pai Natal que fez os melhores Natais de sempre, eram os nossos avós, os mais adultos, que lhes davam aquele cheiro único a filhoses; eram aqueles que nunca se cruzaram com um shopping na vida.
Hoje não gosto do Natal, da correria, da preocupação, do enredo à volta de um presente, da ostentação, de quem vai dar ou receber o melhor, da pressa levada às lojas, do consumismo louco e sem regras. Da forma crucial com que se passa isto para os mais novos e nem se dá conta. Não gosto das luzes, não consigo perceber onde reside a piada num jogo de luzes pela cidade inteira, por mais bonecos que possam ter, se isso acarreta custos maiores que os que se podem.O cheiro já não é aquele, e ninguém me engana porque eu conheço o cheiro do Natal quando era a sério. Nem as sobremesas são as mesmas. As prendas já não têm horário para serem abertas, têm é que existir — e se forem mais melhor. Até já se perdeu a piada de se receber aquele par de meias num embrulho maior que elas.
Para juntar a família assim, podemos fazer um Natal todos os dias, porque o dia já não se distingue da mesma forma. A época mudou mais que o gelo nos glaciares e até o Sozinho em Casa cresceu. As renas já não estacionam o trenó nos imaginários dos mais inocentes e o Pai Natal quase que já chega num Bugatti dos bons. Os enfeites são mais que a solidariedade, a união é muito inferior às filas nas lojas e as famílias unidas são jantares de grupo em massa e quantidades industriais, onde os bifinhos com cogumelos superam em larga escala o bacalhau e o perú.
Já nada é como era antes. Não gosto mesmo deste Natal, onde a tradição perdeu para a vulgaridade. E a não ser que me sente a uma mesa com o Baltasar, o Melchior e o Gaspar… onde mandemos vir panados, comamos da mirra, coloquemos incenso para que não cheire ao frito das filhoses, e no fim de tudo possamos distribuir ouro pelos mais pobres; dificilmente voltarei a gostar do Natal — pelo menos da mesma forma que a minha avó mo mostrou.
Marco Gil
Já nada é o que era...foram-se os avós...foram-se as tradições...ficaram os shoppings, as prendas caras e os doces comprados na véspera, porque hoje...não há tempo.
É apenas mais um banquete em casa de algum familiar que só vemos nestas alturas... para uma grande maioria, pelo que conheço...
Por isso reinventei o Natal!
Eu Vivo esse!
Eu, só tenho memórias de infância a partir dos 7 anos...
E nessa altura, os meus pais entraram numa crise financeira difícil, e passado um ano nascem as minhas duas irmãs.
Quero com isto dizer que, os Natais da minha memória sempre foram sem prendas, com uns chocolates na Árvore de Natal.
Guardo na memória a lareira sempre acesa, a mesa com os doces de Natal feitos pela minha mãe quando acordava de manhã com as brasas da lareira ainda acesas na nossa casa, o bacalhau cozido com couves da horta, e a caldeirada de enguias acabadas de apanhar, as sestas depois de comer a ver filmes de Natal...
Nunca tive Pai Natal em casa...a minha mãe punha o menino jesus no presépio, antes de ir para a missa do galo, e à meia-noite quando chegávamos a casa já lá estava, já tinha nascido.
Acendíamos a lareira outra vez, comíamos mais uns docinhos com o café das velhas, víamos televisão junto à lareira...e o bom do natal para mim era esse momento depois da missa do galo.
É este Natal que guardo, e que reinventei.
E é isto que ainda hoje procuro viver nesta altura do ano.
O conforto e o quentinho de casa, com os doces e as comidas do Natal em família.
E para saber a Natal, gosto de comer essas coisas só nos dias de Natal.
E feitas em casa.
Hoje em dia, perdeu-se esse sentir.
Mas, como não sou nada saudosista, não me fere que assim seja.
Cada um vive o Natal à sua maneira.
Viver e deixar viver.
Cada coisa no seu tempo...
A última vez que passei o Natal em família foi em 2004.
Foi para esquecer...nunca vi tantos presentes juntos numa só divisão.
O histerismo a abrir as prendas... a comparação de prendas...
Tudo aquilo foi novidade para mim...nunca tinha passado um Natal tão consumista, e tão vazio de emoção e de sentimentos.
Mas, as pessoas são livres de o viver como querem e bem entendem.
Quanto a mim, decidi não passar mais o Natal em família...
Reinventei o Natal...o meu Natal...
Vejo muitas famílias que se juntam em hotéis, em família, sem prendas.
Só o estar em família, sem correrias, sem preocupações...
Outras, compram tudo feito para comer em casa, todos juntos...
Outras, têm laços familiares muito fortes, juntam-se varias vezes com regularidade ao longo do ano, e fazem o Natal das Crianças, em que só elas recebem um presente cada uma. Esses continuam a viver o Natal de Sempre, em que as crianças agora são os bisnetos.
Cada um vive o Natal da forma que se sente melhor.
Mas, eu acho que lá no fundo, o espírito natalício se mantém, que é reunir a família e comerem comidas de Natal juntos. Apenas o vivem de uma forma diferente, mais consumista, com menos emoção, com menos sentir...
Mas, nem todas as famílias o vivem dessa forma.
O Natal é o que as pessoas quiserem que ele seja...
Mudam-se os tempos... mudam as mentalidades... mudam as vontades!
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