sexta-feira, 20 de maio de 2016

A Leviana




Não a julguem depressa de mais: a leviana faz falta à vida por três razões muito simples.
Primeira, porque encarna a maior de todas as tentações masculinas;
segunda, por que constitui a fórmula mais líquida de testar a resistência de um homem;
e, finalmente, porque a sua garridez é a oitava maravilha do Mundo.

Aliás, a leviandade de algumas mulheres não deveria ser encarada como um defeito, mas como uma arte de expressão tão séria e extasiante como qualquer outra.
O que não podem é confundi-la com a rameira ou com a libertina - a leviana preza de mais a cegueira dos homens para a desbaratar à má fila, e não depende do dinheiro deles, ou dos seus corpos, mas da sua alma.
Não ambiciona conforto, mas domínio, e não se contenta em despertar o desejo dos amantes, mas a dispor das suas vidas; é, aliás, graças a essa perversidade que se deve o seu estranho poder: a leviana bate-se para conseguir um fim que, uma vez atingido, não sabe o que fazer dele - por puro gozo.

É como se vingasse, ela mesma, o eterno contencioso com os homens, beneficiasse de um crédito de amor secular, albergasse uma fome de amor tão insaciável que tornasse legítimos todos os jogos e desculpáveis todas as cabritices.
Muito se tem escrito sobre o seu feitiço: uns, sustentam que se deve ao seu engenho insuperável para espicaçar o desejo dos homens e mantê-lo ao rubro por tempo controlado; outros, atribuem-no à sua total indiferença perante as consequências — atitude que a maioria dos homens receia e a que, por isso mesmo, lhe custa resistir.

Mas a leviana possui uma receita exacta: é a combinação ocasional entre a coqueteria e o desprendimento, o capricho e a infantilidade, o olhar e o sorriso, a sujeição e a liberdade, o desplante e o embuste, a basquinha e as ligas, e ainda a sábia dosagem de cada estímulo, que faz dela uma sedutora infalível.

Atenção, há que ter presente que ela dificilmente ama alguém: do que ela gosta, sobretudo, é de conservar chamas acesas e de coleccionar corações. As questões morais não a afectam, pelo contrário: é na transgressão que encontra o seu equilíbrio.
Mas ao que o homem não conseguirá nunca resistir não é à sua lingerie barroca ou aos seus batons purpúreos: aquilo que verdadeiramente o subjuga é o jogo de avanços e retrocessos que ela aprendeu como ninguém a cartear e lhe transmitem - a ele - a eterna ilusão de meta móvel.

Noutro plano, é a quantidade e não a qualidade que a sacia; não se importa que as suas vítimas sejam velhas ou novas, espertas ou néscias, solteiras ou casadas; do que ela precisa constantemente é de provar a si mesma que a sua capacidade de desencadear paixões se encontra em boa forma e que nenhumas calças, depois de a conhecerem, manterão o aprumo.

Por outro lado, protagonizando a antítese da oferecida, é a mulher mais cara de todas porque é de todas a que melhor se faz render. Mas o que a torna verdadeiramente irresistível é que nada disto é urdido com premeditação: a leviana surte efeito porque improvisa, sendo unicamente orientada pelo instinto, e, quando volta não volta é abandonada, é até possível que chore lágrimas sentidas.
Com uma única diferença em relação a outras predadoras: a leviana chora, não com pena de perder o seu amado, mas a aposta em si mesma. Pior: a sua felicidade depende da infelicidade das suas vítimas.

A sua pele fica mais rosada e fresca depois de uma falsa jura, o seu coração mais consolado depois de um divórcio induzido, o seu jogo de sedução mais inspirado depois de um suicídio aparatoso.
Não é tão má como se julga.
Pitigrilli escreveu que há certas mulheres que continuam a ser honestas mesmo depois de se terem vendido, como certas nações continuam a ser grandes mesmo depois de derrotadas.


Rita Ferro


As mulheres de hoje...
Andam a aprender a lição com o predador...sendo agora elas as predadoras...
Agora eles que não se queixem...foram eles que as "criaram à sua imagem e semelhança"...

Mas, como diz a Rita Ferro, não as julguem.
Apesar de estarem em desequilíbrio, muito longe da sua essência, prefiro as Levianas do que as Evas submissas, subjugadas, dependentes, cegas e devotas...

Confesso que esta "vingança" me dá um certo gozo...

Sem comentários:

Enviar um comentário