segunda-feira, 20 de março de 2017

PRESÍDIO





Nem todo o corpo é carne... Não, nem todo 
Que dizer do pescoço, às vezes mármore, 
às vezes linho, lago, tronco de árvore, 
nuvem, ou ave, ao tacto sempre pouco...?

E o ventre, inconsistente como o lodo?... 
E o morno gradeamento dos teus braços? 
Não, meu amor... Nem todo o corpo é carne: 
é também água, terra, vento, fogo...

É sobretudo sombra à despedida; 
onda de pedra em cada reencontro; 
no parque da memória o fugidio

vulto da Primavera em pleno Outono... 
Nem só de carne é feito este presídio, 
pois no teu corpo existe o mundo todo!


DAVID MOURÃO-FERREIRA 
in, OBRA POÉTICA



Sem comentários:

Enviar um comentário