Alexander Yakovlev
Procura-me. Eu escondo-me por vezes entre as volutas
secretas de um poema e todo o perfume das rosas
me encobre a sombra. Não desanimes, pode ser difícil
encontrar-me, não desistas, tu podes ser a sílaba que
falta, o til a vírgula, não queiras que a página se perca
entre a surpresa inócua do vazio e a espera desatenta
do futuro. Procura-me. Vê debaixo da mesa atrás
das portas, posso bem estar no escuro pousado na raiz
da memória à espera que ela dê frutos. Posso
andar aí pelo corredor como uma ausência incapaz
de resignar-se, posso ir e voltar de momento a momento
podes até cruzar comigo e não me veres. Às vezes
adormeço e transparente emigro, vem o vento e arma-se
a partida nem eu sei para onde nem por quanto tempo.
Mas procura-me. Saber-te a procurar-me dá-me
alento bastante para enganar a vida, que eu vivo a
doença deste funesto presente. Escondo-me por vezes
e não é por mal, é antes por amor ao labirinto: é uma
ferida funda um crime à beira de nascer
mas tu nunca desistas, por favor. Procura-me.
| Nuno Figueiredo |
Sem comentários:
Enviar um comentário