sábado, 19 de setembro de 2015

Canção de Mim Mesmo 8




O pequenino dorme em seu berço,
Ergo a tela e o observo por um tempo longo, e sem alarde espanto as moscas com a mão.

O jovem e a moça de rosto rosado se viram para o lado na montanha repleta de arbustos,
Eu os perscruto olhando-os lá do alto.

O suicida está esparramado no chão, ensanguentado no quarto de dormir,
Eu testemunho o cadáver com seus húmidos cabelos e noto onde a pistola caiu.

A tagarelice das calçadas, as rodas das carroças, a lama na sola das botas, a conversa no passeio público,
O autocarro pesado, o motorista com seu polegar interrogativo, o estrépito das ferraduras no chão de granito,
Os trenós, os estalidos, as piadas gritadas, o impacto das bolas de neve,
As saudações para os favoritos do povo, a fúria das hordas inflamadas,
A agitação das cortinas da liteira, um doente carregado ao hospital,
O encontro de inimigos, a blasfémia repentina, as pancadas e a queda,
A multidão excitada, os policias com sua estrela forçando apressadamente a passagem para o centro da turba,
As rochas impassíveis que recebem e devolvem tantos ecos,
Que gemidos de empanzinados ou famintos que caem de insolação ou com espasmos,
Que exclamações de mulheres que entram subitamente em trabalho de parto e correm para suas casas dando à luz os seus bebés,
Que discurso vivo e subterrâneo está sempre aqui a vibrar, que uivos reprimidos pelo decoro,
A prisão de criminosos, desprezados, ofertas adúlteras feitas, consentimentos, rejeições com lábios convexos,
Eu os percebo ou a sua aparição ou a sua ressonância — eu chego e me vou.


Walt Whitman
in, Song of Myself

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