quarta-feira, 3 de junho de 2015

Maturidade



Alguém me perguntou uma vez o que seria o mais importante para mim em relacionamentos com outras pessoas. 
Respondi que seria a MATURIDADE. 
A pessoa perguntou então:
“Como assim maturidade? Quer dizer então que preferes  relacionar-te com gente velha?”.

Não gostei do termo “gente velha” (não existe gente “velha”; o que existe é gente em fases diferentes da vida) e percebi mais uma vez que é esse o conceito de maturidade de muita gente, o que não está errado de todo, pois a própria palavra passa a noção de “MATURA + IDADE”, ou seja, idade madura. Mas não é só isso.
Ligar a maturidade à idade da pessoa é um conceito limitado, pois maturidade é bem mais que isso e, num sentido mais profundo, não está necessariamente vinculada à idade cronológica. 
Todos nós conhecemos crianças que nos surpreendem pelo seu nível de maturidade e também pessoas de idade mais avançada que nos assustam pelo seu nível de imaturidade.

Maturidade tem para mim uma ligação muito maior com o grau de desenvolvimento da pessoa. 
Vou até mais longe e digo: com o desenvolvimento da alma – o que explica para mim a maturidade “precoce” de alguns. 
É claro que experiência de vida faz (ou deveria fazer) amadurecer, porém, isso nem sempre é verdadeiro. Como já dito, há crianças maduras e adultos imaturos, o que mostra claramente o que digo. Vou tentar a seguir aprofundar um pouco o conceito de maturidade, apontando aquilo que a caracteriza.

Maturidade é independência

Uma pessoa madura é independente, nos seus actos, na sua forma de pensar, na sua forma de ver o mundo. Uma pessoa madura não se prende à opinião dos outros, não age para agradar (ou deixar de agradar) ninguém, e é fiel a si mesma.

Maturidade é responsabilidade

Uma pessoa madura assume a responsabilidade pela sua vida, pelo seu caminho, tem senso de responsabilidade sobre si mesma, assumindo as rédeas, o controle da sua realidade e do seu crescimento, com disciplina e nitidez. Enquanto uma pessoa imatura sempre busca a “culpa” nos outros, tentando transferir a responsabilidade por sua vida, pelas coisas que faz ou deixa de fazer, pelos problemas que surgem, o ser maduro compreende que não são os outros os responsáveis pela sua felicidade, pelo seu bem-estar, mas também pela sua infelicidade e pelo seu desconforto neste mundo.  Ela assume também a sua responsabilidade no meio onde vive, pela sua família, pelos que dependem dela, pelo seu papel moral e social.


Maturidade é respeito

Quem não respeita, não é maduro. E quem é maduro respeita. Ter maturidade é entender que todos nós somos iguais no nosso direito de existir. É ter consciência de que não há seres humanos superiores e inferiores e que qualquer um, por mais que não gostemos da pessoa, por mais que ela seja diferente de nós, por mais que não compreendamos e não concordemos com ela, merece o mesmo respeito, sempre, sem excepções. Assim, a pessoa madura respeita  qualquer um, também (e principalmente!) a si mesma. E ela respeita também a vida, com todas as suas nuançes, com tudo que dela faz parte.


Maturidade é coragem

Maturidade é coragem de ver as coisas como são, sem enfeitá-las, sem se perder em ilusões. É coragem de ser lúcido, de ser verdadeiro, de enfrentar a vida com os seus altos e baixos, sem fugir, sem enfiar a cabeça no buraco, de caminhar com os próprios pés. E ser maduro é ter a coragem de ser sincero, não se corrompendo por medo de dizer o que realmente pensa ou sente.

Todos nós temos medos, como o de fracassar, por exemplo. Mas uma pessoa madura não se deixa levar por esse medo. Ela enfrenta-o e busca realizar seus projectos. Ela não se deixa travar pelo medo de cair, pois sabe que aprende com os tombos, tendo a hipótese de reconhecer onde errou e prosseguir com optimismo e mais forte, ao contrário dos imaturos, que temem caminhar para não errar, que têm medo de sofrer, e assim não correm riscos e terminam parados no mesmo lugar.


Maturidade é tolerância

Ser maduro significa também ser tolerante com os outros, é aceitar que somos todos imperfeitos e limitados, que ninguém pode desmerecer o direito de alguém existir e ser como ele é, independente de gostar ou não de sua forma de vida.


Maturidade é complacência para consigo mesmo

Ser maduro é ser complacente consigo mesmo, aceitando as próprias limitações, com as frustrações e contrariedades inevitáveis da vida. Pessoas maduras normalmente não se aborrecem quando erram e, quando se aborrecem, nunca mais do que o tempo necessário, não se maltratam por isso, não são duras consigo mesmas. Ser maduro é dar carinho e atenção a si mesmo, aceitando os seus defeitos e limites, tentando sempre melhorar e crescer, entendendo que toda a gente tem os seus defeitos e erra. Também eu, também tu.


Maturidade é aceitação da dor

Ninguém neste mundo está livre de dor e sofrimento. Ser maduro é aceitar esse facto, ao invés de tentar evitar o que nos magoa. Aceitar as dores da vida significa ter certa resiliência, desenvolvendo uma capacidade de absorver o sofrimento, compreendendo que também ele faz parte da vida, mas sem se entregar à tristeza e ao ressentimento, sem transformar o sofrimento num monstro imbatível. É aceitar a dor sem se ver como vítima, é aceitá-la como aquilo que ela é: uma parte de nós. Maturidade não é procurar ser feliz o tempo todo, mas saber que a tristeza também é importante para o crescimento, aceitando-a com dignidade.


Maturidade é diferenciação

Ser maduro é entender que o mundo não é preto e branco, que não há sempre um “certo” e um “errado”, que há várias verdades neste mundo e que a própria verdade não é necessariamente a única que tem validade e que ela às vezes não tem validade alguma. É compreender que as coisas nem sempre são como parecem, que tudo na vida tem, no mínimo, dois lados e que ver sem diferenciar limita muito a nossa visão.


Maturidade é coerência

Uma das coisas que mais tenho visto na internet nos últimos tempos é a incoerência de posturas. Vejo muita gente a contradizer-se, com uma capacidade extrema de dizer uma coisa e negá-la na mesma frase. É gente que diz: “Não sou racista, mas acho que todo o negro é isto ou aquilo”, “Nada tenho contra os homossexuais, mas não aceito dois homens a beijar-se perto de mim”, “Não discrimino religião alguma, mas acho que todos os muçulmanos são terroristas”, e assim por diante. Quem se posiciona assim, mostra incoerência. E isso é um forte sinal de imaturidade.

Sim, maturidade requer coerência. Não adianta falar de amor ao próximo apenas na teoria e, na prática, discriminar outras pessoas, desejando-lhes o mal, propagando preconceitos e coisas negativas sobre elas.


Maturidade é capacidade de reflexão

Uma pessoa madura reflecte antes de se expressar, pois ela sabe que aquele pensamento que veio em primeiro lugar, principalmente em situações carregadas emocionalmente, pode estar totalmente errado, distorcido. Ela sabe que os seus sentimentos e mais ainda, a forma como os interpreta podem estar completamente equivocados e precisam, portanto, de reflexão, ou melhor, introspecção, antes de serem exteriorizados.

É importante o controle racional das emoções e de sentimentos negativos como desprezo, inveja, ciúme, vingança, raiva e agressividade, o que não significa reprimir e muito menos ignorar essas emoções. Significa apenas que elas devem ser reflectidas e filtradas pela razão, analisando uma situação antes de abordá-la.


Maturidade é humildade

Tu és uma pessoa especial, sem dúvida. Mas não és só tu. Todos somos especiais: tu, eu, mas também o carteiro, a mulher da padaria, o vizinho, enfim, toda a gente! Não reconhecer isto e achar-se mais especial que as outras pessoas é ser arrogante, prepotente e imaturo.

Uma pessoa madura compreende que ela é uma pequena parte de um todo, um grão de areia numa duna, uma única letra num livro, uma estrela no firmamento. Ser maduro é ser humilde, é reconhecer que a sua “especialidade” aumenta quando não é realçada, é ter consciência das próprias limitações, é viver com modéstia e simplicidade.


Maturidade é justiça

Somos imaturos quando somos injustos. Por exemplo, quando estamos frustrados e descarregamos a nossa frustração em alguém. Pessoas maduras também se aborrecem com as suas frustrações, mas não descarregam a sua raiva nos outros, sem que eles nada tenham a ver com o que ocorreu. Também somos injustos quando julgamos alguém precipitadamente, quando o atacamos sem ter esse direito, quando não reconhecemos que eles têm os mesmos direitos que nós, quando praticamos o princípio de “dois pesos e duas medidas”, quando julgamos e condenamos alguém sem provas da sua culpa, quando cobramos mais dos outros do que de nós mesmos. A pessoa madura procura agir de modo justo, atribuindo a si e aos outros direitos e deveres iguais.



Maturidade é equilíbrio e sabedoria

Uma pessoa madura tem competência para se relacionar com pessoas em qualquer ambiente e habilidade para evitar conflitos desnecessários e improdutivos. Ela busca o equilíbrio e a paz social, na sociedade, dentro da sua casa, entre os amigos e em qualquer ambiente que frequenta, agindo com sabedoria e buscando somar e não dividir, partilhando o que sabe, procurando o que é bom para todos e não só para si própria e tentando ajudar a construir um clima positivo e harmonioso, onde se constrói ao invés de destruir, sendo claro, sereno, humano, praticando o bem e desejando a evolução do todo.

A pessoa madura sabe calar-se quando é melhor não dizer nada e não se cala quando falar é necessário. Ela procura a paz de espírito, o entendimento, o equilíbrio entre as energias, entre as pessoas, entre tudo, agindo de uma forma constante e não de acordo com o seu humor. Ela sabe que diversão e distracção são necessárias, mas também trabalho e comprometimento, e que a balança só se equilibra quando os opostos se igualam.



Então, resumindo:
Amadurecer é aprender a viver de forma independente, com responsabilidade e respeito por ti mesma e pelo mundo à tua volta, com coragem de ver as coisas como são.
É prosseguir apesar das incertezas e dos medos, sendo tolerante com os outros e complacente contigo mesma, aceitando a dor sem se entregar a ela, tendo uma visão diferenciada e coerente do mundo, reflectindo com humildade, praticando a justiça e procurando sempre o equilíbrio e a sabedoria.

Talvez penses agora:
“Caramba, é muita coisa! Assim ninguém nunca vai conseguir amadurecer!”.
De facto, nenhum ser humano é perfeito.
A maturidade, em sua plenitude, é uma meta, que nos serve como guia e nos ajuda a crescer, mas sem ansiar a perfeição. 
Se fôssemos perfeitos, seríamos anjos e não gente!
É importante entender que nenhum de nós jamais conseguirá ser sempre e completamente maduro, mas que podemos fazer muito para o nosso crescimento pessoal.
E compreender isso ajuda-nos a amadurecer.



Gustl Rosenkranz

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