terça-feira, 12 de setembro de 2023

Mãe

 

Marko Milivojevic





A nossa cultura, com a sua típica falta de consciência espiritual, condicionou-nos a ver a relação Mãe / filho apenas pela perspectiva terrena de uma criança e de um adulto. 
Ou seja, estamos exageradamente habituados a ver a Mãe, única e exclusivamente, pela perspectiva do filho, da criança, da memória daquele tempo em que dependemos totalmente de alguém para cuidar de nós, na fase de maior fragilidade, vulnerabilidade e incapacidade das nossas vidas. 

Desta perspectiva, também podemos imaginar que a relação ideal ou expectável, permitiria que a criança, pela sua inocência e imaturidade, tivesse direito e garantidas as suas necessidades básicas tanto físicas na forma de boa alimentação, cuidados médicos, passeios e brincadeira, sociabilização, assim como as necessidades emocionais na forma de amor, segurança, proteção, paciência e tolerância. 

À Mãe cabe o dever e a responsabilidade de garantir que todas estas necessidades sejam asseguradas. Quando não são, quando a Mãe se revela incapaz, quando não sabe, ou não consegue ou simplesmente não está, vai criar dor, trauma e sofrimento na criança, que irá projetar sempre a sua dor nessa Mãe, aprisionando-se assim a ela pelo lugar de vítima. 

A verdade é que, por mais bonita e perfeita que a idealização seja, a realidade mostra que não há Mães perfeitas, até porque na viagem à terra não é possível experienciar a perfeição, seja de que forma for.

  • Então como lidar com as dores causadas pela Mãe?
  • Como me libertar do sofrimento que ela causou?
  • Como aceitar o mal que me fez?

Precisamos aprender a ver a Mãe por outra perspectiva! 
Se já deste uns passinhos na consciência espiritual e nas dinâmicas Karmicas e sistêmicas, já sabes que todos os eventos da nossa vida são planeados antes da encarnação e estão revelados no nosso mapa astral. 
Antes de encarnar, a Alma revê o seu passado, toma consciência dos seus padrões, potenciais e desequilíbrios, e de acordo com esse passado, prepara o plano da encarnação, escolhendo as pessoas, circunstâncias e eventos que a vêm ajudar a evoluir. 
Neste pacote estão obviamente incluídas, a Mãe e o Pai. 

Mas estás-me a dizer que fui eu que escolhi a minha Mãe? 
Como é possível ter escolhido alguém tão difícil e que me fez sofrer tanto!?
Sim, estou. 

Mas não foi propriamente a mente inferior e terrena que fez essa escolha, mas sim a mente superior ou a Alma que viu na Mãe e no Pai, as energias correspondentes, a vibração perfeita, os mestres necessários para as aprendizagens da encarnação presente. 
Pode não ser a Mãe perfeita para o ego, mas é sem dúvida, a Mãe perfeita para o projeto da Alma.

Resumindo, 
precisamos sair do lugar da criança, dependente do colo e amor da Mãe, que irá sempre ser a vítima birrenta quando a Mãe não corresponder ao ideal, para um lugar de adulto que escolheu a Mãe por razões karmicas e sistémicas complexas que para serem entendidas e aceites, implicam um enorme trabalho e investimento de consciência e responsabilidade pessoal.
 
Ou seja, 
para curarmos a relação que temos com a Mãe e o Pai, 
precisamos sair do lugar da criança para o adulto responsável, 
para o espírito consciente de que a vida é uma viagem espiritual de evolução através dos desafios, encontros e circunstâncias que irão girar à nossa volta. 

Se ainda achas que viver é ter um emprego, uma relação e uma família perfeitos, julgar os maus e juntares-te aos bons, lamento informar que estás a viver numa ilusão e a desperdiçar oportunidades valiosas de evoluir.

Costuma-se dizer que 
o sofrimento é 
a distância que criamos entre 
o ideal e o real.

Esta frase aplica-se bem neste tema pois,
tanto a imaturidade da criança, 
como a ignorância espiritual do adulto, 
como a exagerada idealização que fazemos das pessoas em geral, 
impossibilita-nos de ver a Mãe pelo olho da alma
  • pela consciência superior, pelo princípio de que “tudo tem uma razão de ser”, 
  • de descobrir que segredos da nossa história Karmica ela esconde, 
  • que padrões ela representa, 
  • que lições precisamos aprender com ela, 
  • o que em nós nos fez atraí-la e fazer dela a escolha “certa”, 
  • que papel têm as dores e o sofrimento deixado pelas ações dela, etc.

E como posso então compreender tudo isso?
  1. Investindo no conhecimento de ti mesmo, 
  2. no reconhecimento dos teus padrões positivos e negativos, 
  3. na consciência da bagagem Karmica com que nasceste, 
  4. na consciência das lições da vida presente, 
  5. do propósito desta encarnação, 
  6. na mensagem dos teus números e do teu mapa astral Karmico, principalmente da Lua que é a Mãe, 
  7. na visão humilde de que todas as pessoas na tua vida, tanto as melhores como as piores estão lá por uma razão, 
  8. na responsabilidade total e individual pela tua vida, pela tua felicidade, pelos teus desafios e caminho de evolução. 

Sem este trabalho de consciência, 
a dor perpetuar-se-á e prejudicará apenas o próprio que a sente.

Ou seja, 
como a sociedade, a família, a escola, a política, a religião e a medicina ainda não abriu espaço ou reconheceu a importância deste investimento espiritual, cabe-nos a nós investir em experiências como a terapia, os cursos, as infinitas fontes de informação, livros, workshops, viagens ou qualquer experiência que devolva mais consciência de quem somos ao invés de vivermos iludidos, hipnotizados e distraídos da mais importante viagem das nossas vidas.

Algures na nossa viagem de maturidade iremos perceber que podemos já não precisar da Mãe para viver, ou porque já partiu ou porque nos afastámos dela ou porque ela nos abandonou, mas precisamos de reconhecer e aceitar a Mãe para sermos felizes e termos paz interior. 

Qualquer terapeuta sabe que, um bom trabalho de terapia implica, 
  1. a pacificação com o passado, 
  2. a relação com os pais, 
  3. aceitação das coisas como foram, 
  4. o perdão àqueles que nos magoaram, 
  5. a consciência de que dessas dores e desafios, sobrevivemos mais fortes e maduros, 
  6. o processamento das emoções residuais desses eventos.
 
Mas a visão sistémica, ou seja a visão que inclui não só os eventos da infância mas também a influência das vidas passadas, as heranças dos ancestrais, as invisíveis mas poderosas dinâmicas Karmicas 
convida-nos a ir mais longe:
 
Bert Hellinger, o grande fundador da consciência sistémica, 
veio convidar-nos a ver o perdão como uma arrogância, veio nos ensinar que não há ninguém para perdoar pois perdoar faz crer que existe uma vítima e um culpado. 

Ora, se o acordo feito entre a alma da Mãe e a nossa foi feito no plano espiritual, foi combinado tendo em vista as aprendizagens de ambas as partes, foi escolhido respeitando as questões Karmicas dos dois, não há lugar à culpa. 
Há sim lugar ao entendimento e à responsabilidade de cada um pelo encontro e respectivas aprendizagens. 

Mais ainda, é essencial, segundo Hellinger, 
não só a aceitação do compromisso da Mãe para com a nossa história, 
como de gratidão por ter cumprido o que lhe competia no acordo: 
  1. aceitar trazer-nos à terra, 
  2. vivenciar todo o processo de gravidez, 
  3. ter colocado a sua vida em risco até ao nascimento, 
  4. aguentar a longa viagem dos 9 meses com todos os seus desconfortos e exigências emocionais, psicológicas, familiares, relacionais, físicas, financeiras e outras, apenas para nos trazer à Vida, para que cumpríssemos mais uma etapa da nossa evolução. 

No nascimento, 
a partir do primeiro suspiro, 
entra em ação o plano Karmico que ficará impresso no nosso mapa astral toda a nossa vida. 
Não só começará a verdadeira intenção e missão da nossa viagem
como a Mãe irá desempenhar o papel para que foi “contratada” revelado na nossa Lua.

Pela minha experiência ao longo dos anos, tanto a ler mapas como a fazer regressões, tenho observado a maioria ainda prisioneira das dores da infância, 
ainda a chorar a Mãe real por não ser a Mãe ideal, 
a prejudicarem-se energética, emocional e karmicamente por simples ignorância e falta de terapia.

Já sabemos então que, 
  • idealizar a Mãe causa sofrimento, 
  • perdoar a Mãe, aprisiona-nos no lugar da vítima, 
  • guardar rancor e ressentimento à Mãe, prejudica-nos emocional e energeticamente, 
  • julgar a Mãe, impede-nos de entender porque a escolhemos, 
  • apegarmo-nos à Mãe, mantém-nos no lugar da criança, 
  • chorar a Mãe que partiu ou é ausente, não nos deixa viver a nossa vida. 

Deixo então para meditarmos, algumas propostas:

1. Lembrar que a Mãe não é a Deusa do Amor Perfeito mas sim uma mulher, um ser humano, com as suas próprias dores, com a sua própria história, com os seus próprios sonhos, com os seus próprios limites.  

2. Agradecer o compromisso cumprido que teve para connosco de aceitar trazer-nos à Vida e de representar as energias inconscientes das nossas vidas passadas.

3. Reconhecer que mesmo sem amor próprio, a Mãe deu o que pode, fez o que conseguiu, foi até onde foi capaz. 

4. Se ainda acreditas que ela podia ter sido melhor, 
convido-te a aplicar essa exigência sobre  ti mesmo 
sobre os teus medos, inseguranças e libertação das tuas dores.

5. Compreender que a falta de amor que sentimos foi simples e apenas por falta de amor da Mãe por si mesma. 
Ninguém dá o que não tem certo?

6. Parar de idealizar a Mãe e perceber que ela não está lá para corresponder às nossas expectativas mas que também está numa viagem pessoal de evolução, cheia dos seus próprios desafios.

7. Lembrar que a Mãe também um dia foi criança e carrega em si as suas próprias frustrações da sua Mãe que agora também sabemos, não foi perfeita.

8. Reconhecer que a Mãe não nos deve nada pois deu-nos algo que jamais lhe poderemos devolver: a nossa Vida! 

A partir do nascimento, ela será a nossa Lua, e temos 12: 
ausente, agressiva, submissa, narcisista, materialista, sabichona, autoritária, fria, a vítima, imatura, controladora, manipuladora. 
Reconheces a tua?

9. Desenvolver compaixão e compreensão pela Mãe não só ajuda a desamarrar o laço Karmico como impede que o rancor e o ressentimento ocupem o coração.

10. Considerar que a Mãe representa uma velha vida passada nossa, é uma oportunidade de relembrarmos como um dia também já fomos, o estado emocional com que entrámos na vida presente e agradecer o salto de evolução que estamos a ter a oportunidade de fazer. Sem ela não compreenderíamos isto.

11.Pacificar a Mãe não implica encontro físico. 
Se a Mãe é desafiante, tóxica ou impossível de conviver, é bom que haja limites saudáveis. 
Mas não impede o trabalho interno de aceitação da Mãe, 
de transformarmos as emoções negativas em compaixão e tolerância,
de lhe erguemos um altar interno de gratidão por nos ter trazido à Vida. 
 
12. Gostemos ou não da Mãe, carregamos em nós a sua energia, e negar a Mãe é negarmo-nos a nós próprios, criando bloqueios a todos os níveis. 
13. Permite simplesmente que ela seja quem é, sem expectativas, sem exigências ou cobranças, considerando apenas que ela fez o melhor que pode com aquilo que tinha, condicionada por infinitas e invisíveis dinâmicas Karmicas.

14. Lembrar que a nossa felicidade, a cura das nossas feridas, o suporte emocional, e nosso amor próprio, cumprir a nossa vida é uma responsabilidade nossa. 

Culpar a Mãe é fugir à Vida. 

15.  Se já andas por volta dos 40, começa a reparar e vais perceber que tens mais da Mãe do que aquilo que gostarias de admitir!

16. Procura ver a Mulher e não apenas a Mãe. 
A Mulher, a esposa, a filha, a neta, a irmã, etc.




Nunca iremos ter ou ser a mãe perfeita. 
Mas felizmente, o instinto maternal e o poder do Amor, permitem que a maioria tenha uma mãe que irá, dentro das suas próprias limitações, fazer o melhor que pode e só isso já é de louvar.

Claro que haverá sempre histórias mais intensas, dinâmicas Karmicas mais fortes que se reflectem por exemplo na Mãe que morre no parto, na Mãe toxicodependente, na Mãe que abandona, na Mãe psicótica e outras Mães difíceis. 
Mas temos que lembrar que também elas são necessárias e  escolhidas a dedo para que esses mais exigentes projetos se cumpram. 
 
De acordo com Bert Hellinger, 
a Mãe representa a força, a coragem e o sucesso.
Por isso, rejeitar a Mãe é rejeitar essas qualidades em nós. 

Pelo contrário, pacificar a Mãe dentro de nós, aceitar ela como é, olhá-la pelo olho do adulto compassivo, é abrir as portas ao sucesso, é permitir que a energia do amor volte a fluir, é libertar as cordas Karmicas que nos prendiam a ela.

Não é raro precisarmos de crescer, de nos tornarmos também nós Mães … e Pais, de vermos os nossos filhos a repetir a mesma ilusão connosco, de esperarem a perfeição de nós, de não serem capazes de ver as nossas incapacidades e defeitos, para finalmente percebermos que não podemos continuar a esperar nada deles.

O cordão umbilical, a memória do paraíso uterino, os 9 meses de segurança e colo constantes, a sensação de proteção e amor permanentes, a ausência de dor, desconforto ou vazio, levou-nos a projetar na Mãe a expectativa irrealista e impossível de nos manter naquele estado idílico depois do nascimento e para muitos até ao longo da vida. É esta ilusão que depois gera a respectiva desilusão, sem neste caso, qualquer responsabilidade da Mãe.

A maturidade implica a libertação da Mãe, 
implica estarmos virados e ocupados com a nossa vida e deixarmos que a Mãe viva a dela, 
implica assumirmos a responsabilidade pelas nossas necessidades, alimento, segurança, amor próprio ou, caso contrário, não seremos adultos responsáveis.

“Mais ou menos perfeitas, doces ou terríveis, ausentes ou controladoras, dedicadas ou irresponsáveis, todas as Mães têm em comum algo de extraordinário; tiveram a coragem de aceitar o compromisso da gravidez e de nos apoiar durante 9 longos e exigentes meses e permitir que viéssemos à Vida. Só por isto, são todas maravilhosas e merecem a nossa Gratidão. O que veio depois da primeira inspiração, é já o nosso karma pessoal em movimento e a lenta viagem para a autonomia, para a independência e evolução pessoal.


Vera Luz




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