quarta-feira, 31 de julho de 2019

TRAZ-ME UM TEMPO





Traz-me um tempo sem mistério. 
Um tempo sem mácula e límpido, 
comigo sentado na soleira 
por entre o zunido dos insetos 
e a cantilena dos homens no lagar.

Devolve-me os gestos que julgava perdidos.
Não me fales de viagens! 
De cidades onde não vivi, 
dos corpos que consumiste 
em aventuras mais ou menos frustradas, 
quando eu nem miragem era.

Cala o que me desarma, 
o que me avoluma o tédio:
a imagem desses bares onde bebias, 
nessas noites em que tropeçavas noutros 
e eu não passava de uma impossibilidade 
a fermentar numa paisagem 
antecipadamente derrotada.

Concede-me de novo esse tempo sem mistério, 
um tempo cristalino, 
um tempo de loucura e inocência, 
um tempo de desejos transparentes, 
de corpos ardentes e simples 
como só as coisas puras conseguem ter.


VICTOR OLIVEIRA MATEUS 
in, AQUILO QUE NÃO TEM NOME




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