segunda-feira, 1 de julho de 2019

Dominar a nossa energia interior





Condori disse a Kantu:
- Quando conseguires activar a tua Energia Vital, poderás estender a ponte que liga à eternidade.
Só então começarás a saber como lidar com a Pachachaka.
Hoje, a energia vital, a sexualidade, o sexo, são entendidos como um acto puramente genital.
As pessoas julgam que o sexo está apenas ligado ao prazer ou à procriação e, pelo contrário, não percebem que se trata do fluxo de uma energia vital que atinge os recantos mais escondidos do nosso Ser. É a energia que favorece a união do mundo visível com o mundo invisível, e não contempla simplesmente o acto de reprodução como fim em si mesmo. É um acto que dá saúde, criatividade, inspiração. O sexo, enquanto energia, modela a nossa atitude social, psicológica, moral, em relação ao outro e a nós próprios, estabelece os limites da consciência e da responsabilidade.
- Mas, o que é o sexo? - perguntou Kantu.
- O sexo é o modo como a energia vital se manifesta nos seres vivos - respondeu-lhe Tata Condori- Todos os seres vivos respondem a determinadas leis que têm a sua origem precisamente no sexo. A diferença entre o homem e a mulher, entre o masculino e o feminino, parece conduzir a extremos opostos; na realidade, estes extremos encarnam as diferenças que servem apenas para nos recordar de que existe uma unidade superior que se baseia na bissexualidade e que pode tender para um dos extremos consoante a inclinação: mais para o masculino ou mais para o feminino.
No início, a manifestação desta energia é fundamentalmente feminina. Tudo o que existe a partir da criação, da reprodução, da gestação do novo ser é feminino. O homem fecunda, mas é a mulher que cria e desenvolve a vida. Por isso, a parte feminina é a coluna, a parte inicial da vida.
- Não percebo - confessou Kantu.
- É muito simples.
Nesta parte, chamada Chaka - disse, indicando a zona entre o osso sacro e o monte de Vénus - reside a energia vital, que, na mulher é uma energia criativa muito poderosa. É por essa razão que a mulher possui uma sexualidade e uma energia muito mais fortes que as do homem, mas das quais não tem consciência por ser vítima de uma série de condicionalismos e de tabus culturais que, por sua vez, mascaram os interesses económicos, políticos, sociais e religiosos. Alguns homens tentaram dominá-la, subjugá-la. O sexo feminino é temido e invejado; só os verdadeiros homens aprendem a respeitar e a valorizar esta parte íntima da mulher.
Consciente de que , mais cedo ou mais tarde, teria de aprender a activar a sua própria energia interior, Kantu perguntou:
-Sei que daqui a uns dias vamos começar com o Caminho da Pachachaca, mas por que não posso começar já?
- Antes tenho de te explicar algumas coisas sobre os orgãos genitais, porque é com eles que vamos trabalhar. Nós, curandeiros, chamamos ao orgão genital feminino Paqarina, que significa " lugar do nascimento", ou "lugar em que é conservado o destino da humanidade". Outro nome que lhe damos é Ullana, ou seja, "lugar do conhecimento", e é por isso que o consideramos sagrado. Aí, o homem pode compreender as Leis Universais, imutáveis e soberanas, que estão para lá do tempo e do espaço terrenos e que dependem da consciência divina que existe em cada um de nós.
(...)
Isto que te transmito, é um meio de transmissão secreto, cujas origens remontam a tempos imemoráveis, património dos Qhapaqkuna, uma antiquíssima irmandade espiritual andina cujos membros trabalhavam para despertar o sol Interior existente em cada um de nós, e que trabalhavam em segredo para manterem viva a luz da espiritualidade nos Andes.
Condori continuou:
- O homem quando se aproxima da mulher deve fazê-lo numa atitude quase de adoração, de contemplação, porque só através da porta feminina poderá abrir-se ao infinito. e a mulher, por seu lado, terá de estender a ponte de energia existente entre o seu sexo e o seu coração.
Pacha é o termo que o nosso povo utiliza para designar o tempo e o espaço, para além de designar também a Terra como ente espiritual. Chaka significa a ponte, algo construído entre dois pontos de apoio, e é a palavra usada para indicar o ponto de cruzamento entre a linha vertical e a linha horizontal. Por seu lado, Chacana, que é o ponto de encontro e centro da criação divina, é o osso sacro. Nesta cavidade, jaz enrolada sobre si mesma a Amaru, a serpente de energia que sobe ou desce pela coluna vertebral pondo em contacto e em função determinados centros de poder do nosso corpo.
Ou seja, nós aqui não iremos na direcção a que estás habituada, que se reduz à busca do prazer.
Nós iremos trabalhar a contemplação e a percepção desse mesmo prazer.
Sê sempre uma observadora do teu corpo e descobrirás que ele é como um instrumento musical sofisticado com o qual um músico, consoante a sua habilidade, pode executar autênticas sinfonias, acordes simples, ou apenas sons desgarrados. a verdadeira arte de activar a energia interior consiste em criar uma sinfonia capaz de te unir ao Universo: uma sinfonia de amor, de expansão para o alto.
(...)
Condori prosseguiu:
- Chegou o momento de obrigar Amaru a erguer-se.
Esta serpente desperta e move-se em sintonia com os nossos pensamentos, sentimentos e acções, levantando-se até à cabeça. Amaru está em constante movimento: levanta-se e baixa-se, sobe e desce, seguindo os impulsos que nós lhe damos. Por meio de determinadas práticas físicas, mentais e espirituais, somos capazes de elevar esta energia para o alto, mas, do mesmo modo, também somos capazes de a aprofundar até aos níveis mais baixos. Amaru é uma energia de Fogo de que nos servimos para queimar todos os defeitos físicos, mentais e espirituais do nosso corpo e para nos convertermos em seres de energia limpa e pura, a única que nos permite aproximarmo-nos do Grande Espírito. Quanto mais alto conseguires elevar esta tua energia, tanto mais a sensação que experimentares te aproximará do Divino.
Para entenderes isto, tens de viver a experiência, tens de ter consciência das sensações que experimentas quando a energia começa a mover-se dentro de ti.
Aquele que consegue utilizar esta energia segundo a própria vontade adquire a capacidade de usar todo o poder de que a natureza o dotou.
Ainda que em quantidades diferentes, todas as pessoas possuem esta energia.


Hernán Huarache Mamani
in, A Profecia da Curandeira





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