sábado, 6 de julho de 2019

À IMAGINAÇÃO





Quando da labuta diária estou cansada,
E do terreno devir de dor em dor,
E perdida me sinto, quase desesperada,
Tua voz terna chama-me ao labor:
Ah, fiel amiga! Não estou só,
Enquanto puderes falar-me nessa voz!

Nada espero do mundo exterior;
O mundo interior, prezo-o a dobrar;
O teu mundo, onde dúvida, ódio, desamor
E fria suspeição jamais hão-de medrar;
Onde tu, e eu, e a Liberdade,
Temos incontestada e suprema autoridade.

Que importa, se à nossa volta
Paira o perigo, a culpa, o breu,
Se há em nossa alma à solta
Um radioso e sereno céu,
Aquecido por dez mil raios luminosos
De sóis que não conhecem dias invernosos?

Na verdade, pode queixar-se a Razão
Da triste realidade da própria Natureza,
E dizer ao amargurado coração
Que são vãos os sonhos que ela tanto preza;
E pode a Verdade espezinhar rudemente,
Da Fantasia, as flores imanescentes:

Mas, atenta, tu refreias sempre
Meus voos delirantes e, enquanto
Derramas novas glórias sobre a nefanda nascente,
Extrais da Morte uma Vida de maior encanto.
E com voz divina me falas, ciciante,
De mundos reais, como o teu tão fascinantes.

Não me rendo à tua fátua bênção;
Porém, no silêncio do entardecer,
Con indefecível gratidão,
Eu te acolho, Benigno Poder;
Consolo, se a vida nos exaspera,
Esperança mais doce, quando a esperança desespera!


EMILY BRONTË 
(ELLIS BELL)
in, POEMAS ESCOLHIDOS DAS IRMÃS BRONTË






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