quinta-feira, 16 de junho de 2016
O Que Amamos Quando Estamos Apaixonados?
“Amor – Infecção passageira; sentido da existência; impossível neste mundo; só o de mãe; pássaro rebelde; unicamente o de Deus; carência dirigida; invenção da literatura italiana… Ele é um fogo que arde sem se ver; sua importância supera falar a língua dos homens ou dos anjos; é uma descarga de hormonas… O conceito de amor é de uma variedade assombrosa. Quase todos amam, mas ninguém chega a um veredicto objectivo sobre os limites deste latifúndio da psique humana.
A biblioteca amorosa é uma selva confusa.
O romano Ovídio, na sua Arte de Amar, insistiu em estratégias objectivas para atrair a pessoa amada, mesmo em casos extraconjugais. Séculos depois, Shakespeare imortalizou dois amantes: Romeu e Julieta. O caso mais célebre de paixão literária iniciou-se num domingo à noite e terminou, de forma trágica, na quinta-feira da mesma semana. Talvez o imaginativo Padre Vieira estivesse certo no seu pessimismo: o amor é representado por uma criança (Cupido), porque nenhum amor humano dura tanto que chegue a se tornar adulto.
No século XVIII, um abade erudito e rebelde, Antoine François Prévost d’Exiles (1697-1763) , vagou pela Europa lançando obras variadas. A vida rocambolesca do abade parece ser transcrita na obra de 1731: Histoire du Chevalier des Grieux et de Manon Lescaut. A história de Manon tem idas e vindas por portos, exílio, quebra de votos religiosos e final difícil: este foi o pequeno tijolo que Prévost assentou na parede da literatura amorosa.
O século do Iluminismo foi um século onde a sexualidade era vivida de forma menos hipócrita do que no seguinte, o vitoriano XIX. Sim: havia moralistas e censores, mas o Abade não foi um deles. A obra já citada do Cavaleiro des Grieux e de Manon Lescaut foi a que mais sobreviveu da sua prolífica pena. O tom é quase coloquial e dialoga com o leitor. A narrativa indica a memória de um eu lírico que começa o texto com uma evocação.
Uma mulher vagando na imaginação do mundo
Não é o génio literário que tornou Prévost imortal.
Provavelmente, sua personagem Manon foi maior do que o autor. Isto ocorre por vezes: filhas superam pais. Manon Lescaut serviu para uma ópera quase esquecida de Daniel François Esprit Auber (1782-1871) . Com libreto de Eugène Scribe (1791-1861 ), a obra estreou, em Paris, no ano de 1856, dentro do género tão complexo de definir que foi a ópera comique . O termo não se refere ao aspecto de comédia, mas à existência de diálogos, recitativos e de outras regras específicas.
Manon ainda foi a musa de uma ópera de Jules Massenet (1842-1912), cuja estreia foi na Opéra-Comique de Paris, em 1884. Foi um grande sucesso e integrou, quase imediatamente, o repertório internacional. Há uma beleza do épico e universal romântico em árias vivas e coloridas, com o quotidiano e a microfísica do amor.
Destaque-se a cantada por Manon no Ato 2:
“Adieu, notre petite table “. (Adeus, nossa pequena mesa) Fácil entender o sucesso da obra de Massenet. Fácil supor olhos lacrimejantes na Paris da Belle Époque diante do quadro da ruptura que acompanha o amor. Cada objecto remete a uma evocação do êxtase que ela vivenciou. A materialidade da mesa transcende e enleva, mas machuca pelo que não mais é. A beleza do amor dialoga com sua fugacidade.
No fim do século XIX, Puccini estreou outra versão sobre a obra de Prévost: surge a nossa Manon Lescaut. Mas a força inspiradora da infeliz Manon ainda estaria em ballets e outras composições.É uma força curiosa. O belo Dorian Gray lê Manon Lescaut enquanto aguarda Lord Henry, na obra de Oscar Wilde. Também na Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho, aparece um exemplar do livro logo no início da obra. Sem ser invasiva, sem se tornar uma Napoleão de saias, a frágil Manon entra em quase todos os lugares, inspira criações e ainda paira, diáfana e trágica, mito além do que sonharia seu criador. As fraquezas pessoais de Manon são evidentes, mas qual seria a força desta mulher? De onde vem a sedução de uma quase freira-cortesã-emigrante?”.
Leandro Karnal
Por falar em cortesã, lembrei-me de La Traviata, e da Violetta Valéry...
Ópera de Giuseppe Verdi.
Uma curiosidade bastante interessante que soube recentemente acerca da La Traviata, é que Verdi, inspirado no romance de Dumas, escreveu a Ópera em menos de um ano, e pela primeira vez surgia uma ópera que se referia ao momento actual em que se vivia, 1853.
A estreia foi um fiasco por isso mesmo.
A Alta Sociedade Parisiense não aceitou a data do enredo que estava no cartaz da estreia porque se achavam retratados nela, e exigiu a Verdi que alterasse a data para datas das outras óperas que existiam até então, e desta forma não estaria a retratar de uma forma real a Alta sociedade Parisiense. Verdi alterou a data e a Ópera foi um êxito daí em diante até aos dias de hoje, que é uma das óperas mais vistas em todo o mundo.
Foi baseada no romance A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho.
Dumas Filho inspirou-se nas suas próprias relações com a cortesã Marie Duplessis, e ainda no facto de ser ele próprio filho ilegítimo de Alexandre Dumas. Vítima de rejeição, encontrou ao lado da amante a estabilidade que necessitava, e que veio a ser-lhe o mote para o romance.
A obra acontece na revolução de 1848, na França.
Retrata o romance entre Margarita Gautier, a mais cobiçada cortesã parisiense, e Armando Duval, um jovem estudante de Direito.
Marie Duplessis nasceu na Normandia em 1824 com o nome de Alphonsine.
Foi vendida pelo pai, e aos 15 anos foi para Paris onde começou a trabalhar como prostituta com o nome de Marie Duplessis. Começou logo a ser cobiçada e sustentada com uma vida de luxo por homens da alta sociedade parisiense.
Ia à Ópera quase todas as noites, levava sempre camélias brancas no decote do vestido.
Apesar de ter, por volta de 7 amantes que sustentavam a sua vida de luxo, ela ansiava pelo Verdadeiro Amor. O seu sonho era amar e ser verdadeiramente amada.
Até que se apaixona por um homem de escassos recursos, que não podia sustentar os vícios luxuosos que tinha, deixa os seus amantes e Paris, e vai viver para o campo com o seu amado. A família dele não aceita a relação dele com Alphonsine, por causa do seu passado como prostituta, e o pai do seu amado exige-lhe que ela se afaste. Por essa altura ela apanha tuberculose, estava cheia de dívidas, e quando regressa a Paris sozinha, é abandonada por todos, e morre acompanhada por um antigo amante, o Conde de Saint-Ives, em 1847 com 23 anos.
Ela acaba morta numa vala comum mas, mais tarde o Conde de Saint-Ives trata de a transladar para o cemitério de Paris onde está até hoje.
4 nomes para a mesma mulher!
Alphonsine
Marie Duplessis
Margarita Gautier
Violetta Valéry
Na última cena da La Traviata, Violetta antes de morrer despede-se do seu passado e canta "Addio del passato"
Deixo-vos aqui, cantado pela Maria Callas em 1953
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