quinta-feira, 30 de junho de 2016

Há amor no meio deste caos




A diferença entre 
uma vida maravilhosa e uma vida miserável 
não está no dinheiro que ganhamos, 
na saúde que temos 
ou sequer na capacidade de atingirmos 
todos os nossos desejos.


Pessoas com pouco dinheiro, doentes e/ou relativamente humildes mostram-nos que é possível viver com o coração em paz e cheio de amor. Da mesma maneira, pessoas saudáveis, relativamente ricas e empreendedoras mostram-nos que o sucesso material não conseguiu evitar a mais negra depressão e solidão interna.

O poder não vem então de fora, pois como vimos, de muito e de pouco, conforme as áreas de vida, todos temos um pouco.

O grande anseio do ser humano é o da visão sagrada, iluminada e inteligente da vida. 
O que o ser humano mais deseja é render-se à ideia de que não há nada para controlar, que tudo é como tem de ser. Que vivemos num espaço sagrado, regido por leis universais, que conspiram invisivelmente para a nossa evolução e equilíbrio interior. Que o que chega a nós é sagrado, inteligentemente magnetizado e traz como proposta a nossa aceitação e libertação.

O estado de vida maravilhoso pelo qual ansiamos é então a rendição à vida tal como ela é. 
Não rendição como submissão ou passividade, mas como aceitação de que a única coisa a mudar está dentro de nós. Que o caos que vemos fora é afinal uma maravilhosa ordem vista apenas com os olhos da alma. A riqueza da vida não está no tesouro, mas nas lentes que reconhecem tesouros em tudo e em todos. Logo não há nada mais importante do que sermos capazes de ajustar as nossas lentes.

Olha então de novo para a mesma realidade e considera que um dia terás a capacidade de ver que por traz de tudo e de todos se escondem maravilhosos tesouros que se revelam nas nossas vidas das mais variadas maneiras tais como sabedoria, amor, consciência, liberdade, valorização pessoal, paz interior, alegria, justiça, equilíbrio e muitas outras.

- “Mas como posso eu ver o amor na violência, na fome, na injustiça do mundo?”, perguntas tu?
Aquilo que te parece injustiça, fome e violência é simplesmente a lei do karma em pleno funcionamento, trazendo as consequências de actos passados à vida de cada um. Porque age sobre o nosso espirito e não sobre a nossa personalidade, o que a nós chega é trazido de outras vidas e só com os olhos do espirito o poderemos entender.

- “Como podemos acabar com estes retornos tão dolorosos?”
Aceitando o que ainda precisa voltar. Rendermo-nos ao que um dia demos origem, acolher de mãos abertas e postura humilde o que vem em busca de entendimento e pacificação. Se continuarmos a lutar com a realidade ficamos presos a um eterno ping-pong.

- “Como posso ajudar a purificar estas energias velhas?”
Faz bom uso do teu livre arbítrio emanando apenas Amor. Reconhece que sempre tiveste o poder de escolher e que toda a escolha está sujeita às leis Universais. Logo tudo o que ainda chega a ti são energias às quais deste inicio e que agora retornam à fonte. Mas nada te impede de começar já hoje a emanar o que mais anseias um dia receber, certo?


Vera Luz


Mudança




"À força de me mudar
aprendi a não encostar
os móveis às paredes,
a não pregar muito fundo,
a aparafusar apenas o necessário.
Aprendi a respeitar os rastos
dos antigos inquilinos:
um prego, uma moldura,
uma pequena poleia,
que ficou no seu lugar
embora me estorvem.
Há manchas que herdo
sem as limpar,
entro na nova casa
procurando entender,
mais do que isso,
vendo por onde haverei de me ir embora.
Deixo que a mudança
se dissolva como uma febre,
como uma crosta que cai,
não quero fazer barulho.
Porque os antigos inquilinos
nunca morrem.
Quando vamos embora,
quando deixamos outra vez
as paredes como as encontrámos,
fica sempre um prego deles
nalgum canto
ou um estrago
que não soubemos resolver."

| Morábito |



Nestes últimos 7 anos sinto-me assim, pelas casas por onde passo...



Pergunta filosófica de um Hindu a Jung




Uma vez recebi uma pergunta filosófica de um Hindu:
“Um homem que ama Deus precisa de mais ou menos encarnações do que um homem que odeia Deus para atingir sua salvação final?”

O que você responderia? Eu desisti naturalmente.
E ele disse:

“O homem que ama Deus precisará de sete encarnações para se tornar perfeito, e o homem que odeia Deus apenas três, porque certamente ele vai pensar em Deus e se agarrar a Ele muito mais do que o que ama Deus”.

De uma certa maneira, isso é verdade; o ódio é um vínculo tremendo.
Então para nós a formulação grega phobos (fobia) é talvez mais adequada do que o ódio como princípio de separação. Tem havido, e ainda há, mais participation mystique* na Índia do que na Grécia, e o Ocidente certamente tem uma mente mais discriminatória do que o Oriente. Portanto, como a nossa civilização depende amplamente do génio grego, connosco seria mais o medo do que o ódio.


— Carl G. Jung
in, “The Psychology of Kundalini Yoga”



*Participation mystique: conceito criado pelo antropólogo francês Lucien Lévy-Bruhl (1857–1939) que denota uma identificação profunda inconsciente de um indivíduo com outro indivíduo ou com um objecto, que acontece como uma projecção psicológica.


quarta-feira, 29 de junho de 2016

O EGO COLECTIVO




Até que ponto é difícil viver consigo mesmo? 
Uma das maneiras pelas quais o ego tenta escapar da insatisfação que tem em relação a si próprio é ampliando e fortalecendo a sua percepção do eu. Ele faz isso identificando-se com um grupo, que pode ser um país, um partido político, uma empresa, uma instituição, uma seita, um clube, uma turma, uma equipa de futebol, etc.

Em alguns casos, o ego pessoal parece se dissolver completamente quando alguém dedica a vida a trabalhar com abnegação pelo bem maior de uma colectividade sem exigir recompensa, reconhecimento nem enaltecimento. Que alívio ser libertado da carga incómoda do eu pessoal. Os membros do grupo sentem-se felizes e satisfeitos, não importa quanto precisem trabalhar, quantos sacrifícios tenham que fazer. Eles parecem ter superado o ego.

A questão é:
Será que se libertaram de verdade,
ou o ego apenas se mudou do plano pessoal para o colectivo?

Um ego colectivo manifesta as mesmas características do ego pessoal, como a necessidade de confrontos e inimigos, de ter ou fazer mais, de estar certo e mostrar que os outros estão errados, etc.
Cedo ou tarde, essa colectividade entrará em conflito com outras colectividades porque busca inconscientemente o desentendimento e precisa de oposição para definir seus limites e, assim, a própria identidade. Depois, seus integrantes experimentam o sofrimento, que é uma consequência inevitável de toda a acção motivada pelo ego. Nessa altura, eles podem despertar e compreender que o seu grupo tem um forte componente de insanidade.

Pode ser doloroso acordar de repente e perceber que a colectividade com a qual nos identificamos e para a qual trabalhamos é, na verdade, insana. Nesse momento, há pessoas que se tornam cínicas ou amargas e, daí por diante, passam a negar todos os valores, tudo o que vale a pena. Isso significa que elas adoptam rapidamente outro sistema de crenças quando o anterior é reconhecido como ilusório e, portanto, entra em colapso. Elas não encaram a morte do seu ego; em vez disso, fogem e reencarnam em outro.

Um ego colectivo costuma ser mais inconsciente do que os indivíduos que o constituem.
Por exemplo, as multidões (que são entidades egóicas colectivas temporárias) são capazes de cometer atrocidades que a pessoa sozinha não seria capaz de praticar. Uma vez por outra, os países adoptam um comportamento que seria imediatamente reconhecido como psicopático numa pessoa.

À medida que a nova consciência for surgindo, algumas pessoas se sentirão motivadas a formar grupos que a reflictam. E eles não serão egos colectivos. Seus membros não terão necessidade de estabelecer sua identidade por meio deles, pois já não estarão a procurar nenhuma forma para definir quem são.

Ainda que essas pessoas não estejam totalmente livres do ego, elas terão consciência bastante para reconhecê-lo em si mesmas ou nos outros  logo que ele se manifeste. No entanto, será preciso estar sempre alerta, uma vez que o ego tentará assumir o controle e se reafirmar de qualquer maneira. Dissolver o ego humano trazendo-o à luz da consciência – esse será um dos principais propósitos desses grupos formados por pessoas esclarecidas, sejam eles empresas, instituições de caridade, escolas ou comunidades. Essas colectividades vão cumprir uma função importante no surgimento da nova consciência. Enquanto os grupos egóicos pressionam no sentido da inconsciência e do sofrimento, os grupos esclarecidos podem ser um vórtice para a consciência que irá acelerar a mudança planetária.


Eckhart Tolle
in, O Despertar de uma Nova Consciência
Cap. Ego Colectivo




“Medo, cobiça e desejo de poder são as forças motivadoras psicológicas que estão por trás não só dos conflitos armados e da violência envolvendo países, tribos, religiões e ideologias, mas também do desentendimento incessante nos relacionamentos pessoais. Elas produzem uma distorção na percepção que temos dos outros e de nós mesmos. Por meio delas, interpretamos erroneamente todas as situações, o que nos leva a adoptar uma acção equivocada para nos livrarmos do medo e satisfazermos a nossa necessidade interior de alcançar mais, um poço sem fundo que nunca pode ser preenchido”.

— Eckhart Tolle
in, “O Despertar de Uma Nova Consciência” 

(pág. 15)

O Mito da Mente Vazia




O pensamento é natural. Não existe mente sem pensamento. 
Aliás, o corpo da mente é o próprio pensamento, ou melhor, a sequência de pensamentos ou associações livres que surgem, aparentemente, de maneira aleatória. Não há nada de errado em relação a isso. Supor que a mente deva ser deixada em branco equivale a supor que o psiquismo humano já veio com um defeito de fabricação, que precisa ser consertado.

Há professores de Yoga que insistem em afirmar que é possível manter a mente vazia e que o estado de iluminação só acontece quando a mente é deixada em branco por um longo período. Ora, isso, não coincide com a experiência real da imensa maioria dos praticantes de meditação, seja dentro do Yoga, seja noutros sistemas igualmente eficientes, como o budismo tibetano, ou o zen budismo.

Um amigo disse numa ocasião que a experiência de tentar parar o pensamento foi como fazer a tentativa de fechar um gato selvagem num saco.

Ainda, na hipótese de que fosse possível deixar a mente em branco, temos outros problemas:
essa proeza, por si só, seria capaz de trazer conhecimento, felicidade ou liberdade?

Não creio. O que acontece depois de um período sem pensamentos, é que a mente volta a pensar e, junto com ela, as preocupações retornam com a mesma força dantes. Portanto, nada é resolvido.

Os pensamentos não podem ser equiparados ao Ser, e que o Ser não pode, por sua vez, ser reduzido a um pensamento. Quem seria o sujeito que observa o Eu como um mero objecto, nesse caso? O Eu é o sujeito; ele nunca pode ser objecto da percepção, pois ele é, por definição, a testemunha que olha.

Quando eu não sei quem sou, o eventual silêncio da mente não poderá resolver por si só a questão da minha auto-ignorância. Durante o sono profundo, eu não tenho nenhuma actividade mental. No entanto, isso apenas dá um respiro para a minha mente, mas não me traz iluminação.



Pensar é sofrer?

Outra questão essencial nesta discussão: os pensamentos, por si sós, não produzem sofrimento.
A pessoa que acha que deve parar de pensar para parar de sofrer, acredita que pensar é sofrer.
No entanto, a origem real do sofrimento é a crença de que somos o pensamento, ou de que ser é pensar.

O sofrimento é causado pela confusão que se estabelece quando, ao pensar, acredito que o conteúdo dos meus pensamentos seja o Ser.
A verdade é que os pensamentos acontecem porque o Ser é.
Os pensamentos não existem separados do Ser.
Assim como o íman é a causa do campo magnético, da mesma maneira o Ser é a causa do pensamento.

O campo magnético existe por que o íman existe.
A existência do íman não depende do campo magnético, mas a existência do campo magnético depende da presença do íman.
O pensamento existe por que o Ser existe. 
Tirando-se o Ser, não pode haver pensamento.

Porém, até mesmo na hipótese de que o sofrimento fosse causado pelo pensar, a solução não estaria em parar de pensar. Parar de pensar indefinidamente, no melhor dos casos, irá me tornar uma espécie de vegetal, incapaz de me comunicar, sentir emoções ou crescer interiormente.

Poderia eu dizer, nesse caso, que estou tendo uma vida plena?
Pensamentos equivocados, como achar que somos insignificantes ou indignos de felicidade não se resolvem parando de pensar, mas corrigindo esses pensamentos e substituindo-os por outros que sejam correctos. Será mesmo que eu sou indigno de ter felicidade?
 
Esse tipo de questionamento, com a sua resposta adequada, é o de facto que resolve o sofrimento.

Na prática, o ideal é chegar a bons termos com a nossa própria mente. 
Isso significa fazer, eventualmente, um acordo de paz com ela.
Trocando em miúdos, quando sentamos para meditar, damos à nossa mente a liberdade para que ela seja como é, mas nos damos o direito de nos concentrar no tema que escolhemos para aquela meditação.

Eventualmente, a agitação natural do primeiro momento dará lugar a um estado de maior tranquilidade e estabilidade, no qual nos tornamos capazes de olhar para a mente desde a perspectiva da testemunha, que é o próprio Eu.

É questão de perseverar sem forçar, de maneira compassiva e ao mesmo tempo firme.
Portanto, a solução para esta charada não está em tentar manter a mente vazia, mas em perceber o Eu invariável que somos, presente em todos os momentos, antes, durante e depois de cada pensamento. Quando compreendemos que os pensamentos não escondem o Eu, mas que ele permeia todos os conteúdos, o conflito nascido da ideia de deixar a mente em branco, simplesmente desaparece.


Pedro Kupfer

terça-feira, 28 de junho de 2016

Democracias assistem à instalação da "cultura do medo"

Democracias assistem à instalação da "cultura do medo"



As actuais lideranças políticas mundiais têm responsabilidades directas na cultura de medo que se está a instalar. O embaixador da paz do Parlamento Europeu fala sobre as divisões europeias, que podem acentuar-se com o referendo no Reino Unido.

Destaques de uma entrevista exclusiva de Prem Rawat ao programa "Olhar o Mundo", da RTP, em vésperas de o embaixador da paz do Parlamento Europeu visitar Portugal, numa digressão que passa por mais de 30 países.





Mooji - A Necessidade de Um Parceiro

“Nós não nos completamos, 
isso é um erro. 
Nós nos complementamos”



                                                   


"A necessidade de um parceiro" é o tema desta resposta do mestre Mooji, 
dada a um homem que diz estar a sofrer por uma crença persistente 
de que, segundo ele, para
 “estar completamente seguro e preenchido, 
existe a necessidade de encontrar um amor, 
uma mulher, uma parceira“. 

Dada a quantidade de relacionamentos românticos, casamentos, divórcios e também a uma certa complexidade de tratar o tema no âmbito espiritual (celibato, casamento, união, tantra, liberdade, etc), a resposta de Mooji pode ser uma ajuda inestimável para tentarmos esclarecer essa crença e esse comportamento humano. O vídeo com a pergunta e resposta de Mooji está traduzido e legendado em cima.

Ele relaciona o Divino com a Verdade.
E apesar da maioria de nós já saber disso, quando Mooji fala da “Verdade“, como objectivo humano, não está a falar de religião, dogma ou abordagem filosófica, e sim da descoberta íntima e pessoal de si mesmo nesta existência — a verdade que é o contrário da ignorância. 
Assim, os relacionamentos poderiam estar em busca de algo maior do que preenchimento mútuo (que é “um erro”, segundo ele), e sim desta busca da verdade.


Um trecho do vídeo:

“É verdade, talvez seja o vasana* da humanidade. A necessidade de estar com alguém. Costuma-se dizer que o homem foi feito para a mulher, e a mulher foi feita para o homem. Eu digo: não, a mulher foi feita para Deus, e o homem foi feito para Deus. Não se completam um ao outro, isso é um erro. Não nos completamos um ao outro. Nós nos complementamos, mas não completamos. Você vê? Seu relacionamento de amor complementa. Não preenche, não é para isso que estamos aqui. Podes pensar assim, e podes viver toda a tua vida nisso. Mas, assim que descobres a verdade, então sinto que podes ser um parceiro muito bom. Porque a tua parceira será tua guru, e tu serás o guru dela. Porque estão os dois focados dentro, no mesmo, no amor pela verdade. Não afastados. De outra forma, parece que muitos relacionamentos são um obstáculo, por estarem tão enredados na realidade. A maioria dos relacionamentos promovem a dualidade. Poucos intensificam a procura pela verdade, de alguma forma. Pode ser um amigo, um relacionamento, sua conexão, sua relação como amigo, como parceiro, potencializa a sua busca pela verdade. Embeleza-a! Mas não é muito comum. Mas, ao mesmo tempo, todos os relacionamentos podem fazer uso disso para encontrar a verdade também. Porque um relacionamento romântico é aquele que pode te levar a situações que outro tipo de relacionamento não consegue. Compreendes? Coloca-te em situações que nenhum outro relacionamento consegue. E te permite dizer: ‘a-ha! Até aqui consigo ver’. (…) Portanto, todos os relacionamentos podem ser úteis. Tudo pode ser útil. Na verdade, à medida que vais mais fundo na verdade, verás que tudo te reflecte.”
— Mooji, em “The Need For A Partner” (2013)


*Vasana é uma palavra sânscrita usada para se referir à tendência psíquica de comportamento ou traços kármicos. Há várias traduções, como “tendência latente”, “impulso”, “tendências subconscientes do carácter”, ou, como Swami Sivananda define, “uma forma subtil de desejo”.


Sobre o Amor Próprio




Muito se fala em amor próprio, e questiono …
É tão abstracto esse conceito, será que as pessoas sabem que regressar ao amor é um processo interno que se vai fazendo com o relacionamento consigo próprio…?
Como se sente consigo próprio?
Ama-se ?... honra-se?... respeita-se?...
Se não encontrar essas respostas em si, no seu coração , é onde está a base de todas as feridas…

O Amor começa connosco próprios…
Quando não nos amamos, não nos respeitamos, não nos honramos por quem somos, os outros devolvem-nos falta de amor, desrespeito por nós e não honram quem nós somos…

Esse percurso requer integridade e entrega, reconhecer a qualidade do momento, das experiências quotidianas e se estamos a agir com esse respeito por nós, a ser autênticos e a honrar a qualidade do nosso ser…
Integridade é a totalidade do ser… quem realmente somos e não aquilo que acreditamos ou fingimos ser…

Quando somos fieis à nossa integridade, nunca nos prejudicamos e fazemo-lo conscientemente, somos honestos connosco próprios e sentimos o que não tem qualidade para nós…
Se tivermos amor próprio estabeleceremos relações com base no respeito e amor e não no medo e desrespeito…
As relações precisam se basear no respeito …
Respeitar as opções dos outros, não tentar controlar as decisões dos outros…
Ama-se, respeita-se e por isso ama e respeita os outros… 
Aceita-se a si própria e como tal aceita o outro como ele é…
Relações saudáveis têm esta base…

Não quer dizer que temos que concordar com tudo, mas respeito o ser que é, as suas convicções, as suas escolhas, comunicamos melhor, criamos uma inter relação de respeito mútuo, sem exigências, mas sim respeito e liberdade, assim se constrói o amor próprio e o amor pelo outro, numa estrutura equilibrada e livre…

Amor próprio não é egoísmo como tantas pessoas pensam.
Dizer a uma pessoa que para eu me amar tem que aturar todos os meus problemas emocionais, isso sim é egoísmo…

Amor próprio é uma estrutura interna que se vai  construindo com base na responsabilidade individual, requer não ter medo de lidar com os seus processos internos, não ter medo de senti-los, são parte de si e a si cabe os ir reconhecendo, respeitando, responsabilizando, aceitando que as mudanças são suas, ao reconhecer, sentir, responsabilizar, por este processo interno, começamos a amarmo-nos e não a viver de mentiras, não precisamos que os outros nos digam que somos bons, que somos fantásticos, pois nós próprios o reconhecemos e criamos uma relação autentica e saudável, em amor próprio…

Se temos amor próprio não temos medo de partilhar o nosso amor, pois o nosso coração está totalmente aberto…
Para isso estamos a aprender a comunicar, partilhar, sermos autênticos e isso não é ter que aceitar tudo, mas respeitar tudo na sua integridade, partilhando-nos em liberdade, sem medo de não ser aceite…
Isso deixa de existir, essa dependência de validação do outro deixa de estar presente nas nossas relações…
Assim se constroem relações saudáveis e onde o amor vai crescendo…


Ruth Fairfield


The Mongolian Rute

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Palavras que ferem de morte



As palavras podem, realmente, ferir e causar graves danos emocionais.
E, a dor causada por elas, muitas vezes persiste por muito mais tempo do que a cicatrização de qualquer corte ou ferida física. Algumas palavras podem causar dor que pode demorar a sarar ou criar uma cicatriz "invisível" que se transporta para o resto da vida. A memória de palavras dolorosas pode levar a uma vida de ansiedade, raiva, ressentimento e medo, entre outras repercussões. Podemos magoar e causar danos uns aos outros, a um nível profundo.
Você consegue aperceber-se de quantas vezes diz algo que pode ferir profundamente alguém?

Estamos todos inevitavelmente propensos a ferir alguém com as nossas palavras, mesmo quando é intencional mas, uma escolha que todos podemos fazer é estar conscientes do que estamos a dizer, de como o dizemos e do impacto que as nossas palavras têm sobre os outros.
Afinal, palavras começam e terminam guerras...

Pergunte a si próprio se as suas palavras são necessárias para alguém ouvir ou se está simplesmente a suprimir as suas próprias emoções e à procura de uma saída para elas? 
Se está a tentar curar a sua dor emocional ou à procura de alguém em quem a descarregar?


Como Blaise Pascal escreveu: 
"As palavras amáveis não custam muito. 
Elas nunca magoaram a língua ou os lábios." 



~ Deborah King


Persistência...ou Teimosia




Metemos ombros à porta…empurramos com toda a força, esgotamo-nos, suamos…e ela não se move.
Esgotados, deixamo-nos cair em desânimo…mas nunca nos lembrámos de verificar para que lado abria a porta!

A persistência é uma coisa…a teimosia é outra!
Somos persistentes quando vamos batendo com os nós dos dedos em vários pontos da porta, para lhe escutar o oco.
Somos teimosos quando, depois de ter obtido um som abafado de resistência, continuamos a bater no mesmo ponto.

Vamos ajustando a nossa força à resistência que se nos opõe. 
Não temos de ter uma guerra de titãs com a porta, porque perderemos imensa energia e não adiantaremos nada. Escutar, observar e actuar com determinação.

Quando menos esperarmos, a porta abre-se e, se o nosso esforço não tiver sido alicerçado na confiança…a queda é inevitável. E quem, pelo seu empenho e persistência abrir uma porta, abrirá qualquer uma.

Nem tudo tem de ser uma grande guerra, nem tudo tem de ser um grande drama…haja espírito, boa atitude e senso de humor.

Possa uma espera tornar-se curta, pela certeza de o resultado ser certo.


Alexandre Viegas


Os Outros em Nós





O outro faz o que ele pode.
O outro dá o que ele tem.
O outro é o que ele é.
Você é outra coisa.
Você que tem que se cuidar.
Você não tem nada a ver com o outro.
O outro faz o que tiver de fazer.
E você se mantém na sua linha.
(...)
A atitude dos outros, para nós, se observarmos bem,
é uma fonte de aprendizagem.
A atitude dos outros para conosco
pode nos levar a uma transformação,
pode nos levar a sentir as coisas de outro jeito,
pode nos mostrar certas coisas nossas,
mostram as nossas reações.
A atitude dos outros é sempre uma escola para nós,
sejam quais forem essas atitudes.
Então isso da gente estar esperando do outro
uma certa atitude, isto é uma fantasia humana.
O outro toma a atitude que tomar, aquilo chega a você
e é aquilo que tinha que chegar com todas
as possibilidades para você se transformar.
Agora, se você não gostou daquela atitude,
se você queria outra coisa no lugar daquilo,
Então aí,... você vai ficar muito cansado antes do tempo.
Vai ficar muito esgotado.
Porque o que chega do outro - ou do que quer que seja,
é sempre para nos ensinar. Então o que chegou é aquilo,
não podia ser outra coisa.
Aquilo está nos ensinando alguma coisa.
Aquilo está nos trazendo alguma coisa.
Aquilo não tem que ser mudado para nós ficarmos
mais ou menos satisfeitos.
Aquilo como chegou é assim que a gente tinha que receber.
E aí fique bem atento a isto para ver o quê
que isto está produzindo em você,
o quê que está te trazendo,
que mudanças aquilo está pedindo e...
em geral aquilo está pedindo uma maior visão.
Uma maior compreensão da sua parte,
maior amor da sua parte.
Porque o que chegou do outro
é o que o outro tinha que dar naquele momento,
e muitas vezes o outro poderia dar até outras coisas,
mas o que você precisava foi aquilo, escolhido a dedo.
Então ali tem que realmente ser grato
para aprender a ver esta coisa,
para aprender a abrir esta compreensão.


Trigueirinho


domingo, 26 de junho de 2016

Blues da morte de amor




já ninguém morre de amor, eu uma vez
andei lá perto, estive mesmo quase,
era um tempo de humores bem sacudidos,
depressões sincopadas, bem graves, minha querida.
mas afinal não morri, como se vê, ah, não,
passava o tempo a ouvir deus e música de jazz,
emagreci bastante, mas safei-me à justa, oh yes,
ah, sim, pela noite dentro, minha querida.

a gente sopra e não atina, há um aperto
no coração, uma tensão no clarinete e
tão desgraçado o que senti, mas realmente,
mas realmente eu nunca tive jeito, ah, não,
eu nunca tive queda para kamikaze,
é tudo uma questão de swing, de swing, minha querida,
saber sair a tempo, saber sair, é claro, mas saber,
e eu não me arrependi, minha querida, ah, não, ah, sim.

há ritmos na rua que vêm de casa em casa,
ao acender das luzes, uma aqui, outra ali.
mas pode ser que o vendaval um qualquer dia venha
no lusco-fusco da canção parar à minha casa,
o que eu nunca pedi, ah, não, mandar calar a gente,
minha querida, toda a gente do bairro,
e então murmurarei, a ver fugir a escala
do clarinete: - morrer ou não morrer, darling, ah, sim.


Vasco Graça Moura 
in, Antologia dos Sessenta Anos


Nada hay absoluto



The Broken Column
Frida Kahlo


Nada hay absoluto. 
Todo se cambia, 
todo se mueve, 
todo revoluciona, 
todo vuela y se va. 

| Frida Kahlo |



…No quiero que nada lo hiera, que nada lo moleste y le quite energía que él necesita para vivir, vivir como a él le dé la gana, Pintar, ver amar, comer, dormir, sentirse solo, sentirse acompañado; pero nunca quisiera que estuviera triste.
Si yo tuviera salud quisiera darsela toda, si yo tuviera juventud toda la podría tomar.
No soy solamente la madre, soy el embrión, el germen, la primera célula que- en potencia- lo engendró. Soy él desde las más primitivas y más antiguas células, que con el tiempo se volvieron él.

Cada momento él es mi niño, mi niño nacido, cada ratito, diario, de mí misma.

Afortunadamente las palabras se fueron haciendo.
¿ Quién les dio verdad absoluta?
Nada hay absoluto, Todo se cambia, todo se mueve, todo revoluciona, todo vuela y se va…

Frida Kahlo



Porque estamos aqui como Terráqueos?




A história de cada um de nós é única, 
inimitável ou sequer comparável 
pois é composta de infinitas 
experiências e interacções 
com o mundo e os outros.


Entre os eventos que inconscientemente atraímos e a liberdade que temos de responder a esses eventos, podemos mesmo dizer que cada momento tem toda uma magia e poder de criação, libertação e evolução, único e irrepetível.

Vista de longe, a nossa história é um maravilhoso enredo, uma imensa novela com todos os ingredientes que nos prendem a uma boa história de televisão ou cinema onde depois de todas as tramas, dores e dramas esperamos que se desenrolem num final feliz. Tal como o ansiamos nas nossas vidas...
No entanto, mesmo sabendo que cada percurso é único, há em todas as histórias denominadores comuns. Aliás é pondo o foco no que nos une que irá ajudar o mundo a resgatar a humanidade, compaixão, tolerância para com o próximo pois foi a focar no que nos divide que temos o mundo no estado em que está.

Foquemo-nos então no que nos une:

Somos TODOS humanos, biologicamente iguais.
TODOS andamos a evitar as mesmas dores e
TODOS ansiamos pela mesma sensação de felicidade.
TODOS estamos sujeitos à dinâmica interna Ego / Alma que nos faz oscilar entre o medo e o Amor.
TODOS temos a permanente questão se estamos a honrar a agenda social ou a agenda espiritual, a agenda exterior ou a agenda interior e
TODOS nos questionamos constantemente se estamos a fazer a coisa certa ou não.
TODOS temos os mesmos planetas no mapa a mostrar dramas e potenciais.
TODOS temos um lado masculino e um lado feminino, ou seja,
TODOS somos capazes de amar e capazes de magoar.
TODOS precisamos de dormir, comer e responder às mesmas necessidades fisiológicas.
TODOS ansiamos sempre por algo mais, seja lá o que esse algo for.
TODOS temos dúvidas, medos e inseguranças e também
TODOS temos doses inimagináveis de coragem, força e resiliência.
TODOS precisamos de liberdade para sermos quem somos,
TODOS sentimos esperança em ter uma vida melhor,
TODOS ansiamos por sentir amor. Mesmo atrás da máscara mais dura,
TODOS sofremos com a rejeição, a solidão e o abandono, respondendo também
TODOS negativamente, violentamente e reactivamente a essas mesmas dores.
TODOS somos capazes de coisas maravilhosas como amar incondicionalmente, encantar artisticamente, ser optimista, positivo e contente. Independentemente dos nossos credos, raças, postos, títulos ou cursos,
TODOS estamos a viajar no mesmo planeta e da mesma maneira que aqui
TODOS chegámos vulneráveis, da mesma maneira daqui sairemos
TODOS um dia apenas com a roupa que temos no corpo. Já do outro lado,
TODOS iremos olhar para trás com os mesmos óculos do amor detectando como
TODOS fomos extraordinariamente amorosos nuns momentos e em algumas situações e
TODOS ficámos aquém do amor, da tolerância e da compaixão noutras situações. Provavelmente
TODOS iremos querer voltar para nos voltarmos a encontrar pois só aqui na Terra nos poderemos desembaraçar dos nós karmicos de que
TODOS fazemos parte. Só depois deste trabalho pessoal feito em cada um de nós e a
TODOS a quem estamos ligados teremos a bênção de aceder a um patamar superior, onde
TODOS iremos finalmente aceder a vibrações mais leves e a frequências mais elevadas onde aí e já sem peso ou dúvidas iremos finalmente sentir e experienciar o verdadeiro AMOR e como dessa perspectiva,
TODOS somos Um.


Vera Luz


sábado, 25 de junho de 2016

Nem Santa nem Puta...Só Mulheres


México, 8 de Março, 1991
(Esta frase surgiu no final da Década de 80, 
e foi imortalizada com esta foto 
já na Terceira "onda" do Feminismo no início dos anos 90)



O manifesto das auto-intituladas 
“Mães de Bragança” 
fez José Machado Pais mergulhar num estudo 
que lhe levou uma dúzia de anos a concluir. 
O enfoque não tem de estar 
nas “mães” ou nas “putas”, 
pode estar nos maridos-clientes, 
prisioneiros na relação de submissão 
a que sujeitam as suas mulheres.


Lembra-se do movimento das “Mães de Bragança”? 
Absolviam os maridos. Perdoavam-lhes os desvarios, porque eles, “coitados”, eram “amarrados” pelas “sedutoras”, “macumbeiras”, “pecadoras” vindas de além-mar. As “brasileiras” valiam-se de “falinhas mansas”, “drogas”, “feitiços”, “rezas”, “mezinhas”, “bruxarias”, “pétalas de rosa”, “raízes de amor-perfeito” para os deixar “de cabeça perdida”.

Muito se escreveu sobre o assunto nos jornais e na Net. 
E aí a culpa era quase sempre das mulheres que eles tinham em casa. 
Era como se elas os empurrassem.

“A maior parte das críticas partia das hostes masculinas”, afiança o sociólogo José Machado Pais. “Reivindicavam uma ‘entrega sexual mais activa’ por parte das mulheres, o ‘fim dos tabus sexuais’ e o abandono da ‘moral caduca’.”

Os homens nem precisavam de se redimir. As “danadas”, nota José Machado Pais, eram sempre as mulheres: ou se excediam na sedução e no fervor sexual ou, pelo contrário, ficavam muito aquém do desejado.

Até os homens se viam como vítimas. Eram uns machos.
E “como entre os desejos sexuais e a sua satisfação se interpunham as persistentes dores de cabeça das mulheres, coitados, viam-se obrigados a satisfazer os défices sexuais noutro lado”. Estavam “carentes, confusos, necessitados”.

“Estas narrativas, dominantes no universo masculino, surgem em muitos CD de música popular”, explica o investigador. “Na feira de Bragança, mesmo ao lado do mercado, ouvi muitas dessas músicas, alusivas a carências sexuais. Por exemplo: ‘Ó Maria dá-me o bife/ Dá-me o bifinho agora/ Se me não deres o bife/ Maria vou jantar fora’.”

José Machado Pais chamou-lhe Enredos sexuais, tradição e mudança: as mães, os zecas e as sedutoras de além-mar.
Não é um livro sobre trabalho sexual, imigração clandestina ou tráfico de pessoas, este que acaba de ser editado pela Imprensa de Ciências Sociais. É “um debate sobre os valores e as representações sociais que encapotam a sexualidade”. É que “a prostituição diz muito sobre a sociedade”.

O movimento “Mães de Bragança” começou quando duas mulheres descobriram que os maridos “padeciam de semelhante maleita”: chegavam a casa tarde, com desculpas duvidosas e restos de perfume. “A solidariedade feminina permitiu um trabalho de espionagem em rede”, diz o sociólogo José Machado Pais




Sexualidade reprimida

Em Outubro de 2003, quando Bragança fez capa da revista Time, o investigador coordenador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa sentiu uma “enorme tentação” de viajar até lá. Os amigos avisaram-no: “Não te metas nesses terrenos”; “arriscas-te a ser perseguido por mães, maridos, proprietários de casas de alterne, putas, polícias, bispos e até pela tua mulher.” Nada o impediu de fazer várias viagens de 400 quilómetros para, ao longo de 12 anos, observar, conversar com trabalhadoras do sexo, clientes, mulheres de clientes, donos de bares de alterne e de cafés, barbeiros, cabeleireiras, agentes imobiliários, e vasculhar arquivos de jornais. 

Queria “desvendar os mecanismos sociais de produção de estereótipos associados quer às trabalhadoras do sexo (tratadas por putas, brasileiras ou macumbeiras), quer às mães (apelidadas de beatas ou papa-hóstias)”.

Havia muita sexualidade reprimida por esse país fora.
Não convém esquecer que, “entre 1926 e 1974, Portugal viveu numa ditadura conservadora que impunha uma forte moral de contenção sobre a sexualidade”. As mentalidades iam-se abrindo à força do desenvolvimento — indissociável da emigração e da adesão à União Europeia — e Bragança era um exemplo disso mesmo. Em 30 anos, o número de habitantes dedicados ao sector primário passara de 70% para 10%. A área urbana triplicara. O sector do comércio e serviços expandira-se. Na cidade reproduziam-se bares de alterne e cafés “de subir”, isto é, com quartos no piso superior que podiam ser arrendados à hora.

Não era só o aumento do poder de compra. “A euforia masculina em torno dos bares de alterne foi também nutrida por uma espécie de mobilização sexual não de todo alheia à crescente influência dos media”, escreve José Machado Pais.

O cinema e a televisão “concorriam com os sermões da paróquia no que às moralidades quotidianas dizia respeito”. 

Perante o afrouxar da ordem moralista ou repressiva, muitos homens deixavam-se levar pelos impulsos sexuais. Iam às casas de alterne para “beber um copo”, “lavar a vista”, “desenferrujar os zecas”.

O movimento “Mães de Bragança” começou quando duas mulheres descobriram que os maridos “padeciam de semelhante maleita”: chegavam a casa tarde, com desculpas duvidosas e restos de perfume. “A solidariedade feminina permitiu um trabalho de espionagem em rede.” Revoltadas, redigiram um manifesto e entregaram-no ao presidente da câmara, ao governador civil, ao comandante da polícia. Com isso, despertaram a atenção de meios de comunicação social dentro e fora do país. Bragança entrou na rota do turismo sexual. “Curiosos vindos de Espanha, mas também de outros países europeus, passaram a frequentar a pequena cidade e a desfrutar dos prazeres do alterne”, recorda o investigador. Apesar da fama, “nada se passava de diferente de outras regiões do país”.



As “meninas” do Brasil

Haveria 80 a 100 trabalhadoras do sexo, a maior parte oriundas do Brasil.

Os clientes e os empresários da noite, mas também os comerciantes e os taxistas que com elas ganhavam dinheiro, chamavam-lhes “meninas”.
As mulheres dos clientes, auto-intitulando-se “mães”, chamavam-lhes “putas”.
Recatadas, fieis, trabalhadoras, sentiam-se “ultrajadas no seu estatuto de mães”, “desvalorizadas, traídas, trocadas”. Tinham medo de “perder os maridos, a estabilidade económica, a reputação”. E queriam recuperar o seu “estatuto fragilizado” e intimidar as trabalhadoras do sexo, expulsá-las.

As “Mães de Bragança”, na opinião de José Machado Pais, constituíram um movimento social. Havia nelas uma revolta que era um “reflexo de uma conquista de liberdade”, ainda que uma “liberdade não liberta das pendências do passado, como as idas à bruxa para quebrarem o feitiço do chá”.

“O meu marido estava cheio de porcarias dentro dele”, afiançou uma delas a José Machado Pais. “Pretos e brasileiros em bruxarias são terríveis”, disse-lhe ainda.
“Elas também usam um chá de amarração.”
Como livrou o marido disso tudo?, perguntou ele. “Através da oração”, respondeu ela.

Quando um homem casado vai ao bar de alterne é sinal de quebra de estabilidade conjugal, diz o investigador. “Ou a crise desemboca em divórcio ou se busca o restabelecimento da ordem danificada.” Em vez de se revoltarem contra os maridos, de reconhecerem as suas escolhas, as mulheres acusam as trabalhadoras do sexo, dizem que elas lhos roubarem através de meios ilícitos. “A desculpabilização dos homens alimenta a esperança de se salvar o casamento.”

Desde o desembarque das caravelas no Brasil, as brasileiras povoam as fantasias dos portugueses. Primeiro, eram as índias sedutoras. Depois, também as mulatas. Esse imaginário persiste “como uma herança colonial”. 

E, com o movimento das “Mães de Bragança”, ganhou força o estereótipo da brasileira como mulher acessível, disponível, erótica e sensual. 
“Elas passaram a constituir uma figura dramática compósita, fonte de desejo e de maldição, de prazer e de dor”, menciona o investigador.
Do outro lado do Atlântico também existem estereótipos sobre os portugueses.
Os brasileiros vêem os portugueses como ingénuos, “burros”, avaros, exploradores, donos de incontornáveis apetites sexuais, a quem as mulheres poderiam dar a volta.


Cristo imóvel na cruz


Para muitos homens, em Trás-os-Montes, “‘ir às putas’ é um sinal de virilidade, uma marca de masculinidade”. 

Alguns até parecem ignorar que as trabalhadoras do sexo vendem ilusões, “fingem excitação para excitar os clientes”, despachar o serviço mais depressa, ganhar mais dinheiro.

No entender do investigador,

“a sexualidade da mulher representada como ‘um Cristo imóvel na cruz’ revela muito mais do que uma rotina sexual. Representa, sobretudo, para muitas mulheres, uma rotina de vida, de uma vida sacrificada, que a crucifica nas suas labutas quotidianas”. “A dignidade conferida ao estatuto de esposa e de mãe exige a prática de uma sexualidade dominada”

Pelo que contaram trabalhadoras do sexo ao investigador, alguns não seriam capazes de grande desempenho. Por vezes, os “zecas” enferrujavam mesmo. Elas serviam-se então de todas as suas habilidades e estratégias, incluindo o uso de acessórios, como vibradores. Só que muitos dos que gostavam de ter novas experiências sexuais não aceitavam que as suas mulheres as tivessem.

José Machado pais dá o exemplo de:

um homem que se queixou que a sua mulher, na cama, parecia “um Cristo imóvel na cruz”. Ele lamentava-se, desse modo, “do carácter rotineiro e roteirizado da sexualidade, isto é, de um script sexual de natureza cultural, o sexo à ‘missionário’ ou à ‘papai-mamãe’”. Ora, quando os homens recorriam à prostituição era também porque se sentiam prisioneiros de si próprios na relação de submissão a que sujeitavam as suas mulheres, analisa.

No entender do investigador,

“a sexualidade da mulher representada como ‘um Cristo imóvel na cruz’ revela muito mais do que uma rotina sexual. Representa, sobretudo, para muitas mulheres, uma rotina de vida, de uma vida sacrificada, que a crucifica nas suas labutas quotidianas”. “A dignidade conferida ao estatuto de esposa e de mãe exige a prática de uma sexualidade dominada”, nota. “Às mulheres exige-se abnegação, sacrifício, esquecimento de si mesmas.” Sobrecarregadas com tarefas, são “acusadas de histerismos, maus humores, feitios ruins”. “Alguns casais pouco mais partilham do que as rabugices, o rolo de papel higiénico e o leito conjugal.”

Nada está como antes da capa da Time que indiciava a tomada de Bragança por trabalhadoras do sexo. Com o alarido que se seguiu ao manifesto, o despontar da crise económica, a intensificação das rusgas feitas pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, muitas trabalhadoras do sexo instalaram-se do outro lado da fronteira. Quando deixaram de valer “as malbaratadas justificações das voltinhas a Espanha para atestar o depósito de gasolina, algumas meninas montaram apartamentos em Bragança e redondezas”. Queixam-se de quebra de clientela.

Não será só falta de dinheiro.
Algumas mulheres “começaram a deixar esturricar a comida, a tolerar os buracos nas meias dos maridos, a desleixar-se nas tarefas domésticas”, garante o sociólogo. Arranjaram tempo para frequentar salões de beleza, cuidar mais da sua imagem. E “a estabilidade matrimonial começou a ceder à influência de novas correntes socioculturais, propensas à valorização dos enlaces efectivos eróticos e não apenas à dos vínculos patrimoniais”.


ANA CRISTINA PEREIRA 



A Igreja Católica teve e continua a ter tanta responsabilidade nesta divisão das mulheres!!!!
Responsabilidade essa que fazem por esquecer...

Dividiram as mulheres entre as Santas e as Putas!
Como tão bem disseram as feministas nos anos 80!!!!!

Com a treta da história da Eva submissa ao Adão, com a Inquisição a queimar as mulheres na fogueira (para as enfraquecerem, dividirem e espoliarem-nas dos seus bens materiais que lhes garantiam a sua independência em relação aos homens...)

Resultou nisto que se vê ainda nos dias de hoje!!
E não é só no interior do país!!!
Acontece também nos centros urbanos!
Eu quando me divorciei a minha mãe deixou de me falar durante um ano e meio...isto em 2003...dizia ela que:"...era minha obrigação aguentar a minha cruz, tal como Cristo aguentou a sua..."
Em 2010, fui a uma igreja católica pedir ajuda porque virei sem abrigo, e expulsaram-me por ser divorciada...

Esta é a realidade dos dias de hoje!!!





SlutWalk, La Marcha de las Putas,
Protesto no Continente Americano
(começou no Canadá em 2011, EUA, México, Costa Rica,Argentina, Colombia, Uruguai, Perú, Equador, Honduras; e por todo o mundo Reino Unido, Índia, Austrália, etc... e mais tarde, em 2013, a Marcha das Vadias no Brasil),
contra a Violência Sexual.


A Dificuldade de Estabelecer e Firmar Relações




A dificuldade de estabelecer e firmar relações.
Há uma técnica para isso, conheço-a. Nunca pude meter-me nela. Ser "simpático".
É realmente fácil: prestabilidade, autodomínio. Mas.
Ser sociável exige um esforço enorme — físico.
Quem se habituou, já se não cansa. Tudo se passa à superfície do esforço.

Ter "personalidade": não descer um milímetro no trato, mesmo quando por delicadeza se finge. Assumirmos a importância de nós sem o mostrar. Darmo-nos valor sem o exibir. Irresistivelmente, agacho-me.

E logo: a pata dos outros em cima. Bem feito. Pois se me pus a jeito. E então reponto. O fim. Ser prestável, colaborar nas tarefas que os outros nos inventam. Colóquios, conferências, organizações de. Ah, ser-se um "inútil" (um "parasita"...).

Razões profundas — um complexo duplo que vem da juventude: incompreensão do irmão corpo e da bolsa paterna. O segundo remediou-se. Tenho desprezo pelo dinheiro. Ligo tão pouco ao dinheiro que nem o gasto... Mas "gastar" faz parte da "personalidade".

Saúde — mais difícil. Este ar apeuré que vem logo ao de cima. A única defesa, obviamente, é o resguardo, o isolamento, a medida.
É fácil ser "simpático", difícil é perseverar, assumir o artifício da facilidade. Conservar os amigos. "Não és capaz de dar nada", disseram-me. Oh, sou mesmo capaz de dar tudo. Do que não sou capaz é de me enfiar na técnica da "generosidade" — normalmente, aliás, avara.
Dar tudo — mas de uma só vez ou de cada vez, e não fazer da generosidade governada um meio simpático e coercivo de atrair uma corte.
Nos intervalos, regresso.

Agora, mais do que nunca, se exige a técnica da sociabilidade.
Sou irremediavelmente de um tempo passado. Ninguém dos que convivem comigo me acusam de. O que me é difícil é ser sociável por automatismo. Os sociáveis são-no com toda a gente e ninguém. Criaram esse modo de ser por fora. Como o pentearem-se e fazer a barba. E governam-no como lhes interessa.

De qualquer modo o que me aflige é a facilidade do impulso, o primarismo dos máximos (para cima e para baixo), a incapacidade de controlo, de frieza exterior, a fácil emotividade, o "entrar em pânico" (Regina), a falta — que diabo, digamos tudo — de coragem. Aguentar as contrariedades. Tenho o dom de as tornar mais calamitosas. Acabou-se: é difícil aprender a viver. Ou ter oportunidade de. Um sempre instável equilíbrio. O viver por metade. Bom. Lamúria, já assentámos que não.


Vergílio Ferreira
in, Conta-Corrente 1


Um dia destes vou-te matar





Um dia destes
vou-te matar
Uma manhã qualquer em que estejas (como de
costume)
a medir o tesão das flores
ali no Jardim de S. Lázaro
um tiro de pistola e …
Não te vou dar tempo sequer de me fixares o rosto
Podes invocar Safo Cavafy ou S. João da Cruz
todos os poetas celestiais
que ninguém te virá acudir
Comprometidos definitivamente os teus planos de
eternidade
Adeus pois mares de Setembro e dunas de Fão
Um dia destes vou-te matar
Uma certeira bala de pólen
mesmo sobre o coração.


Eugénio de Andrade


OS RELACIONAMENTOS COMO EXERCÍCIO ESPIRITUAL




À medida que o modo egóico da consciência e todas as estruturas sociais, políticas e económicas que o criaram entram na fase final da sua decadência, os relacionamentos entre homens e mulheres reflectem o profundo estado de crise em que a Humanidade se encontra. E como os seres humanos se têm vindo a identificar cada vez mais com as suas mentes, muitos dos relacionamentos não se enraízam no Ser e por isso transformam-se numa fonte de sofrimento e são dominados por problemas e conflitos.

  • Há actualmente milhões de pessoas que vivem sozinhas ou são pais solteiros, incapazes de estabelecerem um relacionamento íntimo ou não querendo repetir o drama de relacionamentos anteriores. 
  • Outros andam de relacionamento em relacionamento, passando de um ciclo de prazer e dor para outro, à procura da realização pessoal, que lhes escapa sempre, através de uma união com a energia de polaridade oposta. 
  • Outros ainda chegam a um compromisso e continuam juntos num relacionamento disfuncional em que prevalece a negatividade, por causa dos filhos ou da segurança, por força do hábito, por medo de ficarem sós, ou por qualquer outra razão mutuamente "benéfica", ou mesmo devido a uma dependência inconsciente da excitação do drama e do sofrimento emocionais.


Não obstante, qualquer crise representa não apenas um perigo, mas também uma oportunidade.

Se os relacionamentos incutem energia à mente egóica, fortalecem os seus padrões e activam o corpo de dor, como acontece nessa altura,
Porquê não aceitar esse facto em vez de tentar escapar-lhe?
Porquê não cooperar com ele em vez de evitar os relacionamentos e continuar a perseguir o fantasma de um parceiro ideal como resposta aos seus problemas e como um meio de se sentir realizado?

A oportunidade que se esconde dentro de cada crise não se manifesta antes de todos os factos de uma dada situação serem reconhecidos e plenamente aceites.

Enquanto você os recusar, enquanto lhes tentar escapar ou desejar que as coisas sejam diferentes, a janela da oportunidade não se abrirá e você ficará prisioneiro dessa situação, que continuará a ser a mesma ou se deteriorará ainda mais.

O reconhecimento e a aceitação dos factos trazem consigo um certo grau de libertação dos próprios factos. 

Por exemplo, quando você sabe que há desarmonia e se agarra a esse "saber", através desse seu saber surge um factor novo que poderá vir a combater a desarmonia. Quando você sabe que não está em paz, esse seu saber cria um espaço de quietude que rodeia a sua ausência de paz num abraço de amor e ternura e depois a transmuta em paz.
No que diz respeito à transformação interior, não há nada que você possa fazer. 
Você não se pode transformar a si próprio, e certamente não pode transformar o seu parceiro ou qualquer outra pessoa. 

Tudo o que você pode fazer é criar um espaço para que a transformação aconteça, para que a graça e o amor entrem na sua vida.

Portanto, alegre-se sempre que o seu relacionamento não funcionar, sempre que ele revele a "loucura" que há em si e no seu parceiro. O que era inconsciente estará então a ser trazido para a luz. É uma oportunidade de salvação.
Em cada momento, agarre-se àquilo que sabe desse momento, particularmente ao que sabe do seu estado interior.

Se houver cólera, reconheça que há cólera. Se houver ciúme, uma atitude defensiva, um impulso para discutir, uma necessidade de ter razão, uma criança interior a exigir amor e atenção, ou um sofrimento emocional de qualquer espécie – seja o que for, reconheça a realidade desse momento e agarre esse saber. 

O relacionamento torna-se então o seusadhana, o seu exercício espiritual. Se observar um comportamento inconsciente no seu parceiro, envolva-o no amor do seu saber, para que você não reaja a esse comportamento. A inconsciência e o saber não podem coexistir por muito tempo – mesmo se o saber estiver apenas na outra pessoa e não naquela que está a ter um comportamento inconsciente. A forma de energia que reside por trás da hostilidade e da agressividade acha absolutamente intolerável a presença do amor. Se você reagir, seja de que forma for, à inconsciência do seu parceiro, você próprio se torna inconsciente.
Mas se se lembrar então de reconhecer a sua reacção, nada estará perdido.

A humanidade encontra-se sob uma grande pressão para evoluir, porque é a nossa única oportunidade de sobrevivermos como raça. Isso afectará cada aspecto da sua vida, particularmente o aspecto dos seus relacionamentos íntimos. Nunca os relacionamentos foram tão cheios de problemas e de conflitos como agora. Como você terá já provavelmente notado, eles não existem para o fazerem sentir-se feliz ou realizado. Se você continuar a perseguir a salvação através de um relacionamento, ficará desiludido vezes sem conta.
Mas se aceitar que o relacionamento existe para o tornar consciente em vez de feliz, então o relacionamento oferecer-lhe-á a salvação, e você estará a entrar em sintonia com a consciência mais elevada que está a tentar entrar neste mundo. Para aqueles que se agarram aos velhos padrões, haverá sofrimento, violência, confusão e loucura crescentes.

Suponho que é necessário que ambos os parceiros se esforcem para transformar um
relacionamento num exercício espiritual, como sugere. Por exemplo, o meu companheiro
continua a exibir os seus velhos padrões de ciúme e repressão. Chamei-lhe a atenção 
muitas vezes, mas ele é incapaz de o ver.

Quantas pessoas são precisas para fazer da sua vida um exercício espiritual?
Não se preocupe se o seu companheiro não cooperar. O bom senso – a consciência – só poderá vir a este mundo através de si. 
Você não tem de esperar que o mundo se tome sensato, ou que alguém se tome consciente, para poder ser iluminado. Caso contrário, teria de esperar para sempre.
Não se acusem um ao outro de serem inconscientes.
No momento em que você começa a discutir, identifica-se com uma posição mental e passa a defender não só essa posição mas também a sua sensação de eu. O ego assume o comando.
Você torna-se inconsciente.
Às vezes, poderá ser conveniente chamar a atenção do seu parceiro para certos aspectos do seu comportamento. Se você estiver muito atento, muito presente, poderá fazê-lo sem envolver o ego – sem culpar, acusar ou fazer o outro sentir que não tem razão.

Se o seu companheiro se comportar inconscientemente, evite emitir qualquer juízo de valor.
Julgar só serve para confundir o comportamento inconsciente de alguém com a pessoa que esse alguém é, ou então para projectar a sua própria inconsciência numa outra pessoa e identificá-la com isso. 

Evitar julgar não significa que você não reconheça a disfunção e a inconsciência quando as vê.
Significa mais "ser o saber" do que "ser a reacção" e o juiz. 
Você ficará então totalmente livre de reacção, ou então reagirá e continuará a ser o saber, o espaço onde a reacção é observada e onde lhe é permitido ser.

  • Em vez de lutar contra as trevas, você fará entrar a luz. 
  • Em vez de reagir à desilusão, verá a desilusão e ao mesmo tempo olhará através dela. 

Ser o saber criará um espaço evidente de presença e de amor que permitirá que todas as coisas e todas as pessoas sejam tal como elas são.
Não existe maior catalisador da transformação.

Se você praticar isso, o seu parceiro não poderá ficar consigo e continuar a ser inconsciente.

Se ambos concordarem que o relacionamento seja o vosso exercício espiritual, tanto melhor. 
Assim poderão exprimir um ao outro os pensamentos e sentimentos logo que estes ocorram, ou assim que surja uma reacção, de forma que não se crie um hiato de tempo em que uma emoção ou uma ofensa não expressa ou não reconhecida possam ulcerar e crescer. 


  • Aprenda a exprimir aquilo que sente sem culpar ninguém. 
  • Aprenda a ouvir o seu companheiro de maneira franca e não defensiva. 
  • Dê ao seu parceiro espaço para se exprimir. 
  • Esteja presente. Acusar, defender, atacar — todos esses padrões destinados a fortalecer ou a proteger o ego ou a satisfazer as suas necessidades tornar-se-ão redundantes. 
  • É vital dar espaço aos outros — e a si próprio. O amor não pode florescer sem espaço. 


Se você remover os dois factores que destroem os relacionamentos — se o corpo de dor for transmutado e você deixar de se identificar com a mente e com posições mentais, e se o seu parceiro fizer o mesmo —, sentirá a felicidade de ver o seu relacionamento a florescer.
Em vez de espelharem o sofrimento e a inconsciência um do outro, em vez de satisfazerem as necessidades de dependência do vosso ego, você e o seu companheiro reflectirão o amor profundo que sentem, o amor que tem origem na união com tudo o que existe.
É este o amor que não tem oposto.

Se o seu companheiro continuar identificado com a mente e com o corpo de dor quando você já se tiver libertado, isso representará um desafio importante — não para si, mas para o seu companheiro. 
Não é fácil viver com uma pessoa iluminada, ou antes, é tão fácil que o ego acha isso extremamente ameaçador. Lembre-se de que o ego precisa de problemas, de conflitos e de "inimigos" para fortalecer a sensação de separação de que a sua identidade depende. A mente do parceiro não iluminado sentir-se-á profundamente frustrada porque não há resistência às suas posições fixas, significando isso que elas se tornam vacilantes e fracas, havendo mesmo o "perigo" de poderem entrar totalmente em colapso, resultando daí uma perda de identidade.
O corpo de dor exige reacções e não as obtém. 
A sua necessidade de discussões, drama e conflitos não é satisfeita. 

Mas cuidado: há pessoas que são indiferentes, introvertidas, insensíveis, ou estão desligadas dos seus sentimentos, mas que podem pensar e tentar convencer os outros de que são iluminadas, ou pelo menos de que não há "nada de errado" com elas e que é o parceiro que tem problemas. Os homens são mais atreitos a isso do que as mulheres. Tendem a considerar as parceiras como irracionais ou emocionais. Mas se você sentir as suas emoções, não estará longe do radioso corpo interior subjacente a elas. Se você for muito cerebral, a distância é muito maior e precisará de tomar consciência do corpo emocional antes de poder alcançar o corpo interior.
Se não houver uma emanação de amor, de alegria, de presença total e franqueza para com todos os seres, então não há iluminação.

Um outro indicador é a maneira como uma pessoa se comporta em situações difíceis ou que sejam uma provação, quando as coisas "correm mal". Se a sua "iluminação" for uma auto-ilusão egoica, então a vida depressa lhe apresentará uma provação que mostrará a sua inconsciência seja sob que forma for – medo, ira, atitudes defensivas, juízos, depressões, emoções semelhantes.
Se você estiver num relacionamento, muitas das suas provações virão do seu parceiro.

Por exemplo, uma mulher poderá ser posta à prova por um parceiro indiferente que seja muito cerebral. Ela sentir-se-á posta à prova pela incapacidade dele em ouvi-la, em lhe dar atenção e espaço
para ser, o que é devido à falta de presença dele. A ausência de amor num relacionamento, que geralmente é sentida mais vivamente pela mulher do que pelo homem, fará despertar o corpo de dor da mulher e, através dele, ela atacará o parceiro – acusações, críticas, censuras, etc. Por sua vez, esta situação transforma-se na provação dele. Para se defender dos ataques do corpo de dor dela, que ele considera totalmente injustificados, ele entrincheirar-se-á ainda mais profundamente nas suas posições mentais, ao mesmo tempo que se justifica, se defende ou contra-ataca.
Isso acabará por activar o seu próprio corpo de dor.
Quando ambos os parceiros se deixam dominar deste modo, alcançam um nível de profunda inconsciência, de violência emocional, de ataques e contra-ataques furiosos. A violência não diminuirá até ambos os corpos de dor se terem reabastecido e entrarem depois numa fase de latência. Até ao próximo confronto.

Esta é apenas uma das muitas situações possíveis.
Escreveram-se muitos volumes, e muitos mais poderiam ser escritos, sobre a inconsciência nos relacionamentos entre um homem e uma mulher. Mas, como eu já disse, quando você compreender a raiz da disfunção, não precisa de explorar as suas inúmeras manifestações.

Vamos rever brevemente a situação que acabei de descrever. 
Toda a provação que ela contém é na realidade uma oportunidade oculta de salvação.
Em cada uma das fases do processo disfuncional, é possível libertar-se da inconsciência.
Por exemplo, a hostilidade da mulher poderia funcionar como um sinal para o homem abandonar o seu estado de identificação com a mente, para despertar no Agora, para se tornar presente – em vez de se identificar ainda mais com a mente e tornar-se ainda mais inconsciente.
Em vez de "ser" o corpo de dor, a mulher poderia ser a conhecedora que observa o sofrimento emocional em si própria, acedendo assim ao poder do Agora e iniciando a transmutação do sofrimento. 
Isso faria com que deixasse de projectar a sua dor, de forma compulsiva e automática, para o exterior. A mulher poderia então exprimir os seus sentimentos ao seu parceiro.

É evidente que não há a garantia de que ele a ouça, mas dar-lhe-ia uma excelente oportunidade para se tornar presente e romper o insensato ciclo da representação involuntária de velhos padrões da mente. Se a mulher perder essa oportunidade, o homem poderá observar a sua própria reacção mental e emocional ao sofrimento dela, a sua própria atitude defensiva, em vez de ser a reacção. Ele poderia então observar o seu próprio corpo de dor a despertar e a tomar assim consciência das suas emoções. Desta maneira, surgiria um espaço claro e sereno de pura consciência – o conhecedor, a testemunha silenciosa, o observador. Esta consciência não recusa o sofrimento e no entanto transcende-o. Permite que o sofrimento seja e contudo transmuta-o ao mesmo tempo. Aceita tudo e transforma tudo. Abre-se então uma porta para que ela se possa juntar a ele nesse espaço.

Se você estiver presente de maneira consistente, ou pelo menos predominante, no seu relacionamento, este será o maior desafio para o seu parceiro.
Ele será incapaz de tolerar a sua presença por muito tempo e continuar a ser inconsciente.
Se ele estiver pronto, entrará pela porta que você lhe abriu e juntar-se-á a si nesse espaço.
Se não o fizer, ambos se separarão como o azeite e a água.
A luz é demasiado dolorosa para alguém que queira permanecer nas trevas.


Eckhart Tolle
in, O Poder do Agora
Relacionamentos Iluminados(cap 8)