Dizem por aí que vender sexo é um trabalho como outro qualquer…
A venda de sexo não nasceu com a humanidade, ao contrário do sexo que é uma das essências dessa humanidade. Fazer e comprar/vender não são a mesma coisa. E por isso é tão estranho viver-se no mundo com 7 mil milhões de pessoas em que o sexo, das coisas mais naturais, sociais e belas de ser trocadas, trocadas, sublinho, é sem pagamento, moedas e notas (eventualmente é “pago” com prazer, risos, afectos, olhares e aromas e tudo o que envolve a conquista do outro), é hoje uma das coisas mais…vendidas em todo o mundo. Sem esforço de afectos, sem mobilização de ideias, sem cedências de vontades, com todos os traumas psicológicos e físicos de um mundo padronizado, não há nada que um cartão multibanco não resolva…
Vamos directos ao assunto: porque há um movimento mundial, com epicentro na Europa, para legalizar a prostituição?
Porque há uma nova fonte de lucro aí, ou seja, a prostituição deixa de ser uma pequena empresa, com as prostitutas e os proxenetas, e passa a ser uma empresa, grande eventualmente, ou um conjunto delas, geridas por um gestor, quem sabe com um MBA de gestão…
O que está em causa é de facto a industrialização da prostituição. Passarão as prostitutas por isso a pagar mais impostos e eventualmente a ganhar menos, porque há uma fatia do salário que ia para o proxeneta que tem agora de ser para pagar impostos sobre o rendimento, segurança social e a renda/dividendos dos gestores/proprietários. As prostitutas hoje pagam impostos, de consumo, como toda a gente, e essa é a grande fatia fiscal, e têm acesso ao SNS. Passariam a pagar por exemplo segurança social, mas isso não significa, como sabem todos os trabalhadores a recibos verdes, que passariam a receber segurança social…Pagar e receber do Estado neste país não anda de mãos dadas.
São estes bons argumentos para não legalizar a prostituição, digamos, a mudança do proxeneta para o saque fiscal organizado pelo Estado? Não. Ilegalizar comportamentos sociais massificados é inútil. Não evita nada, não melhora nada. Sou a favor da legalização da prostituição, por isso. Mas contra a prostituição. Se isso me coloca num campo conservador, sentar-me-ei aí com gosto. Se me retira do campo feminista, confesso que foi lugar onde nunca estive – a libertação da mulher é ao lado dos homens e é um assunto de classe e não de género. Digamos que no meu mundo um Che Guevara de boina anima-me mais o dia que um desfile da Cristine Lagarde nos gabinetes do FMI…O poder das mulheres não é nos piores lugares de poder num mundo, que retirou poder à maioria da população – e retirou-o a homens e a mulheres.
Saindo agora do negócio da prostituição, que se legitima a coberto de ideias sinceras e honestas de proteger pessoas em situação de fragilidade, e entrando na condição humana.
Duas perguntas.
De um lado, porque vivemos no século XXI, com um espantoso desenvolvimento tecnológico e científico, e há pessoas que precisam de se prostituir para sobreviver?
Do outro: qual a razão, volto ao tema, de sermos 7 mil milhões, e haver milhões de pessoas que compram sexo para o ter, revelando a incapacidade brutal para construir relações, uma solidão, que nasce da desagregação de laços históricos por via da urbanização, pobreza, da miséria, das relações laborais e da competição económica?
Junte-se a isto o peso da Igreja, o tabu que é hoje o sexo, a ausência de uma reflexão sobre a monogamia, e sobra o…cartão multibanco.
Isto é triste mas não é natural, repito.
A melhor metáfora para esta mudança é que hoje uns encontram-se pela internet, mandam uns “sorrisos” iguais para o mundo inteiro já desenhados no computador, a grande fonte de educação sexual, a indústria pornográfica, resume-se a um roteiro, rápido e igual, em todo o mundo, e que diz respeito a corpos jovens, todos iguais, que fazem todos o mesmo, uma doentia padronização das relações onde a alma não se encaixa. E há 100 anos…vamos buscar um pedaço de verdade e alguma mítica nostalgia, dançava-se, muitos o faziam, num baile, corpo a corpo, aroma a aroma, pele com pele. Tango.
O mundo precisa de reinventar o tango, em vez de justificar a desagregação social.
Sobre o argumento que por aí circula, tão de “esquerda”, que vender o corpo é uma “profissão como outra qualquer”, a esquerda tem que ler mais Marx e menos resumos de Marx.
Quem trabalha não se vende.
Vende a força de trabalho, o produto do trabalho, daí a vender é corpo é uma ponte sobre um oceano, um salto qualitativo – e agora chamo aqui a minha condição de mulher – é um argumento brutalmente ofensivo.
O sexo é a dimensão mais íntima da nossa intimidade, do nosso ser, da nossa vivência bela com os outros, não existe em nós um ser emocional e outro racional, um físico e uma alma, e cada um não se separa do outro, a cabeça do corpo, a alma do prazer, quando uma mulher faz sexo com um homem a troco de dinheiro, o que acontece é um recalcamento, na maioria dos casos, da imensa violência que se vive. É um perder o corpo e, por isso, é um perder da alma.
A prostituição deve ser legal. Mas combatida. As fábricas de armas são legais, porque hoje existem e ilegalizá-las só piorará o tráfico de armas. Mas a guerra deve ser combatida.
Raquel Varela
( uma das comentadoras do programa de tv, Barca do Inferno)
Eu acho que a legalização não resolve nada.
Temos o exemplo da Holanda!
O que acontece depois da legalização é o aparecimento de interesses de carácter duvidoso que fomentam o trafico de mulheres que se tornam muito difíceis de combater.
Onde o estado entra e legaliza, fomenta-se o negócio (passa a ser legal) e institucionalizam- se os patrões.
Exceptuando os casos de prostituição associada ao tráfico humano, em determinadas zonas estratégicas, com a inevitável ESCRAVIDÃO SEXUAL associada, temos a verdadeira prostituição, a VOLUNTÁRIA!
E aqui incluem-se todas as formas de prostituição comercial à margem da lei, incluindo a de acompanhantes de luxo (nome pomposo para querer dizer exactamente a mesma coisa).
E porquê, perguntar-me-ão?
A resposta é muito simples, PORQUE É UMA ACTIVIDADE EXTREMAMENTE RENTÁVEL PARA QUEM A PRATICA, ponto final!
Não é invulgar, antes pelo contrário, mulheres (ou homens, embora em número bastante mais reduzido), sem raízes monogâmicas e sem preconceitos sociais com a sexualidade, e gostando de sexo, optarem por esta solução, PORQUE CONSEGUEM FÁCILMENTE AUFERIR DE RENDIMENTOS MENSAIS QUE A MAIORIA DO CIDADÃO COMUM NÃO CONSEGUE NUM ANO INTEIRO!
Esta é que é a verdade que tem de ser denunciada!
Portanto, SE QUEREM ACABAR COM O FLAGELO DA PROSTITUIÇÃO CERTAMENTE NÃO SERÁ EM LEGALIZA-LA, porque não estou a ver os clientes a deixarem lá a sua marca registada numa factura, nem as prostitutas renunciarem para o estado a um quarto do que ganham com a actividade!
Aliás, a prostituição clandestina nunca iria acabar por esse mesmo motivo, isso é certo!
Quantas e quantas, conheci várias em Portugal já há uns bons anos, que declaram outra actividade, como por exemplo, empregadas de limpeza, para terem os tão sonhados direitos? Mas declaravam sempre o mínimo exigido, o resto recebiam por fora, claro está!
A única forma é mesmo PROIBIR por lei a prática pública da prostituição, como se proíbe o consumo e venda de drogas, AUMENTANDO SIGNIFICATIVAMENTE A FISCALIZAÇÃO DESTES ESPAÇOS!
Mas é claro que esta é a solução mais dispendiosa para o Estado, porque não lhe proporcionava rendimento algum e obrigava a um gasto acrescido de uma ordem não negligenciável!
Assim sendo, que solução afinal?
A solução é INVESTIR A SÉRIO NO COMBATE AO TRÁFICO HUMANO REAL NO TERRENO (locais de prática suspeitos) e deixar tudo o resto em paz!
Cada qual é livre de fazer o que quer com o seu corpo, mas tal como noutros casos, temos de combater os abusos e exageros nas práticas públicas, seja qual for a actividade!
Por um lado, o Estado colocar-se-á em mais uma posição de intolerável hipocrisia, como acontece, não com o fabrico de armas, mas com o negócio do nefasto tabaco.
Por outro lado, qualquer transacção comercial sob a tutela do Estado tem de estar sujeita a regras mínimas, com controle e protecção dos agentes económicos envolvidos.
Não consigo imaginar como isso poderá ser efectuado...
Estando essa legalização a ser ponderada em período de profunda crise económica, e não durante um ciclo de prosperidade, descredibiliza o Estado, tornando-o no verdadeiro, no mais interesseiro proxeneta.
Uma mulher casada, sem emprego, que vive economicamente dependente do marido, indivíduo mal formado, que trata a esposa como um objecto, exigindo-lhe sexo, sempre que ele quer sem ter em consideração a vontade dela. Será esta mulher uma prostituta?
Ou as mulheres que vivem da e para a imagem, que vão para a cama com homens ricos, para de uma forma muito subtil receberem apartamento, jóias, carro e boa vida?
Ou as que se casam por interesse, para terem uma vida refastelada?
Não são todas elas prostitutas?
O mesmo acontece com os homens que estão com as mulheres por interesse!
Há muito tipo de prostituição meus caros!
Muito provavelmente existe dentro das vossas casas!
Não há só prostituição feminina; há masculina, hetero, homo e bi-sexual, etc...
Há pessoas que se prostituem sem que a isso sejam obrigadas, antes pelo contrário.
As motivações dos "clientes" também não são certamente só aquelas que se menciona de forma um pouco redutora.
Para além disso, o assunto não se compadece com moralismos, na minha modesta opinião.
Depois, há a questão da liberdade...mas isso é outra conversa.
Acho muito difícil regular como se fosse uma profissão, comportamentos e actos de natureza tão íntima.
Talvez a prostituição seja muito mais uma condição que uma profissão, e assim, a preocupação deverá ser a protecção, a segurança e bem-estar das pessoas.
O que pode e deve ser regulado, são os negócios ao redor da prostituição.
E agora, vem a pergunta que não quer calar:
Para vocês, pais e mães, com filhos e filhas,se a prostituição é uma profissão como outra qualquer, será uma boa opção para os vossos filhos nesta crise económica e falta de emprego que se vive?
Mas é como tudo...cada um faz as suas próprias escolhas...
Têm a liberdade de fazer o que quiserem com o seu corpo, da forma que quiserem.
Observem as notas de Lukács, sobre a relação homem, mulher e sexualidade, portanto a luta pela libertação da mulher e do homem:
"[...] A sujeição sexual da mulher certamente constitui uma das bases mais fundamentais de sua sujeição em geral, tanto mais que as atitudes humanas que lhe correspondem não só desempenham um papel importante no mundo de representações e paixões dos homens, mas no decorrer de milénios penetraram profundamente na própria psicologia da mulher e se incrustaram ali.
Por isso mesmo, a luta de libertação da mulher contra esse seu estranhamento não é, portanto, ontologicamente apenas uma luta voltada contra as aspirações de estranhamento que partem do homem, mas deve também visar a própria autolibertação interior.
Nesse aspecto, o moderno movimento sexual possui um cerne decididamente positivo, progressista. Está contida nele – consciente ou inconscientemente – uma declaração de guerra contra a ideologia do “ter”, que, como vimos em Marx, constitui uma das bases fundamentais de todo estranhamento humano, impossível de ser superado também nesse campo sem um cancelamento radical da sujeição sexual da mulher.
[...] é impossível que uma libertação sexual isolada por si só proporcione uma solução autêntica para a questão central da humanização das relações sexuais.
Aqui existe o perigo de que tudo o que o desenvolvimento conquistou em termos de humanização social da pura sexualidade (erótica) seja novamente perdido.
Somente quando os homens descobrirem relações mútuas que os unam inseparavelmente enquanto seres naturais (que se tornaram sociais) e simultaneamente enquanto personalidades sociais o estranhamento poderá realmente ser superado na vida sexual.
A ênfase exclusiva no momento puramente sexual nessa luta – justificada e importante – por libertação pode muito facilmente substituir, ao menos temporariamente, os estranhamentos à moda antiga por estranhamentos à moda atual.
Com efeito, a sexualidade, por exemplo, segundo a expressão da comunista Kollontai, enquanto “copo d’água” também tem um importante componente, que corresponde em grande medida à sexualidade masculina com o qual os homens estranharam as mulheres durante milênios, estranhando, contudo, simultaneamente a si mesmos. [...]»
Sem comentários:
Enviar um comentário