segunda-feira, 25 de novembro de 2013
Solidão voluntária
"Para ter um intercâmbio com o feminino selvagem, a mulher precisa deixar temporariamente o mundo, colocando-se num estado de solidão — aloneness — no sentido mais antigo do termo. Antigamente, a palavra alone (só) era tratada como duas palavras, all one.
Estar all one significava estar inteiramente em si, em sua unidade, quer essencial quer temporariamente.
É esse exatamente o objetivo da solidão, o de estar inteiramente em si.
Ela é a cura para o estado de nervos em frangalhos tão comum às mulheres modernas, aquele que a faz "montar no cavalo e sair cavalgando em todas as direcções", como diz um velho ditado.
A solidão não é uma ausência de energia ou de acção, como acreditam algumas pessoas, mas é, sim, um tesouro de provisões selvagens a nós transmitidas a partir da alma.
Nos tempos antigos, a solidão voluntária era tanto paliativa quanto preventiva.
Ela era usada para curar a fadiga e para evitar o cansaço.
Ela era também usada como um oráculo, como um meio de se escutar o self interior a fim de procurar conselhos e orientação que, de outra forma, seriam impossíveis de ouvir no burburinho do dia-a-dia.
As mulheres dos tempos antigos, assim como as mulheres aborígenes modernas, reservavam um local sagrado para essa indagação e comunhão.
Tradicionalmente, diz-se que esse lugar era reservado para a menstruação, pois durante esse período a mulher está muito mais próxima do autoconhecimento do que o normal.
A membrana que separa a mente consciente da inconsciente fica, então, consideravelmente mais fina.
Sentimentos, recordações e sensações que normalmente são impedidos de atingir a consciência chegam ao conhecimento sem nenhuma resistência.
Quando a mulher procura a solidão durante esse período, ela tem mais material a examinar.
No entanto, nas minhas conversas com mulheres de tribos das Américas do Norte, Central e do Sul, assim como com descendentes de algumas tribos eslavas, descobri que os "lugares das mulheres" eram usados a qualquer hora, não apenas durante a menstruação.
Descobri, ainda, que cada mulher muitas vezes tinha seu próprio "lugar da mulher", que podia ser uma certa árvore, algum lugar à beira d'água, algum aposento natural criado pela floresta ou pelo deserto, ou alguma gruta oceânica.
Minha experiência de análise com mulheres me leva a crer que grande parte do mau humor pré-menstrual da mulher moderna não representa apenas uma síndrome física, mas também pode ser atribuído ao fato de a mulher se ver frustrada na sua necessidade de reservar tempo suficiente para se revitalizar e se renovar.
Se fixarmos uma prática regular de solidão voluntária, estaremos propiciando uma conversa entre nós mesmas e a alma selvagem que se aproxima da terra firme.
Agimos assim não só para "estar perto" da nossa natureza selvagem e profunda, mas, como na tradição mística desde tempos imemoriais, o objectivo dessa união é o de que nós façamos perguntas e de que a alma dê conselhos."
in, "Mulheres que correm com os lobos"
Dra. Clarissa Pinkola Estes
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