terça-feira, 15 de setembro de 2015

Canção de Mim Mesmo 6




Uma criança disse O que é a relva?, encantadora para mim, apresentando-a em suas mãos;
O que eu poderia responder à criança? Ignoro o que a relva é tanto quanto esse menino.

Penso que seja a bandeira de minha disposição, tecida a partir de um algo verde esperançoso.

Imagino que seja o lenço do Senhor,
Um presente perfumado, uma lembrança deixada para nós como um desígnio,
Tendo o nome do dono gravado de algum modo nos cantos, para que possamos ver e destacar, e dizer De quem?

Ou é possível que a relva ela mesma seja uma criança, o bebé criado pela vegetação.

Imagino que seja um hieróglifo uniforme,
E significa que brota tanto nas zonas largas quanto nas estreitas,
Crescendo tanto entre os negros quanto entre os brancos,
Canadenses, tuckahoes, congressistas, presos — eu dou a eles o mesmo, eu deles recebo o mesmo.

E agora me parece que ela é o lindo cabelo longo dos túmulos.

Com carinho eu te usarei, relva crespa,
Pode ser que transpires do peito de jovens rapazes,
Pode ser que se eu os tivesse conhecido eu os teria amado,
Pode ser que venhas dos velhos, ou de recém-nascidos arrancados prematuramente do colo de suas mães,
E aqui tu te transformas em colos de mãe.

Esta relva é muito escura para que provenha dos cabelos brancos das mães,
Mais escura que as barbas sem cor dos anciãos,
Escura para vir de sob os desfalecidos céus vermelhos das bocas.

Ah! percebo afinal tantas línguas pronunciando,
E percebo que elas não vêm dos céus da boca à toa.

Eu gostaria de poder traduzir as insinuações sobre os rapazes e as moças mortas,
E as insinuações sobre os velhos e as mães, e das criancinhas que foram levadas prematuramente dos colos.

O que achas que foi feito dos jovens e dos velhos?
E o que achas que foi feito das mulheres e das crianças?

Eles estão vivos e bem em alguma parte,
O broto é a prova de que de facto não há morte,
E se acaso algum dia ela existiu, conduziu-se adiante para a vida; não ficou à espera no final para prendê-la,
E deixou de ser a morte no momento em que a vida apareceu.

Tudo avança e se expande, nada entra em colapso,
Morrer é algo diferente do que qualquer um pode supor, é uma sorte maior.


Walt Whitman
in, Song of Myself

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