Na estrada do campo há um besouro morto.
Os três pares de patinhas, dobrou-os com esmero sobre o ventre.
Em lugar do desvario da morte - asseio e ordem.
É moderado o horror desta visão,
âmbito rigorosamente circunscrito entre escalracho e menta.
A tristeza não se pega.
O firmamento é azul.
Para nosso sossego, é uma morte como que mais chã
há um morrer para os homens outro para os bichos,
que perdem - queremos crer - menos sentido e mundo,
ao partirem - quer-nos parecer - de um palco menos trágico.
As suas almas miudinhas não nos assustam as noites,
respeitam distâncias,
conhecem os usos.
E eis aqui este besouro morto no caminho,
num estado indeplorável, luzindo a um ínfimo sol.
Pensa-se nele o simples tempo de o avistar:
parece que não lhe sucedeu nada de importante.
Parece que o importante só a nós diz respeito.
Para vida que é só nossa, uma morte só nossa,
morte que goza de prioridade absoluta.
Wislawa Szymborska
in, Um amor Feliz
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