Revelar a verdade do ser: era esta, para os gregos – pelo menos até ao séc. V a.C. – a função da educação. Nobilíssima e ampla visão (entretanto extraviada, perdida, esquecida e largamente ignorada pela nossa chamada “civilização”); não só da educação, dos métodos e dos objetivos de qualquer pedagogia: mas da natureza do Homem, do seu potencial, da sua condição – bem como das condições necessárias e meios adequados para que este se pudesse (ou possa!) cumprir.
E além disso – para o que nos interessa aqui e agora – a visão grega da educação oferece-nos um vislumbre do que é, ou pode ser, a visão astrológica, metafísica, e encantada da vida.
Tempos houve – há mais de 2500 anos! – em que educar um (“o”) Homem consistia, antes de mais, no exercício do direito – e do dever! – de se reconhecer, e cumprir, como obra de arte viva, ética, e criadora. Isto é, como uma criatura capaz de se conhecer, transformar, e honrar conscientemente os “poderes divinos” de que era criação, ele próprio, e herdeiro.
Nessa altura, o conhecimento intelectual e o fascínio/obsessão pelo mundo material não só eram secundários, mas preocupações menores perante a principal, mais essencial e decisiva tarefa perante a própria existência: conhecer-se, às divindades que através de si viviam, e aos dons, tarefas, caminhos e talentos por eles dispensados a cada um pelo seu nascimento.
Essa visão do Homem e da sua educação subsistem, ainda hoje, sob a forma de uma “pedagogia cósmica” a que chamamos de Astrologia.
“A finalidade [da educação, na Grécia Antiga] era aproximar os homens dos deuses, aproximá-los da (…) força criadora dos deuses da antiguidade (…), que nada mais eram do que princípios cósmicos. Por ocasião do nascimento do jovem, ele era consagrado a certas divindades, segundo sua carta astral. Era a astrologia arcaica, onde o nome que o indivíduo receberia revelaria seu destino, indicando caminhos a percorrer e os talentos a realizar.
O herói era aquele que conseguiria cumprir seus talentos e o traidor seria aquele que se esqueceria deles (desperdiçaria). Portanto, era fundamental o conceito de verdade. Conseguia ser ele próprio, expressando no corpo, no exterior e no interior, tudo aquilo que trouxe de outras existências. Realizar os talentos era tornar-se verdadeiro. A educação arcaica era voltada para a verdade, e não para o conhecimento intelectual. Este era secundário, e a revelação da verdade era fundamental (…)”. Viktor D. Sallis
Isso era o essencial da educação para os gregos antigos: ensinar o Homem a ser Homem, tornando-se cada vez mais divino – através da descoberta e exercício dos princípios divinos manifestados em si como talentos. Os talentos, oferecidos pelos deuses a cada um por ocasião do seu nascimento, deviam ser honrados e cumpridos: e era isso que revelava a cada um, precisamente, o seu próprio destino.
Dito de outra maneira: o “destino” de cada Homem era cumprir e exercitar os talentos e os dons próprios com que tinha nascido – assim cada Homem podia, à medida que exercia os seus dons próprios de origem divina, servir a Criação.
Já não é essa, nem pouco mais ou menos, a “visão” moderna da educação.
Hoje em dia domesticam-se, instruem-se – não se “educam” – e programam peças produtivas de uma engrenagem chamada “sociedade capitalista”, baseada no dinheiro, no consumo, e na auto-glorificação do ego humano dissociado da sua dimensão e natureza divinas – e no altar dos deuses cultuamos o dinheiro, o poder e a fama.
Assim, por exemplo, tudo aquilo e todos aqueles nascidos sob a égide do deus Ares – em termos de signos zodiacais, Carneiro e Escorpião – têm como “destino” e “natureza” cumprir os talentos e os dons associados ao seu deus “regente”. Estes tornam-se, através das circunstâncias próprias da sua existência (e se aproveitar conscientemente as crises e as oportunidades que inevitavelmente a acompanharão), cada vez mais capazes e conscientes de atualizar o potencial da divindade Ares/Marte que através da sua vida particular procura expressar-se.
Estes constatarão, por exemplo, que todos os conflitos, desafios e lutas da sua existência são oportunidades (“divinas”) de exercitar os dons da coragem, audácia, autonomia, capacidade de permanecer sobre os próprios pés, lutando pela vida e por direitos – ou contra circunstâncias limitadoras e opressoras. E ao lidar com estas tarefas existenciais, ninguém está a ser “contrariado” nem castigado pela vida, mas a ter a oportunidade de se cumprir e conquistar a si mesmo, na sua dignidade, na sua essência, na sua humanidade, e na sua divindade imanente.
Mas isso, claro, requereria uma educação profundamente diferente da nossa. E por estes tempos, ou regressamos aos clássicos e às origens, e ao que de melhor delas se perdeu e precisamos recuperar, ou estudamos Astrologia, que vai dar quase ao mesmo. E podemos começar a reconhecer a imensidão dos dramas cósmicos, míticos e mágicos que se movem e vivificam dentro de nós, os deuses que nos habitam,
E o que temos nós de fazer para atualizar os poderes divinos que nos deram origem.
Nuno Michaels
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