sexta-feira, 13 de junho de 2014
Altares...e crenças!
Então nós temos por exemplo, o altar budista.
O altar budista é diverso do altar de outras religiões? Não.
As flores representam a impermanência.
A vela representa a luz.
A água está ali porque Buda morreu com desidratação, e nós queremos dizer: “se eu estivesse lá eu lhe daria água”.
A estátua poderia ser um pedaço de madeira, de pedra, cerâmica, qualquer coisa.
É Buda? Claro que não é Buda.
Ela só está ali, para me lembrar, que se ele realizou se libertar e era um homem como eu, então eu também posso me libertar. Ele é um exemplo de que eu posso me desfazer das ilusões e parar de me agarrar em crenças e partir para um pensamento mais limpo, sem me agarrar em nada externo.
Então Buda não era um deus, não era um salvador, um profeta e na realidade, eu posso tirar a estátua dele dali.
Na verdade, não haviam estátuas de Budas, nos altares, durante os 300 primeiros anos da história do budismo. Ninguém se atrevia a colocar uma estátua de Buda num altar, o que se colocavam eram impressões de pés ou uma árvore, porque ele havia se iluminado embaixo de uma árvore e diziam: “ele passou por aqui”.
As estátuas de Buda só aparecem depois do chamado “Período Gandhara”, e este período aconteceu na região que hoje engloba o Afeganistão.
Ela era um reino grego, e como os gregos haviam invadido a Índia e dominaram aquela região, os gregos influenciaram o budismo para que o budismo produzisse estátuas, e as primeiras estátuas de Buda são gregas. Nariz grego, feitio grego, etc. Então, a existência da estatuária budista, é uma influência do ocidente grego sobre o budismo, assim como a existência do estoicismo na filosofia grega tem uma influência do budismo.
Essa conexão cultural entre o budismo oriental, o oriente e o ocidente normalmente é ignorada, porque nós na faculdade estudamos uma história que isola o oriente, é como se ele não existisse, e toda a história partisse da Grécia e de Roma, é a chamada “História Eurocêntrica”.
E ninguém sabe quase nada aqui do que aconteceu na Índia, na China e no Japão, nesses séculos anteriores, quando nós sabemos que a civilização chinesa é mais antiga que a civilização grega, mais antiga que a civilização romana, só não é mais antiga que a civilização egípcia e babilônica.
Então, o que representa o altar para nós?
É só um mecanismo de lembrança, porque as pessoas gostam de altares.
Nós precisamos realmente de altares?
Não, não precisamos de altares.
Nós reverenciamos a lembrança do seu ensinamento e a verdade de que nós somos homens como ele, porque ele tem a água na frente dele porque morreu desidratado, mas morreu porquê?
Porque comeu em casa de um ferreiro, passou muito mal, teve um enfarto agudo do mesentério, e teve uma diarreia sanguinolenta.
Eu sempre pergunto nas minhas primeiras palestras: “vocês já tiveram diarreia?”
Então vocês são como Buda! Vocês podem se iluminar.
Essa história passou através dos tempos para nos dizer isso: não era um ser sagrado que subiu aos céus numa nuvem.
Era um homem como nós que morreu com diarreia.
Essa é a mensagem fundamental do budismo, lógica, dura, na realidade.
Às vezes eu estou falando e pessoas se queixam e dizem:
“Monge Genshô parece muito céptico, muito terrível, ele tira todas as coisas que nós nos agarramos”.
Mas essa é a verdadeira tarefa do Mestre ZEN.
O Mestre Zen quer dizer: “Qual é a bengala em que você está se apoiando?
Qual é a crença, a ilusão em que você está se apoiando?
Ah é essa? Estou tirando”.
Aí tirei a bengala, tirei a muleta, tirei o tapete debaixo dos pés e, quando não resta nada, e o homem olha para baixo e vê que não tem mais chão onde pisar, então chegou um grande momento, porque só aí o homem pode ambicionar sabedoria.
Enquanto ele estiver agarrado em crenças, ele não pode ambicionar sabedoria, porque a crença é o contrário do saber.
A crença é aquilo em que eu me agarro sem saber nada.
Eu tenho apenas “fé” que é assim.
Mas, se eu souber que é assim, se eu tiver a experiência, então eu não preciso de crença.
Monge Genshô
in, O Pico da Montanha é onde estão os meus pés
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