terça-feira, 8 de junho de 2021

Cartas







Escreves-me cartas, sou o destinatário 
da tua solidão. E sempre compreendo 
tudo, mesmo o que não dizes, o que tinge 
as entrelinhas de um branco desespero
 
que é tanto teu como meu: não tens 
quem te salve, envelheceste, trataste mal 
de um jardim que não chegou a vingar. 
Se nos cruzássemos nas ruas desta cidade 

entre desconhecidos de toda a sorte, talvez 
nos sentássemos a falar da nossa vida, isto é, 
de como vamos ficando cada vez mais órfãos 
de nós próprios. Ou, pensando bem, talvez não.


Rui Pires Cabral




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