Rompe-me o sono um latir de cães
na madrugada. Acordo na antemanhã
de gritos desconexos e sacudo
de mim os restos da noite
e a cinza dos cigarros fumados
na véspera.
Digo adeus à noite sem saudade,
digo bom-dia ao novo dia.
Na mesa o retrato ganha contorno,
digo-lhe bom-dia
e sei que intimamente ele responde.
Saio para a rua
e vou dizendo bom-dia em surdina
às coisas e pessoas por que passo.
No escritório digo bom-dia.
Dizem-me bom-dia como quem fecha
uma janela sobre o nevoeiro,
palavras ditas com a epiderme,
som dissonante, opaco, pesado muro
entre o sentir e o falar.
E bom dia já não é mais a ponte
que eu experimentei levantar.
Calado,
sento-me à secretária, soturno, desencantado.
(Amanhã volto a experimentar).
RUI KNOPFLI
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