segunda-feira, 8 de abril de 2024

Wabi-Sabi...a beleza na imperfeição

 





Conta a lenda que um jovem japonês desejava aprender os complicados rituais da cerimónia do chá com seu grande mestre. Para testá-lo, o mestre pediu que ele varresse o jardim do templo.
Com cuidado, ele limpou cada canto do jardim. Tudo estava perfeito, nenhuma folha caída ou areia fora do lugar... as pedras e plantas também estavam todas organizadas.
Porém, antes de apresentar seu trabalho ao mestre, ele sacudiu o tronco de uma cerejeira, fazendo algumas folhas caírem despretensiosamente pelo chão. O mestre, impressionado, admitiu o jovem no seu mosteiro, pois com essa atitude ele mostrou que existe beleza na imperfeição.




O wabi-sabi é uma filosofia japonesa que encontra beleza naquilo que é imperfeito e incompleto. 

Por um lado, há “wabi”, o que significa harmonia e equilíbrio e, por outro, “sabi”, que significa decadente, degradado e enferrujado. Juntos, referem-se à beleza do imperfeito, irregular ou incompleto. Em suma, subjacente a este conceito está a noção de que nada é perfeito, completo ou permanente.
Literalmente falando, podemos dizer que “wabi” significa simplicidade, rústico... enquanto “sabi” se refere à beleza da idade, desgaste do tempo.
Por ser uma expressão exclusivamente japonesa, não possui uma tradução exata em português nem em outros idiomas.

O termo Wabi surgiu no início do século XV para designar uma nova sensibilidade estética, intimamente relacionada com a cerimónia do chá, um conceito que se referia ao ambiente geral e aos objetos utilizados, à estética elaboradamente simples do Chanoyu. A definição de Wabi remonta à solidão, à melancolia, uma conotação de tristeza por um desejo não realizado. Foi no século XVI que seu significado evoluiu para o que poderíamos chamar de “aceitação” ao que não deu certo. Wabi passou a significar a busca espiritual de descobrir e desfrutar da beleza da simplicidade, da imperfeição e da efemeridade.

O termo Sabi poderia ser explicado como sendo a capacidade de descobrir a beleza em algo que se deteriorou ou envelheceu com o tempo. Sentimos que o objeto possui uma história, uma vida que se reflete em sua aparência atual e que o faz único em sua existência.

Wabi-sabi é portanto, a visão ou pensamento de encontrar beleza em todos os aspectos da imperfeição da natureza. Trata-se da estética das coisas existentes em seu estado natural, das coisas que são “imperfeitas, impermanentes e incompletas”.  Um conceito profundamente influenciado pelos ensinamentos de Buda, interligado com o pensamento budista. É essencialmente um conceito ou ideologia que se desenvolveu como um conceito filosófico por volta do século XVI no Japão, durante o período Muromachi, com bases nos ideais do zen budismo, e que vem do ensinamento budista das três marcas da existência (三法印 sanbōin)
  1. impermanência (Anicca), 
  2. insatisfatoriedade e sofrimento (Dukkha) 
  3. vazio ou não eu (Anatta) 

Todas as coisas do Universo são impermanentes, cíclicas e vazias de um Eu e se conseguirmos parar para refletir sobre isso, veremos o esplendor do ciclo constante da vida em cada detalhe.

Wabi-sabi é uma boa maneira de nos ensinar a entender a natureza em sua plenitude e ver as maravilhas presentes em qualquer substância ou ser em sua forma mais natural e crua. Se olharmos profundamente para as paisagens, os objetos que nos cercam, os relacionamentos que temos e também para nós, seres humanos, a ideia de Wabi-sabi pode ser entendida como a apreciação de uma beleza que está fadada ao desaparecimento, ou mesmo uma contemplação efêmera de algo que se torna mais belo à medida que envelhece, desbota, fenece, morre, se transforma e consequentemente, adquire um novo encanto.

Para os japoneses, Wabi-sabi é um sentimento, mais do que um conceito.

É um sentimento baseado na aceitação, transitoriedade e imperfeição. Aceitar que o belo é imperfeito e incompleto. Um exemplo são os tapetes persas, que sempre possuem um pequeno defeito que garante sua autenticidade.
Perfeição só existe na ficção. A vida real é imperfeita.

Algumas características dessa tendência são a assimetria, aspereza, irregularidade, simplicidade, rusticidade, austeridade e modéstia. Uma forma de pensar muito ligada ao slow living, uma vez que busca a conexão com o autêntico e com a natureza, reconhecendo três realidades essenciais: nada dura, nada é completo, nada é perfeito.

Algo que podemos notar nessa tendência é o foco no processo, e não no produto final. 
Na jornada e não apenas no objetivo. 
É importante ver o belo na imperfeição e nas marcas que ficam registadas com o passar do tempo, como rugas e cicatrizes em nossos corpos.

Podemos perceber esse conceito em diversas artes japonesas como a Ikebana (arte de arranjos florais), jardins zen, bonsais, cerâmicas japonesas e a tradicional cerimônia do chá, kintsugi.
O kintsugi é a arte japonesa de reparar com laca de ouro ou prata objetos quebrados. Quando algo com história é danificado e sofre algum infortúnio, esse acontecimento entra na história do objeto. Portanto, deve ser enaltecido e celebrado, tornando, por exemplo, a cerâmica reparada mais forte e mais bela do que a original.

Como uma filosofia, kintsugi pode ter semelhanças com a filosofia japonesa de wabi-sabi, a aceitação do imperfeito ou defeituoso. A estética japonesa valoriza as marcas de desgaste pelo uso de um objeto. Isso pode ser visto como uma razão para manter um objeto mesmo depois de ter quebrado e como uma justificação do próprio kintsugi, destacando as rachaduras e reparos como simplesmente um evento na vida do objeto, em vez de permitir que o seu serviço termine no momento de seu dano ou ruptura.

Kintsugi pode se relacionar com a filosofia japonesa de "não importância" (無心 mushin) que engloba os conceitos de não-apego, aceitação da mudança e destino como aspectos da vida humana.

Wabi-sabi (侘寂?) é um ideal filosófico japonês, assim como uma abordagem estética centrada na aceitação da transitoriedade e da imperfeição dos objetos e dos seres humanos. 

Esta concepção é muitas vezes descrita como a do belo que é “imperfeito, impermanente e incompleto”

O wabi-sabi é a apreciação do despojamento, introduzida no Japão por Sen no Rikyu na cerimónia do chá. Refere-se ao viver uma vida comum com a simplicidade, com a insuficiência ou com a imperfeição, e está relacionado às doutrinas de desapego do Zen budismo. Estes conceitos estão representados na produção artística através do rústico, do imperfeito, do monocromático e do aspecto natural. Através do wabi e sabi, é possível o alcance do vazio da mente que traz tranquilidade. 
Wabi significa "quietude" e sabi se entende como "simplicidade", e expressam-se através do afeto que os japoneses possuem por simplicidade e subtileza.

Ensina-nos a olhar de uma forma positiva para tudo o que temos e a encontrar beleza naquilo que consideramos ser imperfeito: o wabi-sabi é uma filosofia japonesa milenar que nos permite enfrentar as nossas lutas modernas sem a sensação ilusória de que alcançaremos a perfeição.

Não raras vezes, concentramo-nos naquilo que poderia ser ou ter sido; o wabi-sabi concentra-se em apreciar, simplesmente, o que é. Sofremos com os desafios que encontramos no nosso caminho e o wabi-sabi olha para eles com aceitação e apreciação, encarando-os como algo que faz parte da natureza da vida.

Pelo facto de estarmos constantemente à procura de atingir algo que nos torne mais felizes, acabamos por não aproveitar aquilo que, efetivamente, já é nosso e já existe. É aqui que entra o conceito japonês wabi-sabi, cujas ideologias tradicionais se baseiam na importância de apreciar a beleza da imperfeição.

Os conceitos gerais associados a esta forma de estar na vida são a impermanência e o seu princípio fulcral assenta na crença de que devemos nutrir tudo o que é autêntico ao reconhecermos três realidades simples: “Nada dura, nada está terminado e nada é perfeito”.

Em japonês, os significados e as conotações de wabi e sabi evoluíram ao longo do tempo: wabi estava associado à solidão e à beleza da simplicidade e sabi estava associado à progressão natural das coisas (o passar das estações, por exemplo). À medida que a sociedade japonesa foi, também ela, evoluindo, estes conceitos passaram a ser vistos como libertadores, sendo as imperfeições algo natural, na medida em que resultam da progressão da vida. Juntos, estes termos harmonizaram-se para criar uma conceção mais abrangente da apreciação do avanço do tempo, que representa a beleza da impermanência.

Esta ideologia representa o equilíbrio entre a apreciação do que temos e o tempo, que nos permite entender que tudo é fugaz. É um escape a tudo aquilo que nos tenta convencer de que devemos querer mais; faz parte do mindfulness, porque se relaciona com a importância da atenção plena – para viver o agora e aproveitar esse momento único.

Que lições retiramos do wabi-sabi?
Sendo a noção de wabi-sabi algo muito amplo, são muitos os ensinamentos que nos transmite. Um dos principais encontra-se na mensagem de que tudo na nossa vida é impermanente e é essa transmutação constante que nos permite apreciar a sua beleza.

E sobre o tópico beleza propriamente dita, há algo que o wabi-sabi nos ensina também. Em todos nós existe uma noção programada daquilo que é o belo, desde o momento em que nascemos. Nesse sentido, não desconsiderando o cuidado do nosso corpo (que é a nossa casa), sobreleva-se a importância de aceitarmos o facto de existirem partes do nosso ser que não podemos mudar.

Se não precisamos de algo, para quê comprá-lo? 
Ser wabi-sabi no lar é adquirir peças que sabemos que vão «crescer» connosco, à medida que nos vamos transformando também.

Para aplicar esta filosofia é necessário que aconteça uma mudança de perspetiva. Deixarmos de procurar a perfeição e começarmos a valorizar a forma atual do que nos rodeia. Não existe uma fórmula fixa para aplicarmos estes ensinamentos no nosso dia a dia. Para algumas pessoas, wabi-sabi pode significar praticar a gratidão, para outras pode representar o valor de saber ouvir o outro, por exemplo. Encontre aquela que funciona melhor consigo e relembre sempre o seu ikigai – aquilo que a move todos os dias, ao acordar.

O wabi-sabi prega o oposto do que estamos a viver nos dias atuais. 
Prega a desconexão, a imperfeição e o relaxamento.
A beleza na imperfeição.
A simplicidade e naturalidade.


“Wabi-sabi é a beleza das coisas 
imperfeitas, impermanentes e incompletas, 
antítese da nossa noção ocidental clássica de 
beleza como algo perfeito, duradouro e monumental. ”

Leonard Koren





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