sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O Pescador e o Banqueiro



Consta que, certo dia, um capitalista americano, que havia feito um sucesso invejável na sua terra natal, desembarcou no cais de uma pequena aldeia costeira, algures no México, e, para seu espanto, apercebeu-se, mesmo ali, da chegada de uma pequena embarcação com apenas um pescador. Dentro do bote, havia peixes de várias espécies: uns grandes, outros pequenos, outros ainda de barbatanas amarelas. Perante o pitoresco cenário, o americano elogiou o pescador mexicano pela qualidade do seu peixe:
– Quanto tempo demorou para apanhar tão belo peixe? – perguntou-lhe o forasteiro, com um ligeiro sorriso estampado nos lábios.
– Não muito, caro senhor. Duas, três horas, se tanto…
O americano, então, retorquiu:
– Muito bem! E por que motivo não ficou mais tempo na pescaria, de forma a apanhar mais peixe?
– E que faria eu com o excedente?
– Ora, poderia vendê-lo, por exemplo, no mercado local…
– Nós, aqui, não temos mercado, senhor…
– Eu sou um homem de finanças, licenciado pela universidade de Harvard. Como tal, posso ajudá-lo a criar a sua própria empresa…
O mexicano esboçou um indelével sorriso. Encolheu ligeiramente os ombros e perguntou:
– E que teria eu de fazer?
– Muito simples, caro amigo: teria, por exemplo, de proceder a uma reorganização do seu tempo. Já agora, diga-me: como é que ocupa o seu tempo?
– Eu? Pois bem!... Levanto-me tarde, visito os meus amigos, faço todos os dias a sesta com a minha esposa, pesco um pouco, brinco com os meus filhotes, e, à noite, vou até à cidade tocar violão com os meus amigos, conversar e beber um copo…
– Pois bem! Eu tenho uma ideia para se tornar numa pessoa rica e poderosa…
– Muito bem! Diga: sou todo ouvidos…
– O senhor deveria levantar-se mais cedo…
– E para quê?...
– Para aumentar a sua produtividade, claro…
– Muito bem! E o que faria eu com o peixe que não fosse consumido nas necessidades imediatas da minha família?…
– Com os ganhos da produtividade, o meu amigo poderia, por exemplo, comprar outro barco com bastante mais capacidade…
– Sim. E depois?
– Ora, depois, compraria outro, depois mais outro e outro ainda… até conseguir formar uma frota potente e moderna!
O mexicano não parecia, de todo, convencido, mas, presumivelmente, estava preso ao jogo, quiçá, espicaçado por uma réstia de curiosidade. Retorquiu, por fim:
– E para que me serviria toda uma frota de grandes embarcações, caro senhor?
– Não vê? Com o resultado da sua actividade, poderia dedicar-se exclusivamente à sua empresa...
– Está a dizer-me que ficaria sem este prazer que sinto quando vou para o mar?...
– Mas, em contrapartida, sentiria um gosto profundo, creia-me, em controlar a sua própria produção de pescado, vendê-lo-ia directamente aos grandes grupos económicos, enfim, ocupar-se-ia, apenas, da rede de distribuição…
– E depois, que faria eu?
– Muito fácil, caro amigo: abriria várias sucursais da sua empresa. Primeiro, começaria aqui na sua cidade natal. Em seguida, instalar-se-ia na cidade do México. Depois, far-se-ia representar em Los Angeles. Ah! Também seria importante estabelecer-se em Nova Iorque. E, por fim, conquistaria, caso quisesse, os grandes mercados europeus…
– Compreendo! Tornar-me-ia, finalmente, num homem poderoso e rico…
– E deixaria definitivamente o trabalho sujo e ingrato…
– Muito bem visto. E isso levaria quantos anos, caro senhor?
O americano riu-se, e, no seu olhar, perpassou uma indelével expressão de ironia. Por fim, esboçou um gesto vago com o côncavo da mão:
– Talvez aí uns 10 anos. Provavelmente uns 15. No fundo, tudo dependeria do seu espírito empreendedor, como calcula…
– Muito bem! E daí?...
– Repare bem! Com os dividendos da sua indústria pesqueira, poderia, por exemplo, apostar na bolsa de valores, no mercado imobiliário ou fazer render os seus capitais em paraísos fiscais. Como vê, não lhe faltariam oportunidades de fazer bons e profícuos negócios…
– Percebo. E para quê tudo isso?
O americano não evitou um riso aberto, mesclado de escárnio e de desdém, ao mesmo tempo que lançava um olhar prevaricador ao seu interlocutor.
– Ora, para juntar fortuna, homem! Você poderia ter milhões espalhados por vários países…
– Muito bem! E que faria eu com todos esses milhões?...
– Pois bem! Estaria a coberto de qualquer eventualidade. E, como um dia terá, por certo, de se aposentar, então, poderia escolher uma pequena povoação no litoral…
– Entendo! E, aí, poderia, por exemplo, visitar os meus amigos, fazer a sesta com a minha esposa, pescar um pouco, brincar com os meus filhotes, e, à noite, ir até à cidade divertir-me com os meus amigos, conversar e beber um copo, não é?...
– Exacto! Vejo que é um homem astuto…
– Mas para quê tanto trabalho, caro senhor, se já posso usufruir de tudo isto, não daqui a 10 ou 15 anos, mas neste preciso instante? E, se quiser saber, com uma grande vantagem…
– Diga-ma… se a encontrar!
– É que por essa altura, já não poderia brincar com os meus filhos, como hoje faço: eles estão a crescer…


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