terça-feira, 14 de junho de 2011

Almas Gémeas


«(...)As almas gémeas quase nunca se encontram, mas, quando se encontram, abraçam-se. Naqueles momentos em que alguém diz uma coisa, que nunca ouvimos, mas reconhecemos não sei de onde. E em que mergulhamos sem querer, como se estivéssemos a visitar uma verdade que desconfiávamos existir, de onde desconfiamos ter vindo, mas aonde não tínhamos conseguido voltar.
O coração sente-se. A alma pressente-se. O coração anda aos saltos dentro do peito, a soluçar como um doido, tão óbvio que chega a chatear. Mas a alma é uma rocha branca onde estão riscados os sinais indeléveis da nossa existência. (...)

Gémea não é igual. É parecida. Não é um espelho. É uma janela. Não é um reflexo. É uma refracção. (...)
O desejo de encontrar uma alma gémea não é o desejo de reafirmarmos a unicidade da nossa existência através de outro que é igual a nós. É precisamente o contrário. É poder descansar dessa demanda. No fundo, todos nós duvidamos que tenhamos uma alma. Senão não falávamos tanto dela.

Uma alma gémea é a prova que não estamos sozinhos. (...)
O estado normal de duas almas gémeas é o silêncio. Não é o "não ser preciso falar" - é outra foma de falar, que consiste numa alma descansar na outra. Não é a paz dos amantes nem a cumplicidade muda dos amigos. Não precisa de amor nem de amizade para se entender. As almas acharam-se. Não têm passado. Não se esforçaram. Estão. É essa a maior paz do mundo. Como é que um ninho pode ser ninho doutro ninho? Duas almas gémeas podem ser.

Como é que se reconhece a alma gémea? No abraço. (...) Quando duas almas gémeas se abraçam, sente-se o alívio imenso de não ter de viver. Não há necessidade, nem desejo, nem pensamento. A sensação é de sermos uma alma no ar que reencontrou a sua casa, que voltou finalmente ao seu lugar, como se o outro corpo fosse o nosso que perdêramos desde a nascença. (...)

As almas gémeas revelam-se uma à outra. Não são iguais. Mas revelam-se de forma igual. Como se tivesse surgido, de repente, uma língua que só os dois conseguissem falar. (...)

Toda a angústia do eu se dissipa. É-se inteira e naturalmente aceite. Sem perguntas. Sem condições. Sem promessas. E mergulha-se no outro como se já não fosse preciso existirmos.»

Miguel Esteves Cardoso

1 comentário:

  1. Uma vez li um livro de Alan Kardec, sobre a vida espiritual, "O livro dos Espíritos".
    E lá ele diz:
    “Não existe união particular e fatal entre duas almas.” “A teoria das metades eternas (almas gêmeas) é apenas uma figura que representa a união de dois espíritos simpáticos.”,“é preciso rejeitar essa idéia de dois espíritos criados uma para o outro.”

    Espíritos simpáticos são aqueles que estão num mesmo grau de elevação e quando um deixa de evoluir, naturalmente se separam. Só se reencontrando quando estiverem novamente no mesmo grau de evolução.

    Eu gostei disso! Precisamos aprender a ser inteiros. A idéia de alma gêmea imprime na mente a crença de que precisamos do outro para ser completos e já somos completos em nós mesmos. Não é a sensação de incompletude que nos faz amar, isso é coisa de “alma pobre”, é a infinita capacidade de amar incondicionalmente que nos faz amar algo ou alguém. Não deveria ser a carência, a falta de algo que nos empurra para o encontro amoroso e sim a abundância, o excesso de afeto que temos e precisamos distribuir para nossa alegria.

    Portanto alma gêmea é uma idéia romântica que mais atrapalha que ajuda. Podemos ser “simpáticos” com muitas almas, ou seja, temos afinidades de elevação com várias almas e nos unirmos e separarmos de acordo com esse grau de elevação.

    Não existe uma só pessoa com que você combine e que fique enlaçado para sempre. Esse pensamento é fruto do medo e da ignorância. E não é amor. Onde há prisão e medo, o amor não habita.

    É apenas uma outra forma de ver a coisa...um bocadinho menos romântica...

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