segunda-feira, 18 de abril de 2022

Ressurreição







 Porque a forma das coisas lhe fugia, 
O poeta deitou-se e teve sono. 
Mais nenhuma ilusão lhe apetecia, 
Mais nenhum coração era seu dono. 

Cada fruto maduro apodrecia; 
Cada ninho morria de abandono; 
Nada lutava e nada resistia, 
Porque na cor de tudo havia Outono. 

Só a razão da vida via mais: 
Terra, sementes, caules, animais, 
Descansavam apenas um momento. 

E o vencido poeta despertou 
Vivo como a certeza de um rebento 
Na seiva do poema que sonhou. 


Miguel Torga
in, "Libertação"




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