sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Ana Luísa Amaral





Biografia(curtíssima)

Ah, quando eu escrevia
de beijos que não tinha
e cebolas em quase perfeição!

Os beijos que eu não tinha:
subentendidos, debaixo
das cebolas

(mas hoje penso
que se não fossem
os beijos que eu não tinha,
não havia poema)

Depois, quando os já tinha,
de vez em quando
cumpria uma cebola:

pérola rara, diamante
em sangue e riso,
desentendido de razão

Agora, sem contar:
beijo ou cebolas?

O que eu não tenho
(ou tudo): diário
surdo e cego:

vestidos por tirar,
camadas por cumprir:

e mais:
imperfeição


Ana Luísa Amaral 
in, Inversos


"Sempre achei que o texto tem a ver com a vida. O que existe é uma espécie de deflexão. Como com um lápis dentro de água: não é reflectido, é deflectido. O que fica da vida, do mundo, é um rasto. Mas esse traço está lá mais ou menos fingido. A mão que escreve tem um braço, esse braço tem um corpo, esse corpo pertence a alguém. Esse alguém vive, ama, odeia, tem sentimentos, e é do seu tempo. Desse poema, não posso escamotear a minha própria vida. Estou a arranjar uma maneira inteligente de evitar entrar pela minha vida, falando de beijos e cebolas…os beijos são reais, e encaminham-me para uma dimensão pessoal, de relação amorosa, de que não queria falar. Que não interessa muito, ou não interessa nada.

“… armários e cebolas perturbantes”

As cebolas são as várias camadas de que o mundo é feito, as várias camadas de que uma pessoa se compõe, os diferentes sentidos de que um poema se pode revestir.

Esse poema elabora sobre esta ideia: quanto menos vida mais poesia.
“Ah, quando eu escrevia de beijos que não tinha, e cebolas em quase perfeição!”.

A cozinha apoucava as mulheres porque significava o espaço doméstico e a exclusão de outros espaços, do espaço público, do espaço político. O que apoucava as mulheres não era serem chefes de cozinha (normalmente, esses eram os homens); era serem as que proviam o bem estar da família através do cozinhado.




Creio que é o Maiakovski que diz que a literatura e a felicidade não se coadunam. Quando se está num estado de paixão assolapada, devastadora, a poesia surge como um excesso, uma excrescência. Não é talvez tão necessária. Acho que a poesia preenche falhas. Não significa que escreva em profunda tristeza, angústia, desânimo.
Alguns poemas são profundamente tristes. Outros, profundamente irónicos. Outros, eufóricos. Essa relação entre poema e vida realmente faz-se, mas em certa medida a poesia pode funcionar como um substituto para a vida. Embora isto pareça uma contradição em termos – se a pessoa estiver morta, não escreve. Mas pode funcionar como um catalisador.



É como a subversão, que é, para mim, mais interessante do que a transgressão.
Trabalhei sobre esses conceitos quando escrevi a minha tese de doutoramento sobre Emily Dickinson. No meu tempo, os doutoramentos eram relações de sete anos. Um casamento.
Continuo profundamente fascinada com Dickinson.
Joga com as questões do ser e do parecer.
O subterrâneo é fundamental na poesia de Dickinson.
Dickinson obrigou-me a pensar e a percepcionar-me de uma outra forma.
A subversão começou a assumir uma importância cada vez maior em mim.
As suas indisciplinas, e são muitas, não são feitas via transgressão. Não rompe, não fractura abertamente. Subverte. A subversão é construir uma versão sob a versão existente e fazer com que essa versão existente se esboroe. É a implosão, é a explosão dentro. Essa ideia de corrosão faz-se sentido. Depois, há um lado no qual não reparo muito, mas para que as pessoas à minha volta me chamam a atenção, e que interpreto como distracção. Uma falta de atenção a pormenores que passam pela aparência.
Subverter seria estacionar num lugar onde fosse permitido, mas depois… pôr uma bomba. Os rastilhos e as bombas podem estar sob a aparência menos ameaçadora. Os vulcões de Dickinson não são vulcões a explodir. São vulcões que estão sempre num estado latente de ameaça. Isso é algo que me leva para outro caminho, e depois disso nunca mais fui a mesma.



“Não me chega o saber de experiência feito, e o outro, o dos livros, sobra-me.” Um livro pode ser… Creio que era o Napoleão que dizia: “Tenho mais medo de um jornal do que de cem baionetas”. Um livro pode levar-nos a sítios desconhecidos e pode ser uma bomba. Pode ser um rastilho para as coisas certas e estáveis do mundo.
 “… que assim desarranjaste a minha vida”.
A ideia de desarranjo está em todos os meus livros.
Desarranjo, caos, imperfeição. Palavras constantes.
O desarranjo pode ser a força motriz. Essa espécie de revolta por dentro, essa rebeldia… O desafiar. O recusar o dominante. Dickinson e o feminismo deram-me isso. Quando falo de feminismo, não falo de homens contra mulheres, não digo que os homens são uns algozes e as mulheres umas desgraçadas. Não tem nada a ver com isto. É uma questão de direitos humanos. Não há nenhuma razão científica ou de bom senso pela qual um ser humano deva ser discriminado pelo facto de ter nascido com uma determinada configuração anatómica. Que a discriminação existe, existe. Estas problemáticas levaram-me a outras e foram-me radicalizando. Se fizer uma retrospectiva, percebo que estou cada vez mais radical. Mais intolerante. Mais impaciente.


Há nos meus poemas alusão a criaturas mitológicas e a animais.
Harpias, dragões, panteras.
Gosto de tigres. Gosto mais dos tigres do que dos leões. Os leões são criaturas mais sérias. Pertencem à categoria dominante. O tigre é mais selvagem, está em extinção.


TESTAMENTO


Vou partir de avião 
E o medo das alturas misturado comigo 
Faz-me tomar calmantes 
E ter sonhos confusos 

Se eu morrer 
Quero que a minha filha não se esqueça de mim 
Que alguém lhe cante mesmo com voz desafinada 
E que lhe ofereçam fantasia 
Mais que um horário certo 
Ou uma cama bem feita 

Dêem-lhe amor e ver 
Dentro das coisas 
Sonhar com sóis azuis e céus brilhantes 
Em vez de lhe ensinarem contas de somar 
E a descascar batatas 

Preparem minha filha para a vida 
Se eu morrer de avião 
E ficar despegada do meu corpo 
E for átomo livre lá no céu 

Que se lembre de mim 
A minha filha 
E mais tarde que diga à sua filha 
Que eu voei lá no céu 
E fui contentamento deslumbrado 
Ao ver na sua casa as contas de somar erradas 
E as batatas no saco esquecidas 
E íntegras. 


Ana Luísa Amaral


Neste poema, Testamento,  acabo a falar de batatas íntegras.
Não há batatas íntegras, há pessoas íntegras.
Há dois conceitos que vemos desbaratados ou espezinhados: a integridade e a bondade.
A palavra bondade é uma palavra que já não se usa. Parece que é uma palavra antiga, demodé. Fala-se de pessoas muito inteligentes, valoriza-se a inteligência. Mas uma pessoa boa é rara. A bondade é também a solidariedade para com o outro. É a “com-paixão”. É a simpatia no sentido “sentir com”. Dos nossos políticos, está muito arredada.
A integridade também parece um valor esquecido.
“… as batatas no saco esquecidas e íntegras”. No resto do poema escrevo: “… em vez de lhe ensinarem contas de somar e a descascar batatas”. E as horas, “o horário certo”.
Falo das competências para a vida. Competência de género (a que sabe descascar batatas) e competência social (a que cumpre as horas).
Em vez dessas duas competências, tentei passar à minha filha a importância do íntegro. A minha filha aparece na minha poesia porque é a pessoa mais importante da minha vida.
Eu não ia falar da relação mãe-filha. Pode haver homens tão ou mais cuidadores do que as mulheres, e quando um juiz dá a custódia de uma criança a uma mãe partindo do princípio de que ela é uma melhor cuidadora do que o pai, isto significa um peso social enorme, para um homem como para uma mulher. A relação com os filhos é uma relação para a vida.


O essencial são as pessoas. Sabem o que acho? Este tempo que vivemos, é tão curto… E não temos outro sítio para onde ir, só temos este planeta. Porque não tentar viver o melhor possível? O que conta, de facto, são os laços que nos aproximam. Se soubéssemos cuidar da nossa espécie já era bem bom. Faz-me impressão a ambição desmedida, o querer possuir muita coisa. Outra palavra que a minha filha me ouve dizer muitas vezes: impunidade. Como é possível? A violência é uma coisa contra a qual me revolto. E já não subverto, mas transgrido. Devemos falar, falar sem medo.


A peça Próspero Morreu, inspirada na A Tempestade de Shakespeare:
A Tempestade é para mim a peça mais poética de Shakespeare.
As figuras de Próspero e Caliban são usadas para interpretar as relações de poder que estruturam o chamado mundo desenvolvido e o mundo subdesenvolvido.Próspero é o colonizador, Caliban é o colonizado; é dissimulado, mas a sua subserviência é uma estratégia para a sobrevivência.
“Mas sabe, minha filha do risco que é amar (…) E a vida é o assombro que assombra e amedronta”.
Há um outro verso de que gosto: “Sem liberdade, é o poder um monstro de braços bifurcados, onde se aloja lei sem pensamento e se torna viscoso o coração”.
É uma peça sobre como podem liberdade e amor conviver.



Ulisses é o que empreende a viagem. E Penélope fica a fazer e refazer a sua teia, à espera.
Mas Penélope escolheu isso. Esperar e fazer a teia é a sua opção. A possibilidade de escolha nunca pode ser uma coisa negativa. A liberdade não pode nunca ser uma coisa negativa. O que me assusta é um discurso que privilegia a escolha e uma prática que a desmente e onde impera o medo, o receio. O discurso da cautela faz-me impressão. Não sei ser cautelosa. Não sei ter cuidado com o que se deve dizer. Mas se não me sei defender muito bem, ainda bem. As pessoas que se sabem defender muito…
As das horas certas de que falo no meu verso.
São pessoas que não arriscam. E é sempre um risco tudo aquilo que fazemos."


Ana Luísa Amaral






ANIVERSÁRIO

Sentei-me com um copo em restos de
champanhe a olhar o nada.
Entre crianças e adultos sérios
Tive trinta em casa.
Será comovedor os quatro anos
e a festa colorida
as velas mal sopradas entre um rissol
no chão e os parabéns:
quatro anos de vida.

Serão comovedores os sumos de
laranja concentrados (proporções
por defeito) e os gostos tão
diversos, o bolo de ananás,
os pés inchados.

Será soberbamente comovente
toda a gente cantando,
o mau comportamento dos adultos
conversas-gelatinas e os anos
só pretexto.

Mas eu gostei. E contra mim gostei
mesmo no resto:
este prazer pequeno do silêncio
um sapato apertando descalçado
guardanapo e rissol por arrumar
no chão e um copo

olhando o nada
em restos de champanhe


Este poema, é um bom exemplo da forte influência de Emily Dickinson que a própria Ana Luísa Amaral descreveu assim:

“A sua linguagem poética, ao mesmo tempo metafórica e elíptica, sincopada e oblíqua, sem muitas vezes concordância de formas verbais, nem respeito por plurais ou regras de gramática, deixou espaço a que dela se acentuasse o excessivo ofício com a gramática ou se falasse até de uma gramática própria. O seu uso recorrente de travessões, que fragmentam e questionam o verso, permitiu que deles se dissesse serem formas de dispersão da unidade discursiva, ou, sexualizados, uma espécie de hímen-hifen. Tudo isto me fascina em Emily Dickinson. E mais ainda: o ter falado de tudo, misturando Deus com ladrões, aranhas com vassouras, alma com vulcões, sonho com abelhas, gerânios, piscos e trevos; ou o ter examinado a morte e a vida, explorado o amor e o inferno, o êxtase, a mais pura alegria, o sofrimento, a misteriosa energia das coisas todas do universo. Ainda o tê-lo feito numa voz de mulher, aparentemente submissa, de facto poderosa”. 


Na poesia de Amaral o sujeito filosófico dá lugar ao poético, sem que deixe de haver filosofia no estado de coisas, no puzzle enquanto objecto completo, mais do que em cada verso. Em certos poemas, vê-se claramente a personalidade actual de quem escreve como conclusão de um passado de peripécias, de diversão, desejo, transgressões e uma moral própria que é denunciada por este presente escrito e bem resolvido consigo mesmo.


COISAS DE LUZ ANTIGAS

Aquele namorado que tinha
um nome bom: há quanto tempo foi?
A vida resvalante como gelo
e aquele namorado de nome bom
e férias, ficou perdido em luz,
mais de vinte anos.

Deu-me uma vez a mão
um beijo resvalante à hora de deitar
e na pensão. Mas tinha um nome bom.
falava de cinema e calçava de azul
e um bigode curtinho,
que escorregou aceso como gelo
no centro da pensão.

Rasguei as cartas dele
há quinze anos, em dia de gavetas
e de luz, e nem fotografia me ficou
de desarrumação. Mas tinha um nome bom,
falava de cinema e calçava de azul
e resvalou-me quente como gelo
à hora de deitar:

um namorado sem falar
de amor

(que a timidez maior
e o quarto dos meus pais
nessa pensão
no mesmo corredor)



Alguns poemas têm a característica do retrato do vazio com o consequente preenchimento por nada mais do que o que se vê, sem metáforas, com o discurso puro que não procura a transcendência. Mas este vazio, que chega a ser chocante e visualmente antipoético, acaba por ser, no universo total da leitura, um belo poema. O objecto pode ser encontrado de diversas formas, até com o minimalismo do verso único, e, neste caso, com um todo em que o quotidiano é uma lista de coisas do mais comum que há, uma lista que perpassa o passado e o presente e impõe uma nostalgia para o futuro.

Como neste poema, Lugares Comuns do livro Coisas de Partir:


LUGARES COMUNS

Entrei em Londres
num café manhoso (não é só entre nós
que há cafés manhosos, os ingleses também,
e eles até tiveram mais coisas, agora
é só a Escócia e parte da Irlanda e aquelas
ilhotazitas, mais adiante)

Entrei em Londres
num café manhoso, pior ainda que um nosso bar
de praia (isto é só para quem não sabe
fazer uma pequena ideia do que eles por lá têm), era
mesmo muito manhoso,
não é que fosse mal intencionado, era manhoso
na nossa gíria, muito cheio de tapumes e de cozinha
suja. Muito rasca.

Claro que os meus preconceitos todos
de mulher me vieram ao de cima, porque o café
só tinha homens a comer bacon e ovos e tomate
(se fosse em Portugal era sandes de queijo),
mas pensei: Estou em Londres, estou
sozinha, quero lá saber dos homens, os ingleses
até nem se metem como os nossos,
e por aí fora...

E lá entrei no café manhoso, de árvore
de plástico ao canto.
Foi só depois de entrar que vi uma mulher
sentada a ler uma coisa qualquer. E senti-me
mais forte, não sei porquê, mas senti-me mais forte.
Era uma tribo de vinte e três homens e ela sozinha e
depois eu

Lá pedi o café, que não era nada mau
para café manhoso como aquele e o homem
que me serviu disse: There you are, love.
Apeteceu-me responder: I’m not your bloody love ou
Go to hell ou qualquer coisa assim, mas depois
pensei: Já lhes está tão entranhado
nas culturas e a intenção não era má, e também
vou-me embora daqui a pouco, tenho avião
quero lá saber

E paguei o café, que não era nada mau,
e fiquei um bocado assim a olhar à minha volta
a ver a tribo toda a comer ovos e presunto
e depois vi as horas e pensei que o táxi
estava a chegar e eu tinha que sair.
E quando me ia levantar, a mulher sorriu
Como quem diz: That’s it

e olhou assim à sua volta para o presunto
e os ovos e os homens todos a comer
e eu senti-me mais forte, não sei porquê,
mas senti-me mais forte

e pensei que afinal não interessa Londres ou nós,
que em toda a parte
as mesmas coisas são



E este Músicas (do livro Minha Senhora de Quê) com um tom diferente. Há nestes poemas um lado propositadamente incompleto, aberto, da ideia de ir para um café, passar a tarde a escrever com uma música de fundo, reparando nas conveniências, nas pessoas que passam, tirando fotografias desses rostos.


MÚSICAS

Desculpo-me dos outros com o sono da minha filha.
E deito-me a seu lado,
a cabeça em partilha de almofada.

Os sons dos outros lá fora em sinfonia
são violinos agudos bem tocados.
Eu é que me desfaço dos sons deles
e me trabalho noutros sons.

Bartók em relação ao resto.

A minha filha adormecida.
Subitamente sonho-a não em desencontro como eu
das coisas e dos sons, orgulhoso
e dorido Bartók.

Mas nunca como eles
bem tocada
por violinos certos.


Nos últimos poemas a autora mudou um pouco, a formulação dos temas gerou um lado menos concreto (no sentido de explícito) e mais móvel, dinâmico, embora com perda do humor subtil que era característico de tempos anteriores.


UMA COISA SEM TÍTULO E APÓCRIFA

Um Moisés
decepado
segurando nos dentes
bordão curto demais
para nascente

Um arbusto tão curto
que o seu fumo crescesse
para logo morrer
e nunca mais

Luminosas partículas de pó,
Abraão sem sequer
a dádiva de
sonho

Espaços de projecção como em cinema,
partículas de pó iluminadas:
o invisível pó que se respira em vão
em desertos de fé,
salas vazias

E uma coisa sem título
e apócrifa
nem sequer hora sexta
mas uma
(tão prosaica)
da manhã


*

ENCENAÇÕES E QUASE VOOS

Uma luz construída
ilumina
esses santos,
cada um sem o halo,
mas pombo circundante
na cabeça

São quatro santos no cimo
da igreja,
e cada um dos pombos escolheu
a face mais marcada,
os caracóis de pedra
que fossem mais macios

Talvez não sejam santos,
mas apóstolos, tão de barroco,
e o seu gosto a vestir:
um excesso de desvio
quase pecado

Apóstolos ou santos,
os pombos circundantes na cabeça
são halos delicados
que, julgando-se em céu,
vêem quase metade da cidade,
a meio: o rio e os telhados
de casas

Fingindo-se de mão a abençoar,
são adereço de um teatro
inteiro:
caos encenado
ou um perfil egípcio

E os caracóis solenes e sombrios
convidam ao pecado
e convocam-me aqui: noite de verão,
a liquidez do olhar:

Eu não poder,
em pedra,

abrir as asas




Ana Luísa Amaral tem tido um percurso muito coerente na poesia portuguesa, marcando o seu espaço com mérito. Há uma unanimidade na apreciação da sua obra. A sua voz feminina localiza um realismo humano, estético, e com existências implícitas, umas dentro de outras, anulando-se ou adicionando-se, sempre formando um todo análogo à vida.



CONSTELAÇÕES

 Usamos todos a ilusão
de fabricar a vida:
histórias, constelações
de sons e gestos

Usamos todos a suprema glória
do amor: por generosidade
ou fantasia, ou nada, que de nada se fazem
universos

Usamos todos mil chapéus de bicos
mal recortados e de encontro
ao sol:
o nosso mais perfeito em franja e bico
e um arremedo tal e seiscentista
que ofuscando-se: o sol

Usamos todos esta condição
de pó de vento, ou de rio
sem pé: único dom de fabricar o tempo
em raiz de palmeira
ou de cipreste.











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