domingo, 18 de dezembro de 2011

Avesso




Olá sombra!

Sim, o sorriso é forçado, talvez devesse virá-lo ao contrário, ser 'brutalmente honesta' assim o exige, o avesso, para já, não é nem generoso nem complacente e dói que se farta..

Olá sombra!

Ontem, sem ser por acaso, dei de caras com a 'sombra humana' e só não foi um choque brutal porque tu e eu, ultimamente, até temos 'privado' bastante, nem sempre nas condições mais honestas, admito, já que não te dou o espaço de que precisas para, literalmente, tomares conta de mim, mas vai sendo à medida do que vou sendo capaz... gostei particularmente de 'os monstros dentro de mim', ou melhor, se quiser ser de novo brutalmente honesta comigo e contigo, uma unidade que teimo em ver separada, não gostei assim tanto e comecei por negar que, também dentro de mim, existissem monstros tão feios.
Mas a verdade é o que é e, um por um, lá os fui encarando.
Alguns  provocam-me ainda um medo de morte, com outros estou já mais familiarizada, descobri um ao outro que  continuo a negar, mesmo que olhem de frente para mim e me digam 'nós somos teus, vê lá se nos amas'.

E é por isso que hoje vim aqui encarar-te mais uma vez, e sim, à vista de todos, porque nisso já me conheces e sabes  como me tenho obrigado a ser transparente, mesmo quando é das sombras que falo.
A razão pela qual gostei tanto do Emídio  foi por ele nos mostrar, com uma honestidade brutal e uma transparência que faz por livrar-se das máscaras, como é que, a pouco e pouco, vamos podendo gerir esta nossa dualidade.
Estou cansada daqueles 'gurus' muito iluminados que só falam da luz e da luz e da luz e que nos fazem crer que debelaram as sombras e agora vivem num permanente 'nirvana' dourado.
Mas também já consigo entender que eles me cansam apenas porque, também eu, me faço passar por iluminada, 'vendendo' nirvanas aos meus semelhantes e provavelmente fazendo com que fiquem cansados.

Ah, sombra, isto de sermos duais e nos amarmos a sê-lo tem mesmo tanto que se lhe diga!
E eu cá não sei se um dia há um clic!
E os dois lados se integram em nós como se tivesse havido magia, ou se é dia a dia e passo a passo que vamos andando, um dia para a frente, um passo para trás, outro dia e mais um bocado, outro passo e retrocedemos...
O que sei, o que sinto, é que este passo a caminho de ti me traz, afinal, muita paz interior.
Quando mergulho nos teus braços, quando me sento no escuro do teu peito, quando me entrego à voracidade com que, também tu, queres ser amada... tudo se aquieta, tudo se acalma, tudo se expande.
Nem sequer dou mais a desculpa de que esta é a humanidade que tenho, como quem se desculpa por ser tantas vezes tão imperfeita, mas dou por mim a agradecer não brincar mais aos deuses, a não ser quando me vejo capaz de voltar a brincar como as crianças, e então tanto faz se sou o monstro, o humano ou o deus porque a brincadeira é sempre e só uma brincadeira e mais nada.

O avesso, afinal, não é o mundo virado de pernas para o ar e o esforço que tantas vezes fazemos para o endireitar é precisamente o que faz com que não se endireite.

Ontem, foi tão grande o impacto que a sombra humana do Emídio teve na minha sombra, - isto de sermos todos o mesmo tem destas coisas - que lhe escrevi um email.
E agora mesmo, enquanto escrevia este texto, ele respondeu-me.
E julgo que ele não se importa que eu transcreva uma parte do que ele me disse.
E disse ele:
"A vida é uma aventura deliciosa.
Quando abraço a minha sombra e o meu ego, quando deixa de haver luta dentro de mim, quando deixo de precisar da aprovação dos outros. Quando te amo sem esperar amor de volta.
Sabe bem amar. Estou viciado.
Descubro que sou totalmente egoísta: amo tudo porque me faz sentir tão bem comigo mesmo. Delicioso."

E então é assim, sombra, nós só temos de facto o que é aqui e agora e, aqui e agora, prometo que será um domingo delicioso para ambas.
Abraço-te e hoje comprometo-me a amar-te como mereces.
A ti e aos monstros que somos, a mim e à luz da luz que me faz ser transparente.

Obrigada por fazeres parte de mim!
E, agora sim, o sorriso saiu verdadeiro...


Inês de Barros Baptista

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