sexta-feira, 30 de abril de 2021

Memoriam Memoriae


Esat Ferruh Gürsel





Da nem sempre sublime variedade do Mundo, 
da não rara amargura, 
do remorso, 
de tudo, 

dia a dia te nutres, dia a dia te envolves! 

Dia a dia te expandes - tão grande que és o vulto 
sobreposto por vezes à linha do horizonte...
Dia a dia no dia te enforcamos, 
                                                    e à noite 
apareces de novo no trópico do sono. 

Dia a dia, no vento. Dia a dia, no tronco. 

Tens na carne incorpórea, de memória, mil corpos, 
e concentras nos olhos, aglutinantes, glaucos 
- de um verde que não é de esperança nem de escarro, 
mas de lago, de lodo, de limo delinquente -, 
a saudade e o desprezo do Mundo que te foge, 

dia a dia no mármore, dia a dia no vento.


David Mourão-Ferreira
in, ‘Memoriam Memoriae’






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