quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Efémeros em palavras efémeras


Kasia Derwinska




1.
Vocês que passam com palavras efémeras,
levem seus nomes e vão embora
tirem suas horas do nosso tempo e vão embora
roubem à vontade do azul do mar e das areias da lembrança
tirem fotos à vontade, e assim vão saber
que não hão de saber
como uma pedra da nossa terra constrói o teto do céu.

2.
Vocês que passam com palavras efémeras
de vocês vem espada, de nós vem nosso sangue
de vocês vêm fogo e aço, de nós vem nossa carne
de vocês vem outro tanque, de nós vem pedra
de vocês vem a bomba de gás, de nós vem chuva.
Um mesmo céu e um mesmo ar nos cobre
peguem seu quinhão do nosso sangue, mas vão embora
entrem no jantar dançante, mas vão embora
temos que zelar pela rosa dos mártires
temos que viver como a gente quer!

3.
Vocês que passam com palavras efémeras,
como a poeira amarga, passem onde quiserem, mas
não passem entre nós como insetos com asas
temos o que fazer na nossa terra
temos trigo a criar e regar com o orvalho do nosso corpo
temos o que a vocês aqui não agrada:
temos pedra... e perdiz!
Levem o passado, se quiserem, ao mercado das quinquilharias
devolvam, se quiserem, o esqueleto do passarinho ao prato de porcelana.
Temos o que não lhes agrada: temos o futuro
temos o que fazer na nossa terra.

4.
Vocês que passam com palavras efémeras,
soquem seus dramas num buraco abandonado e vão embora
voltem atrás o ponteiro do tempo até o bezerro sagrado
ou até o disparo ritmado do revólver!
Temos o que a vocês aqui não agrada, então vão embora
temos o que por dentro vocês não têm:
uma pátria que jorra um povo que jorra uma pátria
que combina com esquecer e lembrar.
Vocês que passam com palavras efêmeras,
é hora de irem embora
de morarem onde quiserem, mas não entre nós
é hora de irem embora
de morrerem onde quiserem, mas não entre nós
temos o que fazer na nossa terra
aqui temos o passado
temos a primeira voz de vida
temos o presente, o presente e o que está por vir
temos o mundo aqui e temos a outra vida
saiam da nossa terra, do nosso deserto, do nosso mar
saiam do nosso trigo, do nosso sal, da nossa ferida
de tudo
saiam das lembranças da nossa memória,
vocês que passam com palavras efémeras.


Mahmoud Darwish




Mahmud Darwish, um dos poetas mais importantes que deram voz à causa palestina no mundo e contribuíram para a construção da identidade da poesia árabe moderna.
Nasceu em 1941 na aldeia palestina de Al-Birweh, destruída por Israel em 1948 para a construção em seu lugar da aldeia agrícola de Ahihud.
Trabalhou no Jornal Al-Etihad e na revista Al-Jadid, que pertenciam ao partido comunista na cidade de Haifa. Neste período começou a escrever poesias e ficou conhecido na Palestina como “um poeta da resistência”. Sua poesia irritava os israelenses, por isso a polícia israelense passou a cercar qualquer aldeia que lhe organizasse uma noite de poesia.
Darwish sofreu intensa perseguição. Foi preso três vezes pelos israelenses (1961, 1965, 1967), antes de ser submetido à prisão domiciliar devido às suas declarações e atividades políticas.
Criticou os combates entre os palestinos no poema, "Você agora é outro", publicado em junho de 2007.
Mahmoud Darwish dedicou muitos poemas à causa palestina, a resistência e ao seu povo refugiado e injustiçado. Mesmo tendo uma vida difícil ao lado dos outros palestinos, conseguiu escrever sobre o amor, a esperança, o ser humano e a vida. 
Darwish faleceu em 2008, em Houston, Estados Unidos, com 67 anos.





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