terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Feliz Natal!



Antigamente, não havia senão noite.
E Deus pastoreava as estrelas no céu.
Quando lhes dava mais alimento elas engordavam e a sua pança abarrotava de luz.
Nesse tempo, todas as estrelas comiam, todas luziam de igual alegria.
Os dias ainda não haviam nascido e, por isso, o Tempo caminhava com uma perna só.
E tudo era tão lento no infinito firmamento!

Até que, no rebanho do pastor, nasceu uma estrela com ganância de ser maior que todas as outras.
Essa estrela chamava-se Sol e cedo se apropriou dos pastos celestiais, expulsando para longe as outras estrelas que começaram a definhar.

Pela primeira vez houve estrelas que penaram, e magrinhas, foram engolidas pelo escuro. Mais e mais o Sol ostentava grandeza, vaidoso dos seus domínios e do seu nome tão masculino.
Ele, então, se intitulou patrão de todos os astros, assumindo arrogâncias de centro do Universo.
Não tardou a proclamar que ele é que tinha criado Deus.
O que sucedeu, na verdade, é que, com o Sol, assim soberano e imenso, tinha nascido o Dia.

A Noite só se atrevia a aproximar-se quando o Sol, já cansado, se ia deitar.

Com o Dia, os homens esqueceram-se dos tempos infinitos em que as estrelas brilhavam de igual felicidade. 
E esqueceram a lição da Noite que sempre tinha sido rainha sem nunca ter que reinar.

Mia Couto
in, "A confissão da Leoa"


Dica de Natal: o último de Mia Couto é um maravilhoso presente, para mulheres, essencialmente...
As delicadas vidas das mulheres nesta narrativa plena de poéticas...

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