quarta-feira, 11 de março de 2020

O encantador de serpentes





Quando na praça, ondeando, o encantador
toca a flauta que embala e entorpece,
às vezes ele atinge ao seu redor
alguém, em meio à turba, e o adormece,

e o faz entrar no círculo da flauta,
que quer e quer e quer e vai e volta,
até que emerja a cabeça alta
do réptil, que do seu cesto se solta,

alternando tontura e lassidão,
o que expande e tensiona e o que represa —;
basta um olhar daquele indiano, então,
para infundir no outro uma estranheza

que te mata. Como se de repente
o céu caísse. De súbito estrias
racham-te o rosto. Há especiarias
na memória boreal e a tua mente

de nada serve. Inútil, a magia.
O sol fermenta, vêm febres ferventes,
os raios têm maléfica alegria
e o veneno cintila nas serpentes.


Rainer Maria Rilke





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