tal como a chuva que hoje cai e nos molha na calçada a face,
nós olhando triste uma saudade imensa
num corpo de mulher metamorfoseada.
Sou demasiado são para me esquecer
do tempo apaixonado que vivi nos teus braços
e bebo no teu um coração meu
adormecido no mar do meu cansaço
ou no rio das minhas secas lágrimas.
Tardará muito, se é que as horas contam,
ver-te, de novo, perto de mim, longe,
mas eu espero, sou paciente e, no meu canhenho, aponto,
um dia a menos, o da tua chegada.
E assim me fico, rente ao horizonte,
abrigado da chuva numa cabine telefónica,
e ligo para ti - que número? - ninguém responde
do oceano que avança e retrai colinas,
o vulto de um navio, tu na amurada
acenando um lenço, ó minha pomba branca!...
Como se tempestade houvesse e um naufrágio de chuva
- as vidraças escorrem, as árvores liquefazem-se... -
escurecendo os teus cabelos,
ou, se preferes, a minha boca neles
carregada de ilhas, de nocturnos perfumes
que ateiam lumes, ó minha idolatrada,
na minh' alma inquieta um outro bater d' asas
ou num jardim um leito de flores!...
Ruy Cinatti
in, Obra Poética
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