terça-feira, 24 de julho de 2018

REGRESSO ETERNO





Altos silêncios da noite e os olhos perdidos, 
Submersos na escuridão das árvores 
Como na alma o rumor de um regato, 
Insistente e melódico, 
Serpeando entre pedras o fulgor de uma ideia, 
Quase emoção; 
E folhas que caem e distraem 
O sentido interior 
Na natureza calma e definida 
Pela vivência dum corpo em cuja essência 
A terra inteira vibra 
E a noite de estrelas premedita. 

A noite! Se fosse noite ... 
Mas os meus passos soam e não param, 
Mesmo parados pelo pensamento, 
Pelo terror que não acaba e perverte os sentidos 
A esquina do acaso; 
Outros mundos se somem, 
Outros no ar luzes refletem sem origem. 
É por eles que os meus passos não param. 
E é por eles que o mistério se incendeia. 

Tudo é tangível, luminoso e vago 
Na orla que se afasta e a ilha dobra 
Em balas de precário sonho... 
Tudo é possível porque à vida dura 
E a noite se desfaz 
Em altos silêncios puros. 
Mas nada impede o renascer da imagem, 
A infância perdida, reavida, 
Nuns olhos vagabundos debruçados, 
Junto a um regato que sem cessar murmura. 


Ruy Cinatti 
 in, Nós Não Somos Deste Mundo






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