Qual é a tua droga?
Já foste viciada em droga?
Eu já.
De uma forma tão doentia que tudo na minha vida deixou de fazer sentido diante dela. Minha alegria, minha tristeza, meu tempo, minhas decisões, meus anseios, tudo no meu dia dependia dela. Se recebesse a minha dose diária tudo ficava bem mas se me faltasse, me faltava o chão, o foco, a direcção, a respiração, a vontade de acordar. Sem ela, me faltava eu. E tu que respondeste sim, sabes bem do que eu estou a falar. Ou talvez não. Vai depender do potencial para causar dependência que a tua droga tinha. A minha tinha muito.
Tal como uma droga, o AMOR TÓXICO tem o poder de destruição e causa uma devastadora dependência no ser humano.
O meu vício tomou conta de mim de tal forma que para me manter a receber as minhas doses diárias de “alegria”, negociei valores inegociáveis, perdi os sentidos, os significados, o contaxto com os meus valores, com a minha dignidade e o meu autorrespeito.
Eu me perdi e só me encontrava nela.
Seu mecanismo de ação é bem simples:
Um belo dia és apresentada às primeiras doses que invariavelmente vão trazer-te uma sensação jamais experimentada de bem estar e alegria. A partir daí tudo se desenvolve muito rápido e passas a viver num paraíso de luz, leveza e riso, o que te vai fazer perguntar o que fizeste para merecer tanto carinho, tanta atenção, tanto….AMOR!
As sensações são tão ricas e genuínas que abandonas as tuas armas e embarcas numa viagem extraordinária e definitiva. O teu mundo a preto e branco ganha cores, renova-se e a tua cabeça começa a construir sonhos lindos sem qualquer embasamento na realidade e passas a alimentar-te e a viver exclusivamente deles e para eles.
E é quando tu estás embevecida, dependente daquela atenção e preguiçosa contigo mesma que o amor tóxico mostra as suas verdadeiras cores. É neste momento que todas as sensações boas do início se transformam. A sua face dócil assume uma face sombria e tudo o que era quente, gela; tudo que era claro, escuro; tudo o que era certeza, dúvida.
Ao experimentar um amor tóxico, todos os acessos aos teus sonhos e medos são libertados e tudo o que tiver sido aprendido sobre ti durante aquele período será usado como armas letais com o objetivo único de humilhar e demonstrar o quanto tu és fraca e dependente; com o objetivo único de te destruir.
Numa reação natural, ficas confusa e, sem entender o que mudou, lutas com todas as tuas forças para encontrar de novo na tua droga aquela beleza que pouco antes trazia para a tua vida.
E que batalha inútil tu travas!
E que desfecho estarrecedor, medonho e tenebroso!
Buscas a sua face mais linda, aquela guardada na tua memória, mas a única coisa que encontras é uma realidade horripilante, desconcertante e divorciada de tudo aquilo que um dia ela lhe proporcionou.
Num dado momento nada faz sentido e tu viras um trapo, uma pseudo pessoa, uma pedinte, uma escrava faminta enquanto ela, a tua droga, posa soberana no seu reino obscuro e solitário, e observa-te lá de cima do seu trono, de onde ora toca a tua cabeça com alguma misericórdia, ora olha para ti com desprezo e diz: “ és mesmo patética.”
Pensas em correr para longe dali, mas não encontras nem a saída, nem a força, pelo simples facto que de vez em quando, ao perceber o teu esforço para te libertares, ela vai presentear-te com uma daquelas lindas sensações do início e tu, ainda que por pouco tempo, sentir-te-ás viva.
É necessário um enorme esforço para se libertar de um vício, mas é necessário um esforço imensurável para se livrar do vício de um amor tóxico. É preciso pedir a todos os santinhos que segurem a tua mão e te conduzam para fora daquele quarto escuro e sem janelas. É necessário reconectares-te com a pessoa que tu eras antes daquilo. É preciso encarar a dura constatação de que amaste a tua droga por todas as boas sensações que ela te trouxe, mas a tua droga nunca te amou.
Drogas não amam, simplesmente causam dependência e só saem da tua vida quando estiveres morta. Saem da tua vida para entrar na vida de outra pessoa e reiniciar o ciclo.
Haverá um período longo, negro e doloroso de abstinência e será necessário lutar contra a força irresistível que te fará por vezes esquecer dos horrores, dizendo-te para te agarrares, como uma criança com medo de abandono, às boas lembranças que, dolorosamente, só existem na tua cabeça.
Sabe, porém, que vencida a abstinência brutal, é necessário lembrar que uma vez viciada, existe sempre a tendência ao vício, ela permanece e, portanto, é preciso um exercício diário em que deverás recordar constantemente a ti mesma que és um Ser Individual Completo, que a tua felicidade não se encontra em alguém ou lugar algum fora de ti mesma e que nenhuma fonte de amor é maior que a tua. Tu precisas ser a tua fonte inesgotável de AMOR PRÓPRIO.
Lucy Rocha
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