O Dalai Lama exibe uma sofisticação inesperada que lhe permite compreender os métodos e os temas da ciência, o que chega a ser surpreendente num líder espiritual.
O interesse pela ciência tem-no acompanhado toda a vida, o que o leva a dar tanta importância aos diálogos e às colaborações com os cientistas.
A sua biografia científica começa com a educação tradicional do Dalai Lama, extremamente rigorosa, num sistema sofisticado de Teologia, Metafísica, Epistemologia, Lógica, Filosofia, Artes, Poesia, Música, Teatro, entre outras.
Isto desde os 6 anos de idade, com muitas horas por dia, com uma grande quantidade de memorização, meditação, concentração, para disciplinar a mente.
Também recebeu treino intensivo em dialéctica e debate, que fazem parte do âmago da educação monástica tibetana. O desporto favorito dos monges tibetanos é o Debate.
O seu primeiro debate público foi aos 13 anos, e teve como oponentes 2 abades eruditos de dois dos maiores mosteiros do Tibete.
Aos 24 anos fez dois debates públicos durante 10 horas com os melhores 50 peritos de várias áreas de estudo, e foi avaliado por um painel de juízes rígidos e intransigentes quatro vezes em frente a grandes audiências até 20 mil espectadores. Foi o seu exame final.
O primeiro exame foi aos 16 anos para o Grau de Geshe, o equivalente tibetano a um Doutoramento em Estudos Budistas. Normalmente, estudam entre 20 a 30 anos para obterem o Grau de Geshe, mas o Dalai Lama passou neste exame apenas com 12 anos de estudo.
No final de todos os exames, foi-lhe atribuído o Grau Geshe Lharampa, o mais elevado grau académico.
Sempre foi um jovem curioso e brilhante, ansioso por obter uma educação científica.
Mas, a educação monástica não lhe dava nem um vislumbre das descobertas científicas dos últimos 1000 anos. Para proteger a sua integridade política e cultural, o Tibete fechou-se às influências estrangeiras durante séculos. E o Dalai Lama era isolado de forma a não ter contacto com pessoas que sabiam falar inglês e estavam em contacto com as escolas dirigidas por britânicos nas cidades indianas.
No entanto, algumas sementes de tecnologia moderna tinham conseguido infiltrar-se nos arredores do magestoso Palácio Potala e em Norbulinka, a residência de verão do Dalai Lama.
Algumas coisas tinham sido oferecidas ao seu predecessor, o 13º Dalai Lama, que se interessava muito por tecnologia moderna. Essas coisas foram oferecidas por missões diplomáticas ao longo dos anos.
Entre esses objectos, estavam um gerador eléctrico, um projector de cinema, um relógio de bolso de ouro, três automóveis antigos, um carro a pedais, um comboio de corda, um conjunto de construções da Meccano com vários tipos de engrenagens com que se entretinha horas a construir proezas de engenharia mecânica.
Encontrou depois um terceiro esconderijo de coisas ocidentais numa arrecadação do Palácio Potala, de coisas oferecidas ao 13º Dalai Lama, pelos oficiais políticos britânicos.
Três desses presentes desempenharam um papel especial nas primeiras explorações científicas do 14º Dalai Lama:
Um Telescópio, um Globo e uma pilha de livros ingleses sobre a Primeira Guerra Mundial.
O 14º Dalai Lama tornou-se um Polímato, aprendeu sozinho tudo o que podia.
Começou a ler livros ingleses e aprendeu a falar inglês. Começou através da cartografia dos mapas das batalhas da Grande Guerra a interessar-se por Geografia. Mas, foi o relógio mecânico de corda que assinalou ainda em rapaz a sua propensão natural para a ciência.
Depois, com o Globo, começou a reconhecer os contornos dos países da Europa que tinha visto nos mapas das batalhas de guerra dos livros ingleses, e foi assim que percebeu sozinho que o Globo era um mapa do mundo. Descobriu os fusos horários e como se iam alterando ao longo do dia ( quando era meio-dia de um lado do Globo, era meia-noite do outro lado. E por fim, descobriu que o Planeta Terra era redondo. Esta pequena descoberta foi apenas uma entre muitas, sozinho, que esta mente científica em potência foi fazendo durante a sua infância.
Uma das suas grandes descobertas autónomas e em segredo, foi feita através do Telescópio.
O Tibete, num texto budista clássico levado da Índia para o Tibete, postulava uma Cosmologia na qual o Mundo era plano e a Lua brilhava com a sua própria luz, como o Sol.
Dado que o estatuto do jovem Tenzin(14º Dalai Lama) era magestoso na sociedade tibetana, foi enclausurado nos seus aposentos no Palácio Potala. Foi por isso, sempre muito surpreendente cada vez que descobria algo de novo.
À noite, virava o Telescópio para o céu, estudava as estrelas, os picos vulcânicos e as crateras dos meteoros na Lua. Uma noite, viu que as crateras e os picos faziam sombra. Primeiro, pensou que a fonte dessa luz vinha de fora da Lua, e não do seu interior como lhe tinham ensinado nos seus estudos monásticos. Mas depois, para confirmar o seu palpite, examinou cuidadosamente fotografias da Lua numa revista de astronomia encontrada no esconderijo do 13º Dalai Lama, e descobriu que mostravam a mesma coisa, uma sombra projectada pelos picos e pelas crateras.
A partir daí, o jovem Dalai Lama confirmou que a sua dedução estava certa: A Lua era iluminada não por uma Fonte de Luz intrínseca, mas pela Luz do Sol. Foi quando tomou consciência de que a descrição tradicional não era verdadeira. Ensinamentos com 1200 anos não eram verdadeiros. Descobriu sozinho que, ao contrário do que lhe tinham ensinado, que a Lua e o Sol não estão à mesma distância do Planeta Terra, nem tampouco são do mesmo tamanho.
Estas, e outras descobertas, na sua infância, tornaram-se numa semente de um Princípio que o Dalai Lama tem repetido por várias vezes desde então:
Se a Ciência puder provar que algum princípio do Budismo não é verdadeiro, então o Budismo terá de se alterar consoante as provas.
A partir daí, começou a questionar tudo, a desmontar e a voltar a montar e pôr a funcionar tudo o que estava nos vários esconderijos, inclusive os três automóveis antigos.
Foi quando, aos 14 anos, descobriu ao desmontar o projector de cinema e o gerador eléctrico, como funcionavam as máquinas, como funcionava a combustão interna, e descobriu que o dínamo do gerador criava um campo magnético à medida que ia girando.
Quando em 1959, os comunistas chineses invadiram o Tibete, exilou-se na Índia e abriu-se para ele um mundo de Fontes Científicas. Desde aí, que o Dalai Lama se reúne com cientistas para colocar as suas questões. Passou a devorar livros em inglês sobre Biologia, Física, Cosmologia, Astronomia. Começou a fazer palestras pelo mundo, e assim passou a conhecer cientistas de vários países, e passou a ser fascinado pela Física Quântica. Ficou encantado por descobrir que também a Física Moderna postulava a impossibilidade de conseguirmos encontrar uma justificação última para a nossa noção da Natureza Substancial da Realidade.
Passou a manter encontros com físicos quânticos e com astrofísicos para dar continuidade à discussão das compatibilidades básicas entre a visão da Realidade Budista e as visões que emergem da Física e da Cosmologia.
Quando lhe perguntaram por que motivo, como monge budista, tem um interesse tão forte pela ciência, ele explicou que para ele, o Budismo e a Ciência não são perspectivas do mundo totalmente opostas, mas sim diferentes abordagens com o mesmo fim: Procurar a Verdade!
" No Budismo, o treino é algo essencial para investigarmos a realidade, e a Ciência é uma forma diferente de procurar a Verdade. A busca científica expande o nosso conhecimento, de forma que nós budistas podemos utilizá-lo. Só que, obviamente, para outro propósito."
Para o Dalai Lama, o Budismo e o Método Científico, propõem estratégias alternativas para a mesma busca.
Foi assim que nasceram uma série de encontros com cientistas de alto nível, organizados por um Biólogo, Francisco Varela, que trabalhava em Paris.
E assim nasceram as reuniões da "Mente e da Vida", que reúnem cientistas de várias áreas, de acordo com os interesses científicos muito diversificados do Dalai Lama: Método Científico, Filosofia da Ciência, Neurobiologia, Ciência Cognitiva, Psiconeuroimunologia, Medicina Comportamental, Biologia, Psicanálise, Neurologia, Física Quântica, Cosmologia, Astrofísica, etc...
As reuniões da "Mente e da Vida" têm sido não só uma escola de ciência para o Dalai lama, como também tem sido, a um nível muito significativo, uma professora para a Ciência.
Com estas reuniões, o Dalai Lama apresenta um Budismo actual e contemporâneo, e mantém-se a par dos desenvolvimentos científicos, o que muito tem contribuído como ferramenta para as palestras públicas que faz pelo mundo inteiro.
"Quando existem provas que refutam claramente as afirmações budistas, eu quero conhecê-las e mudar em conformidade. Dessa forma, a tradição budista como um todo irá manter a sua credibilidade no mundo moderno, em vez de incluir aquilo que alguns detractores rejeitam, sem sequer analisarem, por considerarem "superstições". No que diz respeito às Doutrinas Centrais do Budismo, durante as minhas décadas de diálogos com cientistas, tenho descoberto muito mais pontos convergentes do que divergentes, em relação à descobertas científicas modernas"
O Budismo tem as suas próprias explicações detalhadas sobre a Natureza da Mente, e da relação entre a Mente e o Corpo. Por outro lado, a atitude budista defende que a experiência e a investigação são mais importantes do que simplesmente acreditar na palavra de Buda, e nesse espírito, o Dalai Lama considera útil ouvir as descobertas da Ciência.
Fontes:
"Biografia de Dalai lama"
"Emoções Destrutivas e Como Dominá-las - Um Diálogo Científico com Dalai Lama"
Instituto Da Mente e da Vida
Autobiografia de Dalai Lama AQUI
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