domingo, 7 de abril de 2024

Traumas & Gatilhos






Durante muito tempo levaram-nos a pensar que só eventos físicos fortes, violentos e ameaçadores de morte ou experiências de medo, susto ou perda significativa tinham direito ao rótulo de trauma, tais como as experiências dignas do Correio da Manhã como violações, mortes, acidentes, catástrofes, guerras e outras. 

Trauma surge da palavra grega τραῦμα que significa “ferida” e que implica uma lesão ou perturbação produzida no organismo por um agente exterior. 
Podemos resumir que trauma é todo o impacto que ofende e condiciona a perfeita harmonia, saúde e equilíbrio interior e exterior. 
 
Ou seja, trauma não é o que causa a ferida mas sim, o efeito-memória interno emocional, psíquico ou físico que fica do impacto. 

Embora o trauma ou efeito-memória seja nobre, pois leva-nos a proteger-nos de um futuro impacto idêntico, pode ser negativo se congelar a nossa fluidez num estado de pânico permanente.
Ou seja, se um dia fomos atacados por um cão, o trauma irá levar-nos a ter mais cuidado com os cães no futuro. No pior dos casos, irá impedir-nos de sair de casa.

De acordo com observações feitas a várias terapias e técnicas como ferramentas de PNL, hipnoterapia, regressão, medicação perante traumas, a solução ideal passa sempre por reescrever o evento negativo original. Ou seja, se uma má experiência deixou um rasto negativo, também a experiência positiva deixará a sua marca positiva e por isso vemos o entusiasmo e libertação seguidos da superação perante a causa do medo; a pessoa com medo de voar que transforma o pânico em coragem, a pessoa que transforma o medo de cães, sentindo prazer em ter um cão bebé ao colo.  
 
Com o tempo foi-se descobrindo que pode haver trauma sem impacto violento ou óbvio externo. 
E se o excesso de algo pode causar trauma, também a falta de algo pode causar a mesma ou até maior dor. 

É preciso lembrar, para o contexto, que consciência espiritual e desenvolvimento pessoal estão hoje na moda, mas o normal de há 100 anos para trás era esconder emoções, seguir protocolos familiares, sociais ou religiosos e aparentar sempre bem e sob controle. 
Esta rigidez, repressão emocional, ignorância espiritual e um exagerado conservadorismo que vivia do e para o exterior, levou-nos a abafar os nossos desconfortos internos e as nossas perdas, os nossos silêncios e vazios, as nossas angústias e frustrações, condicionando de forma traumática, o nosso bem estar e a nossa saúde a todos os níveis. 

É só imaginar uma experiência de dois bebés, igualmente bem tratados a nível físico mas, um recebe colo, amor e atenção e o outro, é emocionalmente ignorado e vive sem amor e sem atenção humana. 
O primeiro bebé levará para a vida a crença da abundância, do merecimento de amor, enquanto que o segundo bebé traumatizado pela falta, acreditará num mundo sem amor e em pessoas ou relações emocionalmente estéreis. 

Ou o silêncio das mulheres que perdiam os seus bebés, tanto durante a gravidez como em tenra idade, ou de relacionamentos sem amor. 

Ou o peso que os homens carregaram de ter que providenciar para a família sozinhos ou de ter de ir à caça ou para a guerra. 

E para complicar ainda mais, a nossa estrutura interna, como forma de sobrevivência emocional, empurra os eventos do consciente para o inconsciente, para que possa não só sobreviver, como adaptar-se às exigência da rotina do momento. 
Ou seja, por exemplo: o segundo bebé vai ignorar ou reprimir a dor da falta de amor e adaptar-se, atrair e até a considerar “normais”, pessoas emocionalmente vazias, assim como ver como assustadoras, pessoas carinhosas. 

Obviamente o nosso inconsciente não é uma incineradora,  
antes fosse! 
Ele é sim um baú que guarda tudo, um guardião que nos protege e guarda esses eventos traumáticos para que possamos sobreviver, mas que aguarda pacientemente o tempo, a circunstância e a maturidade certa para nos convidar a lidar com esses conteúdos.

E de que forma o nosso inconsciente faz isso?

Através dos Triggers! 
Trigger é uma palavra inglesa que significa gatilho e que foi idealmente adaptada para explicar o fenómeno de activação de memórias antigas para limpeza e integração do inconsciente. 

Por exemplo; alguém que morre em vidas passadas afogado, numa vida futura a água será um Trigger que irá fazer sentir pânico perto da piscina ou do mar e que pretende activar o trauma original para que seja reescrito, curado, liberto, aceite. 

Tal como um despertador, o Trigger avisa-nos quando estamos perante uma oportunidade de revisitar velhas emoções, padrões, experiências que algures no passado não tivemos capacidade de lidar e que vão emergindo ao longo do tempo em busca da libertação e maturidade necessária para os integrar.
Desta ponto de vista o Trigger é importantíssimo pois se soubermos estar atentos e identificar esses gatilhos, revela-nos o que precisa de cura, amor e transformação em nós. Ou seja, o que está pronto para vir ao de cima.

De uma perspectiva negativa, o Trigger é visto como uma provocação, uma ameaça e que ao invés de permitir a cura, leva-nos a uma ainda maior resistência. 
Por exemplo: a pessoa que morreu afogada em vidas passadas, escolhe intencionalmente nascer numa família perto da praia. O medo ou trauma estão alojados no inconsciente, e cada ida da família à praia, aciona um Trigger de pânico. Seja na paciente mãe que o leva com cuidado a fazer as pazes com a água ou, no pai animado mas mais bruto que o empurra para as ondas; em ambos ele tem uma oportunidade de cura embora cada um terá um impacto diferente nele.

Se nos lembrarmos que o que conhecemos de nós da vida presente é apenas 1% perante os 99% das memórias de todas as outras vidas que já vivemos, carregamos em nós milhares de bloqueios, traumas, experiências desafiantes e dolorosas que reprimimos por sobrevivência do momento mas que precisam ser revisitadas e libertas.
 
Não caiamos na tentação de acreditar que o passado já passou e que criar uma vida nova é o grande objetivo. 
Primeiro, não evoluímos com cargas reprimidas, ou seja, não criaremos o novo enquanto não limparmos o velho. 
Segundo, iremos atrair repetições e oportunidades de limpar os velhos traumas e não circunstâncias novas como gostaríamos pois não estamos livres. 

Sabendo disto, resta-nos a rendição à sabedoria da vida. 
Resta-nos estar atentos ao que e a quem atraímos. 
Resta-nos aprender humildemente, como identificar traumas e reconhecer os nossos Triggers pois eles são a forma como percebemos ou somos avisados do que ainda se esconde em nós.

  • Vamos imaginar que o Trigger do menino da água é quando os pais dizem que é dia de ir à praia. A reação imediata de proteção inconsciente pode ser uma birra, fingir-se doente, criar um drama familiar. 
  • Para a criança que viveu a infância sem emoção e relações frias, o Trigger vai ser atrair uma pessoa carinhosa, expressiva, alegre, espontânea que o irá confrontar com o seu desconforto interno emocional mas que o estará a convidar a abrir espaço para sentir mais. 
  • Para o menino do cão, basta ver um ao longe e o Trigger aciona o trauma mas trará consigo uma oportunidade de superar e aprender a conviver com os cães do mundo. 

É importante observar que o exterior é sempre uma projeção do interior e vice-versa. 
De forma inteligente e previsível, o Universo trará sempre o que precisamos, e não o que queremos, e por isso não só o Trigger vem relembrar o problema mas também irá fazer atrair a solução ou oportunidade de superação. 

Se queres saber mais sobre os Triggers, 
  1. Tenta antes de mais não projetar e personalizar em alguém o teu drama e vê sim o outro apenas como a oportunidade de superação. 
  2. Procura observar o que ou quem te irrita, ameaça, provoca, descompensa e lembra que o outro é apenas quem o teu inconsciente usa como Trigger. 
  3. Regista também perante o Trigger, o que sentes, o que te apetece fazer, que emoções vêm ao de cima, que memórias aparecem ou o que te faz lembrar. 
  4. Imagina ainda, como uma pessoa saudável e madura no teu lugar e nas mesmas circunstâncias, lidaria com o teu Trigger.

Infelizmente a maior parte de nós, por falta de conhecimento, reage negativa ou mesmo violentamente perante os seus Triggers. Podemos dizer até que é normal por uma questão de sobrevivência. 
Mas a proposta de cura e transformação 
  • Pede não reação mas sim resposta. 
  • Pede não fuga mas sim confronto. 
  • Pede não resistência mas sim aceitação. 

Isso só é possível com consciência, maturidade, humildade e disponibilidade interna perante o Trigger, o Trauma e todo o processo de cura e libertação pessoal. 

Todos temos Traumas e Triggers. 
Fingir que não os temos, projeta-los nos outros ou escondê-los atrás de máscaras e papeis que representamos, só irá fazer-nos reprimi-los ainda mais e adiar o inevitável processo de cura, pois pela lei da polaridade, não chegaremos à luz sem passar pela sombra. 

Este gigante passo iniciático de assumir a sombra, é grau de Mestre, é para corajosos e conscientes, é para gente humilde comprometida com a sua evolução, é aplaudido por mestres e descrito por poetas. Não é para almas jovens que ainda sobrevivem na inconsciência de si mesmos e na projeção das suas sombras no mundo e nos outros.  

“Não há nada para esconder 
nem sítio para onde fugir 
quando o objetivo 
da Viagem da Vida 
é em direção a nós próprios.” 



Vera Luz



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