terça-feira, 16 de abril de 2024

Estoicismo







A filosofia não promete assegurar 
nada externo ao homem, 
caso contrário estaria admitindo algo que 
está além do seu próprio tema. 
Pois assim como o material do carpinteiro é a madeira, e o da estatuária, o bronze, 
o tema da arte de viver 
é a própria vida de cada pessoa.  
 — Epicteto, Discursos



Estoicismo é uma escola e doutrina filosófica surgida na Grécia Antiga, que preza a fidelidade ao conhecimento e o foco em tudo aquilo que pode ser controlado pela própria pessoa. 
Despreza todos os tipos de sentimentos externos, como a paixão e os desejos extremos.
 
É uma escola de filosofia helenística que floresceu na Grécia Antiga e na Roma Antiga. Os estoicos acreditavam que a prática da virtude era suficiente para alcançar a eudaimonia: uma vida bem vivida. Os estoicos identificaram o caminho para alcançá-lo com uma vida praticando as quatro virtudes na vida quotidiana: sabedoria, coragem, temperança ou moderação, e justiça, e vivendo de acordo com a natureza. Foi fundada na antiga Ágora de Atenas por Zenão de Cítio por volta de 300 a.C..

O nome estoicismo deriva de Stoa Poikile (grego antigo: ἡ ποικίλη στοά), ou "pórtico pintado", uma colunata decorada com cenas de batalha míticas e históricas no lado norte da Ágora, em Atenas, onde Zenão de Cítio e os seus seguidores se reuniram para discutir as suas ideias, perto do final do século IV a.C..[5] Ao contrário dos epicuristas, Zenão optou por ensinar a sua filosofia num espaço público. O estoicismo era originalmente conhecido como zenonismo. No entanto, este nome foi logo abandonado, provavelmente porque os estoicos não consideravam os seus fundadores perfeitamente sábios e para evitar o risco de a filosofia se tornar um culto de personalidade.

As ideias de Zenão desenvolveram-se a partir das dos cínicos (levadas a ele por Crates de Tebas), cujo pai fundador, Antístenes, havia sido discípulo de Sócrates. O sucessor mais influente de Zenão foi Crisipo, que seguiu Cleantes como líder da escola, e foi responsável por moldar o que hoje é chamado de estoicismo. O estoicismo tornou-se a filosofia popular mais importante entre a elite educada no mundo helenístico e no Império Romano a ponto de, nas palavras de Gilbert Murray, "quase todos os sucessores de Alexandre [...] professarem-se como estoicos"

Ao lado da ética de Aristóteles, a tradição estoica constitui uma das principais abordagens fundadoras da ética das virtudes. Os estoicos são especialmente conhecidos por ensinar que “a virtude é o único bem” para os seres humanos, e que as coisas externas, como a saúde, a riqueza e o prazer, não são boas ou más em si mesmas (adiáfora), mas têm valor como “material para a virtude agir sobre”. Muitos estoicos - como Séneca e Epicteto - enfatizaram que, como "a virtude é suficiente para a felicidade", um sábio seria emocionalmente resiliente ao infortúnio. Os estoicos também sustentavam que certas emoções destrutivas resultavam de erros de julgamento e acreditavam que as pessoas deveriam ter como objetivo manter uma vontade (chamada prohairesis) que estivesse "de acordo com a natureza". Por causa disso, os estoicos pensavam que a melhor indicação da filosofia de um indivíduo não era o que a pessoa dizia, mas como a pessoa se comportava. Para viver uma vida boa, era preciso compreender as regras da ordem natural, pois acreditavam que tudo estava enraizado na natureza.

O estoicismo floresceu em todo o mundo romano e grego até o século III d.C., e entre os seus adeptos estava o imperador Marco Aurélio. O estoicismo experienciou um declínio depois que do Cristianismo se ter tornado a religião oficial no século 4 d.C.. Desde então, viu renascimento, nomeadamente na Renascença (Neostoicismo) e na era contemporânea (Estoicismo moderno).

Os estudiosos geralmente dividem a história do estoicismo em três fases: 
  1. Estoa Antiga, ou ético, desde a fundação de Zenão até Antípatro, 
  2. Estoa Média, ou eclético, incluindo Panécio e Posidônio, e 
  3. Estoa Tardia, ou recente, incluindo Musónio Rufo, Séneca, Epicteto e Marco Aurélio. 

Nenhuma obra completa sobreviveu das duas primeiras fases do estoicismo. 
Apenas textos romanos da Estoa Tardia sobreviveram. 

O estoicismo sobreviveu durante o Império Romano, incluindo a época do imperador Marco Aurélio, até que todas as escolas filosóficas foram proibidas em 529 d.C. por ordem do imperador Justiniano, em razão de suas características pagãs, contrárias aos preceitos da fé cristã, já então dominante.


FILOSOFIA
A filosofia estoica tem o foco na vida prática, nas ações e acontecimentos do quotidiano e em como o ser humano lida com esses acontecimentos racionalmente.

Segundo o pensamento estoico, há coisas que não estão sob o controle das pessoas e há coisas que são possíveis de serem controladas. Neste caso, sobre o que não é possível controlar, como o clima, por exemplo, não há nada que possa ser feito para alterar o seu estado.

A ataraxia, a autossuficiência, a negação de sentimentos externos e o enfrentamento dos problemas através da razão são ensinamentos da filosofia cujo objetivo é mostrar que o indivíduo deve se concentrar apenas no que é possível controlar. Deve ser grato ao que já possui e negar os prazeres e emoções extremas:

           Ataraxia

O foco da filosofia estoica é a conquista da felicidade por meio da ataraxia, um ideal de tranquilidade em que é possível viver serenamente e com paz de espírito. Para os estoicos, o indivíduo apenas poderia conseguir essa felicidade através das suas próprias virtudes, ou seja, dos seus conhecimentos.

Autossuficiência 
 
A autossuficiência é um dos principais objetivos dos estoicos. Isso porque o estoicismo prega que cada ser deve viver conforme a sua natureza, ou seja, deve agir de forma responsável com o que acontece na sua própria vida.
Assim sendo, como ser racional que é, o ser humano deve se valer das suas próprias virtudes em prol da conquista do seu maior propósito: a felicidade. 
 
Negação de sentimentos externos 
 
Os estoicos consideram que os sentimentos externos (paixão, luxúria, etc.) são nocivos ao ser humano, pois fazem com que ele deixe de ser imparcial e se torne irracional.
Todos esses sentimentos são tidos como vícios e como causadores de males absolutos que comprometem as tomadas de decisões e a organização dos pensamentos de forma lógica e inteligente.

Enfrentar os problemas através da razão 
 
Na busca pela vida tranquila e feliz, a filosofia estoica defende que todos os fatores externos que comprometem a perfeição moral e intelectual devem ser ignorados.
Mesmo na adversidade, em situações problemáticas ou difíceis, as pessoas devem optar por reagir sempre com calma, tranquilidade e racionalidade, sem deixar que os fatores externos comprometam a sua capacidade de julgamento e ação.


Segundo a filosofia estoica, os acontecimentos que estão fora do seu controle não podem proporcionar a felicidade. A felicidade depende unicamente dos acontecimentos dos quais se pode controlar.
  
Saber quais são as coisas que estão sob o controle de alguém e quais não estão. 
Entre as primeiras estão, por exemplo, as opiniões, julgamentos ou ações que se adota, e é sobre elas que se deve centrar a atenção, tendo em mente que há outras coisas que não podem ser controladas. 
  
  Nas palavras de Séneca: 
  "O homem sábio está preocupado com a intenção de suas ações, não com seus resultados".
 

O estoicismo moderno propõe que esta dicotomia de controle se torne uma tricotomia e se acrescente uma terceira opção, que seriam coisas sobre as quais se tem um controle parcial. 
  Um exemplo seria uma partida de ténis em que o resultado não está sob controle total porque variáveis como a habilidade do adversário, as condições climáticas ou a perícia do árbitro influenciam o resultado. Portanto, neste exemplo, o objetivo não deve ser ganhar a partida, mas jogar da melhor maneira possível, pois isso pode ser controlado.

Para o ser humano alcançar a verdadeira felicidade, deveria depender apenas da sua “virtude”, ou seja, os seus conhecimentos e valores, abdicando totalmente do “vício”, considerado pelos estoicos um mal absoluto.

O estoicismo também ensina a manter uma mente calma e racional, independente do que aconteça. Ensina que isso ajuda o ser humano a reconhecer e se concentrar naquilo que pode controlar e a não se preocupar e aceitar o que não pode controlar.

A pessoa estoica busca agir racionalmente, mesmo com a existência de sentimentos. 
Não que o estoico seja um indivíduo sem sentimentos, mas ele não é prisioneiro deles.

Os princípios da filosofia estoica, que norteiam os seguidores da doutrina, são:

  • A virtude é o único bem e caminho para a felicidade;
  • A pessoa deve sempre priorizar o conhecimento e o agir com a razão;
  • O prazer é um inimigo do sábio;
  • O universo é governado por uma razão universal natural e divina;
  • As atitudes têm mais valor que as palavras, ou seja, o que é feito tem mais importância do que é dito;
  • Os sentimentos externos tornam o ser humano um ser irracional e não imparcial;
  • Não se deve perguntar porque algo aconteceu na sua vida, e sim aceitar sem reclamar, focando apenas no que pode ser modificado e controlado naquela situação;
  • Saber diferenciar o que é bom, mau e indiferente;
  • Assumir a responsabilidade pelo que posso controlar; 
  • Tudo ao nosso redor acontece de acordo com uma lei de causa e efeito;
  • A vida e as circunstâncias não são idealizadas. O indivíduo precisa conviver e aceitar a sua vida da forma que ela é;
  • Amar seu destino, porque não tem outro.
  • Dor e Doença, duas oportunidades para exercitar nossas virtudes;
  • Transformar obstáculos em oportunidades.

 

A partir destes princípios é possível entender que uma pessoa estoica é aquela que não se deixa levar por crenças, paixões e sentimentos capazes de tirar a racionalidade de uma pessoa na hora de agir, como desejos, dor, medo e prazer. Isso por essas circunstâncias serem infundadas e irracionais.


Uma das características do estoicismo que fez dele uma das correntes filosóficas dominantes foi sua natureza prática; foi entendido como uma espécie de caixa de ferramentas que lhes permitiu avançar em direção à autorrealização. 

Portanto, e assumindo que o verdadeiro estoico é um ideal para aspirar, e não um objetivo, algumas dessas ferramentas são as seguintes:

 | Identificar o que você pode controlar e o que você não pode controlar

 | Lidar com as emoções negativas e analisá-las usando a razão

 | Concentrar-se no momento presenta e evitar sofrimento emocional pelo passado ou futuro

 | Preocupar-se com os pensamentos, evitando a dependência de coisas externas.

 | Escrever um diário estoico e anotar as coisas importantes de cada dia para analisar o que deu certo, o que deu errado e o que ainda falta fazer.



Os estoicos forneceram um relato unificado do mundo, construído a partir de ideais de lógica, física monista e ética naturalista. Destes, eles enfatizaram a ética como o foco principal do conhecimento humano, embora as suas teorias lógicas fossem de maior interesse para os filósofos posteriores.

O estoicismo ensina o desenvolvimento do autocontrolo como meio de superar emoções destrutivas; a filosofia sustenta que tornar-se um pensador claro e imparcial permite compreender a razão universal (logos). O aspeto principal do estoicismo envolve a melhoria do bem-estar ético e moral do indivíduo: 

“A virtude consiste numa vontade que está de acordo com a Natureza”. Este princípio também se aplica ao domínio das relações interpessoais; “estar livre da raiva, da inveja e do ciúme”, e aceitar até mesmo os escravos como “iguais aos outros homens, porque todos os homens são produtos da natureza”.
Bertrand Russell
in, A History of Western Philosophy
 
As quatro virtudes são traços de caráter que devemos agir de acordo e valorizar nos outros:

  1. Sabedoria: agir de forma sábia significa tomar decisões com excelência, realizar julgamentos com base na razão e diferenciar entre o certo e o errado. É uma importante virtude por sustentar as outras três.
  2. Coragem: agir de forma corajosa significa enfrentar situações amedrontadoras, incertas, intimidadoras e difíceis sem covardia.
  3. Temperança: agir de forma moderada significa evitar o excesso, agir de forma equilibrada, ter autocontrole e não se deixar levar por desejos desenfreados. Significa não deixar a busca por prazeres se sobrepor à razão.
  4. Justiça: agir de forma justa significa ser razoável, íntegro e honesto ao lidar com o outro. Sem a justiça, a sabedoria, coragem e temperança podem se transformar em vícios. Por isso, as quatro virtudes precisam existir em harmonia.
Para os Estoicos, não importa seu cargo no trabalho, seus patrimónios, sua posição social, seu momento de vida, ou se usa gravata ou tshirt. O que importa são apenas o seu caráter, os valores, e a integridade das suas ações. É por esse motivo que o Estoicismo era praticado por ricos e pobres, nobres e escravos.


A ética estoica defende uma perspetiva determinística; em relação àqueles que carecem de virtude estoica, Cleantes uma vez opinou que o homem mau é "como um cão amarrado a uma carroça e compelido a ir aonde quer que ela vá".

Um estoico virtuoso, por outro lado, alteraria a sua vontade para se adequar ao mundo e permaneceria, nas palavras de Epicteto, "doente e ainda assim feliz, em perigo e ainda assim feliz, morrendo e ainda assim feliz, no exílio e feliz, em desgraça e feliz", postulando assim uma vontade individual "completamente autónoma" e ao mesmo tempo um Universo que é "um todo único rigidamente determinista". 

Este ponto de vista foi mais tarde descrito como “Panteísmo Clássico” (e foi adotado pelo filósofo holandês Baruch Spinoza).


Os estoicos afirmavam que haviam quatro categorias:

  1. Substância (ὑποκείμενον): A matéria primária, substância sem forma, (ousia) da qual as coisas são feitas
  2. Qualidade (ποιόν): A forma como a matéria é organizada para formar um objeto individual; na física estoica, um ingrediente físico (pneuma: ar ou respiração), que informa o assunto
  3. De alguma forma disposto (πως ἔχον): Características particulares, não presentes no objeto, como tamanho, forma, ação e postura
  4. De alguma forma disposto em relação a algo (πρός τί πως ἔχον): Características relacionadas a outros fenómenos, como a posição de um objeto no tempo e no espaço em relação a outros objetos

Os estoicos sustentavam que todos os seres (ὄντα)—embora nem todas as coisas (τινά)—são materiais. 

Além dos seres existentes, admitiam quatro incorpóreos (asomata): tempo, lugar, vazio e dizível.
Eles eram considerados apenas “subsistentes”, enquanto tal estatuto era negado aos universais. Assim, aceitaram a ideia de Anaxágoras (tal como Aristóteles) de que se um objeto é quente é porque alguma parte de um corpo térmico universal entrou no objeto. Mas, ao contrário de Aristóteles, ampliaram a ideia para abranger todos os acidentes. Assim, se um objeto for vermelho, será porque alguma parte de um corpo vermelho universal entrou no objeto.


Os estoicos delinearam que as nossas próprias ações, pensamentos e reações estão sob o nosso controlo. 

O parágrafo de abertura do Enchiridion declara as categorias como: 
"Algumas coisas no mundo dependem de nós, enquanto outras não. 
Dependem de nós as nossas faculdades de julgamento, motivação, desejo e aversão. 
Em suma, o que quer que seja da nossa responsabilidade."

Estes sugerem um espaço que depende de nós ou está ao nosso alcance.



Os estoicos propuseram que o conhecimento pode ser alcançado através do uso da razão: 
A verdade pode ser distinguida da falácia – mesmo que, na prática, apenas uma aproximação possa ser feita. Segundo os estoicos, os sentidos recebem constantemente sensações: pulsações que passam dos objetos através dos sentidos para a mente, onde deixam uma impressão na imaginação (phantasiai) (uma impressão que surge da mente era chamada de phantasma).

A mente tem a capacidade de julgar (συγκατάθεσις, synkatathesis) - aprovar ou rejeitar - uma impressão, permitindo-lhe distinguir uma representação verdadeira da realidade de uma que é falsa. Algumas impressões podem ser aceites imediatamente, mas outras podem alcançar apenas graus variados de aprovação hesitante, que podem ser rotuladas como crença ou opinião (doxa). É somente através da razão que obtemos compreensão e convicção claras (katalepsis). O conhecimento certo e verdadeiro (episteme), alcançável pelo sábio estoico, só pode ser alcançado verificando a convicção com a experiência dos seus pares e o julgamento coletivo da humanidade.


Física
Segundo os estoicos, o Universo é uma substância material de raciocínio (logos), que foi dividida em duas classes: a ativa e a passiva.

 A substância passiva é a matéria, que “permanece indolente, uma substância pronta para qualquer uso, mas que certamente permanecerá desempregada se ninguém a colocar em movimento”.

A substância ativa é um éter inteligente ou fogo primordial, que atua sobre a matéria passiva:

“O próprio universo é Deus e a efusão universal da sua alma; é o princípio orientador deste mesmo mundo, operando na mente e na razão, juntamente com a natureza comum das coisas e a totalidade que abrange toda a existência; então o poder e a necessidade preordenados do futuro; depois o fogo e o princípio do éter; depois, aqueles elementos cujo estado natural é de fluxo e transição, como a água, a terra e o ar; depois o sol, a lua, as estrelas; e a existência universal na qual todas as coisas estão contidas.”
 
— Crisipo, Em De Natura Deorum de Cícero

Tudo está sujeito às leis do Destino, pois o Universo age de acordo com a sua própria natureza e com a natureza da matéria passiva que governa. As almas dos humanos e dos animais são emanações deste Fogo primordial e estão, da mesma forma, sujeitas ao Destino:

“Considere constantemente o universo como um ser vivo, tendo uma substância e uma alma; e observe como todas as coisas têm referência a uma perceção, a perceção deste ser vivo; e como todas as coisas agem com um movimento; e como todas as coisas são causas cooperantes de todas as coisas que existem; observe também a rotação contínua do fio e a estrutura da teias.”
 
— Marco Aurélio, Meditações

As almas individuais são perecíveis por natureza e podem ser “transmutadas e difundidas, assumindo uma natureza ígnea ao serem recebidas na razão seminal ("logos spermatikos") do Universo”. Visto que a razão correta é a base da humanidade e do Universo.

A teologia estoica é um panteísmo fatalista e naturalista: 
Deus nunca é totalmente transcendente, mas sempre imanente e identificado com a Natureza. 
As religiões abraâmicas personalizam Deus como uma entidade criadora do mundo, mas o estoicismo iguala Deus à totalidade do universo; segundo a cosmologia estoica, que é muito semelhante à conceção hindu de existência, não há início absoluto do tempo, pois é considerado infinito e cíclico. Da mesma forma, o espaço e o Universo não têm começo nem fim, mas são cíclicos. 
O Universo atual é uma fase do ciclo atual, precedida por um número infinito de Universos, fadados a serem destruídos ("ekpyrōsis", conflagração) e recriados novamente, e a serem seguidos por outro número infinito de Universos. 

O estoicismo considera toda a existência como cíclica, o cosmos como eternamente autocriador e autodestrutivo.

O estoicismo não postula um começo ou fim para o Universo.
Segundo os estoicos, o logos era a razão ativa ou anima mundi que permeia e anima todo o Universo. Foi concebido como material e geralmente é identificado com Deus ou com a Natureza. 
Os estoicos também se referiam à razão seminal ("logos spermatikos"), ou à lei da geração no Universo, que era o princípio da razão ativa atuando na matéria inanimada. 
Cada ser humano também possui uma porção do logos divino, que é o Fogo primordial e a razão que controla e sustenta o Universo.



Ética
O fundamento da ética estoica é que o bem reside no próprio estado da alma, na sabedoria e no autocontrolo. É preciso, portanto, esforçar-se para estar livre das paixões. 
Para os estoicos, a razão significava usar a lógica e compreender os processos da natureza – o logos ou razão universal, inerente a todas as coisas. 
A palavra grega pathos era um termo abrangente que indicava uma imposição que alguém sofria. Os estoicos usaram a palavra para discutir muitas emoções comuns, como raiva, medo e alegria excessiva. Uma paixão é uma força perturbadora e enganadora na mente que ocorre devido a uma falha em raciocinar corretamente.

Para o estoico Crisipo, as paixões são julgamentos avaliativos. 
Uma pessoa que experiencia tal emoção valorizou incorretamente uma coisa indiferente.
Uma falha de julgamento, alguma falsa noção do bem ou do mal, está na raiz de cada paixão.
O julgamento incorreto quanto a um bem presente dá origem ao deleite, enquanto que a luxúria é uma estimativa errada sobre o futuro.
Imaginações irreais do mal causam angústia no presente ou medo no futuro. 

O estoico ideal, em vez disso, mediria as coisas pelo seu valor real, e veria que as paixões não são naturais. Estar livre das paixões é ter uma felicidade autossuficiente. Não haveria nada a temer – pois a irracionalidade é o único mal; não há motivo para raiva – pois os outros não podem prejudicá-lo.


Os estoicos organizaram as paixões em quatro categorias: 
angústia, prazer, medo e luxúria.


Um relato das definições estoicas destas paixões aparece no tratado On Passions de Pseudo-Andronicus:

  1. Angústia (lupē): A angústia é uma contração irracional, ou uma nova opinião de que algo mau está presente, na qual as pessoas acham correto estarem deprimidas.
  2. Medo (phobos): O medo é uma aversão irracional, ou evitamento de um perigo esperado.
  3. Luxúria (epithumia): A luxúria é um desejo irracional, ou busca de um bem esperado, mas na realidade ruim.
  4. Prazer (hēdonē): O prazer é um inchaço irracional, ou uma nova opinião de que algo bom está presente, na qual as pessoas acham correto ficarem eufóricas.

Duas destas paixões (angústia e prazer) referem-se a emoções atualmente presentes, e duas destas (medo e luxúria) referem-se a emoções direcionadas ao futuro. 
Assim, existem apenas dois estados direcionados à perspetiva do bem e do mal, mas subdivididos quanto ao facto de serem presentes ou futuros.

Numerosas subdivisões da mesma classe foram colocadas sob o título de paixões separadas:
  • Angústia: Inveja, Rivalidade, Ciúme, Compaixão, Ansiedade, Pranto, Tristeza, Perturbação, Luto, Lamento, Depressão, Vexação, Desânimo.
  • Medo: Lentidão, Vergonha, Medo, Timidez, Consternação, Pusilanimidade, Perplexidade e Modéstia.
  • Luxúria: Raiva, Fúria, Ódio, Inimizade, Ira, Ganância e Saudade.
  • Prazer: Malícia, Arrebatamento e Ostentação.

O sábio (sophos) é alguém livre das paixões (apatheia). 
Em vez disso, o sábio experiencia bons sentimentos (eupatheia) que são lúcidos. 
Estes impulsos emocionais não são excessivos, mas também não são emoções diminuídas.
Ao invés disso, são as emoções racionais corretas.

Os estoicos listavam os bons sentimentos sob os títulos de alegria (chara), desejo (boulesis) e cautela (elabeia). Assim, se estiver presente algo que seja um bem genuíno, então a pessoa sábia experiencia uma elevação na alma – alegria (chara).

Os estoicos também subdividiram os bons sentimentos:
  • Alegria: Prazer, Alegria, Bom ânimo
  • Desejo: Boa intenção, Boa vontade, Acolhimento, Carinho, Amor
  • Cuidado: Vergonha moral, Reverência


Suicídio
Os estoicos aceitavam que o suicídio era permitido à pessoa sábia em circunstâncias que poderiam impedi-la de viver uma vida virtuosa, se fosse vítima de dor ou doença intensa, mas, caso contrário, o suicídio geralmente seria visto como uma rejeição do dever social do sábio.
Por exemplo, Plutarco relata que aceitar a vida sob a tirania teria comprometido a autoconsistência (constantia) de Catão como estoico e prejudicado a sua liberdade de fazer escolhas morais honrosas.

Amor e sexualidade
Os estoicos primitivos diferiam significativamente dos estoicos posteriores nas suas opiniões sobre sexualidade, amor romântico e relacionamentos sexuais.
Zenão defendeu primeiro uma república governada pelo amor e não pela lei, onde o casamento seria abolido, as esposas seriam mantidas em comum e o erotismo seria praticado tanto com meninos quanto com meninas com fins educativos, para desenvolver a virtude nos entes queridos.
No entanto, ele não condenou o casamento em si, considerando-o igualmente uma ocorrência natural. Ele considerava as relações entre pessoas do mesmo sexo de forma positiva e sustentava que os homens sábios deveriam "ter conhecimento carnal nem menos nem mais de um favorito do que de um não favorito, nem de uma mulher do que de um homem."
Zenão favoreceu o amor sobre o desejo, esclarecendo que o objetivo final da sexualidade deveria ser a virtude e a amizade.

Entre os estoicos posteriores, Epicteto manteve o sexo homossexual e heterossexual como equivalentes neste campo, e condenou apenas o tipo de desejo que levava alguém a agir contra o julgamento. 
No entanto, as posições contemporâneas geralmente avançavam no sentido de equiparar a sexualidade à paixão e, embora ainda não fossem hostis às relações sexuais em si, acreditavam, no entanto, que estas deveriam ser limitadas para manter o autocontrolo.

Musonius defendia que o único tipo natural de sexo era aquele destinado à procriação, defendendo uma forma de união de facto entre homem e mulher, e considerava não naturais os relacionamentos realizados apenas por prazer ou afeto.

Filosofia social
Uma característica distintiva do estoicismo é o seu cosmopolitismo: todas as pessoas seriam manifestações do espírito universal único e deveriam, de acordo com os filósofos estoicos, em amor fraternal, ajudarem-se uns ao outros de maneira eficaz. 

Nos Discursos, Epicteto comenta sobre a relação do ser humano com o mundo: 
"cada ser humano é, primeiro, um cidadão da sua comunidade; mas também é membro da grande cidade dos homens e deuses...".

Esse sentimento ecoa o de Diógenes de Sínope, que disse: 
"Eu não sou nem ateniense nem coríntio, mas um cidadão do mundo".

Os estoicos da época promoviam a ideia de que as diferenças externas, como status e riqueza, não são importantes nas relações sociais. Em vez disso, advogavam a irmandade da humanidade e a natural igualdade do ser humano. O estoicismo tornou-se a mais influente escola do mundo greco-romano e produziu uma grande quantidade de escritores e personalidades de renome, como Catão, o Jovem e Epiteto.

Em particular, os estoicos eram notados pela sua defesa à clemência aos escravos. 
Sêneca exortava: 
"Lembra-te, com simpatia, de que aquele a quem chamas de escravo veio da mesma origem, os mesmos céus lhe sorriem, e, em iguais termos, contigo respira, vive e morre" 

O QUE É SER ESTÓICO E QUAIS SÃO SUAS CARACTERÍSTICAS?

A palavra estoico, no seu uso moderno, refere-se a uma pessoa que é indiferente ao prazer e à alegria, assim como à tristeza ou à dor. 

O Dicionário da Real Academia da Língua Espanhola define estoico como "Forte, equânime diante do infortúnio" e o mesmo se aplica ao Dicionário de Oxford, que o define como uma pessoa que sofre dor ou problemas sem reclamar ou sem mostrar o que sente. No entanto, a doutrina estoica baseia-se mais em ser guiada pela razão e, como não se pode controlar o que acontece ao seu redor, controlar o que se pensa sobre o que acontece.

Por esta razão, o estoicismo se concentra especialmente nas emoções, às quais se refere como paixões, e que se divide em boas, más e indiferentes. 
As boas devem ser promovidas, as indiferentes ignoradas e as más têm que ser tratadas. 

A reflexão do estoicismo sobre isso é que as pessoas não são perturbadas pelas coisas que acontecem, mas pelas opiniões que têm sobre essas coisas que acontecem. Portanto, é uma questão de confrontar essas opiniões e, antes de assumi-las, questioná-las como se fossem hipóteses e não fatos firmes. Dessa forma, elas podem ser refutadas buscando uma perspectiva mais produtiva e obtendo uma resposta racional a essas paixões para transformá-las em emoções saudáveis.





Diferenças entre o Estoicismo e Epicurismo
O epicurismo também foi uma escola filosófica da Grécia Antiga, fundada entre 341 a 270 antes de Cristo, por Epicuro. Esta doutrina filosófica acreditava que o indivíduo só alcança a paz e a tranquilidade se encontrasse a ausência da dor.

Enquanto o estoicismo ensina que deve utilizar a razão, negar os prazeres terrenos e aceitar as dores e problemas, lidando apenas com o que pode ser controlado, o epicurismo prega que os indivíduos devem procurar prazeres moderados para alcançar um estado de tranquilidade e de libertação da dor.

No entanto, os prazeres não podem ser exagerados, pois, podem apresentar perturbações que dificultam o encontro da serenidade, felicidade e saúde corporal.

Enquanto isso, o estoicismo, contrariando o epicurismo, prega que a busca da felicidade está na eliminação dos prazeres e nas ações racionais diante de qualquer circunstância.

O epicurismo, por seu turno, é materialista. Não compreende que o universo possua uma ordem racional natural, não há uma razão universal que governa todo o universo, do qual a alma humana faça parte.

Enquanto isso, o estoicismo acredita que o universo é governado por uma ordem natural e divina.





  
Bibliografia:

George Stock, "Estoicismo: Guia Definitivo"
Pierre Grimal, "Marco Aurélio, o Imperador Filósofo"
Marcus Aurélius, "Meditações"
Bertrand Russell, "A History of Western Philosophy" 
Epicteto, "Enchiridion" ou "Manual do Epicteto"
Séneca, "Sobre a Brevidade da Vida" 
Ryan Holiday, "O Obstáculo é o Caminho"
  
  


Sem comentários:

Enviar um comentário