domingo, 19 de abril de 2020
A si próprio, para o seu diário
Primeiras horas da manhã; ainda não escreves
(nem tentas escrever), preguiçosamente lês apenas.
Tudo é imóvel, sossegado, cheio, como
se fosse uma prenda oferecida pela musa da lentidão,
como aquele tempo, na infância, nas férias, quando durante muito tempo
se estudava o mapa colorido antes da excursão, o mapa
que tanto prometia,
ou mesmo antes de adormecer, quando ainda não há sonhos,
mas já se pressente o sobrevir deles de várias partes do mundo,
a marcha deles, o peregrinar, o velar deles ao pé da cama do doente
(doente de vigília) e a animação entre figuras medievais
contraídas numa eterna imobilidade por cima da catedral;
as primeiras horas da manhã, o silêncio
- ainda não escreves,
ainda tanto percebes.
Aproxima-se a alegria.
Adam Zagajewski
in, Sombras de Sombras
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