sábado, 27 de abril de 2019

O Instante





Quem posso eu chamar, que palavras lúcidas 
e sóbrias, veementes 
poderão despertar as ondas felizes, 
que outro apelo, que outro alento 
aproximará as árvores, o hálito das suas frases? 

Quem me oferecerá no seu corpo o estuário das mãos,  
que prodígios da terra deslizarão no repouso, 
que declives, que jardins, que palácios diminutos,  
que intangíveis enlaces, que adoráveis volumes? 
Quem me dará o sossego da fábula mais pura 
com o exacto relevo imediata e vagarosa?  

Real e perfeita 
num deslizar de gozo, em lábios que emudecem deslumbrados, 
real e completo, secreto, imediato, maravilhoso 
é o instante que descobre o animal mais ardente, 
a mais ardente exactidão 
a mais oferecida à claridade, 
a mais contínua, a mais profunda suavidade. 

Estamos dentro de um seio onde nascemos  
como de uma montanha latente, somos a nascente confusão 
de múrmurios silvestres e a magia natural 
de um silêncio límpido, abraçamos a maravilha 
aqui e agora, reconcentração na felicidade, 
na evidência de delícias, múltiplas, fatais. 


António Ramos Rosa






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