O livro conta a história de um enfermeiro inglês chamado Noah com 32 anos, que trabalha num hospital em Londres, no serviço oncológico da Pediatria. Um trabalho muito difícil de gerir emocionalmente porque lida diariamente com crianças com cancro, muitas delas acabam por não resistir e partem deixando os pais num desgosto profundo.
O livro começa por relatar esse dia-a-dia desse enfermeiro e da sua decisão de tirar licença no trabalho para viajar para a Índia, Cambodja e Bali. Acabou por se sensibilizar com a situação fragilizada das mulheres indianas e ficou só pela Índia.
Tudo começou quando, ainda no hospital, leu um livro que dizia assim:
“ Aproveitas-te, meu velho, a tua vida como sempre sonhaste?
E o teu talento, o que fizeste com o teu talento? Pegaste nele e fizeste maravilhas pelo mundo, ou deitaste-o fora, com verdadeira cobardia, enquanto pensavas que estavas a desperdiçar uma vida inteira e te lamentavas, perdido nos recantos da tua casa, que eras incapaz de seguir para diante?”
Também eu passei por isto aos 36 anos, o que me fez olhar para uma porta que eu teimava em manter fechada, sem saber o que podia encontrar lá dentro, quando à minha espera estavam outros gritos, outros sons, e uma nova felicidade que teimava em não chegar.
Não parece nada demais, pois não?
Questionamos, pensamos e agimos.
Eu, tal como o Noah, sentia que estava a desperdiçar a minha vida com coisas sem importância, e pensava que, devia fazer algo diferente com a minha vida, com mais valor, com mais significado. Pensava nas mulheres e crianças que vivem para lá do meu horizonte, o que estariam a fazer e se precisariam da minha mão amiga pronta a ser estendida e amparar a queda de alguém. O que eu não sabia era que para o saber fazer com o coração, teria primeiro de amparar a minha própria queda.
Precisava de ir em busca de não-sei-o-quê, com uma nova língua e uma nova força, pelo mundo, porque o mundo é uma casa sem teto para todos nós. E, tal como o Noah, o meu coração chama-me para a Índia, para amparar a queda de meninas e mulheres que vivem nas ruas sem teto.
Por tudo isto, este livro me tocou profundamente no coração.
Quando chega à India, hospeda-se em Old Delhi, e descreve várias experiências que teve lá e que são o ponto de arranque para tudo o que acontece a seguir. Conhece um comerciante chamado Ilesh em Chandni Chowk, um dos mercados mais antigos de Old Delhi, que lhe dá o contacto de uma sobrinha de um amigo seu, para ser a sua Guia Turística durante a sua estadia na Índia, chamada Sahana. Quando a vê apaixona-se de imediato, mas ela já estava prometida em casamento contra sua vontade pela família para um polícia de Delhi. E é através da Sahana que passamos a ter conhecimento sobre como é nascer menina na Índia.
Antes de conhecer Sahana, depois de sair da loja do Sr. Ilesh, foi comer um Sheekh Kabab por 40 rupias, a moeda da Índia, que são 0,60 cêntimos (lá é tudo muito barato desde que seja comprado na rua) e conheceu um homem chamado Lambodar que lhe contou que era casado há 46 anos e que era pai de 7 filhos todos rapazes, e disse-lhe que era um homem de sorte porque não tinha filhas. Explicou-lhe que as mulheres são uma Maldição. Que as mulheres na Índia não são livres, porque antes de nascerem já o seu destino está traçado: a morte ou o sofrimento.
Depois, através da Sahana ficamos a saber a razão do Lambodar ter dito isto a Noah.
Um dia, ao observar as pessoas na rua, interrogou-se “Onde estão as mulheres?”.
Poucas eram as mulheres que caminhavam no meio dos homens, e as poucas que por ali andavam, tinham um olhar assustado, preocupado, e tímido. Foi pesquisar na net, e encontrou uma imensidão de notícias assustadoras sobre as mulheres da Índia: mulheres violadas, mulheres espancadas, mulheres assassinadas, bebés meninas mortas à nascença, meninas abandonadas na rua, mulheres e meninas raptadas, desaparecidas.
Leu um artigo de jornal que relatava uma violação colectiva num autocarro em Delhi no dia 29 de Dezembro de 2012( eu vi um documentário sobre isto na net e fiquei arrasada). A rapariga era estudante de medicina e foi violentamente espancada e violada por 6 homens, incluindo o motorista, dentro do autocarro, até à sua morte.
Depois, numa viagem que fez até Varanasi com Sahana, ela explicou-lhe que a principal razão para haver tanta pobreza e miséria na Índia é a existência dos Varnas e das Castas. Os Varnas são uma categoria, condição social, uma posição numa ordem hierárquica. Enquanto que as Castas (Jati em hindu) são entidades mais pequenas, que dependem da origem, da zona onde se vive, do trabalho que se tem, do parentesco. Cada Casta é única e tem as suas próprias características, rituais, língua, deuses, regras… os Varnas são Categorias que, embora se encontrem dentro das Castas, não as constituem. É uma complexa divisão social hindu, e quem nasce nesta ou naquela Casta, vive e morre nessa determinada Casta. Entretanto, foi declarada ilegal mas, o sistema permanece como forma de tradição, desigualdade social e discriminação.
Existem 4 Varnas, por ordem de importância:
- Brahmins, a classe mais alta, considerados quase Deuses, e são os sacerdotes, os professores e os filósofos;
- Kshatriyas, são os soldados, os polícias e os administradores;
- Vaishyas, são os comerciantes e homens de negócios;
- Shudras, são os camponeses, artesãos, operários e servos.
Por último, há um grupo que é considerado sem Casta. São excluídos da sociedade e são considerados impuros e por isso ninguém lhes toca. São os Dalits, os chamados Intocáveis, aqueles que fazem os trabalhos mais desprezíveis, como limpar o lixo, etc…
O Sistema de Castas assenta numa noção religiosa: a pureza e a Impureza.
Milhões de Dalits continuam a sofrer de forma permanente a discriminação. Dão-lhes trabalhos sujos, como limpar o lixo, excrementos, varrer, pavimentar, eliminar corpos humanos das ruas, limpeza de esgotos, limpeza de fossas, sendo obrigatório que a limpeza seja feita com as próprias mãos sem luvas.
Ninguém lhes toca, e não comem comida feita pelos Dalits, ou tocada por eles, para não contaminarem as pessoas de outras Castas. Não lhes é dado nenhum respeito nem nenhuma dignidade. Quem nasce Dalit, morre Dalit, e muitas crianças acabam abandonadas nas ruas, porque filhos de Dalit serão sempre Dalits.
Isto das Castas é um problema sério com fortes consequências nas comunidades indianas.
As crenças religiosas hindus continuam enraizadas nas comunidades, porque existe uma enorme resistência à mudança. As meninas e as mulheres Dalits continuam a ser exploradas e são maltratadas. Habitualmente são mulheres sem educação e analfabetas. Algumas são chamadas Devadasis, ou Servas de Deus. O hinduísmo é caracterizado por ter muitos Deuses e diferentes Ritos, e este das Devadasis é praticado há muitos anos, em que se acredita que as meninas nasceram para servir uma divindade de um templo, durante toda a sua vida. Elas estão presas ao trabalho e são exploradas desde a sua infância. Depois, mais tarde, são obrigadas a prostituir-se. Quando as meninas são entregues a um templo local, elas casam-se com a deusa Yellamma, a Deusa da Fertilidade, assim que atingem a puberdade. Nessa altura, geralmente entre os 8 e os 12 anos, a sua virgindade é vendida a um homem de Casta Superior e, a partir daí, tornam-se escravas da Deusa. Depois disso, não podem casar com nenhum homem e são obrigadas a usarem objectos que demonstram que são Devadasis. A função delas, até serem consideradas velhas ou pouco atractivas, é servir os desejos sexuais dos homens das suas comunidades. Dizem delas “ Devadasi, Servas de Deus mas esposas de toda a cidade”.
Elas são presas dentro deste sistema, e fazem-nas acreditar que o que fazem é perfeitamente aceitável porque é algo que estão a fazer por devoção à Deusa Yallemma, que está presente na comunidade e tem poder sobre a vida das pessoas, e por isso estas mulheres e meninas crianças acreditam (ou acreditavam algumas) que se não cumprirem a devoção pela Deusa, toda a sua família será amaldiçoada, mas se cumprirem e agradarem a Deusa, ela trará saúde e riqueza. Elas não recebem dinheiro em troca mas, recebem presentes. Dantes viviam no templo mas, hoje em dia isto transformou-se num negócio, em que são vistas como superiores em relação às prostitutas normais dando-lhe um carácter sagrado valorizando mais o negócio para quem o explora.
Para combater a pobreza, os pais entregam as suas meninas ao templo, em troca de um emprego ou dinheiro. Eles sabem que não estão a prestar nenhuma devoção á Deusa mas, fecham os olhos a troco de algum dinheiro. São os pais que decidem a vida delas, e elas nem sabem para o que vão, só descobrem mais tarde quando chegam à puberdade. Outras meninas e mulheres, são vendidas para tráfico e exploração sexual em várias localidades da Índia.
Esta prática foi proibida pelo Estado, mas são os próprios polícias e políticos a recorrer às Devadasis para satisfazerem as suas necessidades sexuais, e nos dias de hoje elas continuam a prestar a devoção á Deusa em suas casas, sendo uma fonte de rendimento para os seus pais.
A violência sexual na India é um crime frequente o que leva a que as mulheres não se sintam seguras na rua. As mulheres grávidas de meninas são obrigadas a abortar, a matar as bebés à nascença ou a abandoná-las na rua.
Este é o maior problema da India:
Violação sexual, Infanticídio e Genocídio.
Quanto ao Infanticídio e Genocídio, as famílias acreditam que os rapazes trarão Força, riqueza, bênçãos e saúde à Família. As raparigas são consideradas uma maldição para a família porque, terão de dar um dote à família do noivo (bens materiais e dinheiro) para eles a sustentarem. Ficam sem a filha e sem os seus bens e o seu dinheiro. É o fim de uma linhagem familiar.
Quanto à Violação, a India tem uma cultura que apoia e defende que as mulheres devem ser violadas como forma de castigo, de poder masculino e disciplina.
Todos os anos são mortas mais de 100 mil mulheres só porque elas não reproduzem rapazes, ou porque os maridos não ficam satisfeitos com a quantidade de dinheiro que recebem da família da noiva quando se casam.
As crenças tradicionais hindus dizem que as meninas têm de ser educadas para serem boas filhas e esposas obedientes. Elas devem ficar em casa e fazer todo o trabalho doméstico. Uma mulher que se desvia das normas sociais representa uma vergonha para a família e para a sociedade, e é punida violentamente como meio de controlo social e castigo. Por exemplo, uma mulher nunca deve sair à noite sozinha, muito menos com um homem. Nem deve sair à rua de noite para fazer as suas necessidades em zonas onde não existem casas de banho. É completamente inaceitável. Mulheres idosas são violadas por irem de noite à rua fazer as suas necessidades, e na sua maioria morrem na rua abandonadas.
Os homens culpam sempre as mulheres pelas suas violações. Em alguns casos, são obrigadas a casar com o agressor, se ele o exigir, de forma a recuperar a sua dignidade. E o preocupante é que, algumas mulheres, admitem por vezes por medo que, provocaram um comportamento violento por parte dos homens. Acreditam que não têm outra escolha senão aceitar a violência por parte dos homens. E isto acontece tanto com as mais velhas, como com as estudantes do ensino médio e universitário.
Eu acredito que o problema está na educação dos mais novos, que crescem em ambientes hostis.
Se eles vêm ao longo do seu crescimento desde pequenos, um comportamento de violência contra a mulher, existe uma forte probabilidade de seguirem o mesmo comportamento porque é o considerado normal e aceitável. Isto chama-se de Modelagem. Por isso acredito que a solução está, a médio e longo prazo, na reeducação de valores e crenças tradicionais.
50 milhões de mulheres estão desaparecidas na India!
Todos os dias, 100 mulheres são violadas!
Uma grande parte da violência contra as mulheres indianas é violência doméstica, queimadas com ácido e espancadas até à morte, raptadas e mortas, fruto de uma crueldade medonha por parte dos maridos e dos sogros, por receberem dotes pequenos, não terem rapazes… é precisamente no leio conjugal onde ocorrem o maior número de crimes. Isto acontece em todos os estratos sociais e económicos, mas a pobreza e a baixa escolaridade agravam bastante a situação devido ao stress económico, à falta de conhecimento sobre as leis, e à falta de informação sobre a igualdade de género. Quando os homens perdem o controlo socioeconómico vingam-se na mulher espancando-a por tudo e por nada. É uma forma de Poder e Controlo, de mostrar a sua masculinidade, de mostrar quem manda. O homem indiano de classe média acredita que masculinidade é agir com autoridade, exercendo livremente esse privilégio de ser homem para estabelecer regras nas relações pessoais e para controlar as mulheres. Para serem homens precisam de ser rígidos, e o pior é que muitas mulheres acreditam e aceitam isto.
Quando uma mulher não se apaixona por um homem logo cedo, passado algum tempo a família escolhe um homem para ela casar e ter filhos, porque
é uma vergonha para a família ter uma filha que não seja casada. Eles têm esse poder sobre as filhas. Se as mulheres ficarem muito tempo sozinhas, as famílias começam a sentir vergonha porque os outros começam a dizer que ninguém as quer porque andam na rua com outros homens e não prestam.
É o estatuto social da família que fica em causa.
As mulheres na India são sempre propriedade de alguém…primeiro dos pais, e depois dos maridos e da família dos maridos. Podem mantê-las, vendê-las ou matá-las. Por isso existem 50 milhões de mulheres desaparecidas na India. Esses desaparecimentos não são investigados.
Quando os dotes não são do agrado do marido e da família do marido, a violência começa logo no início do casamento. Os dotes podem ser em dinheiro e em bens materiais, como terras, casas, carros, ou outras coisas de valor. Na india, quando o noivo não fica satisfeito com os dotes que recebe da parte da família da noiva, ele pode espancá-la ou matá-la, como forma de castigo, de revolta, de machismo. A entrada de uma mulher na família do noivo não serve para nada se a sua família não der bons dotes ao noivo. As mulheres são uma fonte de entrada de dinheiro na família do noivo, e por isso só querem ter rapazes, porque é uma fonte de rendimento.
Os dotes estão fortemente relacionados com o infanticídio e com o genocídio.
As mulheres na India vivem numa sociedade que diz. “Nós não queremos mulheres. Mulheres são uma maldição!”
Quando uma mulher engravida de uma menina é obrigada pela família do noivo a abortar antes da bebé nascer. Se a mãe não aceitar é perseguida até ao fim da gravidez e quando a menina nasce é morta pela família do noivo. Se a mãe conseguir salvar a menina, tem de a fazer desaparecer de casa, abandonando-a na rua. São obrigadas a abortar e a engravidar até terem rapazes, e caso não consigam, são consideradas inúteis e por isso são espancadas e assassinadas, para poderem casar de novo.
As mulheres significam
a saída de dinheiro e bens materiais numa família.
Os homens significam
a entrada de dinheiro e bens materiais na família.
E isto faz com que as meninas sejam logo indesejadas.
Os indianos dizem: “perdemos as nossas filhas porque passam a ser propriedade da família do noivo, ficamos sozinhos sem ninguém para cuidar de nós, e ainda temos de pagar para mantê-las noutra família.
Ter uma filha na India é como regar o jardim do vizinho.”
Muitos pais nem se sentem tristes quando matam as filhas. Eles acreditam que, em vez da criança sofrer no dia-a-dia por ser menina na pobreza ( 1 em cada 4 não resiste até à puberdade, por homicídio por negligência por falta de tratamento médico), é preferível matá-la logo após o seu nascimento.
Isto não acontece só na India.
Há outros países asiáticos e africanos que fazem o mesmo.
No mundo, há cerca de 200 milhões de mulheres desaparecidas.
Só na India são 50 milhões.
Elas estão desaparecidas porque deixaram de existir, foram assassinadas.
Os rapazes quando nascem são vistos como uma bênção.
As raparigas quando nascem são vistas como uma maldição.
Elas são mortas através do aborto selectivo, ou pelo infanticídio, ou abandonadas na rua, e por isso deixam de existir demograficamente.
Na India e na China, 30% das meninas são mortas antes de nascerem.
Isto virou um negócio bastante rentável porque, o Estado proibiu os aparelhos de ultrassom para saber o sexo do bebé antes de nascer, e passou a ser obrigatório registar os aparelhos de ultrassom e a informar quem queria fazer o teste e porquê, mas a maioria dos médicos ignora a Lei e aceita o dinheiro das famílias como suborno. Ganham milhões com isto.
As famílias pobres, que não têm possibilidade de recorrer à medicina, para evitar os dotes, matam as filhas à nascença ou abandonam-nas na rua.
Outra forma de fazer desaparecer as mulheres é através da violência física.
Elas são brutalmente assassinadas pelas famílias dos maridos.
Outras também desaparecem por serem traficadas para fins de exploração sexual, muitas vezes vendidas aos traficantes pelos maridos.
Há coisas que estão a mudar na India, mas há outras que só levantam polémicas, nomeadamente no que diz respeito à Educação.
A India criou a Lei do Direito à Educação, mas depois o Governo aprovou uma alteração na Lei de Proibição do Trabalho Infantil, que permite que as crianças com menos de 14 anos trabalhem nos negócios familiares. Isto é um retrocesso porque a Lei deveria proibir qualquer trabalho infantil e ser obrigatório irem para a escola. Esta alteração à lei, para além de permitir o trabalho infantil, também permite que as famílias recusem a entrada dos filhos na escola. Esta alteração foi feita porque acreditam que trará vantagens para as crianças. Acreditam que estão a ajudá-las a ganhar espírito de empreendedorismo. Isto é inacreditável!
O que representa uma criança que faz um trabalho contra a sua vontade?
Escravidão!
Primeiro salientam a importância de irem à escola, mas depois emendam uma Lei antiga, que proibia o trabalho infantil em 83 áreas consideradas perigosas, passando a proibir qualquer trabalho infantil, excepto nos negócios familiares.
Ou seja, agora têm as crianças a trabalharem, com a desculpa de serem negócios familiares. Não dá para entender uma emenda destas nesta lei, quando
a India é o país com mais incidência de trabalho infantil.
Agora, as crianças voltaram a trabalhar nas fábrica e nos campos. As escolas vão ficar vazias de novo, e recomeçará o tráfico humano de crianças para a exploração comercial. Haverá sempre a desculpa de que a criança é parente de alguém, e não haverá forma de provar o contrário.
O que aconteceu de imediato foi: a maior parte das meninas deixaram de ir à escola, e a maior parte delas estão desaparecidas.
Se as mulheres têm o mesmo tratamento na escola? Sim e não.
Por Lei, elas têm o mesmo direito à Educação que os homens, mas depois verifica-se que os homens com os mesmos cursos que elas, têm salários muito mais altos e muito mais regalias. A descriminação continua, e elas têm um nível de Educação bastante inferior ao dos homens, e a maior parte abandonam a escola precocemente por causa do dever patriarcal.
Seria um grande avanço se as mulheres estudassem, porque existem vários estudos que associam a baixa escolaridade à pobreza e à necessidade das mulheres trabalharem em casa, além de que a educação das mulheres tem um papel importantíssimo para o país. A Alta Educação permite que elas sejam mais competentes dentro e fora de casa, encoraja e promove a educação das crianças, especialmente as do sexo feminino,
reduzindo assim a taxa de feticídio. Podemos prevenir o feticídio com o aumento da escolaridade!!
A India, em muitas zonas rurais, vê na Educação o veículo para uma mudança social na comunidade. Está provado que a falta de educação nas mulheres surge associado à pobre nutrição dos seus filhos e também à morte dos mesmos.
A Educação serve não só para explicar o feticídio, como também a violência contra as mulheres. E por isso, a educação é importante para as mulheres, mas também para os homens, porque os homens com uma educação mais elevada e com atitudes favoráveis em relação à igualdade de género, estão menos propensos a terem comportamentos violentos contra as mulheres.
Por outro lado, o stress económico, o fracasso no trabalho e a insegurança parecem agravar e perpetuar a violência contra as mulheres. Isto está relacionado com as normas de masculinidade e as expectativas dos homens relativamente a sustentar economicamente a família, mesmo nas situações em que a mulher trabalha e tem o seu salário. Logo, pela lógica, se houvesse mulheres com mais escolaridade, elas teriam os seus salários e a situação financeira da família melhoraria e evitaria comportamentos violentos contra elas mas, na realidade não é isso que acontece…em muitos casos,
quando elas ganham mais dinheiro do que eles, a violência doméstica aumenta, para os homens demonstrarem o seu poder e superioridade.
E assim voltamos ao problema da masculinidade, e à superioridade dos homens em relação às mulheres na India.
As questões para se chegar à Discriminação levam-nos a várias situações, como o abuso sexual, o espancar, e a violência psicológica que acontecem dentro de cada família, e à observação da violência entre os pais.
Esta questão da observação, chama-se Teoria de Aprendizagem Social de Bandura, em que o processo de aprendizagem decorre a partir da Observação do comportamento de outras pessoas. É o que se chama de Modelagem. No entanto, os comportamentos não serão postos em prática sem que haja uma motivação, mesmo que os tenha observado e memorizado.
A motivação será, “Se ele pode bater nas mulheres, eu também posso”, “Se ele bate nas mulheres, então eu também irei bater”. As crianças são muito influenciadas por aquilo que vêem nas figuras masculinas. O controlo sobre as mulheres nas suas variadas formas e o respeito incutido que lhes dá outro estatuto social. Os rapazes interiorizam estes comportamentos violentos contra as mulheres como sendo aceitáveis para expressar a sua insatisfação, o stress ou a sua desaprovação. Ou seja, a violência e a discriminação podem ser desenvolvidas como normais se a criança, durante a sua infância, observar ou for vítima de algum tipo de violência ou discriminação. Essas crianças terão quatro vezes mais probabilidades de terem comportamentos violentos, quando comparado com homens que nunca experienciaram este tipo de violência e discriminação.
A lei de 2013 inclui agora pena de morte para as violações que causam a morte ou estado vegetativo da vítima, a relação sexual de um marido sobre a esposa durante o divórcio, a relação sexual de uma pessoa numa posição de autoridade, e a violação colectiva. Inclui também crimes como ferir alguém com ácido, assédio sexual, voyeurismo, intensão de se despir e perseguição. Estas alterações foram importante para a India, no entanto existe muita corrupção na polícia e
na maioria das vezes os processos não chegam aos tribunais e a justiça nunca é feita. Os elementos das Forças Armadas continuam com imunidade e são uma enorme ameaça para as mulheres. Para além disto, a idade mínima para casar continua a ser os 16 anos, e a violação no casamento é legal.
Está lá no Código Penal:
“ Relações sexuais ou acto sexual por um homem com a própria mulher, não tendo ela menos de 15 anos, não é violação”.
Isto é permitido para não criar situações de stress nas famílias e também por questões culturais e religiosas do hinduísmo. A India é uma sociedade patriarca, onde os homens lideram em casa, e a mulher é considerada um Ser Inferior. Só por ser mulher, ela tem de se sujeitar a fazer o que ele manda. E se eles quiserem ter sexo, é obrigação da mulher aceitar e não se negar, porque quando ela casa com um homem, ela já sabe que é esperado que ele domine em todas as esferas da vida. No fundo,
o corpo delas é deles. Quando uma
mulher casa, o homem assume que ela está a consentir ser dominada por ele e a ter relações sexuais, e por isso exige que ela lhe obedeça. Quando por algum motivo, ela não dá o seu consentimento, ele tem o direito de a forçar através da violência. Isto proíbe legalmente as mulheres de dizerem “Não”. Os homens sabem que a lei os protege,
o que lhes permite fazerem o que querem das mulheres dentro de casa. Isto explica a enorme incidência de violência doméstica na India.
As mulheres na India não têm qualquer valor: são mortas à nascença, assassinadas, raptadas para exploração de trabalho infantil, trabalho sexual, escravidão, são espancadas, violadas…
Eu continuo a achar que a melhor forma de alterar isto é através da Educação, tanto dos meninos como das meninas. Por várias vezes me disseram que “Não podemos fazer nada!” e cruzam os braços e ficam a assistir nos seus sofás à miséria humana nas televisões, tornando-se indiferentes a tanta tragédia humana que lhes entra em casa pela televisão. Nós podemos não conseguir mudar milhões de vidas mas, se cada um de nós mudar uma vida, se preocupar com outra e lhe fizer bem, imaginem o bom que este mundo poderia ser.
Sermos uma para cada uma!
Eu acho que este é o dever de todas as pessoas!
Começar por aí, por ser uma para cada uma!
Depois, se conseguirmos mudar mais vidas, melhor.
É claro que é nosso dever cuidar e respeitar todas as pessoas que se cruzam no nosso Caminho!
Mas, num país como a India, onde os homens odeiam as mulheres, que mais podemos nós mulheres desejar, a não ser que cada um se preocupe com uma só mulher, e mude a vida de uma só mulher?
Seria um excelente começo!
O importante é Salvar alguém!
As pessoas têm de ter consciência disto.
A Paz e a dignidade é um Direito de Todos!!!