sexta-feira, 21 de novembro de 2014
Ou vai...ou racha
Não fotografo muitos casamentos.
Nem tenho forma possível, de garantir que os que fotografo duram até ao fim. Sei que se pudesse, incluía no Pack dos serviços um voucher para a eternidade.
Gosto de pensar, falar e escrever sobre o Amor, mas é difícil adjectivar uma palavra, que se auto-define de forma tão hermética, que cada um tem a liberdade certa, de o sentir à sua maneira, sem que esta nunca perca o direito de se chamar assim, Amor.
Hoje num almoço com um grande amigo, trocávamos opiniões sobre o divórcio.
O divórcio não vive nos antípodas do amor, mas por norma acontece quando alguém deixa de amar, embora a sequência de acções que o desencadeiam, seja muitas vezes, de índole menos nobre, que a pura escassez do sentimento. Quer eu, quer o meu amigo, somos filhos honrosos da triste estatística. Cada um com a sua valsa, cada um com a sua história, cada um dono da sua narrativa, maestro ou orquestrante do seu fim.
Não se perdoa uma vida sem amor, por isso é tão fácil de encetar uma conversa sobre um relacionamento, copulando-a convenientemente à drenagem do sentimento.
Sou uma liberal, serei sempre uma liberal, no sentido mais moralmente lato da definição.
A que permite que o ser humano seja senhor do seu destino, da sua liberdade e da pureza das suas opções, mesmo que algumas sejam inconvenientes à conveniente felicidade dos outros.
Não sei qual é o recheio do amor, tenho sempre medo de o partir, mas tenho a certeza que há um inquilino gigante que vive lá dentro, a Verdade. E mesmo quando a verdade dói, ela é sempre merecida, nem que seja apenas, porque é pura e limpa, como o amor que move os homens, que se movem pelas melhores razões.
Hoje ao almoço, liamos numa estatística da Pordata (INE-DGPJ/MJ) que em 1960, 1% em cada 100 casamentos acabava em divórcio, e que em 2013 esta percentagem disparou para 70,4%.
Com alguma ingenuidade poderia acreditar, que isto só aconteceu porque as pessoas são mais verdadeiras, mas a vida já me lavou os olhos.
Também não acredito na voz monocórdica, do arauto da desgraça, que apregoa o síndrome do egoísmo, os vícios da sociedade moderna e as tentações da era digital.
Acho que nunca saberei bem porque é que o amor acaba.
Mas é sempre uma morte que me entristece.
Porque é que há casais que se enroscam no enlace narrativo da vida, até velhinhos?
E outros, que se desenroscam na primeira curva apertada da vida?
O que sei, é que cada vez que vejo dois velhos apaixonados, invejo-os.
Mesmo ignorando, que se conheceram numa excursão ao Machu Pichu no verão passado.
O amor não é uma opção, é um sentimento.
Não se faz download, nem upload de novas versões.
Nem se desinstala, só porque se quer.
Ele vem quando quer, e parece que parte da mesma maneira.
E se às vezes não parte, acho que é porque a vida deu a esses sortudos, o engenho do melhor nó da vida, o mesmo com que se amarra uma mãe a um filho.
Um dia, também vou ser uma velhinha agarrada ao meu velho. Também eu, farei as delícias da juventude em turismo, na digestão de um almoço angustiante.
E nessa altura, o peso leve do meu corpo envelhecido, não vai sentir o peso profético da estatística.
Serei só eu e tu, na “insustentável leveza do ser”, com um recheio de verdade, e um nó feito para a eternidade.
Isabel Saldanha
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