segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

.......pré-ocupar-me


Há uns anos, troquei uma entidade empregadora, um salário chorudo e um comodismo agradável pela aventura de ficar por conta própria, sem nunca saber quantos euros iria ganhar ou perder, e a liberdade de não ter nem de agradar nem de obedecer a ninguém.
Ainda não me arrependi!
Há anos que não faço ideia do que é isso de ter subsídio de férias ou de natal, não me passou sequer pela cabeça, quando saí de uma profissão onde estava há catorze anos, negociar subsídio de desemprego, ou começar a roçar-me pelas paredes, para me despedirem e levar uma indemnização para casa.
Na altura, diziam-me que eu era louca.
Talvez porque somos um povo habituado a reclamar muito os direitos, e a cumprir pouco os deveres, não sei.
Sei que não era ético, sei que para mim não fazia sentido exigir fosse o que fosse ao 'patrão', mas apenas levar da experiência tudo o que me parecesse importante.

A brincar, costumo dizer que hoje sou precária por conta própria.
Continuo sem saber quantos euros vou ganhar, quantos euros vou perder, e o futuro só me assusta quando me pré-ocupo com ele.
Aí, sim, fico cheia de dúvidas, fico cheia de medos e é um rol desmedido de 'ai isto' e de 'ai aquilo' e de 'ses'.
Se há uns tempos me chamavam louca, hoje há quem me chame inconsciente, sobretudo quando reparam que não me pré-ocupo com o que amarra e me prende.

"Sim, é sempre mais eficaz.
Ocuparmo-nos do que nos é dado a viver a cada momento.
Na pré-ocupação, o espaço para o presente fica cheio dessa futura ansiedade e os momentos consomem-se, consomem-nos, tantas vezes sem darmos por eles.
E, sim, continua a haver muitos dias em que, também eu, me pré-ocupo.
E por isso conheço bem a diferença: entre os dias em que estou pré-ocupada e os dias em que estou, simplesmente, ocupada.
Agora, por exemplo, estou ocupada a escrever este texto.
Podia pré-ocupar-me a pensar se alguém irá lê-lo, pré-ocupar-me com o que vou fazer a seguir, pré-ocupar-me com tantas outras coisas, sei lá.

E a culpa, ah, a culpa!
Dos políticos, dos ladrões, dos lobbistas, dos ricos, dos outros, pois.
Todos tão pré-ocupados com o que os outros fizeram, desfizeram, tiraram, roubaram e por aí fora.
E 2014, meu deus!, a pré-ocupação que por aí vai e, afinal, hoje é dia 17 de Fevereiro de 2014 e de 2015 não há nadinha, nadinha que se possa, hoje, ter a certeza de que irá existir.
Ou há?
Se houver, por favor digam...

E ok.
Pré-ocuparmo-nos com o futuro.
Com o corte dos subsídios, com a falência do estado, com as pensões vitalícias dos políticos, com a saúde da mãe, com a reforma um dia, tudo serve, afinal, para nos pré-ocuparmos...

Hoje, escolho ocupar-me com o presente.
Olho pela janela e vejo o cajueiro.
Calculo que não esteja minimamente pré-ocupado com as folhas que lhe irão cair, não tarda muito.
Eu também não estou.
Pré-ocupada com coisa nenhuma.
E é por isso que o espaço cá dentro hoje está assim, livre e desocupado.
E então já irei ver o que vou fazer, agora que estou mesmo a acabar este texto.
Talvez dançar..."

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