quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

Saturnália

 





O que era a Saturnália, 
rito romano pagão 
ao qual se atribui a verdadeira origem 
da celebração do Natal



Saturnália era um feriado romano destinado a dar as boas-vindas ao inverno.

Advogado, escritor e um dos mais célebres intelectuais do Império Romano, o também filósofo Sêneca tem uma citação sobre Roma, onde diz: 
“É o mês de dezembro, mas a cidade toda está coberta de suor”
O motivo de os romanos estarem acalorados no inverno, e o estoico Sêneca, incomodado, era a grande agitação das pessoas por conta da celebração da Saturnália, festival em homenagem ao deus Saturno.

As festas religiosas em Roma eram chamadas de feriae (de onde veio a palavra “férias”) e nesses dias os romanos não trabalhavam, havia troca de presentes e a esperada inversão de papéis entre mestres e escravos. A maior de todas as festas era a Saturnália, a princípio comemorada no dia 17 de dezembro, mas depois “esticada” para três dias, e mais tarde uma semana. Para Sêneca, parecia um ano.

Depois que o imperador César introduziu o calendário juliano, no ano 45 a.C, o solstício mudou, assim como a festa, para o dia 25 de dezembro. Cinquenta anos mais tarde, a data foi escolhida pelo Papa Júlio I para marcar o nascimento de Jesus Cristo, e a festa pagã acabou se transformando no Natal, onde apenas a tradição de troca de presentes se manteve.

Celebrada inicialmente, entre os dias 17 e 23 de dezembro, a Saturnália era definida pelo poeta Catulo como “o melhor dos dias”. A festa era considerada um retorno à era de Saturno, um tempo mítico em que todos os seres humanos eram iguais. Um rei era eleito por sorteio, o Saturnalicius princeps, para abrir os festejos.

Durante as comemorações, havia banquetes, músicas, danças, jogos e muita bebida. Ninguém trabalhava, nem mesmo os camponeses ou os servos. Nesse período, os escravos tinham todas as regalias de um cidadão comum, podendo até desrespeitar os seus mestres.


O Império Romano deixou como legado ao mundo ocidental, entre muitas coisas, os princípios do ordenamento jurídico praticado em dezenas de países, as raízes de línguas como o espanhol, o francês ou o italiano, e até a lógica com que operam os Corpos de Bombeiros que trabalham nas cidades.

Mas talvez haja um elemento desse legado que não é tão conhecido: a festa do Natal.

Em uma das principais celebrações do Cristianismo, hoje marcada por árvores luminosas, Papai Noel, manjedouras e reuniões familiares, é difícil ver qualquer vestígio da cultura romana.
Principalmente porque, por mais de cinco séculos, o Império Romano era um povo que acreditava em múltiplas divindades.


Mas qual é a ligação entre o Natal que conhecemos e a Roma Antiga?

A resposta a essa pergunta se refere a uma celebração romana em particular: a Saturnália, o rito com o qual o inverno era recebido no Império Romano.

"A escolha de 25 de dezembro como a data do nascimento de Jesus não tem nada a ver com a Bíblia; ao contrário, foi uma escolha bastante consciente e explícita de usar o solstício de inverno para simbolizar o papel de Cristo como a luz do mundo", diz Diarmaid MacCulloch, professor de história da Igreja na Universidade de Oxford, no Reino Unido, à BBC News Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC.
"Os costumes festivos e desregrados da Saturnália na mesma época do ano naturalmente migraram para a prática cristã, uma vez que no século 4 o Cristianismo estava se tornando mais proeminente na sociedade romana. As novas crenças seriam mais bem aceitas se não entrassem em conflito com antigos costumes não cristãos", acrescentou.

Mas quando ocorreu esse encontro entre os ritos romanos e as celebrações cristãs e como chegaram aos nossos dias?

A Saturnália era um festival realizado pelos romanos antigos para celebrar o que chamavam de "renascimento" do ano, para marcar o solstício de inverno no calendário juliano (prevalente no império romano e na Europa durante séculos) que, curiosamente, era celebrado em 25 de dezembro.

Porém, a festa começava oito dias antes, em 17 de dezembro, quando as normas que ordinariamente regiam a sociedade eram invertidas: os homens se vestiam de mulher e os senhores se vestiam de servos.

Mas começaram então as semelhanças com o Natal que conhecemos nos dias de hoje: as casas eram decoradas com folhagens, velas eram acesas e... presentes eram trocados.

"Essa celebração era realizada em homenagem ao deus Saturno (daí o nome) e sempre foi caracterizada pelo relaxamento da ordem social e pelo clima de carnaval", diz a historiadora Marguerite Johnson, da Universidade de Newcastle, na Austrália, em entrevista à BBC News Mundo.

Johnson enfatiza que a celebração em homenagem a Saturno no início do inverno tinha um significado: Saturno era a principal divindade dos romanos.

"Ele era o deus do tempo, da agricultura e das coisas sobrenaturais. Como os dias encurtavam e de alguma forma a terra morria de forma simbólica, era necessário que o deus do tempo e da comida ficasse feliz", explica Johnson.

E como parte dessa tradição de agradar a divindidade e outras pessoas, os presentes foram introduzidos.

"Como parte das festividades, os romanos trocavam presentes: velas, chinelos de lã, chapéus e até meias. E o faziam entre famílias, enquanto os escravos desfrutavam de tempo livre."

Mas a historiadora lembra que, 
além da festa da Saturnália, 
os romanos tinham outra celebração importante: 
a do "nascimento do sol invicto ou não conquistado"
 (Natalis Solis Invicti), 
que era celebrado todo dia 25 de dezembro, 
segundo diversos documentos dos tempos romanos.

"No almanaque do século 4, o Calendário de Filocalus, é mencionado uma celebração do Invictus em 25 de dezembro, que é provavelmente uma referência ao 'Sol Invicto'", diz Johnson.

"E é nesse documento que se faz a primeira menção que 25 de dezembro é o nascimento de Jesus", acrescenta a historiadora.

A verdade é que, no fim da era romana, o Natal já fazia parte do calendário romano.

Foi um processo gradual, segundo os historiadores, que teve a ver com uma hibridização ou amálgama de tradições.

Em meados do primeiro século, os cristãos já haviam chegado a Roma e começaram a moldar a sociedade do império.

"À medida que o cristianismo se tornou mais arraigado no mundo romano e a antiga religião politeísta ficou para trás, os cristãos se adaptaram a esses ritos estabelecidos e os tornaram seus", observa Johnson.

"É muito plausível que tenham escolhido essa festa pela sua relação com o renascimento, mas dessa vez com o renascimento de Cristo, a quem ao mesmo tempo foi confiada a missão de os redimir e conduzir à vida eterna", acrescenta.

Já no século 4 tudo passou a estar escrito: entre 320 e 353, o Papa Júlio 1º fixou a solenidade do Natal em 25 de dezembro, talvez como estratégia para converter os romanos.

No ano de 449, o Papa Leão 1º estabeleceu a data para a comemoração do nascimento de Jesus como uma das principais festas da Igreja Católica e finalmente o Imperador Justiniano em 529 a declarou feriado oficial do império.

Então, começou-se a supor que Jesus havia nascido em dezembro. No entanto, o historiador italiano Polidoro Virgilio no século 15 começou a notar as semelhanças entre vários ritos pagãos e a celebração do Natal.

"Polidoro Virgilio apontou a conexão entre a tradição predominantemente inglesa, 'The Lord of Misrule', que ocorria no dia de Natal, e o costume equivalente que ocorria durante a Saturnália. Ambos envolviam senhores e servos ou escravos trocando papéis por um dia", observa Johnson.

Por exemplo, os senhores usavam o pilleus – chapéu de escravo liberto –, e deixavam os escravos fazerem aquilo que mais desejassem ou, até mesmo, demonstrarem algum ato de insolência. Esta peculiaridade do festival era uma forma de escape das pressões sociais acumuladas, ao longo do ano, dentro das rígidas regras de sociabilidade romana.

O findar das festividades era marcado pela compra e oferta de velas, de figos gelatinosos e, em especial, de pequenas estatuetas em argila (sigillaria) que se encontravam à venda numa feira, especialmente realizada para o festival. Esta dera nome ao último dia de celebração, e era muito habitual as pessoas darem aos seus dependentes uma quantia monetária, para que pudessem comprar alguns bens por lá.

Desde então, busca-se a data exata do nascimento de Jesus, que alguns historiadores situam em meados de março ou início de abril.

Mas a influência é tão forte que continuamos a comemorar com presentes, festas e reuniões familiares no dia 25 de dezembro.

Nem sempre o dia 25 de Dezembro foi dia de Natal. 
A origem da celebração deste dia parece ser muito antiga mas a filiação mais directa provêm, como tantas outras coisas, dos Romanos. Estes celebraram durante muito tempo uma festa dedicada ao deus Saturno que durava cerca de quatro dias. Nesse período ninguém trabalhava, ofereciam-se presentes, visitavam-se os amigos e, inclusivamente, os escravos recebiam permissão temporária para fazer tudo o que lhes agradasse, sendo servidos pelos amos. Era também coroado um rei que fazia o papel de Saturno. Esta festa era chamada Saturnália e realizava-se no solstício de Inverno.

Convém lembrar aqui que o Solstício de Inverno era uma data muito importante para as economias agrícolas – e os Romanos eram um povo de agricultores. Fazia-se tudo para agradar os deuses e pedir-lhes que o Inverno fosse brando e o Sol retornasse ressuscitado no início da Primavera. Como Saturno estava relacionado com a agricultura é fácil perceber a associação do culto do deus ao culto solar.

Mas outros cultos existiam também, como é o caso do Deus Apolo, considerado como "Sol invicto", ou ainda de Mitra, adorado como Deus-Sol. Este último, muito popular entre o exército romano, era celebrado nos dias 24 e 25 de Dezembro data que, segundo a lenda, correspondia ao nascimento da divindade. 

Em 273 o Imperador Aureliano estabeleceu o dia do nascimento do Sol em 25 de Dezembro: Natalis Solis Invicti (nascimento do Sol invencível).

É somente durante o século IV que o nascimento de Cristo começa a ser celebrado pelos cristãos (até aí a sua principal festa era a Páscoa) mas no dia 6 de Janeiro, com a Epifania. 

Quando, em 313, Constantino se converte e oficializa o Cristianismo, a Igreja Romana procura uma base de apoio ampla, procurando confundir diversos cultos pagãos com os seus. Desistindo de competir com a Saturnália, deslocou um pouco a sua festa e absorveu o festejo pagão do nascimento do Sol transformando-o na celebração do nascimento de Cristo. O Papa Gregório XIII fez o resto: é mais fácil mudar o calendário do que mudar a apetência do povo pelas festas...



Mark Cartwright




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