"Um romance inquietante e belo que é um hino à amizade, uma elegia à imaginação e, acima de tudo, um poderoso manifesto contra o esquecimento.
SINOPSE
Numa manhã gelada de dezembro, Kyungha recebe uma mensagem da sua amiga Inseon -internada num hospital de Seul na sequência de um ferimento grave a cortar madeira - pedindo-lhe que a visite urgentemente. Quando Kyungha chega à enfermaria, Inseon conta-lhe que veio de avião da ilha de Jeju para ser tratada urgentemente e implora-lhe que vá a sua casa dar de comer e beber ao seu periquito, que de contrário morrerá.
Uma tempestade de neve fustiga a ilha à chegada de Kyungha e muitos dos autocarros foram cancelados ou sofreram atrasos. As rajadas de vento e o nevão constante não a deixam avançar e de repente a escuridão invade tudo. Kyungha não sabe se chegará a tempo de salvar a ave - nem mesmo se sobreviverá ao frio tremendo daquela noite; e não sabe também a vertigem que a aguarda em casa da amiga, onde a história há muito sepultada da família de Inseon acaba por revelar-se, em sonhos e memórias transmitidas de mãe para filha e num arquivo diligentemente organizado que documenta um terrível massacre ocorrido em Jeju.
Despedidas Impossíveis é um hino à amizade, uma elegia à imaginação e, acima de tudo, um poderoso manifesto contra o esquecimento. Como um longo sonho de inverno, estas páginas belíssimas formam muito mais do que um romance - iluminam uma memória traumática, enterrada ao longo de décadas, que ainda hoje ecoa no peito de muitas famílias."
in, Wook
Uma brancura tingida de sangue
Imaginemos um cenário branco, ainda que nem sempre totalmente imaculado, por terras da Coreia do Sul. Essa brancura, por vezes pura, outras conspurcada e invadida pelo sangue outrora derramado, é o cenário de Despedidas Impossíveis, de Han Kang (D. Quixote, 2025), livro que, em conjunto com a restante obra de Han Kang, valeu à escritora nascida em Kwangju o Prémio Médicis 2023 e o (tão merecido) Nobel da Literatura.
E é nesse cenário que as duas protagonistas se aventuram numa viagem, que mescla realidade com sonhos e espiritualidade, dor com memórias, e muitas feridas que teimam em manter-se abertas. Falamos de duas mulheres que construíram uma forte amizade ao longo dos anos, ainda que o tempo e a geografia as tenha separado.
Essas mulheres são Kyungha, escritora e habitante na capital Seul, e narradora deste livro, que vive um momento emocionalmente conturbado relacionado com o seu passado, constantemente assaltada por terríveis sonhos, e que luta diariamente para conseguir a melhor versão do seu testamento, algo que tarda em acontecer; e Inseon, artista multidisciplinar que se distinguiu como realizadora de documentários, habitante da Ilha de Jeju, local que foi palco do massacre que assolou a Coreia no final da década de 1940, fruto do terrível processo de descolonização por parte do Japão e que deu origem a cerca de 30 mil mortes.
Além de terem partilhado alguns trabalhos, juntas tinham, em tempos, combinado em fazer um documentário que traduzisse os sonhos de Kyungha, mas o projeto foi adiado, pelos menos por uma das partes, e a distância entre as duas cresceu. Foi devido a esse afastamento que Kyungha estranhou a mensagem de Inseon pedindo que a visitasse urgentemente no hospital (Inseon cortou os dedos quando estava a cortar madeira) numa manhã gelada de um dezembro marcado por uma tempestade de neve. A razão de toda essa urgência relacionava-se com um favor que Inseon queria pedir à sua amiga: ir a sua casa para alimentar o seu periquito que, caso contrário, não sobreviria sem comida e sem água.
A esse pedido juntou-se a preocupação de ver o estado de Inseon que na sequência de ter cortado a ponta de alguns dedos tinha de ser picada a cada três minutos por uma enfermeira para garantir que os tendões não perdessem a vitalidade. Apesar de muito preocupada, e assustada, Kyungha aceita a demanda, ainda que tenha noção de que a viagem vai ser muito complicada, pois o mau tempo ameaça e muitos voos de avião e autocarros foram cancelados ou estão atrasados. Mas a forte amizade que as une é o motor que faz com que Kyungha enfrente a fúria da Natureza para tentar salvar a vida do pássaro.
Com muita dificuldade, lá consegue apanhar um autocarro e é na quase exclusiva companhia do motorista que chega perto do seu destino, pois depois de se apear ainda tinha de percorrer um longo caminho até à casa da sua amiga, trajeto que pouco ou nada se lembrava e que vai ser um dos maiores desafios da sua vida, pois à medida que é engolida pela neve, frio, vento e escuridão da noite, e a lutar contra enxaquecas e espasmos abdominais, também a sua sobrevivência está em jogo.
Felizmente, consegue chegar ao seu destino e, ao entrar na casa de Inseon encontra um mundo sepultado nas memórias da família da realizadora e que traz à tona memórias e fantasmas do passado relacionados com o massacre de Jeju.
Com essas premissas como ponto de partida para um romance que olha para o luto de um povo atormentado com o passado, Han Kang constrói uma narrativa deliciosamente descritiva, dividida em três partes, em que gradualmente os factos contextuais vão dando lugar às metáforas (em especial através do rigor dos caprichos de um Natureza palpável, ora doce, ora agressiva) e a um mundo de sonhos e surrealismos líricos (os periquitos Ama e Ami, ou os troncos que assumem as figuras humanas representadas nos sonhos de Kyungha) vincadamente dolorosos.
Como na leitura de um diário, os capítulos de Despedidas Impossíveis alternam entre o presente e os ecos de um passado vivido por ambas as protagonistas, juntas ou separadas, em que os flashbacks e os itálicos toldam e moldam os sentidos do leitor em camadas emocionais pautadas por momentos de brutalidade, compaixão, melancolia, entre o desabafo e o medo, entre a luz e a sua ausência, e em que tudo vale para vencer os pensamentos que atormentam as almas frágeis, nem que isso signifique dormir com uma serra de arco debaixo da cama para afugentar as tormentas. Pelo caminho há ainda espaço para refletir sobre o poder da mulher, a liberdade, a opressão e violência sobre um povo “legitimadas” sobre uma bacoca supremacia do invasor face à fragilidade do invadido, a solidariedade e, acima de tudo, a luta contra o esquecimento.
Não sendo um livro “fácil” e que exige alguma resiliência ao leitor, como, por exemplo, algumas passagens da obra de Jon Fosse, Despedidas Impossíveis é um bonito exercício de catarse que condensa décadas de sofrimento individual e coletivo de um povo que continua refém de uma história guardada em pedaços de jornais rasgados, livros, fotografias e cartas à família, através dos quais se misturam dor e esperança, sonhos e pesadelos e em que a neve está sempre presente.
Carlos Eugénio Augusto
GUERRA DA COREIA
A Guerra da Coreia foi um conflito armado que ocorreu na Península Coreana entre 1950 e 1953, envolvendo a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, bem como seus aliados, no contexto macro da Guerra Fria. O conflito foi um dos principais pontos de tensão da Guerra Fria, com a Coreia do Norte apoiada pela China e pela União Soviética, e a Coreia do Sul apoiada pelos Estados Unidos e outros países da ONU.
A guerra terminou com um armistício em 1953, mas sem um tratado de paz, deixando a península dividida e em estado de tensão até hoje.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, e com a rendição do Japão, a Coreia foi dividida em duas zonas de influência, com o norte sob domínio soviético e o sul sob domínio americano, ao longo do paralelo 38.Em 1950, a Coreia do Norte invadiu a Coreia do Sul com o objetivo de reunificar a península sob um regime comunista.Em 1953, foi assinado um armistício que encerrou as hostilidades, mas não um tratado de paz formal, deixando a península dividida ao longo da Zona Desmilitarizada Coreana (DMZ).
A Guerra da Coreia causou milhões de mortes e deixou um legado de divisão e tensão na península coreana, com a Coreia do Norte e do Sul mantendo-se em estados de alerta militar até hoje.
O extermínio de civis (homens, mulheres, crianças, bebés, idosos) começou logo em 1945, após o fim da Segunda Guerra Mundial.
A Coreia foi governada pelo Japão desde 1910 até ao final da Segunda Guerra Mundial.Em agosto de 1945, os soviéticos declararam guerra contra os japoneses, como resultado de um acordo feito com os Estados Unidos (sem o conhecimento e aprovação do povo coreano) e libertaram o norte do Paralelo 38.Tropas americanas, logo em seguida, se moveram para ocupar o sul da península.
Em 1948, como resultado do início da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética, a península coreana foi dividida em duas regiões, com governos separados.
Representantes da zona sul (capitalista, de influência americana) e da zona norte (comunista, de influência soviética) afirmavam, cada um, ser o legítimo governo da Coreia, e nenhum lado aceitava as fronteiras da época como permanentes.
O conflito escalou para uma guerra aberta total quando os norte-coreanos, apoiados belicamente pelos soviéticos e chineses, invadiram o sul, em 25 de junho de 1950.
Naquele período, o Conselho de Segurança das Nações Unidas reconheceu isto como uma invasão ilegal e exigiu um cessar-fogo.
A 27 de junho, o Conselho da ONU aprovou a Resolução 83, condenando a invasão e enviou soldados sob a bandeira das Nações Unidas para restabelecer a paz na península coreana.
Cerca de vinte e um países comprometeram forças militares para a missão da ONU.
A guerra arrastou-se por três anos até que, em 27 de julho de 1953, um armistício foi assinado.
O acordo firmou a Zona Desmilitarizada da Coreia a fim de separar o Norte e o Sul, e permitiu a troca de prisioneiros.
Contudo, nenhum tratado de paz formal foi assinado entre as partes envolvidas, o que faz com que as duas Coreias estejam, tecnicamente, ainda em guerra.
Cerca de três milhões de pessoas morreram na guerra, a maioria civis, tornando-a no conflito mais mortal da Guerra Fria.
Samuel Kim classifica a guerra como o conflito mais mortal no Leste Asiático — a região mais afetada por conflitos armados relacionados à Guerra Fria.
Embora apenas estimativas aproximadas de fatalidades civis estejam disponíveis,
a percentagem de vítimas civis na Coreia foi maior do que na Segunda Guerra Mundial ou na Guerra do Vietnam.
Desde então, ambos os países continuam com provocações mútuas e até atos de violência, com os governos a ter muita animosidade um pelo outro.
Em abril de 2018, os líderes das duas Coreias reuniram-se na Zona Desmilitarizada e concordaram em trabalhar para assinar um tratado de paz para encerrar oficialmente a guerra.
Após anos de tensões e agressões mútuas, uma nova tentativa de paz foi feita a27 de abril de 2018.
Foi reportado, após os líderes das duas Coreias se terem encontrado na Zona Desmilitarizada, que negociações estavam em andamento para finalmente assinarem um acordo oficial de encerramento do conflito.
Não foi divulgado se outros pontos sensíveis, como a desnuclearização da Península Coreana ou o reconhecimento de soberania de cada lado sobre a zona desmilitarizada, fariam parte das negociações.
No entanto, nada mudou até hoje.
CRIMES DE GUERRA
Houve inúmeras atrocidades e massacres de civis ao longo da Guerra da Coreia cometidos por ambos os lados, começando logo em 1945.
De 2005 a 2010, a Comissão de Verdade e Reconciliação da Coreia do Sul investigou atrocidades e outras violações de direitos humanos ao longo de grande parte do século XX, desde o período colonial japonês até à Guerra da Coreia e além.
A comissão escavou algumas valas comuns dos massacres da Liga Bodo e confirmou os contornos gerais dessas execuções políticas.
Dos massacres ocorridos durante a Guerra da Coreia que a comissão foi solicitada a investigar, 82% foram perpetrados pelas forças sul-coreanas, enquanto 18% foram perpetrados pelas forças norte-coreanas.
Milhares de assassinatos políticos, tiveram lugar nas cidades e aldeias.Militares sul-coreanos, policiais e forças paramilitares, executaram milhares de esquerdistas e simpatizantes comunistas( que se alistavam em troca de sacos de arroz)
Espancamentos, fome, trabalho forçado, execuções sumárias e marchas da morte eram comuns.
Os corpos dos mortos eram muitas vezes despejados em valas após fuzilamento, ou então fuzilavam os civis à beira-mar e quando a maré enchia levava os cadáveres.
Ainda hoje, muitos coreanos não comem nada que venha do mar, porque os peixes e crustáceos alimentaram-se dos cadáveres dos seus familiares.
TUDO ISTO É RELATADO NO LIVRO.
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