terça-feira, 12 de abril de 2011
Portugal Hoje...
"Ah, onde estou onde passo, ou onde não estou nem passo,
A banalidade devorante das caras de toda a gente!
Ah, a angústia insuportável de gente!
O cansaço inconvertível de ver e ouvir!
(Murmúrio outrora de regatos próprios, de arvoredo meu.)
Queria vomitar o que vi, só da náusea de o ter visto,
Estômago da alma alvorotado de eu ser..."
Álvaro de Campos
"E é sempre a mesma sucessão das mesmas frases... «E então ela disse...» e o tom diz da intriga dela. «Se não foi ele, foste tu...» e a voz que responde ergue-se no protesto que já não oiço. «Disseste, sim senhor, disseste...» e a voz da costureira afirma estridentemente «Minha-mãe diz que não quer...» «Eu?» e o pasmo do rapaz que traz o lanche embrulhado em papel-manteiga não me convence, nem deve convencer a loura suja. «Se calhar era...» e o riso de três das quatro raparigas cerca do meu ouvido a obscenidade. «E então pus-me mesmo diante do gajo, e ali mesmo na cara dele - na cara dele, hein, ó Zé...» e o pobre diabo mente, pois o chefe do escritório - sei pela voz que o outro contendor era chefe do escritório que desconheço - não lhe recebeu na arena entre as secretárias o gesto de gladiador de palhinhas. «... E então eu fui fumar para a retrete...» ri o pequeno de fundilhos escuros.
Fernando Pessoa
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